Rhaziel
Ser o lobo mais forte não foi uma escolha. Foi o fardo que me coube carregar desde o momento em que abri os olhos sob a luz fria da lua.
Sou Rhaziel, descendente direto de Varyn, o primeiro alfa da linhagem escura. O lobo que guiou a chacina contra a bruxa de sangue antigo. O mesmo que, antes de morrer, selou em nossa linha uma maldição: destruir a fêmea da meia-lua, ou ser destruído por ela.
Desde então, cada geração carrega a lembrança desse juramento. Eu carrego mais que isso. Carrego o espírito dele. Varyn vive em mim — em meus sonhos, nas minhas dores, nos impulsos que às vezes nem consigo controlar.
Meu domínio se estende por montanhas e vales esquecidos, onde nem os humanos ousam pisar. Sou temido. E respeito... bom, respeito se arranca com dentes e sangue. E eu arranquei muito.
Na última Lua Negra, convoquei o Conselho da Alcateia. A fumaça da fogueira se erguia entre nós, enquanto os olhos prateados dos anciões me fitavam como se esperassem algo que até hoje me recusei a dar: esperança.
— Ainda não apareceu? — perguntou Kheron, meu braço direito, sentado à minha esquerda, com cicatrizes que ele ostenta como troféus.
— Não. — Minha voz saiu grave, cortante. — E se depender de mim, prefiro que nunca apareça.
Um murmúrio correu entre os presentes.
— Mas Rhaziel, ela é sua Luna. O elo precisa acontecer. O espírito de Varyn... ficará inquieto.
Fechei os olhos por um instante. Eles não entendem. Não vivem com ele dentro de si. Não sentem o peso de cada lembrança que não é sua, mas ainda assim, vive em sua carne.
— Se essa fêmea marcada aparecer, ela trará guerra, não paz. O elo pode me enfraquecer, ou pior… me quebrar.
— Ou pode ser exatamente o que precisamos — sussurrou uma voz feminina, vinda do outro lado da roda. Era Maelis, loba curandeira, velha demais para se intimidar comigo. — Você domina pela força, Rhaziel. Mas e se o equilíbrio vier do toque dela?
— Equilíbrio? Já tenho o necessário. — Rosnei, deixando meu poder subir, espiralando ao redor de mim. A terra sob meus pés vibrou. — Meus inimigos tombam. Meus soldados obedecem. Minha alcateia é leal. Eu não preciso de uma Luna, não enquanto não aparecer essa bruxa com marca de maldição.
— E se ela já estiver entre nós? — Kheron perguntou. — E se o espírito já a reconheceu e está só esperando você perceber?
O fogo estalou. Meu peito ardia, mas não por raiva. Por uma inquietação que eu fingia não sentir há semanas. Um cheiro estranho rondava meus sonhos. Um som suave, como uma voz... mas distante. Frágil.
“Ela vai libertá-lo... ou destruí-lo.”
Acordei essa madrugada com essas palavras sussurradas pelo vento, e por um segundo — só um — temi que Varyn estivesse… sorrindo.
Minha Luna.
A fêmea marcada.
O elo que pode me tornar imbatível… ou me condenar.
Eu sou Rhaziel. Alfa de todos. Filho da maldição. Guardião da promessa.
E se ela existir mesmo, vou encontrá-la.
Mas que fique claro: não prometo amá-la.
O burburinho entre os homens crescia como vermes debaixo da pele.
— Está cego, Rhaziel! — disse um dos betas mais novos, com a ousadia de quem nunca sangrou o bastante.
Virei o rosto devagar, minha mandíbula cerrada.
— Repita.
O silêncio caiu como neve pesada. Ele engoliu em seco, mas insistiu:
— Digo apenas que... se você recusar o elo com sua Luna, pode enfraquecer a alcateia. Já estamos há anos esperando. E ela talvez... nunca venha. Talvez já esteja aqui, diante de você.
Levantei-me devagar, cada passo meu ecoando no círculo de terra batida, meus olhos brilhando em âmbar feroz.
— Você ousa questionar minhas decisões diante do conselho, Darek?
— Eu só... penso na alcateia.
Segurei seu pescoço antes que pudesse terminar a frase. Não com força, não para matá-lo — mas o suficiente para lembrá-lo de quem comandava ali.
