Boa Leitura!
O bar estava movimentado naquela noite, como sempre. O cheiro de álcool e cigarro misturava-se ao som da música ao fundo, enquanto Ágata deslizava entre as mesas com bandejas cheias de copos e garrafas. Trabalhava ali há meses, servindo drinks para desconhecidos durante o dia e, nos fins de semana, dançava no pole dance de uma casa noturna para conseguir uma grana extra. A vida na França não era fácil, mas ela fazia o que era necessário para sobreviver.
Heitor chegou sem avisar, vestindo sua jaqueta de couro gasta, um sorriso confiante no rosto. Ele se sentou em uma das mesas próximas ao balcão, os olhos brilhando de euforia.
Ágata se aproximou, cruzando os braços. — O que você está fazendo aqui?
Heitor encostou-se na cadeira e sorriu. — Preciso de grana.
Ela bufou. — Mas todo o dinheiro que recebi, você já gastou.
— Eu preciso desse dinheiro agora — insistiu ele, pegando um copo de cerveja e tomando um gole. — Te prometo que vou te pagar. Sei que dessa vez a sorte está do meu lado.
Ágata respirou fundo, tentando manter a paciência. — Olha só, Heitor, melhor você trazer essa grana em dobro, porque eu tô cansada de você ficar fazendo apostas.
Ele riu, deslizando a mão sobre a dela. — Relaxa, gata. Vai dar tudo certo. Dessa vez a gente vai se dar bem.
Ele se inclinou para perto dela, seu hálito quente roçando sua pele enquanto sussurrava: — Quando eu for rico, vou comprar um colar de diamantes pra você.
Ágata sentiu seu corpo estremecer quando ele encostou o rosto em seu pescoço, a respiração profunda, provocadora. Ela se afastou rapidamente, olhando ao redor. — Não faz isso aqui. Os clientes estão olhando.
Heitor abriu um sorriso de canto, divertido com a reação dela.
Ela suspirou, enfiou a mão no bolso e retirou algumas notas amassadas. Olhou para os lados antes de entregá-las. — Tudo que ganhei essa semana.
Os olhos dele brilharam enquanto pegava o dinheiro. — Beleza, gata. Te prometo te pagar em dobro.
Ele terminou de beber a cerveja de um gole só e saiu, contando as notas, satisfeito.
Ágata ficou parada por um instante, observando a silhueta dele desaparecer pela porta do bar. No fundo, sabia que aquele dinheiro dificilmente voltaria para suas mãos. Mas, como sempre, preferia acreditar que, um dia, Heitor manteria a promessa.
Ao sair do bar, Heitor nem teve tempo de acender um cigarro. Assim que pisou na calçada, sentiu mãos fortes o agarrando. Tentou reagir, mas era tarde demais. Cinco homens armados e mal-encarados o cercaram.
— O que é isso? — Ele perguntou, a voz trêmula.
Um soco no estômago foi a única resposta antes de ser arrastado para um carro preto. Jogaram-no no porta-malas e saíram em alta velocidade pelas ruas de Paris.
Quando o veículo parou, Heitor foi puxado para fora e empurrado contra o chão de terra dura. Estava em um terreno baldio, cercado por homens armados. Suas mãos foram amarradas, e o suor começou a escorrer por sua testa. O medo apertou seu peito.
Então, ele ouviu passos firmes e compassados se aproximando.
Yanick Montclair.
Vestindo um terno impecável e segurando um charuto entre os dedos, ele olhou para Heitor com um sorriso frio.
— Você se lembra de mim? — perguntou, soprando a fumaça lentamente.
Heitor arregalou os olhos ao reconhecer o homem. — Claro que sim. Yanick Montclair.
O mafioso soltou uma gargalhada. — Exatamente. Você achou que eu tinha esquecido a dívida que tem comigo?
— Eu… eu prometo pagar… — Heitor gaguejou.
— Você realmente achou que eu não iria te encontrar?
— Eu sabia que você me acharia…
Yanick se abaixou, ficando cara a cara com Heitor. — E me diz uma coisa… Você acha que sua vida vale alguma coisa para mim?
— Me dá… por favor… alguns dias…
— Quantos dias? — Yanick arqueou uma sobrancelha.
— Quarenta! Se eu não pagar, pode me eliminar dessa terra!
O mafioso sorriu de lado e se levantou. — Vou te dar mais uma chance, Heitor Castanhares. Mas preste muita atenção. Se chegarem os quarenta dias e você não me pagar o que deve, eu vou arrancar sua cabeça… e ainda faço coisas piores com a ruivinha que você namora.
O coração de Heitor quase parou. — A Ágata não tem nada a ver com isso!
