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Escolhido do Rei

Um homem chamado Arthur

Engraçado, quando sua vida está chegando ao fim, realmente passa um filme em sua cabeça. Sempre achei besteira quando falavam isso, mas agora que meu sangue flui como água, sinto-me um idiota por duvidar. Meu nome é Arthur. Vivi uma vida de arrependimentos, mas, como todos fazem diariamente, continuei seguindo em frente, tentando meu melhor para que a vida melhorasse. Você, assim como eu, pode achar que Arthur é um nome bom demais para um homem morrendo de um jeito patético. Era o nome de um rei, o nome de um homem destinado à grandeza. Olhe para mim agora, morrendo como um cão desgarrado.

Meu nome original eu não faço ideia e não me importo muito. Fui um órfão que nada sabe sobre quem me colocou no mundo e, sinceramente, não poderia me importar menos. A vida que tive me fez carregar ódio por muito tempo; hoje, é apenas indiferença. Cresci num orfanato: uma existência desgraçada em um lugar desgraçado para uma criança. Não quero insinuar que todas as instituições de acolhimento são péssimas; são indispensáveis para crianças como eu, mas o abrigo "Leão de Judá" era especial. Personificava tudo o que há de pior nesse tipo de ambiente.

Fui maltratado naquele lugar por adultos, por crianças, mas principalmente pela diretora. uma mulher bem desagradável, talvez das piores que já encontrei em toda minha vida, talvez. Você pode pensar que, ao sair de lá, tudo melhoraria. Eu também achei. Achei que encontraria uma família, que minha vida daria uma guinada e que nada poderia ser tão ruim quanto aquele lugar. Você se engana, eu me engano, todos nós estamos profundamente enganados. Primeiro, porque nunca fui adotado, não sei o real motivo disso acontecer, as vezes eu tenho uma pequena ideia, mas pensar muito nisso me deixa triste. Vez ou outra, alguém iniciava o processo, mas acabava escolhendo outra criança. Segundo, porque um desastre atingiu o orfanato antes de eu atingir a maioridade.

Monstros começaram a aparecer por todo lado. Sim, você não entendeu errado: monstros, como nas histórias de fantasia ou RPG. Assemelhavam-se, inicialmente, a animais comuns, mas claramente deslocados da fauna local. Imagine, no Brasil, onde estou nutrindo o solo com meu sangue neste momento , ursos, lobos ou leões surgindo do nada, modificando todo o balanço natural do ecossistema. Biólogos e o próprio IBAMA enlouqueceriam. Era impossível animais assim aparecerem sem uma boa razão, mas foi o que aconteceu. Não eram animais normais, no entanto: eram mais ferozes e vorazes, atacando e destruindo tudo em seu caminho.

Não demorou para que os países tentassem conter essa ameaça estranha em seus próprios territórios. No Brasil, isso não foi diferente. O governo enviou a Guarda Nacional para exterminá-los no Pantanal, onde surgiram primeiro, mesmo sob protestos de ONGs e do IBAMA. Quem os culparia? Todos achavam que eram criaturas fugidas de cativeiros ilegais. Essa história foi alimentada pelas notícias e comentários em fóruns, até que parte da força nacional foi massacrada. A mídia e a internet entraram em pânico quando a maioria dos soldados perdeu a vida. Não se engane, a ameaça foi contida, mas boa parte da força expedicionária não voltou para o abraço de suas famílias.

Você pode pensar: "Ah, Brasil, né? Nem para conter uns bichinhos...". Mas saiba que meu país não foi o único. Até China e os Estados Unidos sofreram baixas irreparáveis em suas forças, ninguém estava preparado para algo desse tipo. Estavam preparados para uma Guerra? Sim, principalmente os Estados unidos que estava incitando várias pelo mundo, mas eles esperavam lutar contra pessoas, no máximo contra drones, não contra monstros. Sobreviventes relatavam que as balas não penetravam direito na pele dos monstros e que, mesmo agonizando, eles não recuariam. Suas peles eram resistentes mesmo contra as armas mais modernas das potências militares. Algo que depois todos atordoados. Como diabos um Lobo poderia suportar o tiro de uma .50 que claramente pode derrubar um helicóptero? Claro que já exagero aqui, mas você entende onde eu quero chegar, certo? Meses depois, mais animais estranhos apareceram, desta vez em todo o território.