— A alcateia sou eu. Enquanto meu sangue correr, não haverá traição, nem dúvida. Se a minha Luna aparecer, eu saberei. Até lá, vocês farão o que sempre fizeram: obedecer.
Soltei-o e ele caiu de joelhos, tossindo.
— Quem mais deseja contestar minhas ordens?
O silêncio respondeu por todos.
Saí da roda sem olhar para trás. Meus passos ressoavam entre as árvores até minha casa no alto da colina. A neblina beijava o chão, e o vento cortava como aço, mas dentro de mim… o fogo era outro.
Quando empurrei a porta da minha casa, ela já estava lá.
Sentada em minha poltrona de couro, pernas cruzadas, o vestido curto demais para o frio da noite. A pele morena, o cabelo castanho ondulado e um sorriso provocante no canto da boca.
— Boa noite, Rhaziel. — sua voz era mel e veneno. — Senti sua falta.
— Ninguém te chamou.
— Não precisava. — ela se levantou, andando devagar até mim, os quadris desenhando promessas que não me interessavam. — Está na hora de parar de lutar contra o que está diante dos seus olhos.
— E o que exatamente está diante dos meus olhos?
Ela sorriu, encostando o dedo no meu peito.
— Sua Luna.
Ri. Baixo. Sombrio.
— Você é ambiciosa, Thalia. E atrevida. Mas não é minha Luna.
— Como pode saber? Seu lobo me deseja. Eu sinto. Você sente.
— Desejo e destino são coisas bem diferentes. — minha voz desceu como pedra. — E meu lobo se cala quando você entra. Ele não rosna, não vibra. Ele dorme.
Ela empalideceu.
— Mas eu lutei por você. Me treinei para isso. Sou forte. Leal. Eu daria tudo.
— E é por isso que nunca será minha. — abri a porta, encarando-a. — Você quer o trono, Thalia. Mas a rainha verdadeira... ainda virá. E quando ela vier, todos saberão.
Ela hesitou. Os olhos brilhando de raiva e orgulho ferido.
— Um dia vai perceber que perdeu sua única chance.
— Ou talvez... só esteja esperando a certa.
Ela saiu bufando, deixando para trás o cheiro doce de frustração e de algo que nunca floresceria.
Fechei a porta. Encostei a testa na madeira fria.
Lá fora, o vento uivava.
Dentro de mim, Varyn se mexia.
“Está chegando...” ele sussurrou.
“A que vai virar tudo.”
E eu, Rhaziel, pela primeira vez em anos… senti medo.
Tinha dias em que eu achava que estava ficando louca. E, pra falar a verdade… quase todos os dias eram assim.
Meu nome é Elowen. Tenho vinte e dois anos, e não sei quem sou.
Não no sentido bonito e poético que as pessoas dizem quando estão tentando se encontrar. Eu realmente não sei quem sou. Não tenho sobrenome. Não tenho uma história que me conte de onde vim. Só existo.
Me deixaram num orfanato quando era bebê. Ninguém foi me buscar. E quando completei dezoito anos, me colocaram para fora com uma mochila velha e a frase: "Boa sorte."
Desde então, moro numa cabana caindo aos pedaços no fim de uma estrada de terra, onde ninguém se importa se você desaparece por dias. As paredes são finas, o telhado pinga quando chove, e a luz oscila como se tivesse medo da própria sombra.
É silencioso aqui.
Quer dizer… deveria ser.
Mas, às vezes, eu escuto. Vozes. Sussurros. E o pior: sei que não são meus pensamentos.
Elas me chamam pelo nome. Sussurram no vento, entre as folhas das árvores. Às vezes à noite, quando o céu está limpo e a lua cheia, é como se ela… falasse comigo.
Sim. A lua.
— Está quase na hora...
— Ele vai sentir você...
— A marca vai despertar...
Eu me encolho na cama, abraço meus joelhos e juro que não vou enlouquecer. Mas juro ainda mais que não vou ignorar.
Porque está ficando pior. O calor nas minhas veias. O cheiro do mundo mais forte do que deveria ser. O som do coração dos outros batendo à distância. As visões. Os sonhos com olhos dourados em meio à floresta.
As pessoas da cidade dizem que eu sou louca. Me evitam. Murmuram coisas quando passo com minha bicicleta velha e meu casaco puído. Dizem que tenho “algo no olhar”. Que meus cabelos são estranhos — muito claros, quase brancos. Como os de uma bruxa.
