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O AMOR PERDOA

UMA NOVA VIDA

PATRÍCIA 

Espero não me arrepender da decisão que tomei, baseada na emoção de encontrar a mulher mais importante da minha vida. E entender que ela não me abandonou, que ela me ama e não quis ir embora.

Eu estava tão machucada por dentro, que tudo o que queria fazer era machucar todo mundo. Os meus pais não entenderam essa necessidade que eu tive de sair de Miami, mas eles não sabem o que de fato aconteceu na minha vida. 

Na verdade, nunca fui de me abrir com ninguém, nem mesmo com os meus pais. O meu pai é o que paga contas e faz as minhas vontades, desde que eu não o chateie. E nunca tive amizade com a minha mãe, ela sempre me deixava com as babás, dondoca da sociedade que não tinha tempo para filho, como nasci menina, o meu pai nunca se interessou em fazer parte do universo feminino. Então fui deixada de lado. 

Desde que ela foi embora, um buraco se abriu no meu coração, e tudo o que fiz desde então, foi maldade. Maltratava as empregadas, e todos que não fizessem o que eu queria. Nunca tive uma amizade verdadeira, mas não posso reclamar, eu também nunca fui amiga de ninguém! Nunca mais deixei que as pessoas chegassem perto de mim. Não deixava que ninguém chegasse perto do meu coração. 

Agora a reencontrei e quero mudar de vida. Fiz tanta merda, que tudo se voltou contra mim. Na hora que aquelas fotos forem parar na imprensa eu quero estar longe. E pela primeira vez na minha vida não quero me vingar. Afinal o que fizeram comigo foi merecido. 

Combino tudo com a Joanna, preciso desse choque de realidade para tentar me encontrar e ter um propósito na vida.

Ela precisa ir imediatamente para cuidar do orfanato, mas eu ainda preciso fazer uma coisa. Preciso fazer algo que nunca fiz antes. É engraçado como estou envergonhada por ter que pedir desculpas a alguém, se nunca me envergonhei das maldades que fiz.

Mas se quero ter uma nova vida, é o que tenho que fazer. Vou deixar a Joanna orgulhosa de mim. Vou ao clube e tento encontrá-la, mas sou informada que ela não trabalha mais lá. Na boate também não, procuro por semanas até descobrir por um vídeo da Internet de uma festa de casamento, o cara de quem fiquei noiva, era um dos herdeiros Lewis e a pediu em casamento, daí foi fácil achá-la, já que dela, eu nem sabia o sobrenome, foi fácil achar o seu noivo e ir até o condomínio falar com ela. 

Depois de muito insistir ela me recebeu. 

Patrícia _ Eu estou te procurando para te pedir perdão. Sei que o que tentei fazer com você, foi monstruoso, só para que saiba, eu cai na minha própria armadilha. Os meus amigos me drogaram e fiquei a mercê da vontade da droga.

Emma_ Eu sinto muito por você!

Patrícia _ Como você pode ser tão boa? Eu pisei em você, maltratei você, te ridicularizei no clube, você tinha que se alegrar da minha desgraça. 

Emma_ Eu não sou assim! Nunca vou rir da desgraça alheia, não importa de quem seja, e você é mulher como eu, e saber que uma mulher sofreu um abuso me abala profundamente. 

Patrícia _ Eu mereci o que aconteceu!

Emma_ Nenhuma mulher merece passar por isso! Eu fico feliz que você queira mudar de vida. Todos nós erramos, e você está tendo a chance de mudar. Antes de fazer qualquer coisa contra alguém pense duas vezes. Todas as pessoas têm suas dores, nunca julgue a atitude de ninguém, nunca sabemos o que se passa no coração de cada um. Tente fazer o bem. Eu espero que consiga se transformar em uma pessoa melhor. 

Patrícia _ Vai me perdoar fácil assim?

Emma_ O meu coração está cheio de amor, não tem espaço para o ódio ou a vingança.

Patrícia _ Você é uma boa pessoa, quando crescer quero ser como você!

E assim, depois de fazer o que eu tinha que fazer, fiz as minhas malas e parti com destino ao Congo.

