Eu sempre fui uma garota pragmática. Desde pequena, aprendi a olhar para as coisas de uma forma lógica e racional. Sempre quis estar no controle, ter certeza do que estava acontecendo ao meu redor, o que era certo e errado. Fui criada assim. Meus pais sempre disseram que, para ser bem-sucedida na vida, eu tinha que ser uma mulher forte, independente, que tomava decisões sem hesitar. Eu segui esse caminho com firmeza, ou pelo menos tentei.
Meu nome é Hadassa Villar, mas meus amigos sempre me chamaram de Hady. Não sei por que, mas eu nunca gostei de ser chamada pelo nome completo. Tinha algo nele que soava sério demais, e eu queria ser mais leve, talvez até um pouco irreverente, para escapar das expectativas que minha família sempre colocou sobre mim.
Aos 26 anos, eu estava noiva de Daniel Damaceno, o que eu achava ser o homem com quem eu passaria o resto da vida.
Ele era a definição do cara perfeito: bonito, inteligente, sempre atencioso e prestativo. Todos os meus amigos e familiares o adoravam. Ele tinha os cabelos castanhos e curtos, o olhar sempre confiante e um sorriso fácil que fazia qualquer um se sentir à vontade. Era o tipo de homem que fazia sentido ao meu lado, ou ao menos eu pensava que sim.
Nossa relação parecia sólida. Estávamos juntos desde o segundo ano da faculdade, e, aos poucos, fomos nos conhecendo cada vez mais, até que o casamento parecia o passo natural. Eu já tinha a data marcada, e Daniel estava empolgado com a ideia de finalmente formalizarmos nossa relação, mas algo dentro de mim estava começando a questionar tudo.
A primeira vez que sonhei com ele foi em um sonho confuso. Eu estava em um lugar escuro, uma espécie de campo aberto à noite. Havia uma música suave ao fundo, algo que eu não conseguia identificar. Tudo era nebuloso, mas eu sentia uma presença perto de mim. Quando eu olhei para o lado, vi um homem, mas o seu rosto estava sempre oculto pela sombra. Eu conseguia ver apenas a sua silhueta alta e forte, e o brilho de uma tatuagem no seu antebraço, que parecia ter um símbolo musical. A imagem era tão vívida que, ao acordar, eu ainda podia sentir o calor da sua presença. Mas, ao tentar me lembrar dos detalhes, o rosto dele se dissipava como fumaça.
Na noite seguinte, ele estava lá novamente. E, dessa vez, a sensação de déjà vu era ainda mais intensa. Eu estava começando a ficar inquieta. Era como se ele fosse uma parte de mim, algo que eu já conhecia, mas ao mesmo tempo, totalmente desconhecido. Eu sabia, com uma certeza inexplicável, que ele era importante. Eu tinha que encontrá-lo.
Nos dias seguintes, o sonho aconteceu novamente. E, sempre que eu acordava, sentia uma estranha tristeza, como se tivesse perdido algo essencial. Mas, ao mesmo tempo, havia uma sensação de ser guiada, como se algo maior estivesse me preparando para aquele encontro. Eu não contava isso para ninguém, nem para Daniel, porque, no fundo, eu sabia que ele não entenderia. Eu nem entendia completamente.
O pior de tudo era que, com o passar das semanas, eu comecei a sentir uma desconexão com Daniel. A relação, que antes parecia estar indo tão bem, agora me parecia vazia. Eu sentia como se estivesse mentindo para mim mesma, como se o homem dos meus sonhos fosse a pessoa que realmente me completava, mas que, de alguma forma, eu ainda não podia ver de forma clara. Eu estava em um turbilhão de sentimentos, e a ideia de casar com Daniel parecia cada vez mais distante.
— Hady, você está bem? — Daniel perguntou certa noite enquanto jantávamos juntos. Ele tinha o olhar preocupado, os olhos castanhos fixos em mim.
— Claro, estou bem — respondi, forçando um sorriso. Mas, no fundo, eu sabia que estava mentindo.
Ele ficou me observando por um momento, como se tentasse ler minhas emoções, mas logo sorriu e voltou sua atenção para o prato. Aquela atitude dele, sempre tão tranquilo e compreensivo, deveria me deixar aliviada, mas, em vez disso, só aumentava minha sensação de que estava sendo desonesta. Como se estivesse aprisionada em um sonho, mas não fosse capaz de acordar.
Nas semanas seguintes, os sonhos continuaram. Ele sempre estava lá, com a tatuagem visível, mas nunca o suficiente para eu conseguir ver seu rosto. Havia uma sensação de que o destino estava me dizendo algo que eu não estava conseguindo entender.
