Quando o celular vibrou pela terceira vez em cinco minutos, eu já sabia: Ryan Scott tinha alguma coisa em mente. E, por experiência, isso nunca era algo bom. Olhei para a tela e, como esperado, a mensagem era simples, direta e completamente frustrante: “Clara, meu escritório. Agora.”
Suspirei e passei a mão pelos cabelos, me preparando mentalmente para mais um dia de caos. Se alguém tivesse me dito que um simples emprego como assistente executiva acabaria me levando a negociar um contrato de casamento, eu teria rido. Rido muito. E provavelmente teria ignorado a oferta. Mas ali estava eu, com uma xícara de café quase fria e a sensação de que o mundo estava prestes a virar de cabeça para baixo.
— Está me escutando, Clara?
— Sim senhor. — Volto a olhar para meu chefe.
— E então? Aceita minha oferta?
— Desculpa senhor mas não vejo o porquê ter me escolhido.
— Você é a única que sabe tanto sobre mim, e prometo que será recompensada por seus esforços.
Engulo em seco e coloco a xícara na mesinha de centro, suspirando.
— Senhor... Eu não acho que eu seja apta para este tipo de função.
— Então prefere não dar conta das contas médicas da sua mãe.
Engulo em seco e cerro os punhos. — Ok, eu aceito.
— Perfeito. — ele se levanta fechando o paletó. — Me encontre no saguão em trinta minutos.
— Sim, senhor. — me afasto, sentindo meu coração sair pela boca.
Volto para a minha mesa localizada de frente para o escritório dele e sento de frente para o computador, mando uma mensagem para Anna, minha melhor amiga, dizendo que terei que cancelar nosso pequeno encontro.
Fico resolvendo algumas papeladas para ele e imprimo tudo, levando para sua mesa.
— Com licença, senhor, aqui estão os relatórios que me pediu.
— Bom... Vamos?
— Agora, achei que seria em trinta minutos.
— Já se passaram trinta minutos.
Arqueio a sobrancelha e olho no meu relógio, 15h30. — Nossa... nem reparei, vou só buscar minha bolsa.
— Não demore.
— Sim, senhor. — reviro os olhos, como ele fala para não demorar se minha mesa fica a centímetros da sala dele?
Pego minha bolsa, desligando o computador e arrumo tudo. Se tem uma coisa que sou é organizada.
— Pronto, senhor.
— Quando estivermos a sós, pode me chamar pelo nome.
— Não acho que seja apropriado.
— Realmente, não é apropriado mas terá que se acostumar, será minha esposa de agora em diante.
Esposa. Que loucura.
Tiro meu crachá e começamos a andar em direção ao elevador, ignoro meus colegas mesmo querendo cumprimentar e parar para conversar, da última vez que fiz isso tive que ficar a noite toda fazendo relatórios diários pois meu chefe disse que se tenho tempo e disposição para conversar então também tenho para escrever relatórios.
Cruzo as mãos e aperto o botão do térreo, ficando ao lado dele, tremo só de pensar que terei que ser a esposa dele, conviver com ele, morar na mesma casa, vê-lo em roupas que não sejam as usuais dele... Me dá arrepio.
Ele me responde como se tivesse lido minha mente.
— Iremos conversar sobre nossa dinâmica de agora em diante, quando chegarmos em casa.
— Não acha que meio rápido demais, Ryan? — sinto a minha garganta arranhar ao pronunciar seu primeiro nome, eu nunca havia dito seu nome antes, sempre foi “senhor” ou “senhor Scott”.
— O que quer dizer com isso?
— Vejo que não tem muita experiência com relacionamentos. — suspiro.
— Eu tenho muita experiência com relacionamentos! — ele se defende mas logo assume a postura que sempre preserva na frente dos funcionários assim que o elevador se abre e nos deparamos com vários funcionários.
— Senhor...
Mordo o lábio ao vê-los tão nervosos na presença dele. Dou um cutucão nele disfarçadamente e ele dá um sorriso amarelo.
— Boa tarde, pessoal...
Sorrio satisfeita e saímos, dou um aceno e começo a rir quando as portas se fecham.
— Do que está rindo?
— De algumas coisas que me lembrei.
— E o que seria?
— Você é muito curioso, Ryan. — cochicho o nome dele pois seria estranho a assistente do CEO o chamar pelo nome.
— Sabe que para isso funcionar, temos que fingir estarmos apaixonados.
Paro bruscamente e começo a repensar minha vida inteira, onde me meti?