A força nacional ainda se recuperava das perdas e relutava em lutar, não queriam perder mais de seus membros e não era como se tivessem muitos para enviar de qualquer maneira. A presidente da época ordenou que o exército enfrentasse as criaturas imediatamente. O resultado foi pior: mais monstros surgiram, e o alto comando parecia mais preocupado com cargos e pensões do que com a população. Estados como Ceará e Mato Grosso contiveram os ataques; nos outros, a situação fugiu ao controle, ceifando incontáveis vidas.

Foi na segunda onda que o orfanato foi destruído, por volta de 2018. Sem teto e ainda adolescente, restou-me viver nas ruas. Sobrevivi de migalhas e humilhações, tratado como um doente contagioso. Boas almas me ajudaram a encontrar um abrigo, mas até por um pedaço de pão e um banho frio eu era humilhado. Havia um padre em São Paulo que tratava moradores de rua com dignidade, mas, por seguir os mandamentos de seu Deus, era visto como inimigo. Infelizmente, eu estava no Ceará, mergulhado em meu próprio inferno.

Só na vida adulta as coisas melhoraram. Consegui um emprego numa fábrica de calçados próxima, quase dois anos depois de morar de favor ou em um abrigo. Aquele era sim um trabalho exaustivo, muitas vezes mais do que trabalhar num supermercado, mas que me permitiu alugar um quarto. Finalmente eu tinha um lugar só "meu" e eu poderia ter um pouco mais de conforto. Consegui comprar uma cama, uma tv e mesmo um videogame. Olha só, minha vida estava melhorando aos poucos. Claro, minha vida resumia-se a ir de casa para o trabalho e do trabalho para casa: oito horas por dia, seis dias por semana. Eles me pagavam apenas um salário mínimo e mesmo podendo comprar algumas coisas eu não podia aproveitar, porque ou eu estava muito cansado ou estava trabalhando como uma mula. Eles me pagavam apenas o mínimo, queriam que eu trabalhasse o máximo e ainda queriam que eu o fizesse com um sorriso.

No início de 2024 quando o turno estava quase acabando, um alerta de evacuação ecoou na fábrica: monstros invadiram o galpão do lado e estavam fazendo um verdadeiro massacre. A polícia estava a caminho, mas demoraria a chegar. Até lá, estávamos à própria sorte. O caos se instalou. Todos correram para as saídas, amontoados num empurra-empurra desesperado. Fiquei paralisado: minhas pernas negavam-se a obedecer, e seguir a multidão significava morrer esmagado ou atrair as feras com o barulho.

O alvoroço que os trabalhadores faziam superava até o ruído das máquinas. Isso era incrível, se você não sabe o quão barulhentas eram as fábricas, eu digo que você é um sujeito de sorte. Trabalhar dois anos naquele inferno sonoro já havia corroído minha sanidade. Quando finalmente consegui me mover, agarrei uma barra de ferro usada para pendurar materiais. Pesada e talvez um pouco grande demais, mas serviria como bastão. Meu plano era fugir pelo lado oposto e rezar para nenhum monstro aparecer. Com a minha sorte, eu acredito que vou esbarrar com uma manada deles.

— Oxóssi, meu pai, me proteja — orei, beijando um símbolo do Orixá caçador.

Enquanto me arrastava entre as máquinas, via pessoas correndo. Um vulto enorme, um cachorro do tamanho de um cavalo, passou rugindo. Gritos ecoavam, mas a energia caiu antes que eu visse algo. As luzes de emergência acenderam-se, e outro vulto, ainda maior, pulou à minha frente.

Na penumbra, apenas seus olhos vermelhos brilhavam, semáforos sanguíneos num rosnado aterrador. Meu corpo tremia; o medo percorria minha espinha como uma lâmina.

— Por que me abandonaste, pai? — solucei.

Sopro de coragem

Era a primeira vez que eu estava vendo um animal tão grande, um monstro, cara a cara, já vira um por fotos na internet e em matéria durante o jornal que escutava quando estava começando a acordar. Essa era a minha rotina para aguentar aquele trabalho, mas ver monstros por imagens era muito diferente. Eles eram muito maiores do que aparentavam e tinham aquela aura de intimidação.

