Tudo que Eu Precisava Era Você
A FUGA
Camila
mãe eu não aguento mais
Camila
todos os dias ele me bate fala que vai me matar
Camila
O pior não é nem ele e sim os traficantes do Miguel e o agiota do pai
Josefina
Eu sei filha mais não é culpa do seu pai nem do Miguel
Josefina
O seu pai foi enganado
Josefina
E o seu irmão foi manipulado pelo Henrique
Camila
eu sei mais eu não posso mais ir deitar a saber que pode ser a última noite
Camila
vou encontrar uma maneira de tirar a nossa família desse inferno
Josefina
não faça isso Camila o Matias não vai gostar disso
Josefina
sabe que se, o Matias achar-te
você provavelmente vai morrer filha
Camila
ele não vai-me achar aqui, eu vou para o Brasil
Camila
Quando eu conseguir passar na emigração eu volto para buscar vocês
um despertador começa a tocar indicando a hora 15:30
Camila
eu tenho que ir mãe, o Matias está prestes a chegar
Camila andava com muita pressa, pois sabia que se não estivesse em casa seria espancada
já em casa Camila não perde tempo e começa a cozinhar uma refeição para Matias que chegaria às 16:00
Matias
CAMILA VEM AQUI AGORA
Camila
oi meu amor o que aconteceu
Matias
JÁ FEZ A MINHA JANTA
Camila
sim, já vou-lhe servir
Matias
SENTA AI E FICA QUIETA
Camila já sabia que não poderia desobedecer o Matias então ela se senta e em silêncio ela observa o Matias comer
A casa estava mergulhada em um
silêncio estranho, o tipo de silêncio que gritava tensões não ditas.
Camila recolhia os pratos da mesa
enquanto sentia os olhos de Matias
cravados nas suas costas.
O cheiro do frango assado ainda pairava no ar, mas o ambiente parecia sufocante.
Camila
Esfriou rápido, não é?
- Ela comentou, tentando soar casual.
Matias não respondeu. Apenas empurrou a cadeira traz com um rangido e ficou em pé, pegando um copo de vinho pela metade.
Camila sentiu o seu coração acelerar. Sabia que o
silêncio dele era um prelúdio, um aviso que algo
estava por vir.
Matias
Você não acha que exagerou no sal hoje?
- Ele finalmente disse, a voz baixa, mas carregada de desdém.
Camila congelou por um segundo antes de se virar.
Camila
Eu... posso tentar melhorar amanhã.
Camila
talvez tenha sido o caldo de legumes...
Matias
sempre com uma desculpa não é?
— matias interrompeu, dando um passo à frente. Ele balançou a cabeça, o copo ainda na mão.
Matias
Não sei como consegue errar algo tam. simples, Camila
Ela engoliu em seco, sentindo o calor subir pelo rosto.
Camila
Eu sinto muito. Não era minha intenção...
antes que pudesse terminar, ele arremessou o copo contra a parede.
O som vidro se estilhaçando reverberou pela cozinha como um tiro.
Camila deu um salto para trás, as mãos instintivamente subindo para proteger o rosto.
Matias
NÃO ERA SUA INTENÇÃO?! SEMPRE É ASSIM COM VOCÊ!
— ele gritou, os passos largos se aproximando dela.
Camila
Por favor, Matias...
— ela tentou recuar, mas sentiu as costas baterem contra a pia. Não havia mais para aonde ir.
Ele agarrou seu braço com força, os dedos Pressionando a sua pele eram como garras.
Matias
VOCÊ ACHA QUE ISSO É UMA BRINCADEIRA?
Matias
QUE EU VOU ATURAR SUA INCOMPETÊNCIA PARA SEMPRE?
Camila mordeu o lábio para não gritar de dor. suas mãos temiam enquanto tentava se soltar,
mas ele a segurava firme, o rosto tão próximo do dela que ela podia sentir o cheiro do álcool em sua respiração.
Camila
Eu... eu não vou errar de novo, prometo.
