A cafeteira estava cheia de vida, uma mistura de aromas e conversas, com o som suave da máquina de café preenchendo o ambiente. Leon estava em sua mesa, como sempre, absorto no seu laptop. Ele adorava aquele canto da cidade, uma pequena pausa antes de seu dia corrido, longe dos holofotes da sua empresa e do mundo artístico. O piano de cauda na sala ao lado estava em silêncio, esperando pela próxima vez que ele pudesse se entregar à sua música.
Ele estava focado, mas algo o tirou de seu estado concentrado. Um som. Uma risada suave, seguida pelo som de passos, uma presença que invadiu o espaço de maneira sutil, mas inegável. Leon levantou os olhos e, por um momento, o tempo pareceu desacelerar. O homem à sua frente, ainda de costas, estava no meio de uma conversa animada com o barista. Mas algo no modo como ele se movia capturou a atenção de Leon.
O homem tinha uma postura confiante, mas havia algo de vulnerável em sua presença. Ele se virou para pegar o café que o barista lhe entregava e, naquele momento, seus olhos se cruzaram. Leon não soubera exatamente o que esperar, mas a intensidade daquele olhar o pegou de surpresa. Era como se o mundo ao redor tivesse diminuído, a conexão silenciosa entre os dois transformando o café em um espaço só deles.
Ethan. Leon não sabia seu nome, mas o sentiu de alguma forma, como se aquele rosto fosse familiar, embora nunca o tivesse visto antes. Havia algo nele que o fazia querer saber mais. Talvez fosse o modo como os cabelos caíam suavemente sobre sua testa, ou a confiança que ele exalava sem esforço. Mas, naquele instante, Leon não conseguiu evitar a sensação de que aquele homem — esse homem — mudaria algo em sua vida.
Ethan, por sua vez, também percebeu o olhar de Leon, mas, ao contrário dele, não se intimidou. Havia algo naquele olhar que o desafiava, algo intrigante, mas que ele preferiu ignorar. Ele não estava ali para mais uma distração. Ethan era um homem de ação, de movimento. Seu trabalho como dançarino, professor de dança, exigia uma entrega total ao corpo e à emoção. Ele sentia, mais do que pensava, e sua vida sempre se guiara pelas batidas do seu próprio ritmo. O silêncio entre os dois era breve, mas, enquanto tomava seu café, Ethan sentiu uma curiosidade crescente sobre o homem à sua frente, o misterioso pianista de ar tão distante.
Leon, ainda com a sensação de que algo havia acontecido naquele breve olhar, voltou ao seu laptop. Mas algo estava diferente. Ele não conseguia focar. Uma parte de sua mente permanecia presa naquele encontro fugaz. Ele queria mais, algo que ele não podia explicar. Não gostava de se deixar levar por sentimentos assim, mas, naquele momento, algo o chamava. Algo que ele não poderia controlar.
Ethan não olhou para trás, mas a imagem de Leon continuava a dançar em sua mente, como uma melodia que se recusava a ser esquecida.
A máquina de café apitou, e o som do fluxo de pessoas encheu a sala novamente. Mas, para Leon e Ethan, o tempo parecia ter parado, mesmo que ambos continuassem a seguir seus caminhos sem saber, ainda que de alguma forma, que aquele fosse o primeiro acorde de algo novo.
!
Ethan começou a frequentar a empresa de arte de Leon, mas não por causa dele. A oportunidade que surgira era uma colaboração entre a escola de dança onde Ethan trabalhava e a empresa de Leon, uma parceria que poderia beneficiar ambos. Ethan estava mais interessado no potencial artístico do que no homem por trás da empresa, mas não pôde evitar que sua curiosidade sobre Leon crescesse à medida que os dias passavam.
Ele sabia que Leon era o CEO de uma das galerias de arte mais renomadas da cidade. Mas a figura que ele via por trás da mesa de escritório, sempre imerso em trabalho, era distante e enigmática. Leon nunca parecia estar realmente presente. Sempre ali, mas nunca completamente. Ethan, com sua energia vibrante e corpo sempre em movimento, parecia ser o oposto de tudo o que Leon representava.
O primeiro encontro deles, em um ambiente profissional, foi cordial, mas sem grande interação. Leon cumprimentou Ethan com um aperto de mão firme, mas o olhar entre eles, por um momento, foi o mesmo de antes: aquele silêncio que falava mais do que qualquer palavra. Ethan se sentiu desconfortável, como se fosse uma interrupção no ambiente controlado de Leon. Ele, no entanto, se concentrou no que tinha a fazer: a dança.
A proposta era simples. A empresa de Leon queria patrocinar um evento que integraria arte e dança, uma colaboração entre os mundos que, até então, pareciam totalmente distintos. O desafio era que ambos os lados tinham uma visão muito diferente sobre como a arte deveria ser apresentada. Enquanto Leon defendia uma estética mais clássica e refinada, Ethan via a dança como uma forma de se expressar livremente, sem restrições. Eles começaram a discutir sobre a direção do projeto, mas a conversa logo se transformou em um jogo de tensões sutis.
“Você realmente acha que a arte precisa ser limitada a essas convenções?” Ethan perguntou, a voz levemente desafiadora. “Eu acredito que a dança deve ser algo espontâneo, algo que viva, que respire. Não algo engessado por regras.”
Leon, por sua vez, se manteve firme. “Não se trata de convenções, Ethan. A arte tem um peso, uma história que precisa ser respeitada. Não podemos simplesmente jogar tudo para o alto por causa da ideia de liberdade.”
