Capítulo 1 – O Diagnóstico
O cheiro estéril de desinfetante e papel recém-impresso impregnava o consultório, misturando-se ao sutil aroma de café frio na xícara intocada sobre a mesa de vidro. O tique-taque do relógio na parede soava como uma sentença, cada segundo caindo pesado no peito de Elora Vancourt, que esperava ansiosa pelo veredicto de seu próprio corpo.
O ambiente era organizado e impessoal—prateleiras repletas de pastas, um computador ligado com a tela piscando prontuários, e diplomas emoldurados na parede como provas do conhecimento médico do homem sentado à sua frente. O Dr. Morgan, um senhor de cabelos grisalhos e expressão grave, folheava o laudo com movimentos calculados, como se procurasse a forma menos brutal de proferir as palavras que estavam prestes a sair de sua boca.
Elora sentia o estômago se contrair em um nó sufocante. Suas mãos estavam frias, mesmo sob o tecido quente do suéter de caxemira que usava.
— Senhorita Vancourt... — a voz do médico finalmente rompeu o silêncio pesado, arrastando-se com um tom de lamento.
Ela engoliu em seco.
— O que foi?
O Dr. Morgan ajeitou os óculos no nariz e inspirou fundo.
— Nós analisamos seus exames detalhadamente. Infelizmente, os resultados confirmam que você tem leucemia mieloide aguda em estágio avançado.
A palavra "leucemia" reverberou em sua mente como um trovão em meio a uma tempestade silenciosa.
— Leucemia? — Ela repetiu, como se ao dizer em voz alta pudesse mudar o significado.
— Sim — ele assentiu, com um olhar profissional, mas compassivo. — É um tipo agressivo de câncer no sangue e, no seu caso, os testes mostram que já atingiu um nível crítico.
Elora sentiu a respiração travar por um instante. Seu coração, antes ansioso pela incerteza, agora martelava contra as costelas com a brutalidade de uma verdade inescapável.
— E isso significa que... — Sua voz falhou antes de completar a frase.
O médico baixou os olhos para os papéis antes de continuar, como se estivesse relendo algo que já conhecia de cor.
— Quero ser completamente honesto com você, Elora. Se não houver uma resposta positiva a algum tratamento experimental... você tem, no máximo, seis meses de vida.
Seis meses.
O consultório pareceu encolher ao redor dela. As paredes brancas se tornaram opressoras, os diplomas do médico pareciam zombar de sua fragilidade, e o tique-taque do relógio ecoava dentro de sua cabeça como uma contagem regressiva implacável.
Ela piscou, tentando processar a informação.
— Seis meses? — Sua voz saiu fraca, como se as palavras fossem pesadas demais para serem ditas.
O Dr. Morgan assentiu, o olhar carregado de empatia.
— Vamos tentar garantir sua qualidade de vida nesse período, e há algumas opções experimentais que poderiam ser consideradas, mas...
— Mas não há garantia de que funcionem. — Ela completou por ele, com um meio sorriso amargo.
O médico hesitou antes de concordar.
— Exato.
Elora desviou o olhar para a janela ao lado, onde a luz do sol filtrava-se através das persianas, criando sombras no chão de mármore. Do lado de fora, a vida continuava normalmente—pessoas andando apressadas na calçada, um ciclista desviando de um carro parado, uma mulher rindo ao celular. Tudo seguia seu fluxo natural, imperturbável pelo fato de que, para ela, o tempo agora tinha uma data de validade.
Seu corpo tremia levemente, mas não de medo. Era outra coisa... um choque que se misturava a uma epifania.
Por vinte e sete anos, Elora vivera na segurança do anonimato, sempre escolhendo o caminho mais seguro, evitando riscos, mantendo-se à sombra. No trabalho, era apenas mais uma funcionária discreta. Nos eventos sociais, se mantinha no canto, sem chamar atenção. Nos relacionamentos... bem, nunca houvera um real. Apenas paixões silenciosas, especialmente por um certo CEO que sequer sabia que ela existia.
E agora, ironicamente, quando a vida estava prestes a ser arrancada dela, percebeu que nunca a havia vivido de verdade.