Camila
só me solta, por favor...
sua voz saiu trêmula, quase um sussurro
Por um momento, ele a encarou, o rosto contorcido de raiva. Então, de repente, a soltou com um empurrão que a fez tropeçar.
Matias
Vai limpar essa bagunça
— ele disse, apontando para os cacos de vidro no chão.
Matias
E da próxima vez, tenta fazer algo direto.
Camila ficou imóvel, com as pernas Tremulas. Ela observou enquanto ele saía da cozinha, pegando a garrafa de vinho na mesa antes de Desaparecer no corredor. Só é então permitiu porque as lágrimas escorrem silenciosamente por seu rosto.
Ela se abaixou para recolher os cacos, Cada Fragmento refletindo Um pedaço Da vida que sentia Estar despedaçando, mas a cada dia.
Camila A ajoelhou-se no chão frio da cozinha, Seus dedos tremendos Enquanto Recolhia cuidadosamente os cacos do copo quebrado.
Cada o fragmento Parecia ecoar A Fragilidade da sua própria vida. Sua respiração estava Pesada, irregular, Mas ela tentou manter o Controle.
Choros poderiam ser ouvidos, mas não agora. Não enquanto ela ainda estivesse em casa.
O som distante da TV sendo ligado na sala era um alívio temporário. Ela sabia que, por ora, matias estava distraído. mesmo assim, o medo permanecia, latejante como um coração acelerado.
um pequeno corte abri-se em seu dedo enquanto pegava um pedaço mais afiada do vidro. Ela arfou baixinho, observando uma gota de sangue formar-se na ponta do dedo.
Camila
( Não faz barulho )
Camila
( Não de a Ele mais razões )
terminando de limpar o chão, ela jogou os cacos no lixo e pressionou o dedo contra um guardanapo. Encostou-se na pia é respirou fundo, Tentando acalmar o Turbilhão em sua mente.
Sentia-se é encurralada, como o animal preso em sua jaula Que parecia encolher a cada dia.
No bolso da calça, o telefone vibrou. um único toque, Disgrato mais o suficiente para acelerar seu coração novamente.
Ela tirou o celular devagar, com os olhos fixos na entrada da cozinha, Certificando-se de que matias não estivesse por perto.
Era uma mensagem de clara, sua amiga de infância.
clara
* Você está bem? A oferta ainda está de pé. quando quiser sair daí, me avise. posso te buscar. *
Camila encarou a tela por um longo tempo. Clara sabia o que estava a acontecer, ou pelo menos desconfiava.
Mas Camila nunca teve coragem de aceitar ajuda. O Medo de fracassar, de ser descoberta, a paralisação.
De repente, um barulho alto veio da sala. Uma garrafa sendo derrubada no chão.
— a voz de Matias ecoou, carregada de irritação.
Ela guardou o celular no bolso rapidamente, o coração disparando.
Respondeu, com a voz um pouco mais alta do que pretendia.
Enquanto caminhava para a sala, uma ideia passou por sua mente. Talvez hoje fosse diferente. Talvez hoje ela finalmente aceitasse a ajuda que Clara oferecia.
Camila encontrou Matias esparramado no sofá, a garrafa vazia ao lado. Ele gesticulava com impaciência para a TV.
Matias
Esse controle não funciona. Traga outro
ordenou, sem nem olhar para ela.
Ela o observou por um instante, os olhos fixos na figura que um dia havia prometido protegê-la.
Tudo o que sentia agora era um vazio esmagador, misturado a uma faísca de determinação que ela mal reconhecia.
respondeu, girando nos calcanhares em direção ao quarto.
Ao entrar, fechou a porta e Encostou-se nela, tirando o celular novamente. Com os dedos trémulos, digitou:
Camila
* Clara, venha-me buscar. Hoje *
Ela hesitou por um momento, mas antes que pudesse mudar de ideia, apertou enviar.
Era um pequeno passo, mas um passo que sentia como um grito contra o silêncio que a sufocava.
Camila esperou até a casa ficar mergulhada no silêncio profundo do sono de Matias.
O som dos roncos vindo da sala a tranquilizou o suficiente para começar seus preparativos.
