— Perdão! — suplicou Elliot desesperado, com a voz trêmula. Seus olhos estavam embaçados pelas lágrimas enquanto recuava instintivamente. — Por favor, pare...
Mas seu súplica caiu em ouvidos surdos.
O golpe atingiu em cheio seu abdômen, fazendo-o perder o equilíbrio. Seu corpo magro caiu no chão com um som surdo. Tentou inalar, mas a dor o paralisou. Sua visão começou a escurecer enquanto uma última palavra se infiltrava em sua consciência.
— Inútil! — gritou Julian com desprezo.
E depois, só houve escuridão.
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Horas depois, Elliot acordou com o corpo dolorido, como era habitual. Cada músculo doía, mas não tinha tempo para reclamar. Sabia que se não se levantasse a tempo, receberia mais castigos.
Desde que perdeu sua mãe, a única casa que seus pais lhe deixaram passou a estar sob o controle de sua tia Bell. Elliot, um ômega sem apoio nem recursos, foi relegado a viver no sótão e obrigado a trabalhar como servo. Não importava se cometesse erros ou não, sempre era golpeado.
Incorporou-se com dificuldade e se obrigou a mover-se. Sua pele estava coberta de hematomas, e cada passo lhe lembrava a brutalidade da noite anterior.
Quando descia as escadas para dirigir-se ao banheiro, a voz de seu primo o deteve em seco.
— Elliot! — chamou Julian com tom autoritário.
Elliot suspirou internamente e deixou de lado sua intenção de se assear. Sabia que opor-se não era uma opção.
— Sim, senhorzinho — respondeu com a cabeça baixa, apressando o passo para ele.
Julian o observou com a testa franzida, sua expressão de fastio evidente.
— Por que não preparou o café da manhã?
— Lo… lamento muito — balbuciou Elliot, sua voz apenas um sussurro.
Não esperou que lhe dessem outro golpe e correu para a cozinha. Sabia que sua tia Bell logo se juntaria a Julian, então preparou dois pratos de torradas o mais rápido possível.
E, efetivamente, Bell apareceu momentos depois.
— Ainda não está pronto o café da manhã? — perguntou com evidente desdém.
— Esse preguiçoso se levantou tarde — soltou Julian com um bufido. — Por culpa dele chegarei tarde à universidade!
Elliot, trêmulo, levou os pratos à mesa.
— As torradas já estão prontas… — sussurrou, esperando que isso acalmasse a situação.
Mas em vez de receber alguma classe de reconhecimento, Bell o empurrou com força.
Elliot caiu no chão sem poder se sustentar, sentindo como o impacto lhe sacudia os ossos.
— Não se aproxime! — gritou sua tia com repulsa. — Você fede e é repugnante!
Elliot abaixou a cabeça, contendo as lágrimas. Sabia que chorar só lhes daria mais razões para desprezá-lo. Mas a dor em seu peito era insuportável. Se sua mãe estivesse viva, ele também estaria na universidade, estudando, sendo um ômega normal… mas a vida lhe havia arrebatado tudo.
Mais tarde, enquanto limpava a casa, ocorreu um acidente.
Um leve estalo ressoou no quarto, e Elliot sentiu como o sangue abandonava seu rosto.
O anel favorito de Julian jazia no chão, partido em dois.
O pânico o envolveu.
— Se descobrirem, estou morto… — murmurou com um fio de voz, sentindo como suas mãos tremiam.
Não podia seguir ali. Não depois disso.
Com o coração descompassado e sem um plano claro, Elliot fez a única coisa que podia fazer: fugiu.
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O sol abrasava sua pele pálida enquanto corria sem rumo. Suas pernas débeis falharam antes que pudesse se afastar demais. Seu corpo, esgotado pela fome e pelas feridas, não resistiu mais.
Elliot caiu de repente sobre o pavimento, sua respiração entrecortada.
— Pare! Tem um garoto caído! — uma voz feminina ressoou na rua.