Uma tarde, estava sentada no sofá, olhando pela janela da minha sala, quando a ideia me veio à cabeça com uma clareza assustadora. E se eu estivesse traindo Daniel com aquele homem dos sonhos? Não fisicamente, claro, mas emocionalmente, ao entregar meu coração a alguém que sequer existia em forma real. O pensamento me abalou profundamente.
Naquele momento, eu soube o que tinha que fazer. Eu não podia continuar com esse noivado, com essa vida que eu estava construindo, quando meu coração estava preso a um homem que eu mal conhecia, mas que, ao mesmo tempo, sentia como se já o tivesse conhecido por toda a minha vida.
Eu respirei fundo e decidi que precisaria tomar uma decisão.
— Daniel, nós precisamos conversar — falei com a voz mais calma que consegui, tentando esconder a ansiedade que me consumia. Ele olhou para mim, e por um momento, a expressão dele ficou confusa.
— O que aconteceu, Hady? — ele perguntou, parecendo genuinamente preocupado.
— Eu... eu não posso mais continuar com isso. Não posso mais seguir com o casamento — minhas palavras saíram de uma vez, como se algo tivesse me empurrado para falar aquilo. Ele ficou em silêncio por um longo tempo, seu olhar fixo em mim, como se estivesse tentando processar o que acabara de ouvir.
— Você está dizendo que quer terminar o noivado? — ele perguntou finalmente, a voz baixa.
Eu acenei com a cabeça, sentindo uma dor profunda. Não era o que eu queria, mas eu sabia que era o que precisava fazer. Eu não podia mais viver em um relacionamento sem ser totalmente honesta comigo mesma. E talvez, só talvez, eu precisasse encontrar o homem dos meus sonhos, para entender de verdade o que o destino estava tentando me mostrar.
— Eu... sinto muito, Daniel. Mas eu preciso fazer isso. Preciso encontrar o meu caminho — falei, minha voz quase sumindo, mas as palavras ainda saindo de mim com força.
— Eu... eu não entendo, Hady. Não sei o que aconteceu com você. Mas, se for isso que você quer, eu vou respeitar. — Sua voz estava tensa, e eu vi a dor nos seus olhos. Não queria machucar Daniel, mas eu sabia que isso era o certo.
Eu o vi sair, a expressão dele gravada na minha mente. Eu não sabia como, mas eu estava começando a entender o que os meus sonhos queriam me dizer. Eu precisava encontrar o homem que estava nos meus sonhos, aquele com a tatuagem musical no antebraço. Talvez, se eu o encontrasse, tudo fizesse sentido. Ou talvez eu estivesse completamente errada. Mas uma coisa era certa: eu não poderia mais viver na dúvida.
Em 2021,eu terminei com Daniel e comecei a buscar o homem dos meus sonhos. Eu sabia que ele existia, mesmo que fosse apenas na minha cabeça. E com essa certeza, eu me entreguei à busca, esperando que, de alguma forma, o destino me mostrasse o caminho.
E tudo o que eu sabia era que, em algum lugar, ele estava a esperar por mim.
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senti um misto de alívio e desespero. Parte de mim sabia que havia feito a coisa certa, mas outra parte questionava se eu estava enlouquecendo. Quem termina um relacionamento estável por conta de um homem que só aparece em sonhos? Quem abandona uma vida planejada por algo incerto, uma sensação, um vislumbre de alguém que pode nem existir?
Mas, por mais irracional que parecesse, algo dentro de mim gritava que eu estava no caminho certo.
No começo, tentei ignorar os sonhos, mas eles continuaram vindo. Sempre o mesmo homem sem rosto, sempre a tatuagem no antebraço. Parecia que ele estava esperando por mim, e isso só me fazia ter mais certeza de que eu precisava encontrá-lo.
O problema era: por onde eu começaria?
Certa tarde, estava em casa, sentada no sofá, encarando a tela do meu celular sem saber o que fazer. Minhas amigas já estavam questionando por que eu terminei com Daniel, e minha família estava ainda pior.
Foi quando minha melhor amiga, Bianca Ribeiro, me ligou. Nós somos amigas desde de crianças, nós conhecemos quando sua família morava do lado da minha casa.
— Hady, preciso que você saia dessa toca em que se enfiou! — ela disse com a voz animada vindo do celular.
— Eu não estou me escondendo — revirei os olhos, mesmo sabendo que, de certa forma, era verdade.
— Ah, claro que não. Só está evitando todo mundo, inclusive a mim! — Bianca fez uma pausa e depois continuou: — Olha, eu entendo que terminar um noivado deve ser difícil, mas você não pode se fechar assim. Vem sair comigo hoje.
