A chuva caía fina sobre o para-brisa enquanto Clara dirigia pela estrada sinuosa que a levava até Vallora. O GPS indicava que faltavam apenas alguns quilômetros, mas o percurso parecia interminável. As árvores ao longo da estrada eram altas e sombrias, como guardiãs silenciosas de segredos esquecidos. Clara sentia uma mistura de curiosidade e apreensão. Receber a notícia de que havia herdado uma mansão de um parente que mal conhecia fora um choque, mas a possibilidade de um novo começo era tentadora demais para ignorar.
Quando finalmente avistou a mansão Everhart, seu coração acelerou. A construção era imponente, com sua fachada de pedra escura coberta por trepadeiras. Janelas altas e estreitas pareciam olhos que observavam quem ousasse se aproximar. Clara estacionou o carro em frente à entrada principal e respirou fundo antes de sair. O ar estava úmido e carregado com o aroma da terra molhada.
Assim que empurrou as portas pesadas, foi recebida por um ranger longo e um salão principal mergulhado em penumbra. O interior era tão grandioso quanto assustador, com um lustre de cristal que parecia prestes a desabar, escadarias de madeira maciça e retratos antigos que a observavam de suas molduras douradas. Clara arrastou sua mala para dentro e fechou a porta atrás de si. O som ecoou pelo espaço vazio, lembrando-a de que estava completamente sozinha.
Ela explorou os cômodos principais, encontrando móveis cobertos por lençóis empoeirados e pilhas de livros antigos espalhados por todos os cantos. Apesar da atmosfera um tanto opressiva, havia algo fascinante naquele lugar. Clara sentia como se estivesse entrando em um capítulo de um de seus próprios romances.
Depois de um tempo, subiu ao andar superior para encontrar seu quarto. Ao passar por um corredor estreito, notou uma porta discreta parcialmente escondida entre duas estantes. Estava trancada. "Curioso", murmurou para si mesma. Decidiu deixar a exploração para outro momento. O cansaço da viagem finalmente começava a pesar.
Mais tarde, enquanto se acomodava, o som de uma campainha ecoou pela casa, interrompendo seus pensamentos. Intrigada, desceu até a entrada e abriu a porta. Um homem alto, de aparência descontraída e sorriso amigável, estava parado ali, segurando uma cesta de frutas frescas.
"Oi, você deve ser Clara", disse ele. "Sou Gabriel, seu vizinho. Achei que poderia precisar de algo para comer."
Clara sorriu, surpresa com a gentileza. "Obrigada, Gabriel. É um prazer conhecê-lo. Entre, por favor."
Gabriel entrou, examinando o interior com curiosidade evidente. "Faz anos que ninguém vive aqui", comentou, colocando a cesta sobre uma mesa no hall de entrada. "É uma casa magnífica, mas... tem sua dose de histórias."
"Histórias?", perguntou Clara, tentando esconder o interesse. Ela era escritora, afinal, e histórias misteriosas sempre capturavam sua atenção.
Gabriel hesitou por um momento antes de responder. "Nada muito concreto, apenas rumores. A família Everhart era conhecida por ser reservada, quase reclusa. Algumas pessoas dizem que certos cômodos da casa foram trancados há décadas e que ninguém ousa abri-los."
Clara arqueou as sobrancelhas. "Interessante. Talvez eu mesma descubra esses segredos."
Ele sorriu de lado, como se soubesse mais do que estava disposto a compartilhar. "Bem, espero que você encontre o que procura. Mas tome cuidado, algumas portas estão trancadas por uma razão."
Depois de se despedir de Gabriel, Clara não conseguia tirar as palavras dele da cabeça. Durante o resto da noite, sua mente estava tomada por perguntas: que segredos a mansão guardava? E por que Gabriel parecia tão enigmático?
Já na cama, Clara tentou se concentrar em um dos livros que trouxera, mas o som de algo vindo do andar de cima interrompeu sua leitura. Era um som baixo, rítmico, quase como passos. Ela congelou por um momento, o coração disparado. "Deve ser o vento", disse a si mesma, mas não conseguiu evitar olhar para o teto, como se esperasse ver algo ali.
Determinada a não deixar sua imaginação tomar conta, Clara apagou as luzes e tentou dormir. No entanto, enquanto o silêncio envolvia a casa, uma sensação inquietante permanecia. Algo naquela mansão não parecia certo.
Na manhã seguinte, Clara acordou com a luz do sol atravessando as cortinas antigas do quarto. Embora o cenário parecesse mais acolhedor sob a luz do dia, a inquietação da noite anterior ainda pairava em sua mente. Após preparar um café simples na cozinha, ela começou a explorar os cômodos da mansão em busca de respostas. A memória da porta trancada no corredor superior não a deixava em paz.
Em um dos escritórios da casa, Clara encontrou uma caixa de madeira com objetos antigos. Entre papéis amarelados e fotografias desbotadas, algo chamou sua atenção: um caderno de capa de couro, desgastado pelo tempo. Ao folhear as páginas, ela descobriu que pertencia a Elias Everhart, um antigo morador da mansão. As anotações falavam de sua vida como herdeiro e mencionavam repetidamente uma mulher chamada Helena. Havia descrições de encontros secretos e cartas trocadas, mas algumas partes estavam ilegíveis, como se o tempo tivesse apagado propositalmente aquelas histórias.