Meu corpo estava todo gelado, como se todo o meu sangue tivesse sumido de dentro de mim. Minhas pernas tremiam e se eu não me esforçasse eu iria cair de bunda. O bastão de metal que estava segurando agora parecia muito mais pesado que antes e eu mal conseguia manter ele erguido. A criatura me olhava de cima a baixo caminhando lentamente na minha direção, meu corpo afastava-se por instinto, se dependesse de mim eu ainda estaria estacionado no lugar. Pude ver o sangue espalhado em seu pelo branco e escorrendo de sua boca misturada com baba.

A criatura me analisava, parecia que não tinha visto ninguém reagir a seu ataque até agora, olhava para mim e para o bastão como se estivesse medindo o grau de perigo que eu poderia oferecer. Quando notou o meu profundo terror a criatura atacou, até tentei atacar, mas o medo não deixava meu corpo agir como eu queria. Tudo o que pude fazer foi colocar a barra de ferro no meio da boca daquela coisa, meu coração ficou aliviado quando a barra conteve a mordida, mas as garras perfuraram minhas costelas profundamente. Para o meu mais absoluto horror a barra de ferro foi mastigada facilmente, como se fosse feita de madeira podre no lugar de ferro. As poderosas garras continuavam dilacerando minhas costelas enquanto a criatura se projetava ainda mais sobre mim, forçando meus braços a cederem e deixar aquela bocarra a se aproximar da minha garganta.

Foi apenas quando eu já tinha aceitado a minha morte eminente que ouvi uma voz vinda sabe-se lá de Exu onde. O monstro acima de mim ganiu e afastou-se enquanto olhava para o meu lado. Ali estava uma pequena e fofa criatura segurando um martelo um pouco maior que seu pequeno corpo. Parecia um Guaxinim, seu belo acinzentado muito bem penteados e olhos brilhantes e enormes. Ele olhava para o monstro com raiva enquanto batia em meu ombro.

— Você lutou bem – o guaxinim disse.

Eu não sei sobre o que fiquei mais impressionado naquele dia. Um guaxinim guerreiro falante ou um guaxinim falando com uma voz tão fofinha; talvez uma mistura dos dois. O monstro não parecia querer avançar enquanto olhava com raiva para o pequeno ao meu lado. Levantei-me e então notei, por cima do ombro, quando um outro cão gigante apareceu no fim do correr fechando a rota de fuga.

— Tch, mais um – o guaxinim disse com raiva – você consegue lutar?

— Eu? – perguntei com deboche – olha pra mim, eu tô morrendo.

— E tremendo – o guaxinim falou – mas você QUER lutar?

Aquilo me pegou de jeito, eu estava tremendo antes mesmo de tudo aquilo começar, eu sempre fui um covarde e isso nunca mudou desde o tempo que eu era uma criança presa naquele orfanato. Mesmo após adulto eu nunca fui de confrontar ninguém, mesmo sabendo que eu estava certo, sempre recuei por medo. Agora estava ali, tremendo e pensando em como eu deveria fugir. Apertei os lábios com raiva de mim mesmo, precisava fazendo alguma cosia, precisava lutar. Se eu não lutasse agora, não seria como das outras vezes, eu iria simplesmente morrer.

— Quero! – respondi firme,

— Ótimo! – o guaxinim disse feliz – sob a autoridade do Rei Djin concedo a você o título “Guardião”

Senti meu corpo se enchendo de poder, era como se uma bateria fosse instalada em meu corpo e a eletricidade começasse a fluir por minhas veias. Não senti nenhuma dor, mas eu me sentia muito bem, de uma forma que eu nunca havia me sentido antes. Na frente dos meus olhos uma janela estranha apareceu, não parecia bem uma janela como as de um jogo, lembrava mais uma folha de pergaminho que desenrolou na minha frente. Havia informações nela, como as de um personagem em um jogo. Força, destreza, essas coisas.

— Uma ficha de RPG? – falei.

— O Rei concede um sistema pessoa para o Guardião entender a si – o guaxinim disse – isso pode aparecer diferente para cada Guardião. Pode ser algo que você goste ou algo mais fácil para você entender. Agora concentre-se, deixe as explicações para mais tarde.