— Não sei, Bia...
— Nada de desculpas! — ela interrompeu. — Vamos a um bar novo que abriu aqui perto. Quem sabe você não conhece alguém interessante?
Prendi a respiração. Conhecer alguém novo. Eu queria isso, mas e se esse alguém não fosse ele? E se eu recusasse e perdesse a chance de encontrá-lo?
— Tá bom — suspirei. — Mas só uma hora, ok?
— Sim, sim! Te vejo às oito!
À noite, me arrumei com pressa. Optei por um vestido preto simples, cabelos soltos e maquiagem leve. Olhei para o espelho e tentei sorrir, mas não parecia natural.
Bianca me pegou no apartamento e seguimos para o bar. O lugar era sofisticado, com uma iluminação baixa e um clima aconchegante. Música tocava suavemente ao fundo, e o ambiente estava cheio, mas não lotado.
Nos sentamos em uma mesa perto do balcão, e logo um garçom veio anotar nossos pedidos.
— Como você está de verdade? — Bianca perguntou, observando-me com atenção.
Suspirei.
— Confusa. Parece que tomei a decisão certa, mas ao mesmo tempo, não sei o que fazer agora.
— Você nunca me contou o real motivo do término. Quer falar sobre isso?
Eu hesitei. Contar sobre os sonhos parecia absurdo. Mas Bianca era minha melhor amiga. Se alguém poderia me entender, era ela.
— Eu... comecei a sonhar com um cara — soltei de uma vez.
Ela ergueu uma sobrancelha.
— Sonhar? Como assim?
— Um homem. Sempre o mesmo. Mas nunca vejo o rosto dele, só sei que ele tem uma tatuagem de símbolo musical no antebraço. E sempre que eu acordo, sinto que ele é real, que preciso encontrá-lo.
Bianca ficou em silêncio por um instante. Depois riu.
— Espera, você terminou com o Daniel por causa de um cara que você sonha?
— Eu sei que parece loucura, mas... — abaixei a cabeça. — Eu sinto que ele é minha alma gêmea.
Ela me observou com mais atenção, o sorriso sumindo.
— E se ele for só um reflexo do que você queria que Daniel fosse? Um desejo inconsciente?
— E se não for? — retruquei.
Ela suspirou, balançando a cabeça.
— Ok, então... você vai sair por aí procurando um cara com uma tatuagem de símbolo de nota musical?
— Basicamente.
— Uau. Você realmente enlouqueceu — Bianca riu, mas depois seu rosto ficou sério. — Mas se isso é importante pra você, eu te apoio.
Sorri, aliviada.
— Obrigada.
Ela ergueu a taça de vinho.
— A um amor que ainda não tem rosto, mas que já roubou seu coração!
Toquei minha taça na dela, rindo.
Eu passei o ano de 2021 inteiro procurando, mas, na verdade, não sabia exatamente o que estava procurando. Aquele vazio dentro de mim parecia maior a cada dia que passava. Eu procurava sinais em todos os lugares, me entregava a cada possibilidade, mas nada fazia sentido. Era como se o meu coração estivesse preso em um labirinto sem fim, e eu não conseguisse encontrar a saída.
Eu acordava, ia para o trabalho e, depois, voltava para casa. O tempo parecia se arrastar como uma eternidade. Eu me sentia presa em uma rotina sem emoção, sem sentido. E então, Bianca, minha melhor amiga, sugeriu algo que me parecia uma loucura, mas, ao mesmo tempo, uma forma de me distrair.
— Hady, você já pensou em ir a uma cartomante? — ela perguntou com um sorriso meio travesso no rosto.
Fiquei em silêncio por um momento, surpresa com a sugestão.
— Uma cartomante? Você está falando sério?
Bianca deu de ombros, como se fosse algo simples.
— Ué, por que não? Você está aqui, se sentindo perdida, e quem sabe isso não te dá uma luz? Você acredita em signos, em tarot, em energias, não é?
Eu suspirei, relutante. Sabia que ela só queria me ajudar, mas, ao mesmo tempo, a ideia de confiar nas cartas, de buscar respostas nas mãos de uma estranha... parecia meio exagerado. No entanto, eu estava tão desesperada por qualquer coisa que me fizesse sentir que não estava sozinha nesse processo, que concordei.
— Tá, vou, mas só para ver o que acontece. Não vou acreditar em tudo o que ela disser, ok?
Bianca sorriu de orelha a orelha.
— Combinado! Vai ser divertido, você vai ver!
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Quando chegamos ao local, uma casa discreta no centro da cidade, uma sensação estranha tomou conta de mim. O lugar parecia tão comum por fora, mas o interior tinha uma atmosfera densa e misteriosa. As cortinas estavam fechadas, o ambiente era iluminado apenas por velas, e o cheiro de incenso preenchia o ar.
