Haruto se levantou rapidamente ao ver Sayuri, uma expressão de surpresa misturada com algo que Yuki não conseguiu identificar. Era como se ele tivesse sido arrancado de um pensamento profundo, algo que ele não queria compartilhar. Sayuri, com um sorriso tímido, olhou para Yuki, como se tentasse medir o clima da sala.
— Ah, Yuki… você está aqui. Não sabia que você viria. — disse Sayuri, sua voz suave, mas com um tom carregado de algo não dito. Talvez uma culpa, ou uma ansiedade que Yuki não conseguia decifrar.
Yuki sorriu, mas era um sorriso sem vida, sem calor, como se o espaço entre ela e Sayuri estivesse tão grande quanto o oceano que separa duas almas que já foram próximas, mas que se distanciaram com o tempo. Ela se levantou e, de forma quase automática, cumprimentou Sayuri com um aceno de cabeça.
— Eu só… eu só precisava de um tempo, Sayuri. Não me importo. — respondeu Yuki, sentindo uma leve irritação, mas tentando manter a calma. O clima agora estava denso, e ela sentia a tensão crescer.
Haruto, desconfortável, olhou para as duas mulheres, como se estivesse preso entre elas, mas ao mesmo tempo, incapaz de tomar qualquer decisão. A situação estava fora de controle, e ele sabia disso.
— Sayuri… Eu… não esperava que você aparecesse aqui — disse ele, a voz mais baixa, quase como se tentasse esconder algo.
Sayuri olhou para Haruto com um sorriso triste, como se estivesse pedindo desculpas, mas sem dizer uma palavra. Ela sabia que sua presença complicaria ainda mais as coisas, mas não conseguia se afastar. Havia algo ali, entre eles, que parecia não ter sido resolvido.
Yuki sentou-se novamente no sofá, sentindo-se como uma espectadora da vida de ambos. A sensação de estar fora de lugar, de não pertencer a aquele cenário, era cada vez mais forte. Mas, ao mesmo tempo, ela sentia que tudo isso fazia parte de algo maior. Algo que ela não conseguia compreender, mas que, talvez, estivesse esperando por ela.
— Não sei o que fazer, Yuki. — Haruto quebrou o silêncio, finalmente se sentando novamente. Seu olhar estava vazio, mas ao mesmo tempo, parecia pedir ajuda. — Eu sempre fui bom em fugir de tudo, mas agora… agora não consigo mais. Não sei mais para onde ir.
Yuki olhou para ele, sem saber como responder. Ela não tinha respostas para si mesma, quanto mais para ele. Mas algo dentro dela dizia que eles não estavam sozinhos naquela sensação de perda, de vazio. Todos estavam tentando encontrar um caminho que, de algum modo, parecia sempre escapar de suas mãos.
— Talvez não precise saber para onde ir, Haruto — Yuki disse, tentando soar mais tranquila do que realmente se sentia. — Talvez o mais importante seja parar de buscar tanto e simplesmente ser.
Sayuri, que até então permanecia em silêncio, olhou para Yuki com uma expressão que quase parecia surpresa. Ela conhecia Yuki há muito tempo e sabia como ela evitava as perguntas mais profundas. Mas, naquele momento, Yuki parecia diferente. Algo havia mudado nela, como se as palavras não fossem mais um refúgio, mas sim um reflexo de sua própria busca por algo que, ela sabia, estava além de suas mãos.
— Yuki… você realmente acha que é isso que precisamos fazer? — Sayuri perguntou, seus olhos agora mais atentos. — Parar de procurar? Eu… não sei. Eu tentei fazer isso, mas sempre me sinto perdida.
Yuki fechou os olhos por um momento, permitindo que o silêncio se instalasse novamente. As palavras de Sayuri ressoaram em sua mente, e ela se perguntou se realmente existia uma solução para aquele sentimento constante de deslocamento.
— Eu não sei, Sayuri. Eu não tenho todas as respostas. Mas talvez… talvez não se trate de encontrar o lugar certo, mas de aceitar que esse lugar está em constante mudança. Talvez nossa busca seja apenas um reflexo da nossa incapacidade de aceitar o que somos e o que estamos vivendo agora. — Yuki falou, e as palavras, embora simples, pareciam carregar uma verdade maior.
Haruto olhou para Yuki, como se estivesse começando a compreender algo. Ele nunca tinha pensado dessa maneira antes. Sempre pensara que havia um lugar certo, um caminho claro a seguir. Mas e se, na verdade, o caminho fosse construir algo novo onde estavam, em vez de buscar algo distante?