— Meu deus... Haja paciência. — ele vem até mim e pega minha mão, atraindo a atenção de todos que estavam no térreo, e corro o mais rápido possível até o carro, fugindo de olhares curiosos e cochichos entre os meus colegas.
— Vai ter que lidar com isso todos os dias agora. — ele me entrega um tablet. — Leia, essa é minha rotina e as regras para isso dar certo e eu não me divorciar com você e muito menos descontar na sua vida profissional.
Abro a boa surpresa pelas regras e desligo. — Também tenho algumas condições.
— Não tem posição para isso.
— Tenho muito mais que você, primeiro você que me fez a proposta e segundo, você tem muito mais a perder do que eu.
Ele parece surpreso com as minhas palavras e vejo o motorista segurar uma risada.
— Certo, e quais seriam?
— Independente se você tiver uma biblioteca ou não, eu vou querer uma só para mim.
— Podemos providenciar isso.
— Segundo: Nada de trabalho em casa a menos que eu queira.
— Mas eu preciso trabalhar em casa.
— Eu estava falando de mim, não vou ser sua secretária em casa, a menos que eu queira trabalhar.
Ele dá um suspiro derrotado e sorrio.
— Relaxa, está acabando. Uhm... Terá que agir como um marido de verdade.
O motorista solta uma risada e fica sério novamente quando eu e Ryan o olhamos de forma sincronizada.
— Enfim... O que significa isso?
— Terá que cozinhar para mim, terá que cuidar de mim quando eu estiver mal, me dar presentes, me levar para jantar, em viagens.
Ele passa a mão pelos cabelos nervoso e solta um suspiro. — Só isso?
— Só, sou uma pessoa compreensiva.
— Ok, por um momento achei que seria bem mais exigente.
— Isso pode mudar com o tempo.
Sorrio ao ver o shopping. Adoro ir ao shopping mas por conta dos “problemas” financeiros, não sobra muito dinheiro para se gastar. Não que eu passe necessidade, até temos uma boa vida mas as contas começam a ficar caras quando sua mãe dá o próprio dinheiro para seu irmão sair com os amigos e você ter que resolver tudo.
— O que tanto pensa?
— Meu irmão vive gastando com os amigos, por isso não sobra dinheiro para mim, eu pago tudo enquanto ele só gasta.
— Bom, hoje é seu dia de sorte, poderá comprar o que quiser.
— Tá brincando!
— Não. Estou falando muito sério.
— Eu estava brincando, sei que você não é de fazer piadas.
— Que bom que sabe. Então não espere humor vindo de mim, muito menos risadas ou sorrisos.
— Entendido.
O chofer abre a porta ao meu lado e pega minha mão, me ajudando a descer.
Ryan pega minha mão entrelaçando de maneira desajeitada.
— Aonde vamos primeiro?
— Comprar o vestido.
— Que vestido?
— O de noiva.
— Mas já? Não é assim que funciona um relacionamento, Ryan.
— Então como é?
— Precisamos fingir que já estamos namorando há algum tempo. Precisamos de uma aliança de namoro.
— Certo. — ele começa a mexer no celular enquanto andamos e tiro o celular da sua mão.
— Namorados devem passear com suas namoradas, parece que seu celular é sua namorada. — guardo seu celular na bolsa.
— Mas eu trabalho.
— Não agora, trabalhe na empresa.
— Se eu soubesse que você seria assim, eu não teria feito o acordo com você.
— Eu sou a única que te conhece o suficiente, então me deixe fazer meu papel.
Entramos na joalheria e fico olhando os anéis.
— Gostei desse, amor.
— Olá, eu e minha namorada gostaríamos de olhar alianças de namoro.
— Olá, senhorita, se importa de eu medir seu dedo? — ela se dirige a mim.
— Claro. — estendo a mão e ela mede com uma fita métrica, logo pegando várias caixinhas com vários anéis.
— Bom, tenho esses, qual seria a faixa de preço?
— Vamos querer o mais caro.
— Sim senhor.
Ela sorri para mim e pega um suporte grande com diversos anéis bem mais lindos e caros dos que eu tinha visto.
— Escolha. — ele cruza os braços.
Fico alguns segundos pensando e logo pego uma aliança fina com pedras brilhantes.
— Esse anel é perfeito para vocês, traz a elegância dos dois, é fina, bonita, perfeita para um relacionamento, as joias combinam com os seus olhos, senhorita.
— Obrigada.
Sorrio e ele paga com o cartão, fico analisando o anel enquanto saímos da loja.
