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A Sombra do Príncipe: Os Cães de Eira

Os Cães de Eria

A família DogSword era conhecida em todo o reino de Wiliry por sua lealdade inabalável à rainha Eria. Muitos os chamavam de Os Cães de Eria, não como insulto, mas como título de honra. Para Tuly, crescer pertencendo a essa linhagem significava ter sua vida definida desde o nascimento: servir à realeza até a última gota de sangue.

— Tuly, você se lembra do que eu lhe disse quando tinha cinco anos? — perguntou seu pai, com a voz grave, porém afetuosa.

— Sobre nosso corpo ser guiado pelos olhos? — respondeu ela, erguendo os olhos curiosos.

— Exatamente. No reino de Wiliry, nossos olhos são a Rainha Eria e sua família. É a vontade de suas majestades que guia nossos passos, como um farol que aponta para um futuro próspero. Nossa missão, como DogSwords, é garantir que eles possam enxergar ainda mais longe. Entende o que quero dizer?

Tuly Margareth DogSword sentia o peso daquele nome sobre os ombros pequenos. Agora, aos dez anos, já compreendia melhor as leis que regiam sua família. Entre seus sete irmãos, foi sobre ela que recaiu o desejo da rainha: servir diretamente ao segundo príncipe.

— Tuly, sabe o que Vossa Majestade viu em você? — o pai perguntou, observando-a com atenção.

— Não, senhor.

— Lembra dos fundamentos do nosso mundo e de como manifestamos dons diferentes?

— Nosso mundo é regido pelas leis de Mana, KI e Aura. Temos magos, mestres em artes marciais e manipuladores de elementos. Nossa família é especialista em KI e Mana, por isso detemos o maior território perto da capital. Já os manipuladores de Aura preferem viver em regiões mais selvagens.

— Muito bem. Mas há aqueles que nascem com núcleos múltiplos. Quanto mais núcleos, mais habilidades essa pessoa pode desenvolver. Um manipulador de Mana pode usar KI?

— Sim, se o núcleo entrar em sintonia com sua vontade de KI e sua Mana se estabilizar ao redor como anéis.

O pai sorriu, orgulhoso.

— Excelente. Você me surpreende, Tuly.

— Mas... o que isso tem a ver com a rainha me escolher como sombra do segundo príncipe?

— Seu irmão Ivan nasceu com dois núcleos e desenvolveu três anéis de Mana. Por isso, serve diretamente ao príncipe herdeiro. Os demais irmãos seguem funções compatíveis com sua aptidão. E você, minha filha... você tem um potencial que nem mesmo você compreende ainda.

— E qual o seu nível, papai? E o da mamãe, que serve à rainha?

Ele coçou a nuca, quase envergonhado.

— Bem... por mais que eu queira me gabar, sua mãe é mais poderosa. Ela tem três núcleos e dois anéis de Mana. É imbatível.

A voz suave e firme de uma mulher ecoou ao fundo:

— Não se deixe enganar pela modéstia do seu pai, Tuly. Este homem é conhecido como o mago mais poderoso dos três reinos. O temido Senhor dos Fios.

A mulher de cabelos loiros e sorriso angelical entrou no jardim. Por trás daquela expressão doce, escondia-se uma guerreira que muitos subestimaram... e que poucos sobreviveram para contar.

— O que fazem aqui nesse dia tão bonito?

— Papai estava me contando por que a rainha me escolheu para ser a sombra do segundo príncipe — respondeu Tuly, empolgada.

— Ora, isso é fácil. Porque você é minha filha — disse a mãe, sorrindo com orgulho. — E a rainha viu o quão poderosa você vai se tornar. Agora, que tal tomarmos um chá no jardim?

Capítulo 2 – Dúvidas e Chamas

Após a conversa com seus pais, Tuly voltou ao quarto com a mente inquieta. As palavras ainda ressoavam dentro dela como ecos longínquos.

"Poderosa."

Todos diziam isso. Que ela teria poder para proteger os outros, para proteger a coroa. Mas... e ela?

Para quê realmente queria ser forte?

A noite caiu silenciosa sobre a mansão DogSword. O céu estava limpo, mas o coração da jovem permanecia nublado.

— Livi? — sussurrou ela, ao perceber a figura silenciosa perto da porta.

— Sim, jovem senhorita — respondeu a mulher de postura firme, mantendo-se vigilante mesmo ali, em meio à calmaria do quarto.

Livi era mais do que uma guarda-costas. Ela havia cuidado de Tuly desde que a pequena aprendera a andar. Era uma DogSword veterana, respeitada, mas de poucas palavras.