Eu realmente gostava de RPG de mesa, talvez por isso esse “sistema pessoal” que ele estava falando apareceu daquele jeito para mim. Ainda era estranho ver meu “Atributos”, como se agora eu pertencesse a algum tipo de jogo, mas eu não tinha tempo para pensar nisso agora. Peguei as barras de ferro sob meus pés, o monstro havia partido ela com os dentes e agora parecia dois pequenos bastões. Para a minha surpresa eles eram leves, tão leves que parecia até mentira.

A luta contra aquelas criaturas foi difícil, mas de alguma forma eu consegui. O guaxinim lutou ao meu lado e talvez por causa disso eu consegui sobreviver no final. Esses novos poderes eram incríveis, eu nunca me senti tão forte em toda a minha vida, era quase como se eu tivesse renascido. Pouco tempo depois a polícia entrou na fábrica e com alguma dificuldade conseguiram conter as outras criaturas. Um batalham tático parece que foi mandado, porque deveria ter uns 50 agentes ali, mesmo assim eles demoraram quase uma hora para conter os outros quatro monstros.

Naquele dia a fábrica foi obrigada a terminar as operações mais cedo, não por vontade própria, mas porque a polícia mandou fechar o lugar por segurança. Por hora a empresa pode parecer boazinha e que se importa com seus empregados, mas não se deixe enganar. Se todos os funcionares fossem mortos, eles dariam alguns dias de “luto” apenas para manter as aparências e então contratariam todas as pessoas necessárias no outro dia.

Os policiais me interrogaram por algum tempo. Eles estavam querendo saber como diabos eu conseguia matar duas daquelas criaturas sozinho. Sim, sozinho, acredita? O guaxinim que estava comigo todo aquele tempo simplesmente desapareceu no meio do ar, assim como quando aparecera a primeira vez. Precisei mentir dizendo que eles já estavam feridos e já meio mortos, mesmo assim eu quase morri no processo. Os policiais desconfiaram bastante daquele depoimento, mas dado as feridas que estavam por todo o meu corpo, eles foram forçados a aceitar o que dizia.

Fui levado para a UPA para tratar meus ferimentos e passei algumas horas lá. Muitas pessoas foram feridas durante o ataque na fábrica, tanto que não fui para lá numa ambulância, mas num ônibus. Fui atendido quase no final da tarde, fui ajudado a estancar o sangramento, mas ser costurados foi bem depois. Devem ter sido umas 25 pessoas atendidas. Os coitados dos enfermeiros já estavam aflitos tom tantas pessoas de uma só vez. Quando finalmente pude ir para casa, no início da noite, eu tomei um longo banho. Foi apenas quando eu saí do banho que vi o Guaxinim novamente, ele estava sentado na minha cama de pernas cruzadas me esperando.

— Agora sim podemos começar as explicações – ele disse.

Explicações

Depois de quase me matar de susto, a pequena criatura começou a me explicar as dúvidas que eu tinha sobre tudo aquilo que estava acontecendo. Eu fui escolhido por ele para ser um Guardião, uma espécie de protetor da humanidade que deveria lidar com os monstros que estavam aparecendo. Como os reais ocupantes do mundo material, cabia a nós humanos proteger nosso próprio lar.

Ele era um Djin, uma criatura mística que vivia longe dos olhos da humanidade desde o início dos tempos. Sua existência aparecia vez ou outra em algumas culturas, como anjos ou fadas. Foi apenas quando o balanço do mundo começou a ser prejudicado com a aparição dos monstros que os Djin puderam mais uma vez se materializar em nossa realidade. Com o surgimento de tais criaturas, o Rei se viu obrigado a agir e, para evitar a destruição do mundo, mandou os Djins para conter seu avanço, porém sozinhos eles não tinham poder o bastante. Esse era o real motivo de humanos serem escolhidos como Guardiões, porque apenas através deles os poderes dos Djins podiam ser canalizados.

— Foi assim que o Rei ordenou que dentre vocês humanos alguns fossem escolhidos – o guaxinim disse.

— Mas como nunca vimos nenhum Djin antes? – perguntei.

— Com o avanço dos tempos vocês humanos começaram a ficar cada vez mais afastados da essência que mantinha nossos mundos ligados – ele explicou – o mundo dos Djins e dos humanos foi separado e apenas alguns Djins muito poderosos podiam passar para esse lado. Acho que vocês os chamam de deuses.