Com a lanterna do celular iluminando o quarto escuro, ela abriu uma pequena mala que havia escondido no armário meses atrás.
dentro, colocou algumas roupas, uma escova de cabelo, o pouco dinheiro que conseguirá esconder, e o documento que Clara havia conseguido para ela:
um passaporte falso com um nome que soava estranho em sua boca, mas que agora era sua única identidade.
Olhou ao redor do quarto uma última vez. As paredes abafavam o peso de tantas memórias, boas e ruins, mas Camila sabia que, se não partisse agora, não haveria mais oportunidades.
Quando saiu de casa, o frio da madrugada a envolveu. Ela andou rápido até o final da rua, onde Clara esperava em um carro pequeno, com os faróis apagados.
- Camila sussurrou ao entrar no carro, a voz embargada pela emoção.
Clara sorriu, apertando sua mão por um breve momento antes de pisar no acelerador.
clara
Nunca duvidei que você me chamaria um dia.
O plano era simples, mas arriscado: dirigir até a fronteira entre o Uruguai e o Brasil em Santana do livramento, onde Clara conhecia um contanto que podia facilitar a passagem.
O caminho pela estrada deserta era longo, mas elas mal falavam. Camila ficava a alternar entre olhar para trás, como se esperasse ver os faróis do carro de Matias,
E encarar a estrada à frente, onde a liberdade parecia tão próxima e tão distante ao mesmo tempo.
Camila
Eles são rigorosos na fronteira?
Perguntou Camila, quebrando o silêncio.
Clara hesitou antes de responder.
clara
Depende. Por sorte, o Marcelo está de plantão hoje.
clara
Ele costuma ajudar gente que precisa, mas... tem um preço.
— Camila perguntou, mesmo sabendo que mal tinha o suficiente.
Clara não respondeu imediatamente, desviando os olhos para o retrovisor.
clara
Ele não cobra só dinheiro. Às vezes quer favores... Mas eu já resolvi isso.
clara
Só precisamos chegar lá.
já era quase amanhecer quando o carro parou próximo a uma pequena estrada de terra, longe da movimentada rua principal.
Elas caminharam até um pequeno posto improvisado, onde Marcelo, um homem de meia-idade com um cigarro pendendo dos lábios, as esperava encostado em uma camionete.
Marcelo
Então, essa é a amiga desesperada?
- ele disse, olhando Camila de cima a baixo.
Camila tentou não recuar, sentindo os olhos dele analisarem cada detalhe.
clara
Você vai ajudar ou não?
Marcelo deu uma risada baixa e apagou o cigarro na sola do sapato.
Marcelo
Ajudo. mas ela tem que saber que, se for pega do lado de lá,
Marcelo
não sabe meu nome. e você, Clara, me deve outra.
Camila assentiu, a sua garganta seca demais para formar palavras.
Marcelo
Ótimo. Subam na camionete.
O trajeto pela estrada de terra foi curto, mas cada minuto parecia eterno.
Quando Marcelo parou o carro perto de um cerca baixa, ele gesticulou para que Camila descesse.
Marcelo
Está vendo aquela trilha ali?
Ele apontou para um caminho estreito entre as árvores.
Marcelo
É só seguir direto.
Marcelo
A fronteira não tem fiscalização por aqui.
Marcelo
Quando atravessar, continue andando até chegar na cidade.
Marcelo
Santana do livramento é segura o suficiente para você se misturar.
Camila assentiu novamente, sentindo uma mistura de alívio e terror.
disse Clara, abraçando-a rapidamente.
Camila queria acreditar, mas as palavras de Clara eram um eco distante enquanto ela caminhava pela trilha.
Cada passo parecia mais pesado, e o silêncio da floresta ao redor era quebrado apenas pelo som dos seus próprios sapatos sobre as folhas secas.
Quando finalmente imergiu na estrada do outro lado, a luz do sol nascente banhou o seu rosto.
Ela estava no Brasil. Um alívio quase insuportável tomou conta do seu corpo, mas ela não podia parar agora. Ainda precisava encontrar um lugar seguro.