Desci do avião, esperando encontrar a Joanna, mas claro ela não está a minha disposição.

Patricia _ Vida nova Patricia, agora você depende totalmente de você. 

Vejo uma mulher que não conheço com uma placa com o meu nome, menos mal ela mandou alguém. 

Patricia _ Oi, sou a Patricia.

A mulher me olha de cima abaixo com uma cara de desagrado.

Mulher _ A Patricia que veio trabalhar de voluntária no orfanato? Tem certeza?

Patricia _ Sim, tenho. A Joanna mandou me buscar?

Mulher _ Ela queria mandar outra pessoa, mas me ofereci para vir no lugar dele. Podemos ir? Tenho mais o que fazer!

Patricia _ Preciso pegar as minhas malas.

Mulher _ Malas?

Saio andando para a esteira de bagagens e noto que na minha nova vida eu mesma vou ter que fazer as coisas. 

Mulher_ Pelo amor de Deus! Você acha que veio para Paris?

Patricia _ Claro que não! Se fosse Paris, nem ia ter que levar malas, comprava tudo lá, mas aqui eu sei que é diferente. 

Mulher _ Quero ver quanto tempo você vai ficar!

Chegamos numa caminhonete velha e cheia de lama. Ela entra e liga o motor, Inacreditável, ela vai deixar que eu coloque as malas sozinhas naquela coisa que chama de carro. Alguns garotos me cercam e falam numa mistura de francês com um dialeto que não entendo, mas ouço a palavra dólar, eles querem dinheiro para me ajudar. Eu aceno que sim e eles pagam as minhas malas e jogam com tudo na caminhonete suja e fedorenta. Tiro o dinheiro e eles avançam em cima de mim. Mãos sujas e suadas me tocam sujando a minha calça branca e a minha blusa de seda verde. A mulher sai do carro e grita alguma coisa, eles pegam o dinheiro e somem.

Eu entro no carro e agradeço. 

Patricia _ Obrigada, você viu o que fizeram com as minhas malas? Tenho duas Louis Vuitton ali, duas Gucci e duas Prada, além da Rimowa. Espero que elas sobrevivam.

Mulher_ Meu Deus! Como pode ser tão fútil? Acho melhor voltarmos e você pegar o avião de volta de onde veio!

Patricia _ Eu não vou voltar!

Mulher _ Aqui não é lugar para você! É só olhar em volta.

Fico chateada com que ela fala, mas olho em volta e o lugar é medonho, prédios e casas destruídas, gente maltrapilha perambulando pelas ruas. Ela dirige feito louca, e nos afastamos cada vez mais e o lugar ao invés de melhorar piora. Me sinto sufocar e abro a janela, poeira e um cheiro de esgoto invadem a cabine.

Meu Deus! Onde vim parar?

(Foto tirada da Internet)

MEU NOVO MUNDO

PATRÍCIA 

A mulher mal humorada, para o carro, com tudo e tenho que me segurar, para não bater a cabeça no parabrisa sujo do seu carro, numa estrada de terra esburacada, com esgoto passando a céu aberto, 

Patrícia _ Chegamos? É aqui a casa da Joanna?

Mulher_ Aqui é o orfanato que você veio trabalhar 

Patrícia _ Mas preciso desfazer as minhas malas e me acomodar antes de trabalhar. 

Mulher_ Você é burra ou só se faz para combinar com a sua cara?

Subiu imediatamente uma vontade de acabar com a raça dela, mas eu me propus a mudar e tento controlar ao máximo o meu temperamento mimado e não aprontar uma das minhas vinganças. Lembro do que a Emma me disse, nunca julgue as outras pessoas, quem sabe ela tem um problema grave, além da cara de limão azedo. Sorrio com os meus pensamentos e não digo nada. Descemos do carro e ela vai andando em direção ao portão. 

O portão é aberto por um senhor que só tem um braço e uma perna. Fico horrorizada que uma pessoa nessas condições trabalhe no orfanato.