— Os deuses são Djins? – eu perguntei desacreditado – tipo, jesus cristo era um Djin? Ou Buda ou...

— Nem todo Djin se parece comigo – ele disse me interrompendo – essa forma é a única que posso ter por que meu poder não é tão grande. Djins que foram divindades um dia podiam se assemelhar a vocês humanos.

Era incrível pensar em algo assim, mas espero que esse tipo de informação não vaze, porque se for assim eu posso imaginar alguns religiosos fanáticos se rasgando de ódio e começando a perseguição contra os Djins.

— Então outras pessoas serão escolhidas? – perguntei.

— Já deve ter acontecido – ele respondeu – assim vamos esperar que as coisas comessem a se acalmar.

Não aconteceu. Detesto ser o arauto das más notícias, mas o trunfo dos Djins para resolver a situação pareceu só piorar a coisa toda. Quando os Guardiões começaram a aparecer por todo lado, a coisa saiu completamente do controle. Os ataques dos monstros começaram a ficar mais frequentes ao ponto de que o exército era completamente inútil para conter o avanço deles. As cidades menores foram perdidas e a população foi forçada ao êxodo para as capitais e cidades maiores, onde a segurança era um pouco melhor.

Os guardiões ainda não eram muitos e isso era o real problema. Guardiões eram escolhidos apenas pelos Djins e isso dificultou muito a aparição de mais deles, já que não parecia haver muitos Djins. Monstros até poderiam ser abatidos pelas forças comuns, mas era muito custoso e muitas vidas se pediam a cada assalto. Estava cada vez mais complicado manter aquilo. Por obvio, era nas Capitais onde os Guardiões costumavam se reunir, pois era o primeiro lugar onde as pequenas fadas procuravam seus escolhidos.

Como aumento constante dos monstros alguns lugares foram totalmente tomados e a pressão sobre os guardiões só aumentava à medida que os dias passavam. Enquanto o problema podia ser contido apenas por grupos privados e Polícia, não havia necessidade de contratar o caríssimo serviço dos Guardiões para a proteção. Apenas quando a situação saiu da linha da classe trabalhadora, e caiu no colo dos realmente ricos, o problema precisava de solução; a criação das Guildas foi essa solução. Plantações, fábricas, distribuidoras e grandes redes de supermercados eram aqueles que precisavam de proteção mais imediata.

No início, pequenos grupos de Guardiões foram formados, mas rapidamente isso começou a ser insuficiente para a proteção das empresas. Havia todo um problema de que os grupos não eram realmente organizados e muito independentes. Quando esse modelo começou a ficar insustentável, as Guildas foram criadas. Elas surgiram para proteger o bem-estar da população, é dito assim para parecer mais bonito e existem aqueles que acreditam nesta mentira descarada. Era o grande capital e a propriedade privada que eram realmente protegidos por essas organizações. Guildas inteiras foram criadas para proteger as terras cultiváveis do agronegócio, fábricas e empresas. Como um país de grande discrepância econômica, existem aqueles que ganham muito dinheiro. Essas pessoas podiam contratar o serviço de Guardiões, mas a maioria da população precisava da proteção da Guilda Nacional.

A ABG, Agência Brasileira de Guardiões, foi um órgão público que o governo brasileiro se obrigou a criar devido à alta demanda de proteção do povo e dos prédios públicos. Houve um grande descontentamento da mídia, que, no fim das contas, eram controladas pelo grande capital que lucrava muito com os contratos milionários que suas corporações tinham com o Governo.

A forma de entrar na agência era a mesma da polícia, qualquer um poderia entrar, mas para ser um agente de campo era necessário ser um Guardião. As pessoas comuns ficavam na parte burocrática ou como apoio de campo, mas nunca enfrentavam diretamente os monstros. Tentei passar algumas vezes no concurso público de Guardiões, já que as condições de trabalho eram melhores, mas eu não consegui por falta de poder e habilidade.

