***Apresentação dos personagens***
Celeste - 21 anos, fotógrafa de retratos e memórias antigas. Sensível, introspectiva, delicada e amante de flores. Voltou à sua cidade após anos fora buscando recomeço.
Matteo - 29 anos, trabalha em uma pequena e antiga loja de instrumentos musicais que era de seu pai, e durante a tarde trabalha em uma biblioteca pública da cidade. Tímido, coração enorme, vive no mesmo lugar desde sempre.
Gandara (cidade onde moram) - Dominada pelo lindo castelo, que parece ter sido o cenário da malfadada história de amor de Paolo e Francesca, narrado no “Inferno de Dante”, a vila fortificada de Gradara, na província de Pesaro e Urbino, irá cativá-lo com a sua rica e antiga história.
Dedicatória
Para você, que foi meu amigo quando eu nem sabia o quanto precisava de amor.
Para você, que sempre esteve lá — mesmo quando a gente se perdeu.
Te amei por mil anos... e agora, com todas as certezas do mundo, te amarei por mais mil.
Este livro é nosso. Porque essa história é real. Porque esse amor é eterno.
— Milena Souza
A paisagem pela janela parecia mais lenta do que ela lembrava. As árvores antigas, os campos dourados e as curvas da estrada seguiam como se o tempo tivesse aprendido a andar devagar ali, naquela parte do mundo.
Celeste encostou a testa no vidro frio do ônibus e fechou os olhos por um instante. Não era cansaço. Era memória. Ela hesitou por um instante, ainda sentada, como se levantar fosse tornar tudo real demais.
Estava voltando.
Depois de tanto tempo, voltava à cidade onde cresceu, onde conheceu o cheiro da terra molhada, o gosto do vento de fim de tarde... e ele. Matteo.
O nome dele ainda morava nela, mesmo quando fingia que não. Mesmo quando dizia pra si mesma que era passado.
Eles se conheciam desde sempre. Brincavam no quintal da casa da avó dela, enquanto suas mães tomavam café e falavam da vida com aquela intimidade de quem dividia mais do que vizinhança. Matteo era parte da paisagem da infância — riso fácil, pés descalços, e aquela forma simples de fazer tudo parecer bonito.
Mas a vida acontece como uma curva imprevista na estrada.
A mãe de Celeste se casou de novo. Ela e os irmãos foram embora sem aviso, sem ensaio. Como se tivessem sido arrancados do enredo de um livro no meio da frase.
Ainda tentaram manter contato. Mensagens aqui e ali, telefonemas com promessas de visitas que nunca vinham. Até que o tempo, e talvez o orgulho, fizeram o que o silêncio faz de melhor: afastou. E um dia, eles simplesmente pararam. Não por desamor. Mas porque às vezes, seguir em frente parece ser a única saída possível.
Mas agora, ela estava de volta. Com o coração mais velho, as malas mais pesadas, e um passado que insistia em respirar junto com ela.
O ônibus parou na rodoviária pequena, onde nada parecia ter mudado. O mesmo banco descascado no canto, o mesmo senhor vendendo cocada na entrada. Celeste desceu com passos tímidos, como quem pisa num sonho antigo.
O ar tinha cheiro de lembrança. E o céu — aquele céu de cidade pequena que parece maior do que em qualquer outro lugar — a abraçou silenciosamente.
Ela não sabia se ele ainda estava ali.
Não sabia se ele a reconheceria.
Mas o coração, ah… o coração parecia saber.
Ele estava lá.
E algo dentro dela sussurrava que, por mais que a vida tivesse seguido, nem tudo tinha sido deixado para trás. O seu coração não queria mais sair dali. O seu coração morava ali.
Ela sabia que já não tinha como voltar atrás. Voltar para esse mesmo lugar onde essa paixão começou era... Amedrontador. Ele ainda pensava nela? Ainda guardava as doces memórias que criaram juntos? Eram muitas perguntas e várias incertezas.
A casinha parecia menor do que Celeste lembrava.
As paredes descascadas, o portão que ainda rangia, o jardim que agora era só mato crescido... e mesmo assim, tudo ali pulsava como se tivesse ficado esperando por ela.
Ela empurrou o portão devagar, o som enferrujado ecoando entre a memória e o presente. O chão de pedra, o batente da porta com a marquinha que ela e Matteo tinham riscado com canivete — um "C + M", tímido, escondido, mas ainda lá.
O coração dela apertou de um jeito estranho. Quente. Familiar. Quase dolorido.
Enquanto isso, do outro lado da cidade, Matteo parou no meio do que fazia.
Não havia som. Não havia razão. Só um arrepio que correu pelas costas e a sensação clara, absurda, inegável:
Ela voltou.
Ele não sabia como sabia. Só… sabia.
Talvez fosse o vento, talvez o silêncio diferente, talvez o fato de que aquele dia, desde o amanhecer, parecia outro. Ou talvez fosse simplesmente o coração dele — que nunca aprendeu a esquecer.