E assim. Camila deu os primeiros passos para uma nova vida, com a promessa silenciosa de que nunca mais deixaria ninguém controlar a sua liberdade.
ações
• falando em espanhol •
* mensagens *
[ localização]
~ sussurro ~
{ pensamento}
novo começo em Santana da do livramento
O céu estava tingido de dourado e rosa quando Camila chegou à periferia de Santana do livramento. A cidade, que compartilhava uma linha invisível com Rivera, no Uruguai, parecia pacata à primeira vista.
Ela sabia que aqui as línguas e culturas se misturavam, e isso a ajudava a se camuflar.
Camila puxou o casaco contra o corpo enquanto caminhava por uma rua estreita. O peso da mala na sua mão esquerda a lembrava de que tudo o que restava da sua antiga vida estava ali.
Com passos hesitantes, ela encontrou um pequeno café que começava a abrir as portas.
Camila
• posso usar o banheiro? •
Perguntou à atendente, uma senhora de cabelos grisalhos que limpava as mesas.
A mulher olho-a por um instante, avaliando-a com curiosidade, mas fez um gesto para o fundo do local. Camila entrou, trancando-se No pequeno espaço.
Ela olhou para o próprio reflexo no espelho: Os olhos estavam fundos, os cabelos bagunçados. O corte no dedo da noite anterior Ainda latejava.
Camila
{ você está aqui. você conseguiu. }
No entanto, ela sabia que há fuga era apenas o começo. Precisava deu um plano. Clara Havia mencionado um Abrigo na cidade que ajudava mulheres em situações Difíceis, mas não tinha dado detalhes.
Camila decidiu enviar uma mensagem rápida:
Camila
* cheguei. Preciso de um endereço. *
Camila
* obrigada por tudo. *
Camila
Enquanto aguardava a resposta, voltou ao salão do café. A mesma senhora Estava no balcão. Preparando um bule de café.
Luna
Perguntou, casualmente, com o sotaque português carregando um leve tom de espanhol.
Camila hesitou, mas sorriu com nervosismo.
Camila
• sim, só de passagem. •
Luna
• hum.Parecee cansada.Quer um café? •
Camila assentiu. Agradecendo baixinho. Enquanto a bebida quente aquecia as suas mãos, o telefone vibrou. Era Clara.
clara
* rua Osvaldo aranha, número 37.
clara
* pergunte por dona Teresa. Boa sorte *
O nome parecia familiar. Clara Já havia mencionado Teresa antes. Uma mulher que administrava uma casa de apoio para mulheres Em situações vulneráveis.
Camila sentiu uma faísca de esperança enquanto digitava o endereço no GPS do celular.
Ficava há alguns Quilómetros dali.
Quando Camila chegou ao endereço, encontrou uma casa simples. Mais acolhedora, com paredes amarelas e um pequeno jardim na frente.
Havia crianças brincando no quintal e uma jovem mulher Estendendo roupas no varal.
Ela hesitou antes debater na porta. Quando esta se abriu, Foi recebida pôr uma mulher robusta, com cabelos curtos e olhos que pareciam enxergar além das Aparências.
Teresa
• Você deve ser Camila •
Disse a mulher com um leve sorriso.
Teresa
• Eu sou Teresa. Pode entrar. •
Camila assentiu, surpresa, e seguiu a mulher para dentro.
Teresa não fez perguntas imediatas. Deixou Camila sentar-se em uma protona surrada Enquanto trazia o copo de água.
Apenas quando Camila começou a relaxar, Teresa puxou uma cadeira e Sentou-se a sua frente.
Teresa
• Clara Me avisou que você precisava de ajuda. •
Teresa
• Quer me contar a sua história? •
Por um momento, Camila sentiu-se congelada. As palavras pareciam pesadas demais para serem ditas.
Mas quando começou, a confissão fluiu como uma represa rompida. Contou sobre Matias, as ameaças, a violência, a fuga.
Teresa ouviu em silêncio, os olhos fixos, mas gentis.