Digo bom dia em francês que sei ser mais conhecido do que o inglês aqui no Congo. Ele responde com um sorriso de dentes amarelos e olha para ela bem sério. Abre o portão e entramos. 

Mulher_ Espere aqui!

Fala comigo como se eu fosse uma criança que foi pega fazendo traquinagem e vai ser levada para a diretoria, não posso deixar de fazer uma careta nas costas dela.

Menina _ Kkkk Sabia que isso é muito feio?

Patrícia _ Desculpe, eu sei! 

Menina_ Não se preocupe! Eu também não gosto da dra. Azeda. Não vou contar nada para ninguém.

Patrícia _ Oi, o meu nome é…

Menina _ Tricha, eu sei! Estava te esperando! Queria ser a primeira a ver a princesa Tricha. Eu sou a Latifa, eu também sou uma princesa.

Patrícia _ Muito prazer! Você é muito linda!

Latifa_ Mas a minha pele não é branca como a sua e o meu cabelo não é de ouro!

Patrícia _ Quem me dera ter uma pele como a sua! A minha, se eu não tomar cuidado, fico parecendo um camarão quando fico no sol um pouquinho. E os seus cabelos cacheados são lindos! 

Latifa_ Obrigada! Eu vou avisar a Joanna que você chegou, a dra Azeda, quando fica conversando com o dr. Le prince charmant demora muito. 

Ela sai correndo e some, a menina é linda, tem uma carinha de sapeca, não deve ter mais de quatro anos. Logo a Joanna chega e me abraça. 

Joanna _ Que bom que você chegou! Eu pedi ao Brad para ir te buscar, mas a doutora Raquel disse que tinha uma encomenda para pegar no aeroporto, e se ofereceu para ir. Fez boa viagem?

Patrícia _ Sim, um pouco cansativa mas estou bem.

Joanna _ Venha, vamos entrar. Quero que você conheça as crianças. 

Ela abre uma porta e vários rostos curiosos se voltam para mim. 

Patrícia _ São muitas crianças! Todas elas não têm pais?

Joanna _ Temos oitenta e seis crianças aqui, e nenhuma delas tem sequer um dos pais! Elas precisam muito de cuidados e carinhos. Algumas delas têm marcas no corpo e na alma, por causa da guerra. Esse país vive numa luta constante, às vezes, o governo contra os rebeldes e as tribos que brigam entre si. Infelizmente essa guerra está longe de terminar!

Patrícia _ Eles são tantos!

Joanna_ Eu disse a você, não é uma brincadeira, um passeio no parque, as crianças aqui precisam de ajuda!

Patrícia _ E se eu não souber o que fazer?

Joanna _ Estou aqui para te ensinar, mas eu acredito em você, Patrícia. É uma mulher inteligente e vai saber lidar com crianças, todas elas precisam de amor e orientação. 

Se aquela mulher acredita em mim, eu sei que vou conseguir. Pelo menos, assim espero!

As crianças me cercam querendo tocar no meu cabelo, nas minhas joias, elas parecem nunca ter visto alguém como eu.

Joanna _ Se acalmem crianças, depois do jantar a Tricha vai contar uma história para vocês dormirem.

Eu fico tentando me lembrar de alguma história que eu possa contar a elas. Converso com algumas, outras são mais tímidas, mas a minha amiguinha não sai do meu lado.

Latifa_ Eu vou te ajudar a lidar com eles. São meio barulhentos, mas você se acostuma.

Estou ajudando a dar o jantar das crianças e um menino começa a chorar, eu não sei bem o que fazer para que ele pare. A Joanna está longe, eu tento falar com ele, mas não entendo o dialeto que ele fala.

Latifa_ Ele disse que está com dor na barriga. 

Eu sento no chão e o pego no colo, tentando acalmá-lo. Murmuro palavras doces, me lembro de quando eu ficava doente e a Joanna cuidava de mim.

Latifa _ Desse jeito todo mundo vai querer ficar doente! Primeiro veio o dr. Le prince charmant e depois a princesa Tricha pega no colo? Até eu quero ficar doente.

Patrícia _ Você pode chamar a Joanna para mim?