Sayuri, que até então parecia mais confusa, agora parecia pensativa. Talvez Yuki tivesse tocado em algo que ela ainda não conseguia entender, mas que, em algum nível, ela sentia.
O silêncio se instalou novamente, mais pesado agora. As três pessoas estavam ali, no mesmo lugar, mas ao mesmo tempo, cada uma presa em sua própria busca, seus próprios dilemas. Yuki sentia que algo estava prestes a mudar, mas não sabia o quê. Algo dentro dela sabia que aquela conversa era apenas o começo de uma transformação que não poderia ser prevista.
As horas passaram, e a conversa, embora lenta e cheia de pausas, fez com que todos eles se vissem sob uma nova luz. Eles não sabiam para onde estavam indo, mas, pela primeira vez, parecia que estavam prontos para simplesmente caminhar, sem a necessidade de um destino fixo.
A madrugada avançava lentamente, e a luz suave da lua entrava pelas janelas do apartamento de Haruto, refletindo nas pequenas partículas de poeira que dançavam ao vento. O silêncio parecia envolver todos os três de maneira confortável agora, uma calmaria que contrastava com a agitação interna de cada um.
Yuki, ainda sentada no sofá, observava Haruto e Sayuri com uma sensação de inquietação crescente. Eles não estavam mais tão distantes, mas a tensão entre os três ainda estava presente, como uma nuvem que não se dissipava. Ela não sabia o que exatamente tinha mudado naquela noite, mas algo em sua alma parecia ter se rearranjado, como se houvesse aberto uma porta para um novo entendimento — não sobre o futuro, mas sobre o presente.
— Você não me contou o que aconteceu entre você e Sayuri — Yuki disse, quebrando o silêncio, sua voz suave, mas firme. O olhar que ela lançou a Haruto foi curioso, mas também cuidadoso. Ela sabia que ele não gostava de falar sobre isso, mas havia algo ali, algo não resolvido que ainda pairava sobre os três. — O que aconteceu? Por que você se afastou dela?
Haruto olhou para o chão por um momento, como se as palavras o tivessem pegado de surpresa. Ele não estava preparado para falar sobre isso, mas Yuki tinha o poder de fazer as perguntas certas no momento exato, quando ninguém mais se atrevia.
— Eu… eu não sei, Yuki. — ele começou, com a voz arrastada, como se o peso da lembrança fosse difícil de suportar. — Quando Sayuri e eu nos conhecemos, foi… simples. Era fácil. Eu era um garoto perdido, e ela era a luz que eu precisava. Mas, com o tempo, as coisas mudaram. Eu comecei a sentir que não estava sendo honesto comigo mesmo. Eu queria algo mais, algo diferente, mas ao mesmo tempo, não sabia o que era. Eu… eu a magoei, e por isso… nos afastamos.
Sayuri, que até então havia permanecido quieta, agora olhava para Haruto, seu rosto suavizado pela melancolia. Ela respirou fundo antes de falar.
— Não, Haruto. Eu também não fui perfeita. Eu pensei que conseguiria consertar tudo, que teria as respostas para nós dois. Mas, no fim, percebi que, em algum lugar, nós dois nos perdemos. Eu… eu nunca soube como lidar com os meus próprios medos, e acho que, de alguma forma, eles acabaram nos afastando. Eu me apaixonei por uma ideia, não pela realidade. E talvez isso tenha sido o mais difícil de aceitar.
A voz de Sayuri era frágil, mas havia uma força sutil em suas palavras. Yuki observava, silenciosa, percebendo a complexidade daquela relação. Era como um quebra-cabeça que, mesmo depois de tanto tempo, ainda não se encaixava completamente.
Ela sentiu um impulso de entender mais, de perguntar algo que talvez fosse difícil para todos, mas algo que precisavam saber. Algo que poderia ser o primeiro passo para finalmente encontrar um sentido para tudo o que estavam vivenciando.
— Então, o que vocês vão fazer agora? — Yuki perguntou, com um olhar que, mais do que curioso, era sincero, como se ela estivesse disposta a ouvir sem julgamentos. — Vocês ainda têm algo para construir juntos ou… já é tarde demais?
A pergunta ficou no ar, como uma espada suspensa, e os dois ficaram em silêncio por um momento. Haruto olhou para Sayuri com uma expressão vaga, como se não soubesse o que responder. Era uma questão difícil, porque a resposta não estava apenas no passado, mas no que eles sentiam naquele instante, no que estavam dispostos a fazer.