Teresa
• você fez bem em sair •
Teresa
• Mas saiba que começar de novo não será fácil. •
Teresa
• Matias pode tentar te encontrar. •
Teresa
• você está pronta para lutar por sua liberdade? •
Camila engoliu em seco. Pela primeira vez em muito tempo, sentiu que havia alguém ao seu lado.
Camila
• Estou pronta. Só não sei como •
Teresa
• Vamos te ajudar. •
Teresa
• Aqui, você pode ficar segura. •
Teresa
• Mas precisamos planejar seus próximos passos. •
Nos dias seguintes. Camila começou a se adaptar ao abrigo. Participava das tarefas diárias, ajudava outras mulheres e, gradualmente, começava a recuperar o senso de controle sobre a sua vida.
Teresa apresentou-a a um advogado local que trabalhava com casos de violência doméstica, ajudando-a entender os seus direitos no Brasil e o que poderia ser feito para protegê-la.
Apesar disso, o medo de Matias ainda pairava. Camila sabia que, se ele descobrisse onde ela estava, não desistiria facilmente.
Teresa
• Você precisa pensar num trabalho. •
Teresa
• algo que lhe dê independência. •
sugeriu Teresa uma tarde.
Teresa
• conheço uma fábrica de confeção que está a contratar. •
Teresa
• Pode ser um bom começo. •
Camila aceitou a sugestão. O trabalho era simples, costurando roupas, mas deu a ela uma sensação de normalidade que há muito não sentia.
Certa manhã, ao sair da fábrica, sentiu o coração disparar ao ver um carro estacionado do outro lado da rua.
Não era o de Matias, mas o susto a fez perceber que, apesar de estar no Brasil, sua liberdade ainda era frágil.
No entanto, Camila decidiu algo importante naquele momento:
não seria mais vítima de seu
------ ------- -------- ----------- -- -------- passado
--------------
A garrafa de vinho rolou pelo chão, batendo contra a perna do sofá antes de parar.
Matias olhava para o teto, os olhos semicerrados e enevoados pelo álcool.
O cheiro do frango assado ainda estava na sala, mas o silêncio na casa parecia diferente naquela manhã.
Ele levantou a cabeça, o desconforto crescente se transformando em irritação.
Chamou, com a voz rouca. Não houve resposta.
Cambaleou até o quarto, chutando a porta aberta. Estava vazio. A cama arrumada, o armário entreaberto. Ele notou a falta de algo:
A mala pequena que Camila sempre guardava no canto inferior do guarda-roupa.
O vazio da casa se tornou pesado. Ela tinha ido embora.
Matias respirou fundo, Tentando controlar o Turbilhão em sua cabeça. No início, riu amargamente, como se fosse uma piada de mau gosto. Mas então a raiva começou a crescer, queimando seu peito.
Matias
Você acha que pode simplesmente me deixar?
murmurou, os punhos cerrados.
Ele pegou o celular na mesa da cabeceira e começou a ligar para ela. Nenhuma resposta. Tentou de novo, e de novo, até a voz monótona da secretária eletrônica ser tudo o que ouvia.
Matias
É isso que você quer, Camila? me provocar?
Matias dirigiu até a casa de Clara naquela tarde. Ele sabia que a mulher era a única pessoa que Camila confiava o suficiente para pedir ajuda.
Bateu na porta com força, os nós dos dedos quase rasgando a madeira.
Quando Clara abriu, o seu rosto endureceu ao vê-lo.
clara
O que você quer, Matias?
Ele perguntou, direto, os olhos ardendo.
clara
Não faço ideia do que você está a falar.
Matias deu um passo à frente, obrigando-a a recuar.
Matias
Não minta para mim.
Matias
Sei que você ajudou.
Matias
Camila não teria coragem de fugir sozinha.
Clara tentou manter a compostura, mas ele notou a tensão no seu rosto.
clara
Mesmo que eu soubesse onde ela está, não diria.
clara
Chega de controlar a Vida dela, Matias.
Ele riu, mas era um som frio, vazio.
Matias
Não se meta nisso. Clara.
Matias
Se eu descobrir que você ajudou, vai se arrepender.
Antes que ela pudesse responder, Matias girou nos calcanhares e saiu. Não precisava de Clara para saber para onde Camila tinha ido.