— Não precisava comprar logo a mais cara.
— Vai ser minha esposa, precisa vestir e usar o melhor, sempre.
Seguro um sorriso e começamos a caminhar pelo shopping.
Voltamos para o carro, após ter que chamar o chofer para ajudar com as minhas compras.
Chegamos na casa dele, ou melhor, mansão, e sorrio. E pensar que vou morar agora aqui.
— Lar doce lar.
— Que frase ridícula. — ele revira os olhos e lhe dou um empurrão entrando em casa.
— É lindo.
— Seu quarto é o quinto à direita.
— Tem mais de um quarto? É claro que tem, Clara, que pergunta burra. — converso comigo mesma.
Ao abrir, sorrio e dou um gritinho de felicidade.
O chofer coloca as coisas em cima da minha cama e Ryan se aproxima.
— Depois pode decorar como quiser, já está tarde e precisamos dormir. Devolva meu celular.
— Ah, certo. — abro a bolsa e lhe entrego.
Ele vai embora e me troco, colocando o pijama que comprei. Me jogo na cama e fico olhando o anel até cair no sono.
Olho para o relógio e vejo ser 05h30. Isso é literalmente minha rotina, acordo às 05h30 para resolver vários compromissos da agenda do Ryan, vou para a empresa e preparo tudo para a reunião matinal da empresa, e é assim durante o dia todo. Para ser sincera, não faço a mínima ideia de como será de agora em diante.
Arrumo o laço da camisa de seda e arrumo minha saia, me sentindo estranha. Eu não estou mais na minha casa, mas como eu vou continuar com a minha casa se estou morando aqui agora?
Como se lesse minha mente, Anna me manda uma mensagem.
“Menina, me explique agora mesmo isso de estar namorando Ryan Scott, você está em todos os lugares possíveis, televisão, internet, blogs.”
“Me encontra na cafeteria daqui a duas horas, eu te conto tudo.” — Suspiro e me assusto quando Ryan aparece de camisa polo e calça branca, escorado na porta.
— Não pode contar a ninguém sobre o nosso contrato.
— Sei disso. Por que acha que eu ia contar alguma coisa?
— Você sorri assim quando está conversando com a sua amiga.
— Como sabe que estou conversando com a minha amiga?
— Você fica com esse sorrisinho feio aí.
— Meu sorriso não é feio!
— Claro que é.
Fecho a cara e me sento para colocar meus sapatos, mas sinto dificuldade quando não consigo me abaixar por conta da saia.
— Qual é o problema?
— Não consigo me abaixar, essa saia está apertada, estou com medo de rasgar. — Bufo e ele se aproxima. — O que está fazendo?
— Te ajudando, o que mais seria?
Ele se ajoelha e pega meu pé com delicadeza, colocando o sapato. Engulo em seco e sinto meu coração disparar quando sinto seu toque.
— Se está apertada, use calça.
— Gosto de usar saia, calça me incomoda.
— Então, use saias mais folgadas, não estamos mais na era vitoriana, não entendo por que usar algo que não te faz bem.
— Não disse que me faz mal, só está apertada hoje, talvez tenha comido demais ontem.
— Eu nem te vi comendo, como pode dizer isso?
— Como se você ficasse de olho em mim. — rio enquanto ele terminar de amarrar meu sapato.
— Quem disse que eu não fico?
Nos olhamos por breves segundos e me levanto nervosa.
— Bom… acho melhor eu ir, preciso fazer algumas coisas.
— Certo. Ahn… bom trabalho.
— Obrigada. — Fico meio desconcertada e ele liga a televisão e então me lembro da Anna falando sobre eu estar em todos os noticiários.
— Sabia disso?
— Anna me contou quase agora. Parece que eles não perdoam mesmo. — Suspiro. — Bom, eu vou indo.
— Vou chamar o chofer.
— Não precisa.
— É minha namorada agora, não vou deixar você dirigir sozinha, tenho muitos inimigos no mundo empresarial.
— Ok, tudo bem, eu vou com o chofer. Então quer dizer que vou ter que lidar com isso todos os dias? — aponto para a televisão.
— Consegue suportar tudo isso?
— Eu te aguento há 5 anos, já saíram muitos boatos sobre mim.
Pego meu casaco e minha bolsa, vamos até a entrada, onde o chofer já está esperando.
— Clara, esse é o Bruno, seu segurança e chofer pessoal.
— Olá, senhorita, é um prazer conhecê-la.
— Olá!
