O Olhar do Leão
Elias sentia o calor do deserto antes mesmo de sair do aeroporto. O ar era seco, pesado, e parecia carregar nas costas o peso de séculos. Ao pisar na terra dourada da Arábia Saudita, ele não sabia que sua vida estava prestes a mudar para sempre.
Ele era apenas um jovem tradutor, discreto e eficiente, chamado às pressas para um contrato temporário em uma das maiores propriedades privadas do país. Disseram-lhe que trabalharia para um “homem de grande influência”. Nada mais. Nenhuma foto, nenhum detalhe.
Ao chegar ao palácio, a opulência o esmagou. Tudo era grandioso: colunas de mármore, tapetes que pareciam rios de seda, lustres maiores do que o quarto de hotel onde ele se hospedara.
Foi quando ele o viu pela primeira vez.
Shake Al-Rashid.
De pé no alto de uma escadaria, vestindo o tradicional thobe branco e o olhar de um predador. Ele não disse nada. Apenas o olhou. Um olhar longo, penetrante. Elias sentiu os joelhos cederem levemente, o coração batendo como se tentasse fugir.
— É ele? — perguntou o shake, sem desviar os olhos.
— Sim, senhor. — respondeu um dos assessores. — O tradutor.
Shake desceu um único degrau, e Elias sentiu como se o mundo inteiro tivesse se inclinado em sua direção.
— Qual o seu nome? — a voz dele era baixa, com sotaque carregado e perigoso.
— E-Elias, senhor.
— Elias — repetiu, com um leve sorriso, como se saboreasse o som. — Gosto de nomes suaves. Combinam com pessoas obedientes.
Elias não respondeu. Apenas baixou os olhos. Não sabia o que fazer com aquele olhar.
Shake deu mais um passo em sua direção. — A partir de agora, você me pertence durante o tempo que estiver aqui. Entendido?
Elias assentiu, sentindo o calor subir pelo pescoço. Ele não sabia se era medo. Ou outra coisa.
No fundo dos olhos de Shake, havia uma promessa silenciosa.
E Elias, mesmo sem entender, já começava a se perder nela.
Elias foi conduzido até os seus aposentos por um dos assistentes do palácio. O quarto era mais luxuoso do que qualquer hotel que ele já conhecera, mas havia algo frio, silencioso demais. As janelas davam para o deserto, onde o sol começava a mergulhar nas dunas em tons de laranja e sangue.
Ele se aproximou do vidro, observando a imensidão. Ali, tão longe de casa, ele se sentia pequeno. Vulnerável. Exposto.
E então, como se fosse invocado por seu pensamento, ouviu a voz.
— O deserto é lindo, não é?
Elias se virou rápido. Shake estava parado à porta, sozinho, sem anunciar sua entrada. Ele tinha uma presença que tomava o ar ao redor. Um perfume amadeirado envolvia sua figura como um véu invisível.
— Senhor... eu não sabia que viria...
— Eu não aviso quando quero algo, Elias — disse com calma. — Eu apenas tomo.
Elias sentiu a garganta secar.
Shake se aproximou lentamente, passos firmes, olhos presos aos dele. Não havia pressa em seus gestos. Ele sabia o efeito que causava. Sabia que aquele garoto era frágil demais para resistir por muito tempo.
— Você sempre abaixa os olhos assim? — perguntou, parando a poucos centímetros. — É medo? Ou obediência?
Elias tentou responder, mas as palavras ficaram presas. Ele queria olhar nos olhos do homem, mas algo o impedia. Shake era mais do que um homem. Era um império vivo, e Elias, uma folha ao vento.
— Você vai aprender a me encarar — disse ele, com um sussurro quente. — Mas, por enquanto... gosto do seu silêncio.
Shake ergueu uma das mãos e, com a ponta dos dedos, tocou o queixo de Elias. Um toque leve, quase reverente — mas carregado de poder.
— Vista-se bem esta noite — disse. — Jantar será só para nós dois. Quero saber tudo sobre você. Cada detalhe. Cada medo.
E antes que Elias pudesse reagir, Shake já havia saído, deixando atrás de si um rastro de perfume, dúvida… e desejo.
Elias levou a mão ao peito, onde o coração batia descompassado. Ele sabia que não deveria se deixar afetar. Mas como resistir ao homem que parecia ter nascido para dominar tudo ao seu redor — inclusive ele?
O Jantar
O silêncio no salão era quase tão pesado quanto o ouro que decorava cada canto. Candelabros altos iluminavam a mesa longa, mas só dois lugares estavam postos. O centro da riqueza saudita se resumia, naquela noite, a um banquete privado entre o rei do deserto e seu novo convidado.
Elias entrou hesitante, guiado por um empregado vestido de branco. Seu corpo ainda tremia sob o traje elegante que escolheram por ele — roupas leves, de linho, mas que deixavam à mostra sua fragilidade. Estava bonito, sim. Mas se sentia vulnerável.
