Sou Solano Sampaio, tenho 18 anos. Sempre fui um cara decidido, com os pés no chão e a cabeça nos meus objetivos. Nunca fui de perder tempo quando quero uma coisa, corro atrás. E com a faculdade não foi diferente. Estudei muito até passar na Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópolis, para Direito.
Você deve estar se perguntando: "Por que tão longe, se sua cidade já tem esse curso?"
Acontece que sempre tive vontade de sair, conhecer coisas novas. Floripa sempre me encantou aquele mar, o clima, a vibe diferente... Sempre quis ir pra lá. E pensei: por que não fazer faculdade lá também? Então fui.Meus pais não curtiram muito a ideia no começo, mas acabaram aceitando. Minha irmã mais nova sempre me apoiou em tudo. Já a Alicia, minha namorada... não ficou nada feliz com essa mudança. Mesmo assim, decidimos tentar à distância. Combinei de voltar em todos os feriados são "só" 307 km até Curitiba. Umas cinco horinhas de ônibus.
Hoje é dia de despedida. Meus pais, minha irmã, meus dois melhores amigos Bruninho e Carlão e, claro, minha pimentinha Alicia, estão aqui comigo. Dói deixar tudo isso pra trás. Mas eu tô indo atrás do meu sonho.
— Meu filho, tenha juízo. Não se deslumbre com as coisas lá... — diz minha mãe, Lurdes, com aquele olhar preocupado de sempre.
— Pode deixar, mãe. Você me criou direitinho. — respondo, tentando dar um sorriso leve, mesmo com o nó na garganta.
— Acho bom, filho — diz meu pai, Arnaldo, meio sério, meio emocionado.
— Vou sentir sua falta, maninho — Melissa faz um biquinho triste, abraçando meu braço.
— Eu também, maninha. Mas assim que der, venho visitar vocês. — passo a mão no cabelo dela, bagunçando de leve, como sempre faço.
Olho pro lado e vejo a Alicia... de braços cruzados, olhar emburrado.
— Ainda tá brava, minha pimentinha? Já conversamos sobre isso, lembra? — me aproximo devagar, tentando beijá-la, mas ela vira o rosto. Ai.
— Não fica assim, cunhadinha... Ele logo volta — diz Melissa, tentando ajudar.
— Ele podia fazer faculdade aqui em Curitiba como todo mundo, mas não... quer ir pra longe. — Alicia bufa, desviando o olhar. — Eu não gosto disso.
— Já falei pra você não se preocupar. Eu só tenho olhos pra minha pimentinha linda. — Tento suavizar, colocando a mão no rosto dela, mas ela se afasta.
Bruninho se aproxima e me dá um tapa leve nas costas.
— Relaxa, cara. Isso vai passar. Ela só tá digerindo sua ida ainda.
— Mas, Bruninho... já faz dois meses que ela tá assim comigo. Eu não queria me despedir desse jeito.
— Amigo, relaxa — diz Carlão — a gente vai ficar por perto dela.
— Valeu por isso. — respondo com um aceno de cabeça, grato por eles.
— Está na hora, filho. — diz minha mãe, já segurando as lágrimas.
Me despeço da família, um por um, tentando segurar a emoção. Quando chego na Alicia, respiro fundo. Era agora ou nunca.
— Pimentinha... Relaxa, vai funcionar. A gente combinou de se falar sempre, fazer chamadas de vídeo nos fins de semana... E eu volto quando der. Agora não fica assim. Se despede de mim direito, vai? Por favor... — pego nas mãos dela, com o coração apertado.
Ela suspira, finalmente cede. Me abraça apertado, e me beija. Não diz nada, mas o gesto fala por si.
Sigo pro ônibus. Sento, encosto a cabeça no vidro. Tento não pensar muito. Nem sempre foi assim com a Alicia... Mas desde que contei, dois meses atrás, que passei em Direito em Floripa, ela ficou diferente. Distante. Tenho feito de tudo pra trazer as coisas de volta ao normal... mas nem sempre dá.
Melhor tentar dormir. A viagem é longa.
Cheguei em Biguaçu e fui direto pro apê que meus pais alugaram pra mim. Liguei pra avisar que cheguei, e depois comecei a colocar tudo em ordem. Passei o fim de semana todo organizando a casa e ajeitando as coisas da faculdade. Segunda começam as aulas.
Acordo animado, me arrumo, tomo um café correndo e pego o ônibus. A faculdade é enorme. Muita gente indo e vindo, barulho de conversa, cheiro de café misturado com o som dos passos. Já curti o clima logo de cara.
