Capítulo 1
Os humanos, dotados de inteligência extraordinária e uma adaptabilidade notável, sempre foram seduzidos pelo poder. Guerras sangrentas foram travadas em nome da ambição e da riqueza, e a Terra, consumida pela ganância, passou por transformações drásticas para suportar a insaciável sede humana. Em resposta, um sistema de controle foi instaurado, criando uma defesa contra os próprios habitantes.
Esse sistema concedeu aos humanos poderes que tanto almejavam, mas, em contrapartida, tomou deles o que havia de mais precioso: a escolha. O sistema decide onde você nasce, onde trabalha, seu nível de força, habilidade mágica e até sua classe social. Quebrar uma dessas regras te transforma em um divergente, um ser à margem, livre, porém perseguido.
Dentro desse novo mundo, os poderes designados pelo sistema são diversos: os magos, os cavaleiros, os professores, os mensageiros e, no auge da hierarquia, os jogadores. Cada um deles desempenha um papel crucial, mas a verdadeira luta começa quando as linhas que definem esses papéis são desafiadas.
Capítulo 1: O Legado de Serafim
A Terra, ao longo das eras, ergueu-se em resposta à insaciável ambição humana. Como uma sentinela protetora, ela se defendeu criando novas formas de vida, despertando as lendas que povoaram as histórias de outrora: elfos com sua sabedoria imemorial, gigantes de força titânica, orcs de ferocidade indomável, quimeras, monstros que habitavam os mares e aberrantes criaturas que dominavam os céus. Esses seres, outrora meras figuras de mito, tornaram-se a realidade que agora caminhava sobre o mundo.
Os humanos, que já haviam reinado como a raça suprema, viram-se forçados a lutar por sua sobrevivência. Cada batalha que travavam era um lembrete sombrio de sua obsolescência, uma luta desesperada contra forças que possuíam habilidades muito além de suas próprias limitações. Os campos de batalha tornaram-se testemunhas silenciosas de um declínio, onde a ambição dos homens agora era ofuscada pelo poder e pela magia dos seres que emergiram das sombras da história.
Milhares de anos se passaram em um ciclo interminável de conflitos. As guerras varriam continentes, e tratados de paz, uma ilusão passageira, eram rapidamente rasgados pelo vento, como se o próprio universo se divertisse com a futilidade dos esforços humanos. No entanto, em meio a esse caos, uma nova ordem começou a emergir. As raças, cada uma com suas peculiaridades e histórias, foram obrigadas a buscar um equilíbrio. Aprenderam, ainda que lentamente, que a verdadeira força não residia na dominação, mas na coexistência.
Nesse novo mundo de rivalidades e alianças frágeis, a luta pela sobrevivência transformou-se em uma busca por harmonia. As florestas, antes repletas de seres solitários, agora ecoavam com o som de encontros entre raças diversas. Os elfos ensinavam os humanos a respeitar a natureza, enquanto os orcs compartilhavam suas táticas de combate. Até mesmo os gigantes, com sua visão ampla, tornaram-se mediadores em conflitos que antes pareciam irreconciliáveis.
E no coração desse novo equilíbrio, no Reino de Serafim, uma vida estava prestes a se manifestar de maneira extraordinária. Em uma noite enluarada, quando a Lua parecia suspensa no tempo, o ciclo da vida e da morte se entrelaçou em um momento mágico. Ao som do primeiro choro de uma criança, uma nova esperança brotou, oculta dos olhares do mundo.
Essa criança, que não seria amarrada às limitações impostas pelo sistema, nascia sob circunstâncias excepcionais. Sua essência era uma mistura das forças ancestrais que habitavam a Terra, uma alma livre que desafiaria as regras do destino. Com cada respiração, ela traria consigo a promessa de um futuro onde a divisão poderia ser superada e a unidade, alcançada. O destino do Reino de Serafim e de todas as raças estava prestes a mudar, e seu nome, embora ainda desconhecido, ecoaria nas canções dos bardos por gerações.