Acabei indo trabalhar para uma guilda privada, mas devido a um erro que cometi não lendo o Contrato, acabei me tornando um escravo dessa empresa. Devido ao contrato leonino, meu “salário” era muito baixo, mesmo que eu estivesse trabalhando feito um maníaco e mal conseguia manter com o mínimo necessário. Às vezes eu pensava se voltar a trabalhar em uma empresa comum não seria melhor para mim, mas o meu contrato com a Guilda me impedia.

Meu primeiro Djin, aquele Guaxinim a quem dei o nome de Jean, foi o que realmente me fez ficar apaixonado naquelas criaturas. Infelizmente, meu tempo junto a Jean não durou nada, durante uma missão, que acabou falhando completamente, meu companheiro foi morto. Fiquei completamente arrasado e me culpei o tempo inteiro por sua morte, mesmo que em seus momentos finais ele dissesse que aquilo não era minha culpa, eu jamais poderia me perdoar. Coloquei na minha cabeça que aquilo nunca aconteceria novamente e me joguei de cabeça em treinamentos constantes.

Acabei tomando outros Djins abandonados por seus mestres sob minhas asas, mas eu não permitia que nenhum deles me seguisse durante minhas missões. Não podia permitir que eles morressem por minha incompetência, isso não aconteceria novamente. Djins eram, sim, capazes de lutar, mas no fim eles não eram muito diferentes dos humanos comuns; sendo assim meu trauma não me permitia levá-los para o campo. Djins também podiam criar armas incríveis, muito mais poderosos que as armas criadas por humanos e esse era o real valor deles.

Quando os humanos começaram a estudar os corpos dos monstros, algumas armas foram criadas. Espadas, adagas, escudos eram muito mais eficientes que balas. Partes boas de monstros eram difíceis de conseguir, então criar armas que pudessem ser reutilizáveis era melhor. Ainda que os estudos tenham avançado muito, as armas criadas por mãos humanas eram mais fracas que aquelas criadas pelos Djins. Com o tempo, armas comuns foram deixando de ser usadas contra os monstros, elas eram ineficientes. Exceto as armas mais poderosas, tipo um míssil balístico, todas as outras eram quase como tentar quebrar uma parede de alvenaria com um cabo de vassoura.

Quando foi descoberto que Djins poderiam criar armas mais poderosas e eficientes, a demanda por essas criaturas foi ao espaço. Guildas ofereciam muito dinheiro por Djins que pudessem fabricar uma adaga que fosse. No Brasil, um Djin que pudesse criar espadas mais simples custava algo como 20 mil reais. Claro, não dava para comprar um Djin, mas um Guardião desesperado poderia "vender" seu contrato com o Djin para uma Guilda. Ela então forçaria o Djin a trabalhar até a exaustão para criar equipamentos. Claro, nem todas faziam isso, mas o que importa a vida de um Djin ou o lucro? Para as empresas, tudo o que importa é lucro, a morte é apenas uma fatalidade.

Eles podiam, sim, criar tais armas, mas sempre havia um limite para o quanto eles poderiam depositar de energia mágica em um item criado. Mesmo que eles se esforçassem muito, nunca conseguiam passar desse limite, e quando não eram mais úteis para seu propósito, eles eram jogados fora como lixo. Imagino se não foi isso que meus pais pensaram de mim quando me abandonaram no orfanato.

Hoje, eu devo ter mais de 30 dessas fofuras vivendo comigo. Mantê-los saudáveis é muito difícil com o dinheiro que eu ganho, mas eu sempre faço um esforço extra. Eles sempre dizem que querem trabalhar para ajudar na casa, mas eu recuso, afinal, não foi para isso que eu os resgatei. Precisei trabalhar dobrado para poder custear meu pequeno orfanato de Djins, e felizmente algumas pessoas me ajudavam ocasionalmente, mas no geral era eu sozinho para tocar o orfanato.

Não é como se eu fosse um guardião muito bom, então voltar para casa ferido era algo constante. Mesmo que eu conhecesse muito dos monstros, acompanhar seus movimentos era um problema. Como eu não tinha tanta habilidade, eu precisava pelo menos ter conhecimento, certo? Acalmar meus bebês era sempre problemático, eles eram muito fofos, sabe, preocupavam-se mais com a minha saúde do que eu mesmo. Por sorte, meu país tinha um sistema público de saúde, caso o contrário eu teria gastado todo o dinheiro que conseguia nas minhas missões no hospital.

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