Ele conhecia as histórias que ela contava sobre Santana do livramento, sobre o sonho de cruzar a fronteira e Desaparecer.
No dia seguinte, Matias estava estacionado numa rua movimentada de Rivera, observando as pessoas que cruzavam a fronteira a pé.
Era um ponto conhecido por ser menos vigiado, um lugar onde quem queria escapar fazia suas apostas.
Ele ficou ali por horas, mas não viu sinal de Camila. Ligou para alguns conhecidos, incluindo um amigo que trabalhava na alfândega.
Matias
Qualquer mulher cruzando sozinha pela fronteira te chamou a atenção?
perguntou, tentando soar casual.
Eduardo
Nada fora do comum, cara.
Eduardo
Mas se souber de algo, te a aviso.
Mas Matias não era de esperar por informações. Ele começou a circular pela cidade, perguntando discretamente em hotéis baratos e pousadas.
Era como caçar uma sombra; frustrante, mas ele estava determinado. Camila não podia simplesmente evaporar.
Dias depois, Matias conseguiu uma pista. Um funcionário de um posto de gasolina mencionou ter visto uma mulher com as características de Camila entrando num carro de madrugada. O carro combinava com o que Clara dirigia.
Isso o levou até Santana do livramento. Ele começou a visitar pequenos cafés e lojas, perguntando discretamente sobre uma mulher com o sotaque uruguaio.
A resposta era sempre a mesma: ninguém sabia de nada.
Mas Matias não desistiria. Na sua mente, a fuga de Camila não era apenas uma afronta; era uma traição pessoal. Para ele, ela era sua propriedade, alguém que devia obediência e submissão.
Sentado em um banco da praça central, ele observava as pessoas passarem.
Matias
{ Ela está aqui, em algum lugar. }
Matias
{ E quando eu encontrar, vou fazê-la pagar por isso. }
Ele ouviu falar de um abrigo local que ajudava mulheres. Teresa. O nome foi mencionado em uma conversa ao acaso entre dois taxistas. Matias guardou o nome como uma arma pronta para ser usada.
Matias
{ Vamos ver quanto tempo você consegue se esconder, Camila. }
DIFICULDADES DO DIA A DIA
No interior abafado de um pequeno apartamento no centro de Santana do Livramento, Tiago, um homem de 30 anos, está parado à porta, segurando um envelope amassado com as mãos trêmulas.
Era um notificação oficial que o obrigava a resolver um problema urgente na prefeitura. Ele adiará o quanto pôde, mas o prazo acabou.
Agora, ele precisa sair, enfrentar o mundo lá fora, um mundo que ele evitou por anos.
O som distante de motos cruzando a Avenida Tamandaré e o latido dos cães de rua invade o silêncio do apartamento, trazendo consigo a ansiedade.
Tiago respira fundo, apoiando-se no batente da porta como se precisasse de força física para dar o próximo passo.
Sua mente está em Turbilhão:
Tiago
{ E se alguém falar comigo? E se me olharem? }
Após minutos que pareciam horas, ele veste uma jaqueta surrada e coloca um boné, abaixando a aba o máximo possível para esconder o rosto.
Ele abre a porta com um rangido hesitante e sai. O ar fresco da manhã fria de Santana do Livramento o atinge como uma bofetada.
O cheiro de asfalto molhado e o vento carregado de umidade o deixam mais alerta, mas também mais desconfortável.
Ele ajeita a jaqueta, tentando se proteger não só do frio, mas da exposição.
Ao caminhar pelas ruas de paralelepípedos, ele mantém o olhar fixo no chão, desviando de pessoas que conversam em português e espanhol, as suas vozes ecoando como um zumbido na mente dele.
As fachadas coloridas dos prédios históricos passam como borrões. Ele tenta ignorar os carros que passam lentamente e as pessoas que o encaram por breves segundos.
A sensação de ser observado é insuportável, mesmo que ele saiba, racionalmente, que ninguém está a prestar atenção nele.