— Você... você já matou alguém? — Tuly perguntou, hesitante.

Livi não hesitou:

— Sim, jovem senhorita.

Claro que sim. Todos na família, em algum momento, precisavam passar por isso. Mas ouvir aquilo tão diretamente causava um nó estranho no estômago de Tuly.

— Como você soube que era a coisa certa a fazer?

Livi se aproximou um pouco, abaixando-se para ficar na altura da menina. Seus olhos sérios não carregavam culpa, apenas verdade.

— Quando se está entre a vida e a morte, o instinto é sobreviver. Não se trata de quem é bom ou ruim, mas de quem está disposto a seguir em frente.

— E se... — Tuly apertou os punhos. — E se o segundo príncipe for alguém que me faça matar por diversão? E se ele for cruel?

Um silêncio pairou no quarto, pesado como uma espada erguida no ar.

— Tenho certeza de que ele não é esse tipo de pessoa — Livi disse, com voz firme. — Mas, mesmo que um dia duvide disso, confie em seu próprio julgamento. Não deixe que ninguém decida quem você é.

Tuly assentiu, ainda sem saber exatamente o que isso significava. Mas sentiu o coração um pouco mais leve.

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Os dias passaram como folhas ao vento. A movimentação na mansão DogSword aumentava a cada hora. Servos iam e vinham, adornos sendo pendurados, armaduras sendo polidas. O aniversário de onze anos de Tuly se aproximava — um evento importante, não apenas por marcar a nova idade, mas por simbolizar sua passagem oficial como aprendiz da realeza.

E, para aumentar o nervosismo da caçula, membros da família real estariam presentes.

Ela preferia a paz do jardim dos fundos, onde podia treinar e pensar em silêncio, longe dos olhares atentos de professores e servos. Foi lá que ele a encontrou.

— Sabia que iria te encontrar aqui — disse uma voz familiar.

— Irmão mais velho... — Tuly se virou, surpresa. — Pensei que não viria.

— Papai me decapitaria se eu perdesse o grande dia da nossa caçula.

— Bem... a mamãe faria isso. — Tuly sorriu.

— Tem razão, Tuly. Ela faria. — Ele riu, bagunçando os cabelos da irmã com carinho. — Mas além disso, queria ver como está o seu cultivo.

— Está melhorando! — respondeu com entusiasmo. — Olha o que consigo fazer agora!

Ela ergueu as mãos e concentrou sua energia. Um anel fino de mana surgiu ao redor do pulso, tremulando como uma chama viva. Pequeno, instável... mas real.

— Impressionante — disse o irmão, genuinamente surpreso. — Está muito à frente da maioria da sua idade. A rainha realmente viu algo em você.

Tuly sorriu, orgulhosa. Mas, no fundo, o peso da responsabilidade continuava lá, como uma sombra constante.

— Irmão... você acha que estou pronta?

Ele a olhou com seriedade, depois sorriu com ternura.

— Não sei se alguém um dia está pronto. Mas sei que você é a pessoa certa para essa missão.

E naquele momento, em meio ao jardim, ao vento e à luz dourada do fim da tarde, Tuly sentiu pela primeira vez que talvez, só talvez... o poder que todos viam nela realmente existisse.

Primeira impressão

Na Casa DogSword, as manhãs começavam cedo. O som das espadas ecoava pelo pátio interno como música de rotina. Tuly já havia terminado a prática do dia: equilíbrio, observação e silêncio. Coisas que uma sombra precisava dominar desde cedo.

Mas ao contrário de muitos treinamentos rígidos, sua casa era um refúgio de carinho. O pai a observava com olhos atentos, sempre pronto para corrigir sua postura, mas também o primeiro a lhe oferecer um sorriso e um pedaço de pão com mel no fim do treino. A mãe, firme e sábia, jamais a deixava esquecer que por trás de uma boa sombra existia um coração leal e um olhar atento.

> Naquele dia, no entanto, a espada de madeira foi deixada de lado.

Tuly vestia um vestido azul escuro com detalhes prateados, escolhido por sua mãe para a visita ao castelo. Livi, sua tutora e acompanhante, ajeitava os últimos detalhes antes da partida.

— Lembre-se do que dissemos sobre se comportar — disse Livi, segurando seu olhar com firmeza. — Mas não precisa ter medo. Você só vai conhecer o lugar onde irá treinar no futuro.

— Eu não estou com medo — respondeu Tuly, endireitando a postura. — Só... curiosa.