Ela sai correndo para chamar a Joanna, eu olho para ele que parou de chorar por um segundo para vomitar em cima de mim. Eu fico com pena dele que chora novamente, mas eu estou cheia de vômito. A Joanna chega com outra voluntária e essa pega o menino dos meus braços. 

Patrícia _ Ele vomitou em mim! 

Joanna _ Acontece, se acalme.

Patrícia _ Preciso me trocar.

Joanna _ Cadê a sua mala?

Patrícia _ Ficou no carro da dra. Azeda.

Joanna _ Já vi que andou conversando com a Latifa. O nome dela é Raquel, não deixe que ela ou as crianças a ouçam chamá-la assim. Bonita do jeito que é, vai ser uma pedra no sapato dela.

Patrícia _ Podemos ir para a sua casa para que eu possa tomar um banho?

Joanna _ Eu moro aqui, não é seguro uma mulher estrangeira sozinha morar numa casa na vila.

Patrícia _ Eu vou morar aqui também? Eu posso ficar num hotel!

Joanna _ Só tem hotel na Capital, não é viável ou seguro ir e vir todos os dias. Vamos ver onde estão as suas coisas.

Assim que abrimos a porta para o pátio, um homem vem andando com as minhas malas nas mãos. 

Latifa _ Le prince charmant! Que sorte a minha, duas vezes num dia.

Ele abre um sorriso lindo para ela e o meu coração que sempre foi meio morto para essas coisas, dispara descontrolado. 

Joanna_ Oi Brad, Essas malas são da Patrícia? Íamos procurar agora, uma das crianças vomitou nela.

Ele ergue o olhar para mim, que fico morta de vergonha, a primeira vez que aquele homem me vê e estou suja de vômito. Ele fica sério me olhando e franze a testa, em desagrado. Parece a cara que o meu pai fazia se tivesse que lidar com as consequências de uma das minhas vinganças. 

Eu o olho de cabeça erguida, deixando aflorar o meu lado altivo. 

Brad _ E não tem só essas! Eu não sei para onde ela pensou que estava vindo. Eu emprestei o meu carro para a Raquel ir buscá-la e quando cheguei em casa reparei nas malas na caçamba. Não tirou a bagagem. 

Patrícia _ A dra. Raquel me mandou esperar, eu não sabia que a Joanna morava aqui, pensei que só daríamos uma passada no orfanato e depois iríamos para a casa dela.

Brad_ Tome as suas malas, vou buscar o restante, Joanna depois quero conversar com você. 

Quando vou pegar a minha mala nossos dedos se encostam e sinto um choque, uma estática e puxo a minha mão e a mala cai no pé dele.

Patrícia _ Me desculpe! Eu tomei um choque. 

Ele me olha mais sério ainda.

Brad_ Latifa, cherry pode mostrar a moça onde fica o quarto da Joanna? Ela precisa se limpar. 

Fala com a menina com um sorriso doce, e a voz completamente diferente do que usou comigo. 

Latifa _ Claro! Vamos princesa Tricha, eu te ajudo. 

Ela empurra a mala de rodinhas, enquanto pego a outra. Olho mais uma vez para ele enquanto me afasto, ele está conversando sério com a Joanna. Será que como a dra Azeda não concorda que eu tenha vindo pra cá?

(Foto tirada da Internet)

BRAD DE'LAROSSI

BRAD

Estou a quatro anos no Congo, o que era para ser uma missão de paz de seis meses vacinando crianças, se estendeu por quatro anos.

Uma vez que conheci essas crianças, não consigo virar as costas para elas. Estava numa péssima fase da minha vida. Tudo aconteceu numa espiral de problemas, um atrás do outro, que quando um amigo me convidou para essa missão de paz dos médicos sem fronteiras, eu simplesmente deixei tudo para trás e parti. 

Pensei que conseguiria fugir da dor. Mas ela me acompanha até hoje. Tinha uma vida que todos achavam que era perfeita, mas claro que não era.