A cartomante, uma mulher com cabelos grisalhos e um olhar profundo, nos convidou a entrar. Sua presença era serena, mas tinha algo no ar que fazia a minha pele arrepiar.
Bianca, sem cerimônias, se sentou à mesa e sorriu para a mulher.
— Olá, querida! Estamos aqui em busca de respostas.
A cartomante me olhou com um olhar penetrante, como se soubesse exatamente o que eu estava sentindo. Ela acenou para que eu me sentasse, e eu o fiz, hesitante.
— O que você procura, minha filha? — a mulher perguntou com a voz suave, quase como um sussurro.
— Eu... estou tentando encontrar alguém. Minha alma gêmea, eu acho... — comecei, minha voz vacilante.
A cartomante sorriu de forma enigmática e pediu para eu esticar as mãos.
— Vamos ver o que as cartas têm a dizer sobre o seu destino.
Ela começou a embaralhar as cartas com uma calma impressionante e depois as colocou sobre a mesa, viradas para baixo. Fez um gesto com as mãos e pediu para que eu as olhasse.
Enquanto ela revelava as cartas uma por uma, meu coração batia mais rápido. Algo nas imagens parecia ressoar com a minha alma. As cartas falavam de um amor que estava distante, de uma espera que eu não podia controlar, e, conforme a cartomante falava, senti como se o peso de uma verdade não dita caísse sobre mim.
— Sua alma gêmea está chegando, minha filha — disse ela com uma suavidade que me fez prender a respiração.
Eu olhei para ela, sem acreditar no que estava ouvindo.
— Ele está resolvendo pendências do passado para poder seguir em frente. Está muito próximo de você, mas não será fácil para ele. — A cartomante pausou, olhando-me com um semblante sério. — No começo, ele pode não querer te conhecer, ou achar que não quer um relacionamento sério, pois tem medo de ser machucado. Ele já foi ferido, e, embora te ame, tem receio de se entregar.
Eu sentia uma sensação de déjà vu, como se as palavras dela tivessem sido ditas pela minha alma antes.
— Ele tem medo de se machucar. E você precisa estar bem consigo mesma, para que possa amá-lo como ele merece. Não é só ele que precisa curar-se, você também.
Aquelas palavras me cortaram profundamente. Era como se tudo o que eu sentia tivesse sido cristalizado nas palavras da cartomante. Eu não estava pronta para ele. Não estava pronta para ninguém.
Ela continuou, enquanto as cartas ainda estavam espalhadas sobre a mesa.
— Tenha paciência. Ele virá até você. Não é você que irá até ele. O tempo irá te trazer para o que é seu.
— Mas quanto tempo? — perguntei, sentindo a agonia me consumir.
A cartomante me olhou com um sorriso calmo.
— O tempo não pode ser apressado, minha filha. É a espera que traz a resposta. Quando você aprender a esperar com paciência, o universo alinhará tudo.
Fiquei em silêncio, processando tudo o que ela disse. Eu queria acreditar. Mas o medo da espera, da incerteza, do desconhecido... aquilo me consumia. Como eu poderia esperar por algo que não sabia se existia?
Quando saímos da casa da cartomante, Bianca estava radiante.
— Eu sabia! Sabia que ela ia te ajudar! Agora você tem as respostas que precisava.
Eu, por outro lado, estava imersa em um turbilhão de emoções. As palavras da cartomante ficaram ecoando na minha cabeça: ele virá até você. Eu sentia uma pressão crescente em meu peito.
Os dias passaram lentamente. Eu tentava focar no trabalho, tentar seguir em frente com minha vida, mas tudo parecia tão vazio. A única coisa que preenchia meu pensamento eram os sonhos com aquele homem sem rosto. Mesmo quando estava acordada, eu sentia a dor de algo que faltava. Como se a peça que faltava ao meu quebra-cabeça nunca fosse ser completada.
Comecei a correr, como forma de tentar afastar os pensamentos. A corrida me ajudava a aliviar a ansiedade, mas a dor no meu peito nunca ia embora. À noite, muitas vezes me pegava chorando, sentindo uma saudade de algo que eu não sabia o que era. Era uma saudade sem nome, uma dor insuportável que me fazia sentir que algo estava muito errado, mas ao mesmo tempo, eu não sabia o que era.
Eu estava à deriva, perdida em um mar de incertezas, e nada parecia me tirar daquela sensação de vazio. Mas, no fundo, sabia que precisava aprender a esperar. Mesmo que isso me corroesse por dentro.
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