Era a senhora Rosa, quem regressava do mercado. Desceu apressada de seu carro e se aproximou de Elliot.
— Ajuda… por favor! — sussurrou ele debilmente.
A mulher franziu a testa com preocupação.
— Leve-o ao hospital, rápido! — ordenou ao chofer.
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Horas depois, Elliot abriu os olhos.
As luzes brancas do hospital o deslumbraram, e a sensação de uma via em seu braço lhe lembrou que ainda estava com vida.
A seu lado, a senhora Rosa o observava com paciência.
— Já está acordado?
Elliot assentiu debilmente. Sua garganta se sentia seca.
— Foi você quem me ajudou? — perguntou com a voz quebrada.
— Sim. O que te ocorreu?
Elliot baixou o olhar. Não podia contar a verdade… mas tampouco queria regressar.
As lágrimas escaparam de seus olhos enquanto suplicava:
— Não quero voltar… Não tenho nada, mas posso trabalhar. Por favor, ajude-me a me esconder.
A senhora Rosa o observou em silêncio. Logo, com um tom sereno, disse:
— Tranquilo. Sou a governanta da família Lancaster. Levarei você comigo.
Elliot piscou, surpreendido.
— A família Lancaster…?
Não sabia que essa decisão mudaria seu destino para sempre.
...
...Elliot...
...Ômega Puro e Dominante...
...19 anos...
Elliot não podia regressar. Insistiu que a Sra. Rosa o levasse com ela imediatamente, seu medo de ser encontrado por seu primo e tia era muito grande. Com um suspiro resignado, a mulher concordou, mas em sua mente já havia idealizado um plano. Se o levasse para a residência Lancaster, poderia conseguir um emprego e, com sorte, proteção.
Elliot não era alheio ao sobrenome Lancaster. Em várias ocasiões tinha visto notícias sobre eles na televisão. Eram uma família poderosa, com negócios que abrangiam múltiplas indústrias e uma presença inabalável na alta sociedade. No entanto, o que mais se mencionava nos círculos de fofocas era o jovem herdeiro, Cassian Lancaster, um alfa de caráter frio e uma ambição desmedida.
—Antes de chegar, explique-me o que aconteceu com você —pediu a Sra. Rosa.
Elliot engoliu em seco, baixou o olhar e começou a falar. Contou-lhe como sua vida se tornou um pesadelo após a morte de seus pais, os abusos que sofreu por parte de sua tia e seu primo, e as inúmeras vezes que tentou escapar sem sucesso.
—É muito estranho. Se já se apropriaram da casa de sua família, por que não simplesmente te expulsaram? —comentou Rosa com um tom de suspeita.
—Talvez porque queriam ter um servo sem pagar —respondeu Elliot com amargura.
—Os papéis da casa já estão no nome de sua tia? —perguntou Rosa com curiosidade.
Elliot negou com a cabeça. —Não sei. A única coisa que sei é que não ficarão de braços cruzados e me procurarão. De fato, esta não é a primeira vez que fujo. Antes conseguiram me encontrar e reforçaram a segurança da casa, mas depois de um tempo se confiaram e a descuidaram.
Rosa franziu a testa. Algo não se encaixava totalmente. Se realmente só queriam sua casa e um servo gratuito, não teriam razões para se apegar tanto a Elliot. Havia algo mais nessa história, algo que ainda não entendia.
—Você não pode voltar a se encontrar com eles. A única solução é mudar sua aparência —disse Rosa com firmeza.
Sabia que um Ômega tão belo como Elliot se destacaria em qualquer lugar, e esse colar que levava consigo a fazia pensar que sua linhagem podia ser mais importante do que ele mesmo acreditava.
—É a única relíquia que minha mãe me deixou —disse Elliot, notando o olhar de Rosa no colar que pendia de seu pescoço.
Pouco depois, chegaram à mansão dos Lancaster. A Sra. Rosa usou um caminho traseiro para evitar olhares curiosos e levou Elliot diretamente a um quarto na área de serviço.