Estudei muito, para ser o melhor que eu pudesse na minha profissão. Me graduei com bolsa de estudos, a minha mãe era empregada doméstica, nós vivíamos nos fundos da casa de seus patrões. Eu admirava muito o patrão da minha mãe. Nunca conheci o meu pai, a minha mãe nunca me falou dele, eu também nunca a vi com ninguém. O dr.Gutierrez tinha duas filhas e eu sempre soube que elas eram proibidas para mim, crescemos juntos, e eu as tratava como irmãs. Mas sabia qual era o meu lugar naquela casa. Nunca me revoltei e nem quis mais do que poderia ter.

A minha mãe desde pequeno, sempre me dizia para não ter mais do que amizade com elas, e sempre respeitei isso. O Dr Gutierrez  é médico e sempre conversava comigo e perguntava da escola. E a vontade surgiu de seguir a mesma profissão que ele. Quando eu contei a ele, disse-me que o deixaria orgulhoso, se eu seguisse os seus passos. 

Eu consegui bolsa integral em Harvard, e fui fazer medicina. Me formei e fiquei imensamente feliz quando ele apareceu na minha formatura. A família dele tem um hospital em Miami e depois da residência, resolvi que queria a pediatria. Ele convidou-me para ingressar no hospital da família, fiquei feliz e me dediquei ao hospital. 

Conheci a Alice e começamos a namorar, eu já era um médico prestigiado. Ela era de família rica, mas eu nunca me importei com isso, nos apaixonamos e logo ela engravidou eu a pedi em casamento e nos casamos. Ela me dizia que não queria sair da casa dos pais para não deixar a sua mãe sozinha, que havia ficado viúva há pouco tempo. Então a minha mãe  se aposentou e ficou com o meu apartamento e eu lhe fiz a vontade e fomos morar na mansão da família dela.

Eu trabalhava muito e logo começaram as cobranças, depois que nossa filha nasceu, ela queria ir para festas e jantares da sociedade, aos quais eu não tinha interesse e nem tempo. As brigas eram constantes. Se eu não fizesse as suas vontades, o mundo vinha abaixo.

Depois que sua mãe casou-se de novo com um conde da Inglaterra e foi para lá, parece que tudo desmoronou, nossa filha era sempre deixada com as babás. O Dr Gutierrez me pediu para assumir a Vice presidência do hospital, pois ele estava doente. Então a minha carga de trabalho triplicou e um belo dia recebi as minhas malas no hospital junto com o pedido de divórcio. Ela nem falou comigo, somente através de advogados. Eu via a minha filha, somente em fins de semanas alternados, isso quando ela não dizia que a Allyson tinha um compromisso importante e eu não poderia vê-la.

E o meu mundo tão perfeito começou a desmoronar, a minha mãe descobriu um câncer já em estado avançado, não tive como salvá-la e no seu leito de morte eu descobri a verdade sobre a minha concepção. 

Ela me contou que sou filho daquele homem que eu admirava tanto. Em uma noite em que ele chegou bêbado em casa, foi para o quarto dela e a violou. No dia seguinte arrependido, implorou que ela não contasse nada para a sua esposa, pois iria estragar o seu casamento e carreira. E ela se calou, quando descobriu a gravidez, falou com ele que prometeu cuidar do meu futuro. As bolsas que eu achava que ganhei nas escolas eram na verdade pagas pelo meu pai.

Até mesmo, Harvard foi paga por ele.

Fiquei furioso com ele, e com ela por nunca terem me contado a verdade. No enterro dela, ele tentou falar comigo, mas eu não aceitei conversar. No hospital, apesar dele não estar lá, ficou um clima estranho, não que alguém soubesse, mas eu me sentia uma fraude. Parece que tudo o que conquistei foi por ele. Eu nem conseguia me concentrar no trabalho, quando resolvi procurar outro hospital onde eu pudesse trabalhar sem a sombra dele, ele também faleceu e fui chamado para a abertura do testamento. 

Ele me deixou o hospital em testamento e foi então que as minhas meias irmãs ficaram sabendo toda a verdade e não aceitaram nada bem. Ele me deixou de pés e mãos amarrados, se eu não aceitasse o hospital às minhas irmãs ficariam sem nada. Se eu aceitasse a herança, teria que dirigir o hospital e elas ficariam com as outras propriedades, dinheiro e empresas que ele tinha.