Talvez eu seja.
Nunca consegui manter um emprego. Sempre parece que estou em outro mundo. Nunca tive amigos. Nunca tive alguém.
Mas mesmo sozinha, mesmo com medo…
…eu sinto.
Algo está vindo.
Algo que vai mudar tudo.
E mesmo sem saber por quê, ou quem realmente sou, uma parte de mim pulsa com uma certeza que não posso explicar:
Ele está me procurando.
E quando nos encontrarmos…
O mundo não será mais o mesmo.
O sofá afundava sob meu corpo magro, o cobertor envelhecido escorregando pelas minhas pernas enquanto eu fitava a lua pela janela rachada. Ela parecia maior naquela noite. Quase viva. Como se cada cratera pulsasse com uma luz ancestral que só eu conseguia enxergar.
Meus olhos estavam vidrados nela.
E então… eu ouvi.
“Venha.”
Não era uma voz. Não era som.
Era um sussurro dentro do sangue.
Meus pelos se eriçaram. Meu coração parou por um segundo.
O símbolo pálido que sempre existiu em meu ombro — que eu acreditava ser apenas uma mancha de nascença — brilhou em um dourado quase imperceptível. Ardente. Vivo.
“Você é nossa.”
Minha respiração prendeu.
O vento soprou por baixo da porta como um beijo gélido no tornozelo, e o silêncio que antes me acolhia parecia agora conter algo prestes a explodir.
Sem pensar, me levantei.
Dei um passo. Outro. Os pés descalços tocando o chão frio como se a casa já não me pertencesse.
Como se eu não pertencesse mais a este mundo.
Abri a porta. A madeira rangeu, a noite se abriu diante de mim como uma prece antiga.
Não havia movimento lá fora. Nenhuma alma. Só o som.
Um som que parecia vir da terra, das árvores, do céu.
Baixo, constante, quase um eco em mim mesma. Como um tambor ancestral.
E então, entre os ventos... um uivo. Longo. Rasgado.
E seguido por outros.
Meus olhos marejaram sem saber por quê.
Eu fui. Guiada por um instinto primitivo que não compreendia.
Atravessei o mato. O terreno. A estrada.
Meu corpo se movia como se soubesse para onde ir, mesmo que minha mente gritasse perguntas que ninguém respondia.
Os uivos me guiavam.
Até que percebi onde estava.
Uma estrada deserta, envolta por árvores densas e escuras, iluminada somente pela lua que pendia no céu como uma vigia silenciosa.
Parei no centro da estrada.
Meu coração batia acelerado, mas… eu não tinha medo.
Nem mesmo quando eles surgiram.
Olhos dourados brilharam na escuridão.
Lobos. Cinco. Talvez seis. Cercando-me em silêncio.
Mas não temi.
Porque algo queimava dentro de mim.
Uma chama crua e antiga, subindo do estômago até a garganta.
Algo selvagem.
Algo meu.
Preparei-me para gritar, para lutar, para me defender — quando um uivo estrondoso ecoou pela floresta.
Tão forte que o chão pareceu vibrar sob meus pés.
Os lobos pararam. Curvaram-se. Abaixaram as cabeças em reverência.
E então… eu o vi.
Saindo das sombras como o próprio fim do mundo, um lobo negro de olhos incandescentes atravessou a névoa. Enorme. Imponente. Seu olhar parecia perfurar a minha alma, arrancar cada segredo que escondi até de mim mesma.
E a voz…
— Minha fêmea.
Aquela voz… era dele.
Mas não foi dita com a boca.
Foi dita com o sangue.
Meu corpo estremeceu.
O lobo negro parou a poucos passos de mim.
Seu peito largo arfava devagar. A cabeça imponente se ergueu como a de um rei que encontrara aquilo que procurava por séculos. Eu não conseguia me mover. Não por medo… mas porque algo dentro de mim reconhecia ele.
Sem aviso, a pele dele começou a brilhar.
A forma imensa se curvou, tremulando como se feita de fumaça e fogo.
E então… ele se ergueu.
Um homem.
Nu, poderoso, coberto por fragmentos de sombra e luz que aos poucos revelaram a pele bronzeada, o porte esculpido e os olhos... os olhos de lobo. Dourados. Selvagens. Intocáveis.