Enquanto lia, Clara foi interrompida por batidas na porta. Era Gabriel novamente, desta vez trazendo ferramentas para ajudar a limpar o jardim da mansão. “Achei que poderia precisar de ajuda”, disse ele com um sorriso caloroso. Trabalhando lado a lado, os dois começaram a retirar folhas secas e galhos acumulados pelo tempo. A conversa fluía naturalmente, e Clara percebeu que havia algo reconfortante na presença de Gabriel, como se ele fosse uma âncora em meio à tempestade de emoções que sentia desde sua chegada.
“Você descobriu algo interessante na casa?”, perguntou ele casualmente. Clara hesitou antes de mencionar o caderno e as cartas. Gabriel pareceu surpreso, mas não pressionou. Em vez disso, falou sobre como a mansão sempre foi cercada por rumores e mistérios. “É como se esse lugar guardasse as memórias de quem viveu aqui”, comentou ele, lançando um olhar pensativo para a casa.
Mais tarde, determinada a seguir sua investigação, Clara voltou ao corredor e encarou a porta trancada. Lembrou-se da caixa no escritório e decidiu examiná-la novamente. Para sua surpresa, encontrou uma pequena chave presa entre as páginas finais do caderno. Suas mãos tremiam ao encaixar a chave na fechadura. Um clique suave ecoou pelo corredor, e a porta se abriu, revelando uma escada estreita que levava ao sótão.
O sótão estava repleto de baús, móveis cobertos por lençóis e uma sensação quase palpável de abandono. No centro do espaço, uma caixa coberta por um tecido bordado chamou sua atenção. Dentro dela, havia cartas assinadas por Helena, que descreviam um romance proibido com Elias e planos de fuga que nunca se concretizaram. Clara sentiu uma conexão imediata com aquelas palavras, como se estivesse desenterrando algo que também fazia parte de sua própria história.
De repente, um ruído atrás dela interrompeu o momento. Clara virou-se rapidamente, mas não viu nada além da escada vazia. Ainda assim, não conseguiu se livrar da sensação de que não estava sozinha. Com as cartas em mãos, ela desceu do sótão, determinada a descobrir mais sobre os segredos da mansão e sobre si mesma. A cada revelação, parecia que seu destino estava intrinsecamente ligado ao daquela casa misteriosa.
Clara acordou ao som de pássaros cantando, uma bem-vinda mudança em comparação à noite silenciosa e inquietante que enfrentara. Sentindo-se energizada pela descoberta das cartas no sótão, decidiu que aquele seria o dia de desvendar mais sobre a misteriosa Helena e seu romance com Elias. Enquanto tomava seu café, as palavras das cartas ecoavam em sua mente: promessas de amor eterno, sonhos de escapar juntos, mas também uma sombra de medo que pairava sobre seus planos.
Determinada, Clara dirigiu-se ao pequeno vilarejo de Vallora, na esperança de encontrar registos ou alguém que soubesse mais sobre a história da família Everhart. Ao chegar à biblioteca local, foi recebida por uma senhora de cabelos grisalhos e óculos redondos que parecia saída de um conto de fadas. “Bem-vinda, minha querida. Posso ajudá-la em algo?”, perguntou ela, com um sorriso caloroso.
Clara explicou brevemente sua situação e mencionou os nomes Elias e Helena. O sorriso da bibliotecária desapareceu por um instante, substituído por uma expressão séria. “Ah, a mansão Everhart... e os segredos que ela guarda”, murmurou a senhora. “Siga-me.”
Ela conduziu Clara até uma seção de arquivos antigos, onde retirou um livro grosso, repleto de registros históricos da região. Entre relatos de fundações de fazendas e genealogias das famílias locais, Clara encontrou um capítulo dedicado aos Everhart. Descobriu que Elias Everhart era o último herdeiro legítimo da linhagem, mas sua morte, cercada de mistério, interrompeu bruscamente sua história. Helena, por outro lado, não era mencionada em documentos oficiais, apenas em boatos: diziam que era uma mulher de origens simples, mas que sua beleza e inteligência haviam cativado Elias.
“Eles diziam que a família Everhart nunca aceitaria a união deles”, comentou a bibliotecária, como se lesse os pensamentos de Clara. “E há rumores de que Helena desapareceu logo após a morte de Elias. Ninguém nunca soube o que aconteceu com ela.”
De volta à mansão, Clara sentiu o peso das novas informações. O passado trágico de Elias e Helena parecia lançar uma sombra sobre o presente, como se seus destinos estivessem de alguma forma entrelaçados com o dela. Enquanto folheava novamente as cartas no sótão, percebeu uma inscrição gravada na parte interna da caixa onde elas estavam guardadas: “Para sempre e além”. O toque delicado das palavras despertou uma emoção profunda em Clara, um misto de tristeza e esperança.
Mais tarde, Gabriel apareceu novamente, desta vez trazendo um livro de histórias locais que encontrou em sua própria casa. “Achei que isso poderia te interessar”, disse ele, com um sorriso. Clara agradeceu, sentindo-se cada vez mais conectada a ele, como se Gabriel fosse mais do que apenas um vizinho prestativo — talvez ele fosse parte do quebra-cabeça que começava a se formar.
Naquela noite, enquanto Clara lia o livro deixado por Gabriel, uma passagem chamou sua atenção. Havia menções a um esconderijo secreto na mansão Everhart, um lugar onde Elias e Helena teriam se encontrado para planejar sua fuga. Animada, Clara decidiu que na manhã seguinte iria explorar cada canto da casa até encontrar esse lugar. Mais uma vez, sentiu a familiar sensação de estar sendo observada, mas dessa vez, ao invés de medo, sentiu uma determinação crescente. A mansão Everhart ainda tinha muito a revelar, e Clara estava pronta para descobrir seus segredos — e talvez, redescobrir a si mesma no processo.
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