Assim começava a jornada de uma criança destinada a redefinir o equilíbrio do mundo, em um caminho repleto de escolhas, desafios e um poder que ainda estava por se revelar.
Os ventos frios da manhã sopram suavemente através das árvores do Reino de Serafim, levando consigo os primeiros raios de sol que filtram pelas folhas. O castelo, uma estrutura majestosa de pedras antigas e torres elegantes, ergue-se como um guardião sobre as planícies, onde as raças agora convivem, ainda que com desconfiança. Dentro de suas muralhas, a vida seguia seu curso, mas algo extraordinário estava prestes a acontecer.
Na sala do trono, a rainha Althea observava os súditos que se reuniam para discutir as últimas notícias de disputas entre clãs. Seus olhos, uma mistura de sabedoria e preocupação, percorriam os rostos ansiosos que a cercavam. Os elfos e humanos tentavam encontrar um terreno comum, enquanto os orcs, mais uma vez, ameaçavam romper a frágil paz. Althea sentia que a tensão no ar poderia explodir a qualquer momento, e a última coisa que desejava era outra guerra.
“Majestade”, chamou um conselheiro, interrompendo seus pensamentos. “Os orcs exigem mais terras ao sul, afirmando que os humanos estão invadindo seus territórios. Precisamos agir com rapidez.”
Ela respirou fundo, a pressão do momento pesando sobre seus ombros. “Precisamos de um mediador, alguém que tenha o respeito de ambas as partes. Precisamos de um símbolo de união.”
Enquanto isso, nas profundezas da floresta, uma criança ainda não reconhecida caminhava com o espírito da curiosidade. O nome dela era Sofi, e seu nascimento havia sido envolto em mistério, cercado por eventos incomuns. Desde muito jovem, ela demonstrava uma conexão incomum com a natureza ao seu redor; flores desabrochavam à sua passagem e animais se aproximavam dela como se soubessem que ela era diferente.
Um dia, enquanto explorava uma clareira iluminada pelo sol, Sofi sentiu um chamado, uma presença que ecoava em seu coração. Sem pensar, seguiu o som, até encontrar um antigo altar coberto de musgo e flores silvestres. No centro, uma pedra brilhava com uma luz suave e pulsante. Ela estendeu a mão, e assim que seus dedos tocaram a superfície fria, uma onda de energia a envolveu, sussurrando segredos antigos e revelando visões de um futuro onde as raças estavam unidas.
“Quem é você?” A voz, suave e etérea, reverberou em sua mente. “Você é a chave para o que está por vir.”
Assustada, mas intrigada, Sofi se retirou do altar, sentindo que algo havia mudado dentro dela. Era como se a essência do mundo estivesse agora entrelaçada à sua própria. Ela precisava compartilhar isso com alguém, mas quem? Os adultos sempre pareciam tão preocupados com as disputas e os medos. Era hora de agir, de fazer sua voz ser ouvida.
No castelo, Althea recebeu notícias de uma criança que poderia ser a resposta que tanto esperava. “Dizem que ela tem um dom único, capaz de unir as raças. Precisamos encontrá-la antes que seja tarde demais.”
A rainha reuniu seu conselho, e juntos decidiram partir em busca de Sofi, acreditando que ela poderia ser a chave para restaurar a paz e equilibrar as forças em conflito. Enquanto a comitiva se preparava, Sofi, em sua floresta, sentia uma força crescente dentro dela, como se estivesse prestes a desempenhar um papel muito maior do que poderia imaginar.
Os destinos de Sofi e Althea estavam prestes a se cruzar, e o futuro do Reino de Serafim dependia da coragem de uma criança e da sabedoria de uma rainha. A busca pela harmonia começava, e a jornada de Sofi apenas começava. A história estava prestes a se desenrolar, e as escolhas que fariam poderiam mudar o mundo para sempre.