A carruagem partiu ainda de manhã, cruzando campos abertos e estradas que serpenteavam até os muros da capital. Durante o caminho, Tuly observava tudo pela janelinha: vendedores apressados, crianças correndo, bandeiras tremulando no alto das torres. O mundo parecia grande, mas ela não se encolhia diante dele.

Quando chegaram aos portões do castelo, um grupo de guardas as recebeu. Um deles, gentil, abriu a porta da carruagem e ajudou Livi a descer. Tuly desceu sozinha, o que não passou despercebido.

— Ela é assim mesmo? — cochichou o guarda, divertido.

— Muito mais do que parece — respondeu Livi com um sorrisinho.

O interior do castelo era feito de mármore claro e colunas decoradas com vitrais mágicos. Cada passo parecia ecoar um pouco alto demais. Tuly caminhava com a confiança que aprendera em casa — mesmo que os olhos arregalados de encantamento a traíssem um pouco.

Enquanto Livi conversava com os atendentes sobre horários e permissões de circulação, Tuly se afastou discretamente, atraída por uma porta antiga entreaberta, escondida por uma tapeçaria azul.

> O corredor atrás da tapeçaria era estreito e frio, levando até um jardim oculto. Um lugar diferente do restante do castelo, como se guardasse segredos de outras eras.

As folhas das árvores brilhavam como prata sob a luz mágica. Havia uma fonte no centro, e sobre ela, um garoto tentava equilibrar uma maçã na cabeça enquanto arremessava uma adaga.

Tuly observou em silêncio, até que a maçã caiu com um “ploc” nada gracioso.

— Se continuar com os olhos fechados, só vai acertar o próprio pé — disse ela, séria.

O garoto girou nos calcanhares. Os cabelos loiros reluziam como ouro sob o sol filtrado pelas árvores. Os olhos dourados a fitaram com um misto de surpresa e... interesse.

— Você me seguiu?

— Você deixou a porta aberta.

— E você entrou?

Tuly deu de ombros.

— Não achei nenhum aviso escrito “Príncipe Mal-Humorado em Treinamento”.

Ele soltou uma risada baixa.

— Você é atrevida. Gosto disso.

— E você erra feio com adagas.

Tuly se divertiu pela primeira vez com alguém que não havia como uma Sombra e isso a encheu de alegria, por dentro se sentiu privilegiada de ser escolhida para se tornar a sombra do segundo príncipe.

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Após o encontro inesperado com o segundo príncipe, algo mudou dentro de Tuly.

Ela ainda era uma criança, mas os olhos que antes viam os nobres como figuras distantes e intocáveis agora se prendiam a um rosto específico, uma risada sincera, um olhar curioso.

Silas. Ele era diferente — não apenas por ser príncipe, mas pela maneira como a enxergou… como se já soubesse que ela era mais do que parecia.

De volta à mansão DogSword, Tuly não falou muito sobre o castelo. Mas, entre um treino físico e outro, entre livros de estratégia e lições de diplomacia, a pergunta permanecia em sua mente:

“Quem ele vai se tornar?”

Naquela noite, após o jantar, encontrou seu irmão mais velho no salão de espadas, afiando uma lâmina enquanto ouvia música baixa vinda de uma caixa mágica. Ele era a sombra do príncipe herdeiro, o orgulho da família, e ainda assim sorria ao vê-la entrar, como se não houvesse hierarquia entre eles.

— Irmão… — ela começou, sentando-se ao lado dele. — Quando você foi escolhido para ser a sombra do príncipe herdeiro… ficou com medo?

Ele soltou uma risada breve, surpreso pela pergunta, e pousou a lâmina com cuidado.

— Medo? — repetiu. — Fiquei apavorado. Achei que ia falhar, que não seria bom o bastante.

Tuly o olhou com espanto.

— Mas você é o prodígio da família. Todos dizem que você nasceu com o dom das sombras.

— Isso não impede ninguém de tremer por dentro — respondeu ele, com um olhar gentil. — Mas sabe… quando vi o olhar do príncipe, percebi que ele também tinha medo. Foi aí que entendi que meu papel não era só protegê-lo… mas caminhar com ele, mesmo nas sombras.

Tuly ficou em silêncio por alguns instantes, absorvendo cada palavra.

— Um dia quero ser como você.

Ele sorriu, tocando levemente os cabelos dela.

— Você vai ser ainda melhor, Tuly. Eu vejo isso em você.

Ela assentiu, tentando conter o sorriso, mas seu estômago entregou o que viria a seguir com um leve ronco.