Então pelo bem delas, eu tive que aceitar aquela herança. Mas mesmo assim as duas entraram em guerra comigo.

Elas não achavam justo que eu herdasse o hospital, na verdade, nem eu! Eu não queria aquela herança, não queria nada dele. Primeiro ele foi um canalha com a minha mãe, segundo me deixou crescer naquela casa sem um pai, sem saber que ele estava próximo de mim, não me deu o seu nome, sempre tive mágoa por na minha certidão de nascimento, estar como pai desconhecido. 

Eu perdoei a minha mãe, nunca vou entender os seus motivos, mas a perdoei. Mas ele? É outra história, só me arrependo de não tê-lo confrontado, não que o que ele fez tenha perdão! Mas deveria ter falado tudo o que me corrói o peito. 

Assumi o hospital e tentei levar a vida adiante. Mas os problemas não terminaram. Desde que fui declarado dono do hospital, os problemas começaram a se acumular. Greve de funcionários, materiais cirúrgico roubados, empresas de produtos hospitalares que sempre trabalharam conosco, de repente cancelaram contratos. Uma coisa atrás da outra. Eu não tinha tempo para nada, só tentando não deixar que o hospital não quebrasse. Quando parecia que tudo ia bem, que conseguia resolver uma crise aqui, outra ali, começaram os processos por negligência, dois médicos foram afastados, até  a apuração dos casos.

E quando começa esse tipo de coisa, tudo desmorona, o advogado do hospital me dizia para pagar que tudo sumiria, mas eu sempre acreditei na justiça, e eu também queria saber se houve realmente negligência por parte dos profissionais que integravam a minha equipe. 

As ações caíram drasticamente e os diretores também começaram a questionar a minha competência, eu queria entregar essa presidência para um administrador competente, mas nem isso pude fazer. O testamento dizia que tinha que ficar pelo menos um ano no cargo. Eu nem tinha tempo para fazer o que gosto, que é a pediatria.

Uma noite estava saindo do hospital pela primeira vez em dias, dormia de duas a três horas no sofá do escritório mesmo. Quando chegou uma ambulância com um garoto que havia sofrido um acidente de carro, que estava no banco da frente e sem cinto de segurança. Não havia um pediatra de plantão, então fui atender o garoto. 

Notei a hemorragia interna e o mandei para a cirurgia, me lavei e entrei e descobri como a equipe estava desfalcada. Só estávamos eu, o anestesista, e uma enfermeira que eu não gostava, e nem confiava. Essa mulher correu atrás de mim por muito tempo, enquanto eu era casado e tivemos uma briga séria, durante um plantão, que eu dormi no quarto de descanso dos médicos, e acordei com ela se deitando nua ao meu lado. A coloquei no seu lugar, mas não dei queixa e nem quando me tornei dono do hospital, a demiti, nunca fui uma pessoa vingativa.

A cirurgia levou horas, eu estava cansado, os ferimentos eram muito graves, mas tenho certeza que fiz o que podia. O deixei na ala intensiva com a fé de que ele sairia dessa. 

Sai do hospital e fui para casa, deitei e dormi, me levantei depois de quatro horas e voltei ao hospital. Estava no meio de uma reunião da diretoria, quando a mãe da criança entrou me acusando de ter matado o seu filho.

O garoto morreu e um prontuário com a minha assinatura dizia que dei a ordem de ministrar um remédio que o garoto não podia tomar, pois era alérgico. No primeiro momento eu duvidei que tinha cometido esse erro, tentei de diversas formas, descobrir o que realmente aconteceu e não consegui, cheguei a um ponto de duvidar de mim mesmo. Eu matei uma criança. 

Até sair a sentença de erro médico, eu ainda comandei o hospital, mas depois, contratei um administrador, pois já havia se passado um ano, e saí do país. Mas a dor de ter causado a morte de uma criança, nunca saiu do meu coração. 

(Foto tirada da Internet)

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