Enquanto procuro a sala, alguém esbarra em mim com força.
— Olha por onde anda, cara! — falo, virando rápido.
— A culpa não é minha, você que devia prestar atenção! — retruca um cara, sem nem olhar direito, e sai andando.
Idiota. Penso. Mas deixo pra lá. Sigo procurando minha turma e encontro a sala. Várias aulas depois, percebo que o curso vai ser puxado. Mas não tem problema — tô feliz por estar aqui.
Ah, acho que não mencionei: eu adoro jogar basquete. E fiquei sabendo que aqui tem um time universitário. Me inscrevi assim que vi o anúncio. Agora, tô indo direto pro clube conhecer a galera.
Me chamo Juliano Pimentel, tenho 18 anos e sou de Floripa. Moro com meus pais, Rodrigo e Belinda — um casal incrível, do tipo que quero imitar quando tiver minha própria família. Tenho um irmão mais velho, o Hector, que é super protetor. Acho que é porque eu vivo me ferrando nos relacionamentos — sempre acabo sendo traído.
Minha mãe é uma guerreira. Está lutando contra um câncer de mama há um ano e, desde então, minha vida virou do avesso. Antes, eu era um cara cheio de amigos, jogava basquete, tinha aula de bateria, namorava... Agora, passo mais tempo em casa com minha família. Não que antes não passasse — sempre fomos muito unidos, participando um da vida do outro — mas, naquela época, não havia grandes preocupações, nem responsabilidades pesando tanto nos ombros.
Depois do diagnóstico da minha mãe, me fechei. Meu ex me traiu justo quando a gente descobriu a doença dela. Fiquei destruído. Prometi pra mim mesmo que não ia mais me envolver com ninguém. Larguei tudo: basquete, bateria, rolês com os amigos. Os únicos que ficaram de verdade foram o Vitinho, meu vizinho, e a Martinha. Eles são meus melhores amigos desde sempre e vivem insistindo pra eu não desistir das coisas que gosto.
— Ju, tá tudo pronto pra segunda? — pergunta minha mãe, mexendo no lenço que cobre a cabeça com um jeitinho distraído.
— Tá sim, mãe. Não se preocupe. — respondo, ajeitando a mochila ao lado da cadeira.
— Você sabe como ela é, né, filho? — diz meu pai, Rodrigo, com aquele tom calmo de sempre, tentando aliviar o clima.
— Filho... já fez o que eu te pedi? — insiste minha mãe, me olhando de forma doce, mas determinada.
— Ah, mãe... de novo isso? Por favor, deixa isso pra lá. — solto um suspiro impaciente, tentando cortar o assunto.
— Não deixo, Ju. Você precisa voltar a sair, ver seus amigos. Você se isolou demais. — Ela cruza os braços e me encara firme.
— Mãe, eu tenho o Vitinho e a Martinha.
— E só tem eles porque eles insistem em estar com você, — comenta Hector, se aproximando com os braços cruzados. — Se dependesse de ti, nem isso teria.
A porta se abre de repente e os dois citados entram, quase como se tivessem ensaiado na entrada.
— Ainda bem que a gente insiste, né? — diz Martinha, jogando a bolsa no sofá e rindo.
Todos riem junto com ela.
— Oi, tios! — dizem os dois em coro.
— Oi, crianças. Vieram pela noite do cinema, imagino — comenta meu pai, divertido.
— Isso mesmo, tio. — responde Martinha, já indo direto na cozinha pegar pipoca como se estivesse em casa. E, bem, ela meio que tá.
— Ju, a gente ainda não terminou nossa conversa. — diz minha mãe, voltando ao assunto com firmeza.
— Mãe... eu não quero mais jogar basquete. — baixo os olhos, esperando que ela aceite isso de uma vez.
— Vixi... tarde demais, Ju. — diz Vitinho, rindo com culpa. — Te inscrevi no time da faculdade.
— O quê?! Vitinho, você fez isso sem me perguntar? — levanto, indignado.
— Ele fez porque eu e sua mãe pedimos. — meu pai se manifesta, com um meio sorriso. — Você sempre amou jogar, filho. Tá na hora de voltar. Boa, Vitinho.
Fico quieto. Por dentro, tô magoado. Eu larguei tudo por causa da minha mãe, e agora eles tão forçando isso? Não consigo evitar de me sentir um pouco dispensado.