Shake já o esperava, sentado à cabeceira. Quando Elias entrou, ele não disse uma palavra. Apenas o olhou. Longamente. Como se despisse tudo que ele era com os olhos.
— Sente-se — disse por fim, apontando para a cadeira ao lado.
Elias obedeceu, em silêncio.
Garçons apareceram como sombras, servindo pratos que Elias não conhecia pelo nome. Mas ele mal tocou na comida. Sentia o olhar de Shake queimando sua pele, mesmo quando o homem não falava.
— Você está nervoso. — Shake comentou, com um pequeno sorriso.
— Um pouco, senhor.
— Sabe o que mais eu gosto em você, Elias?
O menino o encarou, finalmente, mesmo que por segundos. Shake continuou:
— Sua obediência. Seu silêncio. É raro encontrar alguém que não tente provar nada. Você apenas... é.
Shake se inclinou na direção dele. As velas lançavam sombras suaves sobre seu rosto anguloso.
— Você me intriga, Elias. — Sua voz agora era quase um sussurro. — E tudo que me intriga... eu preciso ter.
Elias engoliu seco.
— O senhor não me conhece.
— Ainda não. Mas vou conhecer.
O homem estendeu a mão e tocou a dele sobre a mesa. Elias não a afastou. Não conseguia. Aquele toque era firme, quente, decidido. Como se Shake estivesse marcando território.
— Tenho paciência — disse ele. — Mas nem sempre. Então, cuidado com o que provoca em mim.
O jantar seguiu em silêncio, mas já não havia comida. Apenas tensão. Olhares. Promessas não ditas.
Naquela noite, enquanto deitava em lençóis macios demais para seu mundo simples, Elias sentia a mão de Shake ainda sobre a sua. Como se o toque permanecesse mesmo depois de retirado.
E no escuro, ele se perguntava:
É possível resistir a alguém que faz você se sentir visto... até o osso?
Com prazer. Aqui está a continuação do Capítulo 2 de O Dono do Deserto, mergulhando ainda mais na tensão emocional e na perigosa aproximação entre Shake e Elias:
Mais tarde, a noite caiu sobre o palácio como um véu silencioso. As luzes externas iluminavam as colunas douradas e os jardins áridos, enquanto Elias caminhava devagar pelos corredores em direção ao seu quarto. Ainda sentia a palma da mão de Shake sobre a sua, como se o calor tivesse sido absorvido pela pele.
Ele tentou convencer a si mesmo de que era apenas um trabalho. Apenas uma função a cumprir.
Mas nada ali parecia simples. Muito menos o homem que agora povoava seus pensamentos.
Quando chegou ao quarto, encontrou a porta entreaberta. Seu corpo congelou por um instante. Será que haviam entrado? Estaria sendo testado?
Com o coração acelerado, empurrou a porta com cuidado.
No centro da cama, sobre os lençóis brancos, havia uma peça de roupa.
Um manto preto de seda, bordado em dourado. E junto dele, um pequeno bilhete, escrito à mão:
> “Vista-se. Venha ao terraço. — Shake.”
O nome parecia pesar no papel como um comando. Elias sentiu o rosto corar. Ele não queria obedecer. Mas também não conseguia não obedecer.
Vestiu o manto. Era leve, fino demais, e colava-se ao corpo de forma íntima, como se o próprio Shake o tivesse moldado para ele. O toque do tecido em sua pele era ao mesmo tempo suave e invasivo.
Subiu as escadas até o terraço. O vento do deserto soprava forte ali, levando o calor do dia e trazendo um arrepio que não vinha só do clima.
Shake estava encostado na balaustrada, de costas. A luz da lua dourava os contornos do seu corpo como uma pintura viva.
— Pensei que hesitaria — disse, sem se virar.
— Pensei que não fosse um convite — respondeu Elias, com honestidade surpreendente.
Shake virou-se lentamente. Seus olhos passearam por Elias como se tivessem fome.
— Não foi mesmo.
Ele caminhou até o garoto, parando perto o suficiente para que o ar entre eles se tornasse eletricidade.
— Você é lindo demais quando tenta resistir.
Elias baixou o olhar, mas Shake ergueu seu queixo com dois dedos.
— Quero que saiba — disse com voz firme —, eu nunca tomo o que não é dado. Mas quando desejo algo, eu espero. E cobro.
O coração de Elias parecia preso na garganta. Ele sabia que estava diante de algo maior que ele. Algo perigoso, sim — mas também irresistivelmente... vivo.
Shake se aproximou mais. Seus lábios quase tocaram a pele de Elias, mas não o fizeram.
— Boa noite, Elias — murmurou.
E então, como se fosse um castigo ou um presente, virou-se e foi embora, deixando o garoto ali, tremendo no vento quente do deserto.
Um Cativeiro de Seda
O sol já queimava o céu quando Elias acordou. Tinha dormido pouco, inquieto com tudo que acontecera — ou quase acontecera — na noite anterior. O toque, o olhar, o manto. Tudo parecia uma dança silenciosa entre comando e permissão. Entre domínio e desejo.