— Bom, nos encontramos na empresa?
— Certo. Estarei esperando.
Nos abraçamos rapidamente e desajeitadamente e entro no carro. Pego meu tablet e coloco meus fones, começando a trabalhar em alguns modelos de vestidos. Quando não estou trabalhando para o Ryan, estou lendo livros de fantasia, romance ou desenhando roupas.
Anna sempre me falou que eu deveria desistir da vida de secretária e entrar na carreira de estilista, mas para investir na carreira de estilista preciso ter uma vida boa. É por isso que não vejo a hora de minha mãe morrer.
Isso seria muito cruel de se falar da sua própria mãe, mas ela foi muito cruel comigo, a típica mãe narcisista, a que vive me julgando, dizendo que sempre serei a solteirona da família, que eu nunca serei ninguém na vida e vive enaltecendo meus irmãos, mesmo quando sou eu que cuido dela e das contas do hospital em que ela está.
Só percebo que cheguei na empresa quando Bruno abre a porta e estende a mão.
— Obrigada, Bruno.
— Estou apenas realizando meu trabalho, senhora Scott.
Abro a boca surpresa e dou uma risada tímida.
— Por que está me chamando de senhora Scott? Eu e Ryan não estamos casados ainda.
— Foram ordens dele, senhora.
Solto uma risada genuína e sinto meu rosto queimar de vergonha.
— Certo, então tenha um bom dia, Bruno.
— O mesmo para a senhora.
Ele volta para o carro e vai embora. Entro e cumprimento todos com um sorriso e Evangeline se aproxima.
— Agora, devo te chamar de senhora Scott? Devo fazer reverência quando você chega na empresa? Ai, meu Deus, isso significa que nunca vamos ter a noite das meninas nas sextas? — Ela se desespera enquanto me entrega um cappuccino.
— Evie, se acalma, nada mudou, vou continuar sendo sua amiga e não vai precisar me tratar como se fosse sua chefe, nem se ele mandasse.
— Eu me demito se ele mandar você se afastar da gente. Mas agora, mudando de assunto, eu vi as fotos no shopping, ele comprou um anel mesmo?
Sorrio e mostro o anel enquanto bebo o café.
— Ai. Meu. Deus. Quanto foi isso?
— Não queira nem saber.
— Vamos, me conte, você sabe o quanto sou ansiosa.
— Trezentos e cinquenta mil dólares.
Ela dá um gritinho esganiçado quando entramos no elevador, finalmente ficando a sós.
— Se controle, Evangeline, alguém pode ouvir e vazar, não sei o que ele pode achar bom ou ruim.
— Mas me explica isso, como tudo começou? A gente sabe que você é muito próxima dele porque é a secretária pessoal dele, mas não sabíamos que vocês estavam vivendo um romance de livros.
— Pois é...
— Me explica isso, como foi o primeiro encontro, ele beija bem?
— Evangeline!
— O que foi?
— Não vou falar disso com você, pelo menos não agora.
— Tudo bem, no seu tempo.
Chego ao meu escritório e suspiro ao ver sua sala vazia. Ligo o computador e entro na internet, procurando o nome dele e só há duas coisas que estão circulando na internet sobre ele. A primeira é nosso “relacionamento” e a outra coisa é o escândalo em que a empresa se meteu, tanto que foi por isso que ele me fez essa oferta maluca.
Vejo Angélica se aproximar e sorrio.
— Oi, fez a digitalização daqueles documentos?
— Desculpa... eu esqueci.
Mordo o lábio nervosa e tento não me irritar. — Angel, eu te amo e você com certeza sabe disso, mas eu juro que estou me segurando aqui para não te matar. Como pôde esquecer disso?
— Desculpa, desculpa, por favor, não conte para o chefe.
— Você é muito engenhosa, mocinha. Acha que pode fazer besteira e esperar que, só porque namoro o seu chefe, eu vou passar batido os seus erros?
— Não, definitivamente não! Eu realmente esqueci, me desculpe.
— Ok, eu não pretendia fazer muita coisa hoje, mas terei que fazer tudo. Consegue me trazer as pastas?
— Sim, senhora Scott.
Rio e logo paraliso quando vejo Ryan parado na porta de braços cruzados. Tento avisar Angel, mas ela continua rindo, então, quando se vira e quase cai ao ver seu chefe parado enquanto brinca com meu novo título.
— Senhor... — ela o cumprimenta.
— Evangeline. Muito trabalho?
— Sim, senhor, eu só vim cumprimentar a Clara, ou melhor, a Senhora Scott.
