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Paixão Envolvente

Prologo - Memórias de Sangue e Medo

Ela se vê no alto de uma árvore imponente, mas seus galhos próximos oferecem uma passagem segura. Como de costume, desce rapidamente, seus olhos atentos a todos os lados. Ela sabe que, em algum ponto à beira do lago, há um homem envolto na escuridão, vestindo um casaco com capuz. Ele segura um pedaço de madeira. Mesmo ciente de que descer com urgência lhe custará caro, ela prossegue. Um galho pontudo rasga a pele de seu antebraço direito, e ela sente o sangue quente escorrendo, manchando seu vestido. A dor é apenas um ruído distante enquanto aterrissa no chão de terra úmida.

Com o coração acelerado, ela se afasta, tropeçando em seus próprios passos. Tenta abafar um grito, pressionando as mãos contra a boca, mas é tarde demais. O homem, que se afastara, agora a encara fixamente da margem do lago. Ele grita seu nome.

A voz dele corta a noite com fúria, provocando nela um temor que percorre sua pele. O rosto do homem está encoberto pela escuridão, mas ela consegue ver o brilho de seu sorriso frio. Sem pensar, ele começa a caminhar em sua direção. O brilho ameaçador em seu olhar sombrio a faz girar sobre os calcanhares, e ela corre em direção a uma estrada de terra, não muito longe dali. A trilha até ela sobe uma leve inclinação entre as árvores. Ela sabe que essa estrada a levará direto para casa, então corre o mais rápido que pode. Ouve o homem gritar seu nome outra vez, sua voz ecoando perto demais. O coração dela dispara, e o medo cresce conforme ele vocifera, seus rosnados cada vez mais próximos.

Os pulmões dela queimam com o esforço, até que a pequena subida entre as árvores se aproxima. Ela escorrega nas folhas secas, e o pânico a invade quando sente sua mão enorme agarrar seus cabelos com força. Ela solta um grito, se virando bruscamente enquanto luta para se libertar. Os olhos dele brilham ameaçadores, e ela vê o canivete cintilar ao se erguer no ar. Seus olhos se arregalam, e ela solta outro grito enquanto se debate freneticamente. Com um movimento desesperado, seus cabelos finalmente se soltam da mão dele. Ela dá alguns passos para trás, desviando do golpe, mas a lâmina ainda rasga seu abdômen, cortando o vestido.

Ela cai sentada no chão, a dor latejando em seu corpo, mas aproveita um instante de distração do agressor. Com todas as forças que lhe restam, acerta um chute na perna dele, fazendo-o perder o equilíbrio. Ele cai, rolando pelo terreno sujo, soltando uma torrente de palavrões. Sem perder tempo, ela se levanta com dificuldade e corre o mais rápido que consegue até alcançar a estrada.

Ao chegar, vê os faróis de um carro surgindo na curva à distância, vindo em direção à cidade. Desesperada, ela se lança na frente do veículo, acenando por socorro. A caminhonete azul freia a poucos centímetros dela. Um homem desce furioso, mas ao vê-la, seus olhos se arregalam de pavor. O rosto dele é indistinto, e seu nome lhe é desconhecido. Cambaleante, ela vai ao encontro dele, pressionando uma mão contra o abdômen e a outra sobre o corte no braço, sentindo o peso da exaustão e do terror.

— Por favor, me ajude! – A voz dela soa como um sussurro desesperado, e ele não hesita.

A porta do carro é aberta, e ele a coloca no banco de trás com cuidado. Um alívio breve toma conta de sua mente cansada, mas logo o terror retorna. Antes que o homem fechasse a porta, a figura que a perseguia surgiu das sombras. Num movimento brutal, ele a puxa para fora com uma força descomunal. Ela grita, mas o som é abafado pela noite fria e pela dor que toma conta de seu corpo.

— Não!