— Relaxa, mano. — Hector coloca a mão no meu ombro. — Já falei com os pais do time. Tá tudo organizado pra você participar sem atrapalhar a rotina aqui de casa.
— Vou ficar bem, meu amor. — diz minha mãe, segurando minha mão com carinho. — Faz isso por mim, por favor.
Respiro fundo. Olho pra ela e não consigo dizer não. Nunca consigo. É por isso que eu evito esse assunto.
Acabo concordando com um aceno, e a conversa se encerra. Depois disso, a gente vai escolher o filme. Rola aquela bagunça clássica, todo mundo gritando sugestões ao mesmo tempo, e assim passa o final de semana.
Hoje é meu primeiro dia na faculdade. Vitinho e Martinha, como sempre, estão atrasados, então entro sozinho.
O campus tá cheio, gente pra todo lado. Desvio de um grupo e, de repente, um cara que tá andando pra trás esbarra em mim com força.
— Olha por onde anda, cara! — ele solta na hora, na defensiva.
— A culpa não é minha! Olha você por onde anda! — rebato, já com raiva. Que cara sem noção, penso. Ele esbarra em mim e ainda reclama?
Mas não dou bola. Sigo andando, dou uma olhada no celular e mando mensagem no grupo:
Ju: Cadê vocês?
Vitinho: Tô entrando na faculdade, já chego na nossa sala.
Martinha: Merda! Vou perder a primeira aula. Acho que só vou conseguir ver vocês mais tarde. Passo na quadra. Amo vocês.
Ju: Tinha que me lembrar... já tinha até esquecido.
Vitinho: Nem pensar! Você vai sim. Prometi pra tia. Vai lá também, Martinha. Martinha: Ju promete dar uma chance para novas amizades? Não vou sossegar até concordar
Ju: tudo bem sua chata
A conversa encerra ali, e pouco depois o Vitinho entra na sala. Logo em seguida, o professor aparece, e a aula começa.
Logo na entrada da quadra, escuto uma voz ao meu lado:
— Oi! Você também vai entrar pro clube de basquete?
— Oi? Sim, vou sim. — respondo, meio surpreso.
— Ah, que legal! Eu sou o Henrique. A gente é da mesma turma de Direito. Vi você na aula, mas não deu tempo de me apresentar.
— Prazer, Henrique. Sou Solano, mas todo mundo me chama de Solo. Foi mal, tava tão focado na aula que nem reparei.
— De boa, cara. Vamos entrar?
— Claro, vamos lá.
A quadra é enorme, bem cuidada, com as arquibancadas vazias, exceto por uma ou outra figura curiosa. Curti o clima. Já tô animado.
Logo o treinador chega e chama a atenção de todo mundo:
— Sejam bem-vindos! Eu sou o treinador do Floripa Flyers. Antes de começarmos, quero que os novatos se apresentem. Você primeiro, garoto. — diz, apontando pro Henrique.
— Henrique Pereira. Podem me chamar de Rick. Tô no primeiro ano de Direito.
— Solano Sampaio, mas podem me chamar de Solo também. Primeiro ano de Direito.
— Fernando Costa, estudante de Administração.
— Juliano Pimentel, primeiro ano de Medicina. — diz o último, com uma voz que parece familiar.
Pera... eu já vi esse garoto antes...
... Já sei. O idiota de mais cedo.
— Victor Martins. Podem me chamar de Vitinho. Também tô na Medicina.
— Legal, cinco novatos. — comenta o treinador. — Time, sejam legais com eles. Agora, vão pro vestiário trocar de roupa e depois comecem o aquecimento.
No vestiário, um dos veteranos se apresenta:
— Sou o Caio, capitão do time. Tentem se enturmar, isso é importante pro grupo funcionar bem.
A galera concorda e vai se trocando. Sem perceber, fico encarando o tal Juliano.
— Qual é, cara? Por que tá encarando ele? Vocês se conhecem? — pergunta Rick, reparando no meu olhar.
— Não conheço, mas já não gostei. Esbarrou em mim mais cedo e ainda foi arrogante. Odeio gente que se acha.
— Eita, Solo... Deixa isso pra lá, pelo bem do time. Posso te chamar de Solo, né?
— Claro. E tudo bem, contanto que ele não mexa comigo de novo.
Já trocados, a gente caminha em direção à quadra.
— E aí, caras. Vamos aquecer juntos? — diz Vitinho, se aproximando.
— Por mim, tudo certo. — responde Rick, virando pra mim. — Vamos, Solo?
— Pode ser.