Para escondê-lo melhor, aplicou um pó preto na pele e desordenou seu cabelo prateado até que sua aparência ficasse desfigurada. Agora, seu atrativo natural estava camuflado sob uma máscara de sujeira.
—Não te incomoda? —perguntou Rosa com certa preocupação.
Elliot se observou em um espelho e sorriu. —Não, gosto! É melhor assim.
—Escute bem —Rosa continuou enquanto terminava de arrumá-lo—. Nesta mansão vivem o senhor e a senhora Lancaster. Têm dois filhos, a senhorita Celine e o jovem Cassian.
Elliot prestou especial atenção ao último nome. Tinha ouvido antes. Cassian Lancaster, o gênio Alfa que aos dezenove anos já tinha se graduado da universidade e estava para iniciar uma segunda graduação. Era famoso por sua frieza e exigência.
—Casualmente, o jovem Cassian precisa de um servo e assistente pessoal. Você trabalhará para ele e cobrirá suas necessidades. É um homem brilhante, mas tem um caráter difícil. Até agora, ninguém suportou estar a seu serviço por mais de um mês. Se conseguir aguentar, receberá um bom salário —acrescentou Rosa com um tom esperançoso.
Elliot sentiu um vislumbre de emoção. Fazia tanto tempo que não tinha dinheiro em suas mãos, e essa oportunidade poderia ser sua salvação.
—Trabalharei muito duro, prometo —assegurou com determinação.
—Bem. Venha comigo, deve se apresentar ao jovem Cassian.
Rosa o levou à biblioteca da mansão, um lugar imponente com estantes que alcançavam o teto e enormes janelas por onde entrava a luz tênue da tarde. Ali, Cassian estava sentado em uma escrivaninha de madeira escura, concentrado em um livro. Seu cabelo negro e seus olhos escuros lhe davam um ar ainda mais intimidante.
Rosa pigarreou antes de falar.
—Jovem, desculpe a interrupção. Quero apresentar seu novo assistente pessoal.
Cassian levantou a vista com visível incômodo pela interrupção, mas quando seus olhos se fixaram em Elliot, sua expressão mudou drasticamente. Franziu a testa e se jogou para trás em seu assento, olhando-o com incredulidade.
—Meu Deus! —exclamou, levando uma mão ao peito—. Quantos anos essa pessoa está sem tomar banho?
Elliot se tensou, sem saber se deveria se sentir ofendido ou rir diante daquela reação. Rosa, por sua vez, suspirou, antecipando o quão difícil seria a convivência entre esses dois.
...
...Cassian Lancaster...
...Alfa Dominante...
...19 anos...
....
...Rosa...
...Beta...
...49 anos...
— Não é que ele não tenha se banhado, jovem mestre — tentou explicar a senhora Rosa a Cassian —. O nome dele é Elliot. Tem a mesma idade que você… e o sangue dele é negro.
— Negro? — murmurou Cassian, franzindo a testa com incredulidade.
— Por favor, aceite Elliot como seu novo servo pessoal, jovem mestre. Nesta mansão já não restam mais candidatos — pediu a senhora Rosa com seriedade.
Cassian exalou com frustração. Não tinha paciência para lidar com servos incompetentes, mas também não queria complicar as coisas para Rosa, então, a contragosto, aceitou.
— Está bem — disse com desinteresse.
— Obrigado, jovem mestre — respondeu a senhora Rosa, dando um tapinha no ombro de Elliot como quem diz para ele trabalhar bem.
Elliot não disse nada, apenas assentiu em silêncio, sentindo o olhar do alfa sobre ele.
A senhora Rosa se retirou, deixando-os sozinhos na enorme biblioteca.
— Há algo que o jovem mestre precise? — atreveu-se a perguntar Elliot, mantendo a cabeça baixa.
Cassian voltou a se concentrar em sua leitura, folheando um grosso livro de negócios.
— Nossa, parece que você sabe falar — comentou com um toque de zombaria.