Ele era perigoso.
E ainda assim, eu não conseguia olhar para outra coisa.
— Voltem. Agora. — sua voz cortou a noite como aço, e os outros lobos o obedeceram sem questionar.
Sumiram na escuridão, restando apenas ele. E eu.
Ele me encarou.
— Você está bem? — a pergunta não parecia formal. Era mais profunda. Como se ele estivesse sentindo o que eu sentia.
Assenti, embora minha cabeça gritasse que não.
Como eu poderia estar?
Meu corpo queimava por dentro. Minhas veias pulsavam em um ritmo novo.
Ele deu um passo.
Eu não recuei.
Seus dedos tocaram os meus, por puro acaso… ou destino.
Foi como um trovão.
Um choque atravessou meu braço, meu peito, minha alma.
Arfei. Ele também.
Nossos olhos se encontraram — e naquele instante, soube.
Éramos um só.
Mas como?
Como eu, a garota louca da vila, sem passado nem nome verdadeiro, podia ser feita da mesma essência que aquele ser?
O medo não me paralisou.
Me impulsionou.
Gritei.
O som rasgou a noite. Um som selvagem. Quase animal.
Minhas pernas se moveram antes mesmo que eu pensasse.
E então eu corri.
Corri como nunca antes.
Não era humano. Eu não era mais humana.
Minhas pernas voavam sobre o chão, os braços empurrando o vento, os olhos marejados de fúria, confusão, instinto.
Deixei aquele homem para trás, sua voz me chamando, seu olhar queimando em minha nuca.
Mas eu não parei.
Porque alguma parte de mim sabia…
Se eu ficasse, nunca mais seria livre.
E ao mesmo tempo… uma parte sombria gritava que fugir dele seria impossível para sempre.
A noite estava quieta demais.
E isso me incomodava.
A lareira crepitava na minha casa de pedras escuras. Eu ainda estava com a camisa aberta, tentando entender o desconforto que me tomava desde o fim da tarde. Algo dentro de mim se agitava como uma fera presa, inquieta, enlouquecida.
Foi quando Drevan, um dos meus guerreiros de confiança, arrombou a porta sem cerimônia.
— Sentiram. — ele disse, sem fôlego. — Uma força bruxa… muito forte. Está perto.
Meu coração errou o compasso.
O mundo pareceu congelar por um instante.
Ela.
A promessa que percorreu séculos.
O fardo da linhagem.
A fêmea marcada.
— Reúnam todos. Agora. Vamos.
Em menos de dez minutos, os guerreiros estavam prontos. O pátio da casa virou solo sagrado.
Vestes rasgadas. Ossos se moldando. Dentes alargando.
Transformações completas.
Corpos imensos, pelagens espessas, olhos em brasa.
Minha matilha. Minha linhagem.
Lobos prontos para a caça.
A estrada parecia se desenhar sozinha diante de nós. Quanto mais avançávamos, mais denso se tornava o ar. A magia vibrava. Dançava. Chamava.
— Está me dando náuseas. — murmurou Kharon, um dos mais velhos.
— É como se o ar gritasse. — disse uma das fêmeas. — Algo ancestral… selvagem… e assustador.
Mas eu?
Eu sabia.
Sentia nas entranhas.
Ela estava lá.
Caminhei na frente. Meus pés firmes no solo frio.
Meus olhos cruzaram os dela antes mesmo de me dar conta.
Ela estava parada, como se hipnotizada pela lua.
Pele pálida, cabelos quase brancos, como neve sob prata.
E aqueles olhos...
Perdidos. Vivos. Antigos.
Um sussurro atravessou meu peito, vindo dela.
Não era dito em voz alta. Mas era real. Quente. Cortante.
“Sou sua.”
A marca em seu ombro pulsava.
Minúscula. Irrefutável.
Minha garganta se fechou.
Era ela.
Minha Luna.
A fêmea prometida.
A bruxa amaldiçoada?
— Voltem. Todos. — ordenei com a voz grave. Não queria interrupções. Nem olhos sobre ela.
Eles se afastaram, relutantes. Mas obedeceram.
Dei alguns passos à frente, devagar, como quem teme quebrar o encantamento.
— Você está bem? — perguntei, mas a pergunta era tola. Era óbvio que não.