Sayuri foi a primeira a quebrar o silêncio.
— Eu não sei, Yuki. Eu não sei se podemos voltar ao que éramos antes. Mas, talvez, seja hora de olhar para frente, em vez de ficar olhando para trás. Talvez ainda haja algo aqui, mas eu não sei o que é. Eu… estou tentando entender.
Haruto assentiu lentamente, como se o entendimento estivesse começando a se formar em sua mente, mas ainda não estivesse completamente claro.
— Eu… eu também não sei. — ele disse, finalmente. — Mas talvez a gente precise dar o primeiro passo, sem saber para onde estamos indo. Talvez o que importa seja simplesmente caminhar, mesmo sem ter todas as respostas.
O ar parecia mais leve agora, como se, de algum modo, uma parte da barreira invisível que os separava tivesse sido removida. Não havia mais o peso das expectativas, nem as perguntas não respondidas. Havia, finalmente, um espaço para o silêncio confortável, para o entendimento implícito de que, por mais que ainda não soubessem o que o futuro traria, estavam dispostos a continuar.
Mas Yuki não pôde deixar de sentir que o peso da sua própria busca também estava ali. Ela sabia que não podia mais ignorar o que estava acontecendo dentro de si mesma. O pensamento de "não era aqui que eu deveria estar" ainda pairava em sua mente, mas agora, talvez, ela começasse a entender que não se tratava do lugar físico. Talvez fosse mais sobre onde ela estava emocionalmente, sobre como ela se sentia consigo mesma. E isso, de alguma maneira, a libertava.
— E eu? — Yuki falou, mais para si mesma do que para os outros, mas seus olhos encontraram os de Haruto e Sayuri. — E eu, onde é que eu me encaixo em tudo isso? Onde é que eu me encaixo… na minha própria vida?
A pergunta era silenciosa, mas carregada de um significado profundo. Ela não esperava uma resposta imediata, mas o som da sua própria voz parecia lançar um desafio para o futuro.
Os três ficaram ali, sentindo o peso daquilo tudo, sabendo que as respostas não viriam facilmente. Mas, ao mesmo tempo, havia algo libertador na busca por essas respostas. Algo que os unia, ainda que de maneiras diferentes, na jornada que todos estavam prestes a trilhar.
E, naquela noite, no apartamento simples de Haruto, o futuro parecia um horizonte aberto, cheio de possibilidades, mas sem pressa de ser desvendado.
O relógio marcava lentamente as horas, e a quietude da madrugada parecia descer como uma neblina silenciosa, cobrindo tudo em sua suavidade. Yuki sentia que aquele momento era um ponto de inflexão, como se as palavras ditas e as não ditas tivessem traçado uma linha invisível no ar, que os unia e, ao mesmo tempo, os separava.
Haruto se recostou no sofá, seus dedos tamborilando na madeira da mesa de centro, mas ele não parecia ansioso. Havia algo de calmo em sua postura agora, como se ele tivesse finalmente começado a aceitar o turbilhão de emoções que ainda se agitava dentro dele. Olhou para Yuki, e seus olhos, antes distantes, pareciam buscar algo mais.
— Você… — começou Haruto, com a voz baixa, quase hesitante. — Como você tem se sentido? Sei que nossa conversa se concentrou muito em mim e em Sayuri, mas… e você, Yuki? Você tem algum lugar onde se sente em paz? Onde se sente em casa?
Yuki piscou, surpresa pela pergunta. Ela não estava esperando ser o centro da conversa, mas de alguma forma, Haruto havia capturado algo em sua expressão. Ele não sabia, mas havia tocado em algo profundo que ela vinha evitando há um tempo.
Ela deu um suspiro e olhou pela janela, onde as luzes da cidade ainda brilhavam ao longe, como pequenas estrelas piscando na escuridão. O vento fresco movia-se lentamente, e Yuki sentiu um leve alívio ao sentir a brisa em seu rosto.
— Não sei. — Ela falou, com uma sinceridade crua. — Eu… tenho me perguntado muito sobre isso. Sobre o que significa ter um lugar onde realmente pertenço. Eu pensei que poderia encontrar isso aqui, mas… talvez eu tenha confundido as coisas.
Sayuri, que até então estava em silêncio, se aproximou, quase como se tivesse sentido a angústia não dita nas palavras de Yuki. Seus olhos se suavizaram, e ela falou com um tom de compreensão.