Yanick deu um passo para trás e falou em francês, com um tom cruel: — Mais je vais m’assurer que vous souffriez tous les deux. (Mas eu faço questão de fazer isso com os dois.)
O desespero tomou conta de Heitor. — Me dá esse tempo e eu te pago!
Yanick deu uma última tragada em seu charuto e sorriu. — Ah, e só para deixar claro… Não são mais quinhentos mil euros. Coloquei para correr juros. Agora, você me deve um milhão.
Heitor sentiu a respiração falhar. Seu corpo inteiro tremia. — Eu prometo… Só me deixa ir…
Yanick fez um gesto com a mão, e os homens soltaram Heitor. Ele caiu de joelhos, respirando com dificuldade.
O mafioso se afastou, ajustando a gravata. — E lembre-se, Castanhares… Não tente fugir. Não tente me enganar. Porque eu sempre estou de olho em você.
Heitor engoliu em seco enquanto via Yanick se afastar, desaparecendo na escuridão da noite. Ele sabia que sua vida estava por um fio. E, dessa vez, não era só a dele que estava em jogo.
A madrugada estava fria e úmida. A chuva fina caía sobre Paris, encharcando as ruas e tornando o vento ainda mais cortante. Ágata subia as escadas estreitas e rangentes do prédio velho onde morava com Heitor. Seu casaco comprido estava pesado de umidade, o cigarro pendia de seus lábios, e em suas mãos havia algumas sacolas com mantimentos baratos.
Ela empurrou a porta do apartamento com o ombro e entrou, já tirando o cigarro da boca. Mas ao levantar os olhos, viu Heitor sentado no sofá, imóvel, olhando fixamente para a parede.
— O que aconteceu? — perguntou, franzindo o cenho.
Heitor sequer piscou. A voz saiu rouca:
— Eu vou morrer.
Ágata revirou os olhos e jogou as sacolas sobre a mesa.
— Para de drama, Heitor. Como assim morrer? Descobriu alguma doença grave?
Ele soltou um riso amargo e se levantou. A luz fraca do abajur iluminou seu rosto, revelando os hematomas nos lábios e na bochecha. Ele ergueu a camisa, mostrando as marcas de socos espalhadas pelo tronco.
Ágata arregalou os olhos.
— O maior mafioso agiota de Paris me pegou hoje — Heitor disse, a voz trêmula.
Ela tragou o cigarro, tentando conter o nervosismo.
— Lembra daquele Yanick? Logo quando você chegou aqui, eu precisei pegar dinheiro emprestado com ele.
— Eu lembro sim — respondeu, exalando a fumaça.
— Pois é, ele me achou e me ameaçou.
Heitor se aproximou, seus olhos carregados de desespero.
— Tenho 40 dias pra pagar um milhão de euros. Se eu não conseguir… Ele vai me matar. E matar você também.
O coração de Ágata disparou. Ela passou as mãos pelos cabelos molhados, sentou-se pesadamente no sofá e balançou a cabeça.
— Eu não acredito, Heitor. Isso é impossível…
— Eu sei. Mas eu não sei o que fazer… Eu vou tentar fugir.
Ágata virou-se para ele, furiosa.
— Você sabe que se tentar fugir vai ser pior! E isso ainda sobra pra mim! Caralho!
Ela sentou ao lado dele, enquanto Heitor pegava o cigarro de sua mão e tragava fundo. O silêncio entre eles era carregado de tensão.
Ele soltou a fumaça devagar, como se já aceitasse seu destino.
— Vamos morrer da maneira mais horrível possível.
Furiosa, Ágata socou o braço dele várias vezes.
— Tudo por sua culpa! Apenas sua culpa!
Heitor baixou a cabeça.
— Eu sei que é culpa minha… Mas quer que eu faça o quê?
O apartamento mergulhou em um silêncio denso, apenas o barulho da chuva contra a janela preenchia o vazio.
Ágata mordeu os lábios, os pensamentos a mil.
— Que droga… — murmurou.
Eles estavam encurralados. E precisavam encontrar uma saída. Rápido.
O dia foi um tormento para Ágata. A ameaça de Yanick ecoava em sua mente, tornando cada momento uma tortura. Na lanchonete onde trabalhava, seus olhos estavam sempre em alerta, observando cada cliente que entrava, temendo que algum capanga do mafioso surgisse para acabar com ela.
Quando a noite chegou, ela seguiu para seu segundo trabalho na boate. Mas, diferente das outras vezes, sentia um peso nos ombros, um medo constante.
No vestiário, Ágata abriu o armário, jogando sua bolsa dentro, mas antes mesmo de começar a se trocar, olhou ao redor, desconfiada.
Antonela, sua colega de trabalho, estava em frente ao espelho, retocando o batom vermelho quando percebeu sua inquietação.