Uma risada baixa e sem humor escapou de seus lábios, chamando a atenção do médico.
— Senhorita Vancourt, eu sei que é um choque, e entendo se precisar de um tempo para processar. Podemos encaminhá-la a um especialista para apoio emocional…
Elora se levantou devagar, sentindo os joelhos um pouco fracos, mas sua mente estava incrivelmente clara.
— Obrigada, doutor — disse, sua voz carregada de uma determinação inesperada.
O Dr. Morgan piscou, surpreso com sua reação.
— Tem certeza de que não quer conversar mais sobre isso?
Ela sorriu, mas não era um sorriso triste. Era um sorriso de decisão.
— Eu finalmente percebi algo hoje.
Ele inclinou a cabeça, esperando que ela continuasse.
— Até agora, eu apenas existi. Mas tenho seis meses para realmente viver.
E com isso, Elora Vancourt saiu do consultório. Não como uma mulher condenada, mas como alguém que acabara de despertar para a vida.
Capítulo 2 – Adeus à Invisibilidade
Elora saiu do consultório como se estivesse pisando em um mundo novo. O sol de fim de tarde lançava um brilho dourado sobre a cidade, tingindo os prédios altos com reflexos quentes. O som dos carros, das pessoas conversando, das buzinas impacientes… tudo parecia mais intenso, mais vivo. Pela primeira vez, ela sentia que realmente enxergava o mundo ao seu redor, como se tivesse estado dormente por anos.
Seis meses.
Era um prazo cruel, mas também uma libertação. Ela passou a vida sendo discreta, apagada, sem nunca ousar brilhar. Trabalhara por anos na Wolfram Enterprises, a maior empresa de tecnologia do país, sem que ninguém realmente notasse sua presença. Seus colegas a tratavam com cortesia, mas nenhum deles a via de verdade. E Darian Wolfram…
O homem que ela amava em segredo.
O CEO poderoso, sempre impecável em seus ternos caros, com a presença marcante que fazia todos os olhares se voltarem para ele. Um homem que nunca olhou para Elora duas vezes.
Mas isso ia mudar.
Ela caminhou pelas ruas como se cada passo fosse uma promessa. Pegou um táxi e deu o endereço de um dos melhores salões da cidade.
— Quero um corte, uma coloração nova e um tratamento de pele — disse à recepcionista, sem hesitar.
A mulher a olhou de cima a baixo, analisando seu cabelo castanho sem graça, preso em um coque baixo, e sua pele pálida sem maquiagem.
— Alguma preferência?
Elora sorriu.
— Surpreendam-me.
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Horas depois, quando se olhou no espelho, mal se reconheceu.
Os cabelos, antes longos e sem vida, agora tinham um corte moderno, levemente repicado nas pontas, e uma nova cor: um tom de chocolate profundo com reflexos dourados que iluminavam sua pele. Seu rosto estava realçado por uma maquiagem elegante, e sua pele, antes opaca, parecia radiante.
Ela estava deslumbrante.
E era apenas o começo.
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Na manhã seguinte, entrou na Wolfram Enterprises de cabeça erguida. Estava acostumada a passar despercebida, a caminhar pelos corredores sem que ninguém notasse sua presença. Mas naquele dia, cada olhar se voltava para ela.
Elora vestia um conjunto sofisticado: uma saia lápis preta que moldava suas curvas, uma blusa de seda vinho e um salto alto que a fazia caminhar com uma confiança inédita. Seu cabelo brilhava sob a luz do hall de entrada, e seu perfume — um aroma doce e marcante — deixava um rastro pelo caminho.
Quando entrou no elevador, alguns colegas a fitaram com surpresa. Ela percebeu o olhar de espanto de Claire, do departamento financeiro, e até mesmo Ethan, o sempre distraído designer, arregalou os olhos.
— Uau, Elora… você… mudou? — Claire comentou, franzindo o cenho como se tentasse entender a transformação repentina.
Elora sorriu.
— Digamos que resolvi viver um pouco.