Chegando à fila da prefeitura, a sua respiração se acelera. As pessoas ao redor parecem ocupar todo o espaço.
Ele sente os ombros se comprimirem e o coração martelar contra o peito.
Ele encontra um canto afastado para esperar, mas mesmo ali, o barulho de conversas, passos e portas se abrindo e fechando é ensurdecedor. A sua cabeça dói.
Tiago
{Só isso. Eu resolvo isso e volto para casa.
Repete como um mantra, tentando ignorar o suor frio que desce pela nuca, apesar do clima gelado.
Quando chega a sua vez, ele mal consegue articular as palavras. A voz sai baixa e hesitante, as suas mãos apertando o envelope como se fosse um escudo.
O atendente parece impaciente, mas Tiago não tem coragem de encará-lo diretamente.
Depois do que parece uma eternidade, ele sai da repartição com os papéis resolvidos, o peito ainda pesado.
O alívio só chega quando ele cruza novamente a porta do seu apartamento, se joga no sofá e fecha os olhos, tentando esquecer o mundo que deixou lá fora.
Tiago permaneceu deitado no sofá, imóvel, enquanto o silêncio de seu pequeno apartamento lentamente tomava o lugar da cacofonia da rua que ainda ecoava em sua mente.
Ele não ligava a TV, não abria o celular. Tudo parecia uma ameaça à sua frágil sensação de alívio.
Seu corpo estava exausto, como se tivesse corrido uma maratona, mesmo que tudo o que tivesse feito fosse sair e voltar.
Minutos passaram. Talvez horas. O envelope com os papéis que ele trouxera da prefeitura ainda estava ao lado dele, intacto, como um troféu de uma batalha que ele não desejava lutar.
Olhando para ele, Tiago sentiu um misto de alívio e arrependimento.
Tiago
{ Será que fiz tudo certo? }
Tiago
{ E se esqueci alguma coisa? }
Sua mente ansiosa começando a girar de novo.
Levantando-se devagar, ele caminhou até a cozinha, onde uma xícara suja ainda estava sobre a pia. Ele a lavou sem pensar, distraído, enquanto olhava pela janela.
Do outro lado, um pedaço da cidade ainda se movia. Crianças jogando bola em um beco próximo, e uma senhora conversava com alguém do outro lado da calçada.
Tudo parecia tão natural para elas.
Tiago
{ Como conseguem fazer isso todos os dias? }
Mesmo com a porta trancada, a sensação de vulnerabilidade persistia. Era como se a cidade tivesse invadido sua mente, trazendo de volta todas aquelas vozes e olhares que ele tentou evitar.
Ele sabia que precisava descansar, mas a inquietação o mantinha preso.
Tiago sentou-se na mesa com sua velha caderneta, um refúgio de pensamentos que ele mantinha há anos. Com uma caneta que falhava nas bordas das palavras, ele começou a escrever:
Tiago
Sai hoje. Não foi fácil.
Tiago
A fila era longa, e o mundo parecia grande demais.
Tiago
As pessoas falavam como se eu não existisse.
Tiago
Mas eu sentia cada olhar.
Tiago
Consegui. Resolvi o problema, mas o cansaço não some.
Tiago
Me pergunto se isso um dia vai mudar.
Tiago
Talvez não, mas, pelo menos, voltei para casa.
Fechou o caderno, soltando um longo suspiro. Talvez escrever fosse o único momento em que ele se sentia no controle.
O dia já escurecia, e Tiago olhou para o relógio.
Tiago
{ Mais um dia passou }
Amanhã seria outro dia, e ele faria de tudo para não precisar enfrentar o mundo novamente.
Por ora, ele permitiu que o silêncio da noite envolvesse seu pequeno universo. A solidão, ainda que pesada, parecia menos cruel do que o caos lá fora.
Naquela noite, exausto pelo esforço de ter saído, Tiago adormeceu cedo, afundado no sofá com um cobertor fino cobrindo o corpo.
Porém, o sono não trouxe paz.
Ele se viu de volta à sala de aula do ensino médio, com suas paredes amareladas e janelas altas que deixavam a luz entrar de forma dura e implacável.