O conflito entre eles não era apenas artístico, mas algo mais profundo, mais pessoal. Ethan percebeu que Leon não era apenas um homem que levava a arte a sério; ele levava sua vida a sério de maneira controlada, quase imutável. E isso o incomodava. Ele, que vivia com intensidade e sem medo de se entregar ao que sentia, viu em Leon uma resistência que ele não conseguia compreender.
O projeto avançava, mas a interação entre eles permanecia cheia de pequenas tensões. Embora os dois se vissem várias vezes por semana, as conversas eram sempre pontuadas por um respeito frio, sem que houvesse mais do que um simples relacionamento profissional. Mas, ao mesmo tempo, cada vez que seus olhos se encontravam, uma nova camada de compreensão parecia se formar. Havia uma curiosidade crescente de ambos, algo que os atraía, mas ao mesmo tempo os afastava.
Durante uma dessas reuniões, enquanto discutiam mais sobre o evento, Leon olhou para Ethan com uma expressão que parecia ser mais um questionamento do que uma afirmação. “Você realmente acredita que eu sou capaz de mudar minha visão sobre a arte?” Ele não sabia por que perguntou, mas a curiosidade estava ali, marcando sua fala.
Ethan, sem hesitar, respondeu com um sorriso suave, um brilho nos olhos que falava de uma confiança inabalável. “Eu acho que todos podem mudar, Leon. A arte tem esse poder.”
A resposta ficou no ar por um tempo, como uma melodia não resolvida, uma promessa silenciosa de que, talvez, mais do que a arte, fosse possível mudar também a maneira como viam o mundo um do outro.
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A relação entre Leon e Ethan parecia estar em um constante jogo de provocações e mal-entendidos. Embora o projeto tivesse avançado, com ambos colaborando de maneira profissional, algo no ar sempre os fazia se afastar um pouco mais do que se aproximavam. Leon, com sua postura sempre reservada e perfeccionista, achava difícil entender o comportamento impulsivo de Ethan. Para ele, tudo parecia ser tão espontâneo, sem considerar as consequências. Isso o incomodava, e ele tentava, de alguma forma, manter a distância.
Ethan, por outro lado, achava Leon insuportavelmente frio. Para ele, o pianista parecia se esconder atrás de uma máscara de controle, uma fachada que o impedia de realmente viver sua arte. Ele não compreendia como alguém poderia viver tão obcecado por perfeição e regras, como se a vida fosse uma partitura que precisasse ser executada sem nenhum espaço para o improviso.
A tensão entre eles começou a se intensificar à medida que o evento de arte se aproximava. Eles precisavam decidir, de uma vez por todas, qual seria o tema da apresentação que uniria dança e música. Ethan sugeria algo mais moderno, mais arrojado, enquanto Leon defendia uma abordagem mais clássica, que respeitasse as tradições da arte. Os diálogos entre os dois tornaram-se cada vez mais carregados de um tipo de confronto silencioso, como se cada um estivesse tentando provar algo ao outro.
Durante uma reunião particularmente tensa, quando discutiam sobre o figurino para os dançarinos, a frustração de Ethan transbordou.
“Você sempre acha que tudo precisa ser tão… rígido?” Ethan disse, com a voz mais alta do que o habitual. “Não pode ser assim! A dança precisa ser livre, precisa se mover com o ritmo da vida! Não posso viver em um mundo onde tudo é quadrado como uma partitura!”
Leon o olhou com a mesma expressão distante de sempre, mas agora havia algo mais nos seus olhos. “E você acha que a liberdade vem de ignorar tudo o que já foi feito antes? Eu não estou tentando engessar nada, Ethan. Estou tentando mostrar que a arte, seja ela qual for, precisa de estrutura. Sem isso, ela perde seu significado. E você parece não entender isso.”
Aquelas palavras cortaram o ar entre eles como uma faca afiada. Ethan sentiu um calor subindo pela sua pele, uma mistura de frustração e algo mais, algo que ele não conseguia entender direito. Ele queria gritar, desafiar Leon, mas se viu paralisado pela frieza dele, que parecia não se importar em provocar um confronto direto.
“Eu entendo, Leon”, disse Ethan, sua voz agora mais calma, mas com um tom irônico. “Talvez você esteja certo. Talvez a arte precise de estrutura. Mas a vida, Leon, a vida não é uma partitura. Ela é imprevisível. E às vezes, você precisa se permitir ser imprevisível, se permitir sentir.”
O silêncio se arrastou pela sala depois daquela última frase. Leon sentiu o peso das palavras, mas ainda assim se manteve firme. Ele não sabia como responder, nem mesmo se queria. Mas, por dentro, ele sentia uma inquietação crescente, algo que não conseguia explicar. Ethan, com sua liberdade, sua visão impulsiva e desafiadora, estava mexendo com algo dentro dele, algo que ele sempre tinha tentado controlar.
Ethan, vendo que a discussão estava indo para um lugar sem retorno, se levantou da cadeira, respirando fundo. “Talvez seja melhor deixarmos o projeto para amanhã. Precisamos de um tempo para pensar.”
Sem esperar uma resposta de Leon, ele pegou sua bolsa e saiu da sala, deixando Leon sozinho, com o peso das palavras que trocara com ele. Leon não sabia o que estava acontecendo com ele, mas algo estava começando a se formar, uma dissonância que ele não conseguia ignorar.
Naquele momento, enquanto o som dos passos de Ethan ecoava nos corredores vazios, Leon fechou os olhos, pensando no quanto aquela irritação, aquele desconforto, o havia afetado. Ele não queria admitir, mas a verdade era que, em algum lugar dentro dele, uma parte dele desejava a provocação de Ethan. E isso, por si só, era algo que ele não sabia como lidar.
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