Ela acorda com um grito preso na garganta, o corpo banhado em suor. O quarto está mergulhado na penumbra, mas a segurança do lugar não alivia o pânico que ainda faz seu coração bater rápido. O pesadelo era sempre o mesmo, repetido tantas vezes que quase parecia real. Porém, o que ela não sabia era que, no fundo de sua mente, aquilo não era apenas um pesadelo. Era uma memória esquecida. Uma verdade enterrada nas sombras do passado, esperando para ser revelada.

Capítulo 01 - Correntes Invisíveis

Nova York, um ano antes…

Kyera Winter entrou na sala e viu sua tia Siena à beira de um colapso. Sentada no sofá, com os olhos perdidos no vazio e um copo de vinho pela metade na mão, ela parecia mais uma pintura de sofrimento do que uma pessoa real. Siena não notou a presença de Kyera, e o silêncio no ambiente era tão pesado que Kyera precisou respirar fundo antes de se aproximar.

— Tia Siena? A senhora está bem? – perguntou Kyera, cautelosa, quebrando o silêncio sufocante.

Siena se virou lentamente, e a dor em seu rosto deu lugar à surpresa. Seus olhos vermelhos e inchados a encararam, confusos, como se estivesse decidindo se ficava feliz ou irritada com a presença de Kyera. O coração de Kyera acelerou, mesmo sem saber o motivo de tanto abalo.

— Kyera, querida, você não deveria estar no trabalho? – murmurou Siena, a voz carregada de tristeza e frustração.

— O Phill decidiu fechar mais cedo hoje – respondeu Kyera, sem entender o que estava acontecendo. – Tia, o que está acontecendo? Por que você está assim?

Siena hesitou por um instante, até soltar um longo suspiro. A voz dela tremeu ao falar:

— Eu não consigo mais manter isso em segredo. – Lágrimas começaram a rolar por seu rosto. – Sua mãe, Kyera... Ela se foi.

As palavras atingiram Kyera como um soco no estômago. Ela mal conseguia acreditar no que estava ouvindo. A última vez que vira sua mãe, era apenas uma criança. Desde que se mudara para Nova York com sua tia, nunca mais tivera notícias de sua mãe ou de qualquer outro parente de Lone Ridge. Crescera sem contato, mas sempre esperou por um reencontro, por respostas que explicassem por que foi abandonada.

— Como assim, minha mãe se foi? – A voz de Kyera falhou, ainda incapaz de processar o que havia acabado de ouvir.

Siena assentiu devagar, as lágrimas escorrendo.

— Ela faleceu de câncer há dois meses, no hospital de Lone Ridge. Sofreu muito, e o tratamento não deu resultado. – explicou Siena, dando um pequeno gole no vinho antes de encarar Kyera com tristeza. – Mas saiba que, mesmo à distância, ela te amava muito. Ela lamentou profundamente não ter visto você durante todos esses anos.

Aquelas palavras martelaram na mente de Kyera. Dois meses. Dois meses e ela só estava sabendo agora?

— Minha mãe faleceu há dois meses e ninguém me contou? – A indignação explodiu dentro dela, junto com uma necessidade urgente de entender. – Por que você não me contou antes, tia?

O grito de Kyera encheu o ar, ecoando suas frustrações. Lágrimas quentes começaram a rolar por seu rosto. Siena parecia prestes a desmoronar.

— Kyera, não é tão simples assim. Havia razões, boas razões. – tentou justificar Siena, com a voz falhando miseravelmente.

Mas Kyera não conseguia mais controlar sua raiva. Tudo aquilo parecia uma injustiça esmagadora.

— Boas razões? Como você pode dizer isso? – Kyera afastou-se, magoada. – Minha mãe estava doente, faleceu, e ninguém me disse nada. O que foi que eu fiz para merecer esse silêncio? Por que todos me deixaram no escuro?

Siena se levantou e foi até Kyera. Seu rosto estava tão vermelho que Kyera não sabia dizer se era por raiva ou pelo efeito do vinho.