— Às vezes, o lugar onde nos sentimos em casa não é um espaço físico. — disse Sayuri, sua voz suave, mas carregada de uma sabedoria silenciosa. — Talvez seja mais sobre encontrar a paz dentro de nós mesmos. Eu sempre pensei que poderia encontrar meu lugar com os outros, mas só quando comecei a me entender melhor que comecei a ver onde eu realmente pertenço. E isso, para mim, não é um lugar concreto. Está em mim, em como eu me vejo, em como eu me trato.
Yuki olhou para Sayuri, surpresa com a profundidade de suas palavras. Não esperava encontrar esse tipo de reflexão vinda dela, mas algo na maneira como Sayuri falou a fez pensar. Talvez, apenas talvez, ela estivesse tão focada em encontrar respostas no mundo externo que havia ignorado as respostas que estavam em seu interior.
Haruto, que observava a interação entre as duas, parecia se perder em seus próprios pensamentos, sua expressão uma mistura de dúvida e introspecção. Ele olhou para Yuki mais uma vez, e dessa vez, sua voz saiu firme, como se estivesse se resolvendo em algum nível.
— Eu entendo o que você está dizendo, Sayuri. Mas, Yuki… não sei se consigo aceitar essa ideia de que tudo está dentro de mim. Eu passei tanto tempo fugindo de quem eu sou, que não sei mais como lidar com esse “eu” interior. Às vezes, sinto que sou apenas uma sombra do que eu poderia ser.
Yuki, tocada pela vulnerabilidade nas palavras de Haruto, deu um pequeno sorriso, um sorriso triste, mas genuíno.
— Eu entendo você, Haruto. Eu também me senti assim. Ainda me sinto assim, de certa forma. Mas, talvez, seja essa a primeira vez em muito tempo que eu realmente olhei para mim mesma e vi o quanto eu também me afastei de quem sou. Não porque não queria ser essa pessoa, mas porque estava tão preocupada em ser algo ou alguém que eu não era.
A sala parecia mais densa agora, como se as palavras delas tivessem aberto um campo de energia no ar, algo que ninguém sabia como lidar. Os três estavam ali, juntos, mas ainda havia uma linha invisível que os separava — uma linha de experiências passadas, medos não enfrentados, e sonhos ainda não realizados.
Sayuri, que havia ficado em silêncio por um tempo, agora se levantou e caminhou até a janela. Ela olhou para a cidade do alto, suas mãos repousando sobre a vidraça, como se quisesse absorver a visão à sua frente. A noite estava quieta, mas algo em seu semblante indicava que ela estava mais distante do que nunca.
— Eu… não sei se estou pronta para mudar agora. — ela disse, a voz quase sussurrada, como se estivesse falando consigo mesma. — Mas talvez o que precisamos seja deixar de lutar contra tudo. Não sei. Eu só sei que preciso de tempo. Tempo para entender quem eu sou sem me perder no que os outros esperam de mim.
Yuki observou Sayuri de longe, e por um momento, ela sentiu uma sensação de cumplicidade. Era como se a dor delas, por mais distinta, fosse a mesma. A busca, o desejo de pertencimento, de entendimento. Uma busca que não poderia ser apressada. Era algo que levava tempo, algo que cada um tinha que descobrir por si mesmo.
Haruto se levantou, olhando para as duas mulheres que, de alguma forma, haviam se tornado o reflexo de seus próprios sentimentos. Ele sentia que estava, finalmente, começando a entender algo sobre si mesmo — e sobre o quanto ainda precisava se redescobrir.
— Então, o que fazemos agora? — ele perguntou, mais para si mesmo do que para as outras pessoas, mas todos sabiam que a pergunta era válida.
Yuki olhou para ele e, com um suspiro, disse:
— Talvez a única coisa que podemos fazer agora seja dar um passo para frente. Mesmo sem saber onde estamos indo. Mesmo sem saber se encontraremos o que estamos procurando. A única coisa que podemos fazer é seguir.
Os três se olharam, e, sem dizer mais nada, a certeza de que estavam prontos para começar a caminhar, juntos ou separados, começou a se formar no ar. Não era o fim, nem o começo de uma resposta clara. Era apenas um passo — um passo de aceitação.
E naquele momento, Yuki sentiu que, talvez, ela finalmente começasse a entender o que significava "estar em casa". Não era um lugar, mas uma jornada. E ela estava disposta a seguir.
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