Tiago estava sentado no fundo, como sempre fazia, tentando Desaparecer. Ao redor dele, os colegas riam, trocavam piadas e passavam bilhetes. Ele não fazia parte disso.
Rogério
Ei, Tiago! Tá vivo aí ou virou estátua?
uma voz ecoou pela sala. Era Rogério, o líder do grupo que adorava provocar. A turma riu alto. Tiago olhou para a mesa, sem responder, torcendo para que isso bastasse para o deixarem em paz.
Rogério
Fala alguma coisa, cara! Ou tá treinando pra ser invisível?
insistiu Rogério, aproximando-se de sua carteira. Tiago sentiu o rosto queimar.
Letícia
Deixa ele, Rogério
disse Letícia, a única colega que às vezes demonstrava compaixão. Mas isso só piorou.
Rogério
Ah, claro! O Tiago não fala com a gente, mas a Letícia pode defender ele.
Rogério
Tá apaixonada por ele, é isso?
Letícia
Não é isso, eu só… só acredito que você devia parar
Respondeu Letícia visivelmente Desconfortável. Tiago desejava que ela não tivesse falado nada.
Queria gritar para ela sair, mas sua garganta parecia trancada.
Rogério deu um passo para trás, mas antes de sair, olhou para Tiago com um sorriso Maldoso.
Rogério
Você devia agradecer a ela
Rogério
cara. É a Única que nota que você existe.
Rogério
Quando o professor entrou, tudo voltou ao normal, pelo menos para os outros. Mas para Tiago, a dor é a humilhação eram como um peso insuportável.
Rogério
Ele passou o resto da aula contando os minutos, evitando qualquer som que pudesse denunciá-lo.
A cena mudou abruptamente. Agora ele estava em casa, muitos anos atrás, na sala onde seus pais discutiam com uma fúria que parecia capaz de partir
Ele era apenas um garoto, sentado no canto com as mãos cobrindo os ouvidos, mas não havia como escapar das palavras que o cercavam.
eduarda
EU Não Sei O Que Fazer Com Ele!
gritou a sua mãe, desesperada.
eduarda
ELE NÃO FALA COM NINGUÉM, NÃO SAI DE CASA!
eduarda
ATÉ OS PROFESSORES DIZEM QUE ELE NÃO SE ESFORÇA.
eduarda
PARECE QUE ELE QUER DESAPARECER!
Rodolfo
Talvez ele precise de terapia, algum tipo de ajuda.
Respondeu o pai, mas sua voz era mais dura do que compreensiva.
Rodolfo
Ou talvez seja preguiça.
Rodolfo
Ele só fica naquele quarto, como se o mundo não existisse.
Tiago queria gritar que ele não era preguiçoso, que ele só não sabia como lidar com as pessoas, que tudo era demais para ele. Mas as palavras nunca saiam.
De repente, a mãe virou-se para ele, os olhos cheios de lágrimas e frustração.
eduarda
VOCÊ VAI ACABAR SOZINHO, TIAGO.
eduarda
SOZINHO E ESQUECIDO!
Ele acordou ofegante, o coração martelando no peito como se estivesse a correr. O apartamento estava escuro, e por um momento ele não sabia onde estava.
O sonho ainda parecia real, as palavras ecoando na sua cabeça.
Ele levantou-se e foi até o banheiro, lavando o rosto com água fria. No reflexo do espelho, viu um homem cansado, marcado pelas memórias que nunca o deixaram.
Você vai acabar sozinho, Tiago...
A frase ainda queimava, mas ele afastou-a com um longo suspiro. Pegou o caderno e escreveu:
Tiago
Hoje sonhei com eles.
Tiago
Parece que ainda estou preso lá, no passado.
Tiago
Queria esquecer, mas é como se eu carregasse isso comigo o tempo todo.
Tiago
Talvez minha mãe estivesse certa. Talvez...
Ele parou, deixando o pensamento incompleto.
Fechou o caderno, jogando-se no sofá mais uma vez. Lá fora, a noite parecia calma, mas dentro de Tiago, a tempestade nunca cessava.
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