— O que houve? Está assustada, Ágata? — perguntou, arqueando a sobrancelha e se aproximando.
Ágata desviou o olhar e forçou um sorriso.
— Eu só estou ansiosa hoje.
Antonela riu, balançando a cabeça.
— Mas você faz isso há dois anos. Esses olhares dos clientes são normais.
Ágata olhou ao redor mais uma vez e então segurou a mão de Antonela, puxando-a para um canto mais afastado. Ela sussurrou:
— Não estou preocupada com isso.
Antonela franziu o cenho.
— O que houve?
Ágata olhou para os lados antes de responder, a voz carregada de desespero:
— Eu estou desesperada. Desesperada!
— Por quê?
— Um agiota maldito está ameaçando o Heitor e eu de morte.
Antonela arregalou os olhos.
— Eu te falei que o Heitor iria te colocar em uma enrascada! Mas você é louca, apaixonada por esse homem…
— Para de me dar sermões e escuta o que estou te dizendo! — Ágata cortou, impaciente. — Eu tenho 40 dias pra conseguir um milhão de euros, ou ele vai matar o Heitor e a mim!
Antonela ficou em silêncio por um momento, assimilando as palavras. Então suspirou.
— Amiga… Eu queria te ajudar, mas um milhão é muito dinheiro.
Ágata mordeu o lábio inferior, os olhos marejados.
— Eu sei. Então é o mesmo que estar morta.
Antonela observou sua amiga por alguns segundos e então abriu um sorriso malicioso.
— Já sei! Você pode se tornar acompanhante de luxo.
Ágata arregalou os olhos, sentindo o estômago revirar.
— Isso não! Eu nunca aceitei ser…
— Calma! Não estou falando de qualquer um! — Antonela a interrompeu, animada. — Estou falando de homens milionários, dispostos a pagar qualquer coisa por uma mulher linda como você.
Ágata balançou a cabeça.
— Isso não está certo…
— Você prefere morrer?
O silêncio de Ágata foi resposta suficiente.
Na mansão moderna situada em um dos bairros mais nobres de Paris, Louis Beaumont apreciava a tranquilidade da noite. Aos trinta anos, era um dos herdeiros mais ricos da cidade, tendo herdado uma fortuna incalculável após a morte de seu pai. A família Beaumont era referência no ramo automobilístico, e Louis, desde pequeno, fora criado para dar continuidade ao império.
Mas, apesar de todo o dinheiro e prestígio, havia algo que ninguém via: a solidão.
Louis nunca soube quem era sua mãe e passou a infância cercado por babás e empregados. Cresceu rodeado de luxo, mas sem o calor de uma família. Seu pai, embora presente nos negócios, sempre manteve uma postura rígida e distante, ensinando-o que confiança era algo raro e que a maioria das pessoas se aproximaria dele apenas por interesse.
Com o tempo, essa lição ficou marcada em sua personalidade. Ele viajou o mundo, conheceu culturas, frequentou os melhores eventos e jantou com as pessoas mais influentes do planeta. Mas a desconfiança sempre o acompanhava. E foi assim que ele se tornou um homem reservado, distante, frio.
Naquela quinta-feira à noite, a mansão estava silenciosa. Apenas o suave som de um jazz preenchia o enorme salão. Louis segurava uma taça de Cognac Louis XIII, uma das bebidas mais caras da França, enquanto seus olhos fixavam um ponto indefinido na lareira.
Lembranças de seu pai vinham à mente. Apesar da rigidez, ele sentia falta das conversas, dos ensinamentos e até mesmo das raras demonstrações de carinho.
Seus dedos giraram levemente o líquido âmbar na taça, e um suspiro escapou.
O som de passos suaves interrompeu seus pensamentos. O mordomo, um homem idoso e de confiança da família, se aproximou com respeito e, com intimidade rara entre eles, perguntou:
— Precisa de mais alguma coisa, senhor Beaumont?
Louis desviou o olhar da bebida e fitou o empregado.
— Estou bem. Se quiser, já pode se retirar.
O mordomo fez um leve gesto de reverência e saiu do salão, deixando-o novamente sozinho.
Louis voltou a encarar a bebida, sentindo o peso da solidão, um sentimento que nem toda sua riqueza conseguia aliviar.
A noite em Paris continuava fria quando o celular de Louis vibrou sobre a mesa de mármore. Ele franziu a testa ao ver o nome na tela. Alexis. Fazia tempo que não falava com seu velho amigo.
— Alô? — atendeu com a voz calma.
— Louis, estou na porta da sua mansão.
Louis ergueu a sobrancelha, surpreso.
— Não acredito… imprevisível como sempre.
— Exatamente, mon ami! Agora manda liberar a entrada, porque estou congelando aqui fora.