— Querida, sinto muito! Eu queria ter contado, mas só soube quando já era tarde demais. Quando ela ficou doente, já não havia mais o que fazer – disse Siena, passando a mão pelo rosto de Kyera.

— Eu poderia ter ido vê-la. – sussurrou Kyera, as lágrimas sufocando sua voz. – Eu mal me lembro do rosto dela, mas eu a amava.

— Eu sei, querida, eu sei. – respondeu Siena, abraçando Kyera como nunca fizera antes. Siena sempre foi excêntrica, divertida, mas Kyera nunca a vira chorar daquele jeito. Nunca a vira expressar tanto sentimento, exceto através de suas telas.

— Preciso ir até lá! – disse Kyera de repente, afastando-se. – Quero visitar o túmulo da minha mãe.

Siena franziu a testa, encarando Kyera com seus grandes olhos verdes, iguais aos dela.

— O que você disse?

— Eu disse que vou visitar o túmulo da minha mãe.

A expressão de Siena se transformou. Algo sombrio tomou conta do seu rosto.

— Você não vai!

— O quê? Claro que vou! Tenho o direito de saber mais sobre minha mãe, de visitar o túmulo dela.

De repente, Siena soltou um rosnado que fez Kyera recuar. Ela agarrou os braços de Kyera com força, sacudindo-a.

— Você não vai, Kyera! Eu proíbo você de ir à Lone Ridge! – gritou Siena, com uma mistura de medo e raiva nos olhos. – Você não faz ideia do que aconteceu, dos problemas que cercaram sua mãe, do motivo pelo qual ela te mandou para cá!

As lágrimas que Kyera tentava conter começaram a escorrer livremente. Ela não entendia o que sua tia estava tentando esconder.

— O que a senhora está escondendo de mim? Eu tenho o direito de saber!

Siena soltou um suspiro, mas não cedeu.

— Você está proibida de ir ao Texas, Kyera. Não resolverá nada você ir até lá. Sua mãe não queria que você fosse – disse Siena, soltando-a e afastando-se lentamente. – Respeite o desejo dela e fique longe daquela cidade. Faça jus ao sacrifício de Sara.

Os olhares delas se cruzaram em um confronto silencioso, até que Siena se virou abruptamente e saiu do apartamento, deixando Kyera sozinha com um turbilhão de emoções. Kyera precisava de respostas, precisava entender de que sacrifício sua tia falava e por que ela estava agindo daquela maneira. Mas, naquele momento, tudo o que sentia era a dor e a injustiça queimando dentro de si.

Capítulo 02 - Segredos na Pele

Nova York, dias atuais…

Kyera se levantou da cama, ainda com os resquícios do pesadelo que a atormentava desde a infância, quando chegou a Nova York para viver com sua tia, Siena Winter. Ela esticou os braços para aliviar a tensão e passou os dedos pelos cabelos de um tom vibrante de cobre, enquanto tentava afastar as imagens sombrias que rondavam sua mente. O relógio marcava quase meio-dia, e o ronco de seu estômago a lembrou de que precisava se alimentar. Cozinhar não estava nos planos daquele dia.

Movendo-se pelo apartamento espaçoso que herdara de Siena após sua morte trágica em um acidente de carro, Kyera afastou as cortinas pesadas da janela do quarto, revelando a paisagem grandiosa de Nova York, com suas pontes e arranha-céus imponentes. O céu nublado indicava a iminente chegada de mais chuva, intensificando a atmosfera melancólica típica do inverno.

Ela pensou com carinho em sua tia extravagante. Siena, a única mulher da família Winter que escolheu uma vida de solteira, longe do interior do Texas, onde suas irmãs permaneciam com seus maridos. Siena trocara a vida rural pela arte, vivendo como pintora em Nova York. Embora não fosse famosa, conseguiu uma vida confortável com a venda de seus quadros. Mais que excêntrica, Siena era uma alma livre e criativa.