Juliano apenas dá de ombros, do tipo que confirma minha primeira impressão sobre ele. Arrogante.
— Espera... você é o cara que não olha por onde anda! — ele diz, virando pra mim.
— E você é o idiota mal-educado! — rebato na hora.
Climão.
— Que isso, gente? Estamos no mesmo time, não precisa disso. — Rick tenta acalmar.
— Concordo com ele. — diz Vitinho, virando-se pra Juliano. — Qual é, Ju, você prometeu pra Martinha que ia dar uma chance pras pessoas. Ou já esqueceu?
Juliano revira os olhos, irritado com a fala.
— Tá, tá, já entendi. Foi mal aí. — diz ele, seco.
Babaca. Ainda assim, engulo seco e tento me concentrar.
— Vamos logo começar o aquecimento. Não quero levar bronca do treinador. — digo, encerrando o assunto.
Começamos a aquecer. Rick e Vitinho engatam num papo animado, rindo e se conhecendo melhor. Eu e Juliano, por outro lado, ficamos calados, cada um no seu canto. Mas de vez em quando, a gente se encara — como se fosse inevitável.
Enquanto alongo, percebo algumas garotas nas arquibancadas. Nenhuma delas é minha namorada, então deixo pra lá. Só que tem uma ali que não para de gritar, meio maluquinha, o que me faz rir sozinho.
O treino termina. Corro pro vestiário, tomo uma ducha rápida e me preparo pra pegar o ônibus.
Saindo, vejo Rick e Vitinho ainda no maior papo, como se fossem amigos há anos.
— Solo, bora sair pra comer? — pergunta Rick.
— Pode ser.
Juliano aparece na sequência, ainda com a toalha no pescoço.
— Vamos sair pra comer, Ju? — convida Vitinho.
— Não rola, Vitinho. Vou pra casa.
— Ah, qual é, Ju. Fica mais um pouco com a gente.
De repente, a garota gritalhona da arquibancada surge do nada e pula no pescoço do Juliano.
— AMORZINHOOOOOOOO! Você arrasou no treino hoje! Tava morrendo de saudade! — ela grita, abraçando ele com tudo.
— Sem drama, Martinha. — diz Vitinho, rindo.
— Não precisa ter ciúmes, gatinho. Tem abraço pra você também! — ela fala e abraça o Vitinho com o mesmo entusiasmo.
— Meninos, essa é a nossa amiga Martinha. Ela faz Nutrição aqui na facul. — diz Vitinho.
— Prazer, Martinha. Eu sou o Rick e esse é o Solo. — diz Rick, me apontando.
— Prazer, gatinhoooos! Martinha ao dispor de vocês! — ela diz, sorrindo maliciosa.
— Caramba, Martinha... Não pode ver um homem que já dá em cima. — reclama Juliano, cruzando os braços.
— O que eu posso fazer? Tenho dois gatos lindos na minha frente. Não resisto! — ela pisca. Todo mundo ri. Menos o Ju, claro.
— Obrigado pelo elogio, Martinha. Mas só tenho olhos pra minha pimentinha. — digo, entrando na brincadeira.
— Ahh, que pena... Gato, simpático e ainda com um sorriso lindo. Tinha que ser comprometido... — faz um biquinho dramático. — Mas e você, Rick? Também é comprometido?
— Solteiríssimo. — responde ele, com um sorriso.
— Ui, gostei. — ela pisca mais uma vez.
— Martinha, você não tem jeito mesmo. Desisto. — resmunga Juliano. — Tô indo.
— Ahhh não, amorzinho! Vamos fazer alguma coisa! Mal te vi hoje. — diz ela, segurando no braço dele.
— Queria o quê? Vive atrasada... E eu já tenho compromisso.
— Tem certeza? — insiste Vitinho. — Vamos lá só fazer um lanche.
— Tô fora. — diz ele, seco. — Tchau. — acena rapidamente pra mim e pro Rick, e se despede dos amigos.
Ele vai embora, e eu comento:
— Meio sem noção o seu namorado, hein?
— Não liga, meninos. — Martinha responde, sorrindo de leve. — O Ju é complicado, só isso. E ele não é meu namorado. Nós três somos amigos de infância.
— Ah, entendi.
— Bora fazer nosso lanche? Que tal no shopping...? — sugere Rick.
Adorei conhecer os meninos... e a maluquinha também. Meu único problema é o tal Juliano. Ele me irrita. E não sei por quê.
Na real... sei sim. É porque ele se acha.
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