Quando as portas do elevador se abriram no andar da diretoria, ela respirou fundo. Darian Wolfram estava ali, conversando com sua assistente. Ele tinha aquele ar inabalável de sempre, a postura imponente, o olhar sério enquanto analisava documentos.
Mas então, ele ergueu os olhos.
E pela primeira vez… ele a viu.
Capítulo 3 – Primeira Impressão
Os corredores da Wolfram Enterprises nunca estiveram tão agitados. Cochichos discretos se espalhavam entre os funcionários enquanto Elora Vancourt atravessava o andar da diretoria com passos seguros e postura impecável.
Ela sentia os olhares em sua direção—alguns admirados, outros surpresos e, claro, havia aqueles que avaliavam sua mudança com uma ponta de ceticismo.
O salto alto fazia um som ritmado contra o piso brilhante, ecoando como um lembrete de que, desta vez, ela não era apenas uma sombra naquele ambiente corporativo.
Ela era impossível de ignorar.
E então, aconteceu.
Darian Wolfram ergueu os olhos dos papéis que analisava e encontrou os dela.
Por um segundo, o mundo pareceu suspender sua rotação.
Os olhos cinza dele a percorreram como se tentassem decifrar algo que não fazia sentido. A testa se franziu levemente, e um vestígio de confusão passou por seu rosto.
Ele a estava vendo.
Depois de anos sendo invisível para ele, finalmente seus olhares se cruzaram de verdade.
Noelle, sua assistente pessoal, pigarreou ao lado dele, chamando sua atenção de volta para os documentos. Mas já era tarde.
O olhar dele ficou preso em sua memória.
E o dela, nele.
Elora manteve a expressão serena, ignorando a aceleração de seu coração e o calor que subiu por sua pele. Continuou andando, como se não tivesse percebido nada de diferente.
Mas havia percebido.
E pelo brilho intenso nos olhos de Darian, ele também.
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Naquela manhã, sua transformação já era o assunto principal nos corredores.
No setor de marketing, algumas mulheres trocavam comentários entre sorrisos.
— Você viu Elora? Ela está… incrível! — uma delas disse, arregalando os olhos.
— Nunca imaginei que por trás daquele visual sem graça houvesse alguém tão… deslumbrante.
No elevador, dois executivos conversavam baixinho.
— Aposto que ela é uma nova contratada. Nunca vi essa mulher antes.
— Claro que já viu. Ela sempre esteve aqui.
— Está brincando?
Os rumores só cresciam. Mas Elora não se deixava afetar. Apenas sorria, como se não estivesse ouvindo nada.
No entanto, nada a preparou para o momento em que Darian Wolfram reapareceu.
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A cafeteria da empresa estava movimentada quando Elora pegou seu cappuccino e se virou para sair.
E então, sentiu a presença dele antes mesmo de vê-lo.
Alta. Imponente. Intensa.
— Você é nova aqui?
A voz grave e rouca ressoou, enviando um arrepio por sua pele.
Elora ergueu os olhos, encontrando Darian parado ao seu lado.
Os traços perfeitos do rosto dele eram ainda mais impressionantes de perto. O maxilar firme, a pele bronzeada, os olhos cinza que pareciam atravessar qualquer barreira.
Mas o que mais chamou sua atenção foi a forma como ele a analisava, como se tentasse encaixá-la em algum lugar de sua memória, mas não conseguisse.
Ele não a reconheceu.
Elora sentiu uma onda inesperada de diversão.
— Não exatamente — respondeu, levando o cappuccino aos lábios, sem se abalar com a presença dominante dele.
Darian estreitou os olhos, intrigado.
— Como é seu nome?
Elora inclinou a cabeça ligeiramente, permitindo que uma mecha de seu cabelo recém-colorido deslizasse pelo ombro.
Ela poderia responder. Poderia revelar sua identidade ali mesmo.
Mas onde estaria a diversão nisso?
Seu sorriso foi sutil, quase desafiador.
— Descubra.
E então, sem dizer mais nada, virou-se e saiu da cafeteria.
Deixando para trás um Darian Wolfram que, pela primeira vez, não parecia ter o controle da situação.
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