Kyera suspirou, afastando-se da janela, e foi até o banheiro. Ao levantar os braços para tirar a camisa que usava como pijama, observou a longa cicatriz que marcava o interior de seu antebraço, uma lembrança que ela nunca conseguiu entender. A cicatriz, que ia desde perto da axila até o cotovelo, era um mistério. Nem mesmo sua tia soube explicar, alegando que Kyera já chegou em sua casa com aquela marca, provavelmente fruto de alguma travessura, já que ela era uma criança agitada.

O mais estranho, no entanto, era o desconforto persistente que aquela cicatriz lhe causava, como se escondesse um segredo importante, enterrado nas profundezas de sua mente, que ela temia desvendar.

Deixando esses pensamentos de lado, Kyera entrou no chuveiro. A água quente trouxe um alívio imediato, relaxando seu corpo tenso. Após um tempo sob a ducha, ela saiu, vestiu jeans, uma camisa de manga longa e uma jaqueta. Calçando seus tênis na porta do apartamento, saiu em direção ao seu restaurante favorito, a poucas quadras de distância.

O almoço foi um momento de paz, enquanto ela apreciava a comida e o silêncio. Depois, visitou uma livraria, e os livros que comprou a deixaram animada. A leitura sempre foi uma de suas paixões, uma fuga para mundos imaginários que a ajudavam a esquecer os desafios do dia a dia. Além disso, correr em alta velocidade também era algo que a fascinava, e foi essa paixão que a levou a aprender a pilotar e a comprar uma motocicleta.

De volta ao apartamento, Kyera se aconchegou entre almofadas no sofá e se perdeu em seus filmes favoritos. As horas passaram tão rápido que mal percebeu que era quase hora de ir para o trabalho como bartender em uma casa noturna. Ela se vestiu rapidamente, prendeu os cabelos em um rabo de cavalo alto e saiu. Lá fora, a cidade já estava iluminada, pronta para a vida noturna de Nova York.

Ao descer até o saguão do prédio, os saltos de suas botas ecoaram pelo chão, chamando a atenção de algumas pessoas no hall de entrada. Entre elas, Stephan, o porteiro noturno e um amigo de longa data.

— Boa noite, senhorita Winter. – cumprimentou Stephan com um sorriso simpático e um leve aceno de cabeça.

— Boa noite, Stephan. – Kyera respondeu, devolvendo o sorriso. – Como está sua esposa?

Stephan sorriu, grato.

— Ela está muito bem, graças a você. Obrigado por tudo.

Kyera encolheu os ombros, modesta em relação ao que havia feito. Algumas noites antes, ela havia presenciado a esposa de Stephan ser atacada por um assaltante nas proximidades do prédio. Usando suas habilidades em Krav Maga, Kyera interveio rapidamente, derrubando o agressor, que foi preso logo em seguida. Embora a mulher de Stephan tenha sofrido ferimentos leves, ela agora se recuperava bem.

— Não foi nada, Stephan. Só fiz o que era certo. – disse Kyera com humildade. – Diga a Patrícia que mandei lembranças, e se precisarem de algo, sabem onde me encontrar.

— Muito obrigado, senhorita Winter. A senhora é muito gentil. – disse Stephan, com um sorriso. – Tenha uma boa noite.

Kyera assentiu e acenou para o porteiro antes de seguir para a garagem do prédio, onde sua motocicleta estava estacionada. Assim que saiu, foi recebida pelo caos típico das avenidas de Manhattan durante a hora do rush. As ruas estavam repletas de carros, enquanto pessoas se movimentavam apressadamente, algumas buscando relaxamento e diversão após um longo dia de trabalho, outras ansiando pelo conforto de casa. E, como ela, havia aqueles que apenas começavam sua jornada de trabalho.

Ela acelerou a moto, sentindo a adrenalina e a liberdade ao cortar o trânsito denso com agilidade. Logo chegaria ao seu destino, onde permaneceria até quase o amanhecer.

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