Ela assentiu. Tremia, mesmo sem frio.
Fiquei em silêncio, apenas a encarando.
Até que nossos dedos se tocaram, e uma descarga elétrica nos atravessou.
Vi sua expressão se contorcer. O mesmo choque queimou minha pele.
Ela me olhou como se quisesse entender, mas não pudesse.
E então gritou.
Um som feroz. Quase sobrenatural.
E correu.
Ela fugiu.
Com força sobre-humana, agilidade impossível.
A magia a envolvia. A chamava. A impulsionava.
Fiquei parado. Estático. O cheiro dela ainda em meus pulmões. A marca ainda ardendo em minha mente.
Minha Luna é uma bruxa.
O sangue de Varyn gritou em minhas veias.
A promessa ecoou nos meus ossos.
“Se a marcada surgir, você deve destruí-la.”
Mas eu não podia.
Ela era minha.
— Reúnam os anciãos. Agora. — disse ao retornar à aldeia. — É urgente.
E enquanto a noite me engolia, apenas uma coisa era certa:
O destino acabava de mudar o jogo.
E tudo que eu acreditava… estava prestes a ruir.
O salão do conselho estava cheio. As tochas ardiam com uma fúria incomum, refletindo nas paredes de pedra bruta. O clima era pesado.
A tensão, cortante.
— Você viu a marca! — rugiu um dos anciãos. — Ela é a bruxa marcada, Rhaziel! Você sabe o que isso significa.
— Ela é sua Luna, sim... e esse é o castigo. — completou outro, de olhos opacos e alma seca.
Meus punhos cerrados tremiam sobre a mesa de carvalho.
Eu ouvia. Cada palavra como uma lâmina contra minha pele.
— Vocês querem que eu a mate. — minha voz soou baixa, mas carregada de um perigo latente. — Sem que ela saiba sequer quem é. Sem entender a própria maldição que vocês tanto temem.
— Ela tem o sangue da bruxa original! — urrou um guerreiro do sul. — Pode destruir todos nós se não for contida.
— Ela não sabe nem o que é! — gritei, batendo na mesa. — Não sabe o próprio nome, a própria força. O que vocês esperam que ela faça?
— Justamente por isso. — disse um outro, velho e corrompido pelo medo. — Elimine-a antes que descubra.
A sala mergulhou num silêncio tenso.
Foi quando ela se pronunciou.
Yalis, a curandeira.
A mulher de cabelos brancos como ossos, olhos de tempestade e sabedoria acumulada em séculos. Sempre calada, sempre distante. Mas hoje… ela me encarou como se falasse com meu espírito.
— Ela é poderosa. Sim. — sua voz era suave, mas ressoava como trovão. — Mas não nasceu para destruir. Ela nasceu para acabar com a maldição.
Os olhos se voltaram para ela. Alguns riram. Outros a acusaram de ter enlouquecido.
Ela ignorou todos.
— Você pode moldá-la, Rhaziel. — disse, com a firmeza de quem vê o futuro. — Ela não é sua ruína. É sua salvação. Sua Luna foi feita para você. Não tem como fugir disso.
Engoli em seco.
O ar parecia denso demais para respirar.
A mais poderosa entre todas.
A que poderia trazer a cura… ou a ruína.
O que o destino havia feito comigo?
— Basta! — berrei, o corpo em chamas, o sangue pulsando com uma fúria ancestral. — Vocês querem que eu destrua minha Luna? Minha fêmea? Isso?
Um dos anciãos tentou se levantar, mas o meu rugido o fez recuar.
— Eu não vou matá-la!
A cadeira caiu quando me afastei.
Saí do salão como uma tempestade que não encontra paz.
O vento cortava o rosto como navalhas de gelo.
Lá fora, a lua me encarava com o mesmo brilho do olhar dela.
Elowen.
Meus ossos se romperam.
Minha pele se moldou.
Garras rasgaram o chão de terra batida.
Me transformei.
Não havia tempo para pensar.
Nem espaço para recuar.
Só correr.
Meu lobo disparou pelos campos, veloz como a fúria de uma maldição viva.
Mas dentro de mim, o homem gritava.
Ela era minha.
E mesmo que o mundo inteiro quisesse vê-la morta...
Eu seria o único capaz de salvá-la.
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