Louis sorriu e fez um gesto para que seu mordomo autorizasse a entrada. Minutos depois, Alexis cruzava as portas da mansão, tirando o casaco enquanto encarava o amigo com um ar provocador.
— Sempre sério e solitário, — comentou.
Louis se levantou, ajeitando os punhos da camisa.
— E você sempre imprevisível e aventureiro.
— Respeita que sou seu único e melhor amigo, — disse Alexis, batendo no ombro dele.
— Claro.
Alexis jogou-se no sofá luxuoso, esticando as pernas com naturalidade.
— Vou embora na segunda-feira. E minha missão antes disso é te tirar dessa mansão e te levar pra se divertir.
— Nem pensar.
— Cara, faz isso pelo teu amigo. Você mudou muito, não reconheço mais.
Louis suspirou e serviu-se de mais um gole de conhaque.
— Não vejo mais graça em muitas coisas.
— Mas a vida tem graça, sim.
— Me sinto um velho de setenta anos.
Alexis soltou uma gargalhada.
— Velho? Você é um bonitão, milionário, e só tem 30 anos! Você devia estar vivendo como um rei.
Louis enfiou as mãos nos bolsos.
— Estou saturado.
— Vamos para um lugar diferente. Te garanto que vai gostar.
Louis arqueou a sobrancelha, desconfiado.
— Que lugar?
— Se chama Vip 69, uma festa privada.
Louis soltou um riso nasal.
— É um desses eventos de milionários para orgias absurdas?
Alexis riu junto.
— Sei que você já frequentou muitos desses lugares, mas não, essa é diferente.
— E o que tem de diferente?
— É um lugar com uma galera mais solta. Sem formalidades, sem interesse. Só diversão.
Louis balançou a cabeça, descrente, e voltou a se sentar.
— Não tenho paciência para festas de gente que não quer sair da adolescência.
— Está se referindo a mim?
— Também.
Alexis colocou a mão no peito, fingindo estar ofendido.
— E você é um idoso estagnado.
Louis rolou os olhos.
— Olha só… eu vou para essa festa vip só porque está me pedindo.
Alexis abriu um sorriso vitorioso e bateu palmas.
— Isso, homem! Sai da caverna, lobo solitário. Amanhã será uma noite memorável.
Louis suspirou, já se arrependendo da decisão. Algo dentro dele dizia que aquela noite seria diferente de todas as outras.
A manhã de sexta-feira estava nublada em Paris. Ágata tremia enquanto tragava mais um cigarro, sentada na calçada em frente à lanchonete onde trabalhava. Seus olhos estavam vermelhos, o rosto cansado. O chão ao redor dela estava cheio de maços vazios.
Antonela se aproximou, cruzando os braços ao ver a cena.
— Pelo visto foram muitos maços de cigarro, — comentou, chutando um dos pacotes vazios.
Ágata soltou a fumaça lentamente e balançou a cabeça.
— Eu estou desesperada. Sem dormir, sem comer, sem respirar.
Ela enfiou a mão trêmula no bolso e puxou o celular, mostrando a tela para Antonela.
— Olha só isso!
Antonela pegou o celular e arregalou os olhos ao ler as mensagens.
— Ele descobriu seu número?!
— E diz que sabe tudo sobre mim, inclusive sobre minha família.
Antonela franziu a testa, pensativa.
— Eu andei pensando a noite inteira em uma forma de te ajudar. E tive uma ideia.
Ágata jogou o cigarro no chão e pisou em cima, impaciente.
— Então fala.
— Vai ter uma festa chamada Área VIP 69, e pelo que ouvi dizer, a elite francesa vai estar lá.
Ágata revirou os olhos.
— Lá vem você…
— Escuta, foi a única ideia que eu tive!
Ágata suspirou e fez um gesto para que ela continuasse.
— Quem sabe você não conhece um milionário que esteja disposto a pagar uma boa grana pra dormir com você?
Ágata a encarou, incrédula.
— Antonela, eu não sou prostituta! E eu tenho namorado.
Antonela cruzou os braços e arqueou a sobrancelha.
— Um lixo de namorado, né?
Ágata desviou o olhar, respirando fundo.
— E como entraremos nessa festa se só a elite pode ir?
Antonela abriu um sorriso malicioso.
— Ahá! Então já se interessou.
— Não torra minha paciência, só responde.
— Simples: fingimos que somos modelos super famosas no Brasil e nos infiltramos. Somos bonitas, ninguém vai reparar.
Ágata mordeu o lábio, ponderando.
— Eu vou aceitar seu plano só porque não tenho escolha.
Antonela bateu palmas e sorriu.
— Isso que eu gosto! Agora vamos pensar em como nos transformar em modelos internacionais.
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