— Hm… nossos irmãos já devem ter comido todos os doces — ele comentou, se levantando com um falso ar de indignação.

— O quê?! A mamãe fez aqueles de mel e frutas vermelhas!

— Bora lá antes que não sobre nem farelo — disse ele, estendendo a mão.

Ela segurou firme. E os dois sumiram pelos corredores da mansão, como duas sombras leves e cúmplices.

Na Véspera do Início

Na ala leste da mansão DogSword, o salão estava iluminado com lamparinas mágicas que flutuavam sob o teto de madeira escura, espalhando uma luz dourada e calorosa. A família inteira se reuniu naquela noite — um raro momento em que as sombras deixavam de lado seus treinos e missões para simplesmente serem... irmãos.

Tuly entrou ao lado do irmão mais velho e foi recebida com aplausos e brincadeiras.

— A pequena sombra apareceu! — gritou um dos irmãos do meio, com os cabelos desgrenhados e um doce na mão.

— Cuidado com ela, ouvi dizer que hoje já derrotou dois travesseiros numa batalha sangrenta — zombou outra irmã, rindo enquanto entregava um prato com bolinhos de mel.

Tuly se jogou no meio dos irmãos, pegando os doces como se estivesse em uma missão de vida ou morte. O pai observava a cena com o típico olhar sério, mas com um brilho orgulhoso nos olhos. A mãe, elegante como sempre, servia chá para os mais velhos e fazia questão de oferecer um para Tuly também.

— Amanhã ela completa doze anos — disse a matriarca, com um sorriso discreto. — E o legado continua…

Tuly olhou para os pais, os irmãos, os mestres ali presentes… e sentiu algo aquecer em seu peito. Aquilo não era apenas uma ceia em família. Era uma despedida simbólica da infância.

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Na madrugada silenciosa, Tuly foi levada à Sala das Chamas Silenciosas, o lugar onde todos os herdeiros da Casa DogSword passavam pelo ritual de aptidão ao completarem doze anos. O ambiente era austero e solene, com as paredes cobertas por inscrições antigas e o símbolo da casa entalhado em alto-relevo acima do altar de energia.

O irmão mais velho a esperava ao lado dos três mestres: o do Ki, o da Mana e o da Áurea. A presença dele transmitia calma. Era impossível ignorar a postura perfeita e a serenidade com que ele observava tudo. Era o prodígio da família, a sombra do príncipe herdeiro — e o exemplo a ser seguido.

Tuly respirou fundo. Apesar de já ter passado por treinos físicos e teóricos desde muito pequena, esse era o momento que marcaria o início oficial de sua jornada.

— Tuly DogSword — começou o Mestre de Ki —, você será testada nas três fontes que formam nosso legado. A chama responderá à sua essência.

Ela se ajoelhou no centro do círculo. O silêncio pesava.

A chama azul acendeu lentamente. Em vez de escolher um único caminho, ela se dividiu em três, conectando-se de forma suave aos pedestais de Ki, Mana e Áurea. Nenhuma explosão. Nenhum espanto desnecessário. Mas o brilho constante de uma afinidade tripla estável, algo raro e impressionante, mesmo que não inédito.

Os mestres trocaram olhares discretos, mas mantiveram a compostura. Já o irmão mais velho, que observava com atenção, se aproximou apenas o suficiente para ver um detalhe que os outros talvez não tenham notado: por um instante, um filete prateado de energia cintilou no centro do círculo, como se algo antigo estivesse adormecido dentro dela.

Ele não disse nada.

O Mestre de Áurea foi quem se manifestou com voz baixa:

— Uma afinidade tripla desde o início. Isso confirma o que os treinos físicos já demonstravam. A linhagem segue forte.

O patriarca da família, posicionado na entrada, deu um passo à frente com semblante sério.

— A partir de hoje, Tuly iniciará seu treinamento com os mestres, como aprendiz de sombra. — Ele fez uma pausa, os olhos fixos na filha caçula. — E quanto ao que viram aqui esta noite… ficará entre nós. Nem mesmo os aliados da coroa devem saber.

— Ela ainda é jovem — acrescentou o irmão, com um leve sorriso. — E precisa de tempo para entender sua própria força antes que o mundo tente usá-la.

Tuly, que observava tudo em silêncio, ergueu os olhos com firmeza.

— Eu prometo não decepcionar nossa casa.

O patriarca assentiu.

— Lembre-se, filha: a força não é o bastante. O verdadeiro valor de uma sombra está em sua lealdade… e no silêncio com que protege a luz.

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