Ao se vestir, encontrou um novo envelope sobre a mesa. Sem som, sem batidas na porta. Apenas o bilhete.
> “Hoje, você será minha sombra. Andará comigo. Ouvirá tudo. Dirá pouco. — Shake.”
A caligrafia era firme. Sem hesitação. Assim como ele.
Foi conduzido pelos corredores dourados do palácio até o pátio principal. Lá estava Shake, rodeado por homens de ternos escuros, tratando de negócios, falando árabe com fluência feroz.
Elias se manteve em silêncio. Observando. Traduzindo quando necessário. Mas o que mais o desconcertava era o fato de Shake sempre saber onde ele estava. Cada vez que desviava os olhos, encontrava os de Shake sobre ele. Firmes. Quase possessivos.
Horas se passaram. Reuniões, visitas a alas privadas do palácio, conversas com embaixadores e homens influentes. Mas em nenhum momento Shake permitiu que Elias saísse de seu campo de visão.
Até que, ao fim da tarde, em um salão reservado, o silêncio entre os dois finalmente se quebrou.
— E então? — Shake perguntou, sentado em uma poltrona larga, com uma taça de vinho na mão. — Está cansado de mim?
Elias, em pé à frente dele, hesitou. — Não, senhor.
— Você me obedece rápido demais — comentou. — Não tem vontade própria?
— Tenho. Só... não quero usar com o senhor.
Shake sorriu. Um sorriso escuro, de quem reconhece poder onde outros veem fraqueza.
— Sabe o que mais me atrai em você, Elias? — perguntou, apoiando o copo e se levantando lentamente. — É o fato de você saber que está sendo dominado... e mesmo assim, aceitar.
Ele se aproximou. Cada passo era como um tambor no peito de Elias.
— Isso não é medo. É escolha. E isso... é perigosamente encantador.
Shake parou diante dele. Seus dedos roçaram a nuca do garoto, deslizando até a clavícula.
— Hoje à noite, terá mais uma escolha. Você virá até mim... ou não. Mas se vier — sua voz baixou, rouca —, não haverá mais volta.
E então ele se afastou, como sempre fazia: deixando Elias com o corpo em chamas e a alma em ruínas.
Naquela noite, o palácio parecia inteiro respirar com ele.
E no espelho, ao se encarar, Elias não via mais o menino tímido e obediente de antes. Via alguém que estava sendo lentamente moldado pelo toque de um homem que não pedia — tomava.
Mas Elias ainda tinha uma decisão a tomar.
E bater na porta do shake seria cruzar uma linha da qual seu coração talvez nunca mais voltasse.
O corredor parecia mais longo do que antes. Silencioso, como se o próprio palácio prendesse a respiração. Cada passo de Elias ecoava nas paredes douradas, mais alto do que devia. Sua mão suava. O coração batia desordenado. Ele estava indo. Por vontade própria.
Diante da porta de Shake, parou.
Ali, a respiração dele se prendeu no peito. Porque não era apenas desejo. Era medo. Era atração por algo que poderia consumi-lo inteiro. Mas mesmo assim... ele bateu.
Uma batida firme. E um silêncio em resposta.
Depois, a porta se abriu.
Shake estava ali, sozinho. Usava um robe escuro, aberto no peito, e os olhos — aqueles olhos — pareciam ainda mais escuros à meia-luz do quarto. Ele não disse nada. Apenas abriu espaço para que Elias entrasse.
Elias entrou.
A porta se fechou atrás de si com um estalo suave. Um som que selava um pacto invisível.
— Você escolheu — disse Shake, finalmente, sua voz mais baixa que nunca. — Agora é meu.
Ele caminhou até Elias com calma, como um predador que sabe que sua presa não vai fugir. Levou a mão ao rosto dele, acariciando-o com a ponta dos dedos, como quem explora território sagrado.
— Sabe o que acontece com as coisas que me pertencem?
Elias tentou falar, mas sua voz não saiu. Apenas balançou a cabeça, num gesto pequeno.
— Eu cuido — disse Shake, e então seus lábios tocaram a testa de Elias, suavemente. — Eu protejo.
Uma pausa.
— E às vezes... eu quebro.
O corpo de Elias tremeu. Não de medo. Mas da estranha certeza de que, mesmo que fosse quebrado, ainda assim queria ficar.
Shake encostou sua testa na dele, e por um instante, o mundo se calou.
— Hoje, não tocarei você como desejo — sussurrou. — Hoje, você apenas vai dormir ao meu lado. Quero que conheça o silêncio que vem antes do fogo.
E assim foi.
Elias deitou-se ao lado de Shake naquela noite. Não houve pressa. Não houve pressões. Apenas dois corpos dividindo um mesmo espaço, em silêncio, sentindo o calor de um vínculo que nascia. Perigoso. Incontrolável. Real.
Shake adormeceu com a mão sobre o peito de Elias.
E Elias, pela primeira vez em muito tempo, dormiu sem medo.
Mas sonhou... com a tempestade que vinha.
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