Na movimentada rua do mercado, um alvoroço tomou conta da cena. Um garoto corria com todas as suas forças, seus pulmões ardendo a cada passo, uma pequena sacola de pães firmemente apertada em seu peito. Atrás dele, um homem baixo e rechonchudo o seguia, gritando e gesticulando como se estivesse em uma corrida desesperada.
Gael, com suas roupas rasgadas e uma determinação indomável, se esgueirava pelas vielas estreitas, contornando barracas e se esquivando de transeuntes. A adrenalina pulsava em suas veias, e, por um momento, a fome e o medo se dissipavam, substituídos por uma única ideia: salvar o que havia conseguido.
Pensamentos sombrios passavam por sua mente; ele havia cogitado desistir da vida muitas vezes. Mas, ao lembrar-se de Lia, sua irmãzinha, a única razão pela qual ainda lutava, a determinação retornava. Viver, apesar de tudo, era a única opção.
Finalmente, em um lugar remoto da cidade, onde apenas humanos de classe inferior, principalmente professores, habitavam, Gael alcançou sua casa improvisada. Era uma construção precária, feita de tábuas desgastadas e lonas puídas. A caminhada do mercado até ali era sempre longa e cansativa, e a chuva insistente tornava tudo mais difícil. Contudo, ao olhar para Lia, envolta em seu pedaço de lençol, a esperança ressurgia em seu coração.
— Gael, você demorou dessa vez. Eu fiquei com medo — disse Lia, seus olhos grandes e preocupados.
— Desculpe, Lia! Mas olha o que eu trouxe! — Gael exclamou, exibindo a sacola. — Pães fresquinhos do mercado! Eu sei que você gosta.
— E você não vai comer? — a pequena perguntou, sua voz refletindo uma inocente preocupação.
— Não se preocupe comigo. Sou bem resistente à fome — respondeu ele, tentando esconder a verdade.
Nesse momento, o estômago de Gael roncou, denunciando sua mentira. Lia riu, uma risada leve que trouxe um momento de alívio em meio às dificuldades.
— Mentiroso! Toma um pelo menos — insistiu, estendendo-lhe um dos pães.
Ele hesitou, mas a doçura do gesto a fez aceitar. A bondade de sua irmã sempre o tocava de uma forma que nenhuma dor conseguia apagar. Gael olhou para o pão, depois para Lia, e finalmente decidiu morder um pequeno pedaço, engolindo em seco, enquanto seu coração se aquecia.
A vida não era fácil. Gael se tornara órfão há cinco anos, com a morte prematura de sua mãe logo após o nascimento de Lia. Seu pai nunca chegou a conhecê-la; rumores diziam que ele era um jogador, um enganador que havia iludido uma simples garçonete. Após a tragédia, Gael se viu sozinho. Ninguém queria assumir a responsabilidade de cuidar de duas crianças da classe inferior, pois, segundo eles, só seriam um peso morto.
Assim, ele lutava todos os dias para sobreviver, não apenas por si mesmo, mas pelo bem da sua irmã. Cada dia era um novo desafio, uma batalha constante contra a fome e a miséria. Ele sonhava com um futuro melhor, um lugar onde não precisassem mais viver nas sombras da cidade, onde a esperança não fosse apenas uma palavra vazia.
Enquanto eles compartilhavam o pão, o olhar de Gael se fixou na janela, perdida na escuridão da noite. Ele sabia que havia mais do que aquele mundo ao seu redor. Havia lendas de criaturas poderosas, de magia e de mudanças, e ele se perguntava se, algum dia, poderia escapar daquela vida limitada. Mas por enquanto, sua prioridade era Lia, e tudo o que fazia era por ela.
— Um dia, Lia — disse ele, mais para si mesmo do que para a irmã. — Um dia, vamos encontrar um lugar melhor. Prometo.
E naquele momento, mesmo em meio à adversidade, um fio de esperança se entrelaçou entre os dois, iluminando a escuridão que os cercava.
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