Elliot apertou os lábios, incomodado.
— Então ficarei calado.
Cassian arqueou uma sobrancelha.
— Sente-se. Essa é sua primeira tarefa.
Elliot obedeceu de imediato e sentou-se em uma cadeira perto dele, atento a qualquer instrução. No entanto, o esgotamento o venceu. Não havia comido nem dormido bem em dias e, antes que percebesse, acabou adormecendo, seu corpo incapaz de resistir mais.
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Passaram-se várias horas. Quando Elliot acordou, sentiu algo macio sob seu corpo. Piscou várias vezes, confuso. Já não estava na cadeira de antes, mas sim em um sofá da biblioteca.
— Jovem mestre…? — chamou em voz baixa, mas Cassian já não estava.
O pânico se apoderou dele.
— Será que me meti em problemas por adormecer? Será que me despedirá? —
Assustado, decidiu procurar a senhora Rosa para explicar o sucedido, mas a mansão era demasiado grande e acabou se perdendo nos intermináveis corredores.
— Como volto para a zona dos servos? — murmurou para si mesmo, sentindo-se como se estivesse em um labirinto.
Enquanto isso, a senhora Rosa, ao notar sua ausência, revisou as câmeras de segurança para localizá-lo.
— Elliot… — suspirou a mulher ao encontrá-lo. Ele havia terminado em um corredor pouco transitado, perto do armazém.
Quando Elliot a viu, correu até ela.
— Senhora… acho que cometi um erro. Certamente o jovem mestre me despedirá!
— Quem te disse isso? O jovem mestre não disse nada — respondeu Rosa com calma —. Vamos, volte para o seu quarto. Deve se preparar para o jantar.
Elliot assentiu e começou a se afastar.
Na família Lancaster, era tradição que todos os membros se reunissem para jantar.
— É suposto que eu o alimente? — murmurou Elliot, ainda sem entender completamente seu papel como assistente pessoal.
"De qualquer forma, devo me desculpar por ter adormecido", pensou Elliot, decidido a não se render.
Em seu quarto, encontrou um uniforme de servo e algumas peças de roupa de reserva. Trocou de roupa, agradecido pela ajuda de Rosa, e prometeu fazer o seu melhor.
Quando chegou a hora do jantar, Elliot recebeu sua primeira tarefa: ir buscar o jovem mestre.
Outro servo o guiou até o quarto de Cassian.
— Bata na porta e anuncie-se — indicou o companheiro.
— Obrigado — respondeu Elliot com um leve aceno.
Respirou fundo e bateu na porta.
— Jovem mestre, sou eu…
— Entre.
A voz de Cassian ressoou desde o interior, grave e autoritária.
Elliot abriu a porta com cautela.
O quarto era amplo e luxuoso, com um design europeu clássico que o lembrava dos palácios da realeza que havia visto na televisão.
Cassian estava aplicando perfume após ter saído do banho e trocado de roupa.
Elliot lembrou-se do sucedido na biblioteca e baixou a cabeça.
— Perdoe-me, prometo que não voltarei a adormecer — disse com humildade.
Cassian observou-o com indiferença.
— Não importa. Embora eu tenha pedido que você se sentasse, acabou adormecendo — comentou sem dar muita importância.
O Alfa aproximou-se e parou mesmo em frente a ele, seu aroma impregnando o ar.
Elliot engoliu em seco, sentindo-se algo intimidado pela presença dominante de Cassian.
— Sinto muito, jovem mestre. Por favor, não me demita.
Cassian olhou-o fixamente.
— Não tenho intenção de demiti-lo porque você tem uma qualidade especial.
Elliot ergueu o olhar com surpresa.
— Uma qualidade…?
Cassian inclinou-se levemente para ele, seus olhos escuros brilhando com um vislumbre de diversão.
— Sua única qualidade é que você é feio, ômega.
Elliot piscou, confuso.
— Ah? Isso é um elogio ou um insulto, jovem mestre? — Disse enquanto inclinava a cabeça.
...
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