Sem pensar, Matteo pegou a chave do carro e saiu. O caminho até a casa dela era tão conhecido quanto o próprio nome. O bairro antigo, a rua das árvores tortas, a curva onde ela sempre tropeçava na infância… tudo estava igual. Exceto o tempo.
E então ele a viu.
De costas, no pequeno quintal, o cabelo solto dançando com o vento.
O mundo parou.
Matteo estacionou e saiu devagar, como se tivesse medo de que ela sumisse se ele se aproximasse rápido demais.
Celeste virou, sentindo algo dentro dela estremecer. E então os olhos deles se encontraram.
Foram segundos. Mas nesses segundos, tudo voltou.
A infância no quintal, os sorrisos compartilhados, os desenhos na calçada, as lágrimas da despedida, as mensagens não respondidas, as palavras que nunca disseram… e o amor. O amor quieto, escondido, antigo — mas ainda vivo.
— Matteo... — ela disse, como quem respira depois de muito tempo submersa.
Ele não respondeu com palavras. Só caminhou até ela. Os olhos brilhando, a boca entreaberta como se o coração falasse primeiro. Quando ficou perto o suficiente, ele a olhou como quem encontra algo perdido há anos.
— Eu sabia, — ele sussurrou. — Eu sabia que você tinha voltado. Meu peito me avisou antes de qualquer coisa.
Ela sorriu entre as lágrimas.
— Esse lugar… esse momento… parece um sonho.
— É real. Você tá aqui. Eu tô aqui. E talvez seja agora que tudo começa de novo.
Ela estendeu a mão, hesitante.
Ele pegou com ternura, os dedos se entrelaçando como antes, como sempre.
O reencontro não foi feito de explicações. Foi feito de sentimento.
Porque quando duas almas se reconhecem, não é preciso dizer muito. O que é verdadeiro se entende no silêncio.
Ali, no quintal da casinha antiga, com o cheiro de saudade e céu limpo, eles se olharam como se o tempo tivesse se curvado para permitir que aquele momento existisse.
E existiu.
Com todo o amor guardado. Com toda a intensidade de quem nunca deixou de sentir. Com toda aquela paixão avassaladora. Ela estava de volta em seu lar.
(Narrado por Matteo)
Tem sentimentos que a gente tenta calar, mas eles encontram um jeito de cantar mesmo assim.
E o meu amor por você… nunca ficou em silêncio de verdade.
A loja estava quieta naquela manhã. Eu organizava algumas partituras enquanto o som suave do piano tocava baixinho no fundo, como fazia todos os dias. Era a trilha sonora do meu cotidiano — notas que preenchiam o vazio que você deixou.
Foi quando aquela melodia começou.
A Thousand Years.
Na mesma hora, meu corpo parou.
Os dedos congelaram sobre as folhas. O ar ficou mais denso, como se todo o tempo tivesse desabado de repente em cima de mim.
O coração disparou.
Você.
Não era só a música. Era uma presença. Uma certeza absurda, sem explicação lógica.
Você estava de volta.
A música era nossa. A que tocava baixinho quando a gente conversava sobre o futuro — mesmo sem saber se ele viria. A que embalava nossos silêncios quando as palavras não bastavam. E ali, naquela manhã comum, ela se tornou sinal.
Fechei os olhos.
E eu vi você. Não em imagem… mas em sensação. No peito.
Na alma.
Deixei a loja antes mesmo de terminar o turno. Fui direto. Os passos me guiando como se eu já soubesse exatamente onde você estaria.
A antiga casa onde tinham nossas inicias marcadas.
Te ver ali, depois de tudo, foi como ouvir a música certa depois de uma vida inteira de ruído.
O tempo não te levou de mim. Só adiou.
Desde que você foi embora, meu mundo virou rotina. Eu dizia pra mim mesmo que você era passado. Um passado doloroso, mas que frequentemente voltava em meu coração.
Manhãs entre instrumentos silenciosos, tardes entre livros e histórias que não eram minhas.
Trabalhar me salvava. Mas viver… viver só voltou a fazer sentido agora.
Não importava em que lugar eu ia, você estava lá. Sentia seu doce cheiro em qualquer lugar. Tudo o que eu via e ouvia me lembrava você. Aos domingos, quando ia à igreja, via você sentada no mesmo lugar de sempre. Quanto mais eu tentava fugir, mais eu te amava.
Porque quando vi você naquele quintal, os olhos marejados e o coração quase visível no peito, eu soube: nada do que senti foi em vão.
Cada música que toquei. Cada livro que li esperando encontrar pedaços seus nas entrelinhas. Cada oração feita no banco mais escondido da igreja…
Tudo me trouxe até aqui.
Você voltou.
E mesmo sem dizer nada, mesmo sem tocar meu rosto ou repetir promessas…
eu sei que a gente tem outra chance. Não posso e nem vou deixar você escapar entre minhas mãos.
E se for pra te amar por mais mil anos, eu já comecei ontem.
Na loja.
Na música.
No instante em que o amor falou mais alto que o tempo.
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