— Como você é uma das melhores amigas dela, eu vou autorizar que a chame apenas de Clara, mas que não a interrompa enquanto ela estiver trabalhando.
— Sim, senhor.
Ela me dá uma piscadinha e sai correndo.
— Caso tenha que me entregar algo, apenas entre e deixe em cima da minha mesa, vou estar em uma reunião importante.
— Sim, senhor.
Ele para ao meu lado antes que eu consiga fechar o notebook e então fecha com tudo.
— E pare de ficar vendo essas notícias.
Sinto seu perfume caro e fico nervosa com sua aproximação, sentindo algo no meu estômago. Talvez vergonha?
Paro de mexer no computador e começo a fazer uns alongamentos, sentindo minhas costas estralarem. Sinto minha barriga roncar e mordo o lábio ao ver que Ryan continua na reunião.
Uma das regras de ter um relacionamento, mesmo falso, com ele é que não posso sair sozinha, as refeições têm que ser com ele, para ter mais visibilidade na mídia. Ainda não entendo o que ele fez para que esse escândalo colocasse a empresa em risco. Sei tudo sobre o que ele faz ou acontecesse nessa empresa, mas de alguma forma, ele conseguiu esconder isso de mim.
Pego minha garrafa e vou até a cozinha, a enchendo. Acho que essa é a quinta vez que saio da minha mesa para encher a garrafa, bebo muita água quando estou nervosa.
Bato a ponta do meu salto no chão, impaciente, enquanto minha garrafa enche, percebo algumas colegas me olharem e começarem a cochichar.
Sei que ter um relacionamento do nada com o CEO de onde você trabalha não é uma boa coisa para seus colegas, pois podem achar que estou sendo beneficiada ou até mesmo roubando a oportunidade de outra pessoa. O mundo empresarial é assim.
Assim que termino de tomar meu remédio, volto para a minha mesa e começo a trabalhar freneticamente numa tentativa de esquecer o quanto estou faminta.
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Após horas e mais horas trabalhando, esfrego os olhos, sentindo-os queimarem devido à quantidade de horas que passei de frente para uma tela.
Bocejo, sentindo uma leve fraqueza e vejo que já são 20h45, duas horas mais tarde do que meu expediente de hoje, então decido ir embora e não esperar Ryan.
Desligo a luz em minha mesa e coloco algumas pastas que faltam em minha bolsa. Amanhã não quero saber de papeladas enormes. Caminho até o elevador e aperto o botão do térreo, me apoio na barra de ferro que fica na frente do espelho e suspiro, sentindo meu pescoço queimar e doer.
Me assusto com uma mão masculina no meio da porta e vejo Ryan adentrar o elevador com um olhar curioso.
— Por que não me falou que estava indo embora?
— Você disse que não queria ser incomodado hoje, apenas obedeci.
— Você é minha namorada-
— Primeiramente, sou sua funcionária e devo respeitar suas ordens.
— O que eu fiz? Por que está agindo assim?
— Nada.
— Convivo com você há cinco anos, sua cara diz muito mais do que sua boca.
— Só estou cansada, com sono e com fome.
— Não almoçou?
— Não. Você disse que não posso sair sozinha e no contrato está dizendo que as refeições devem estar nós dois.
— Mais um motivo para me chamar.
Cruzo os braços e suspiro ao ver que mais alguém quer entrar no elevador. É tão difícil assim pegar outro elevador ou ir de escada? Reviro os olhos discretamente quando vejo Isabella adentrar o elevador.
Isabella é o tipo de mulher que atrai a atenção de todos os homens, seja pela sua beleza, sua inteligência ou até mesmo sua habilidade em “outras atividades”. Como eu sei? Infelizmente, já vi ela e Ryan juntos, um casinho que apenas eu sabia. Ela é loira, rica, de família influente e extremamente amiga de Ryan.
Me encosto na parede e ela sorri falsamente, nunca nos demos bem.
— Clarissa, que bom te ver. Como vai?
— Bem, e você, Isabella?
— Bem, obrigada por perguntar. Ryan, fofinho, vamos jantar? Estou morrendo de fome.
— O que quer comer?
— Abriu um restaurante incrível perto da minha casa, o que acha de passarmos lá e depois nos divertimos um pouco?
Mordo o lábio, segurando a enorme vontade de rir. Volto a minha atenção para o visor, indicando que estamos chegando no térreo.
— Isabella. Entenda, só vou te levar para jantar, mas não vai mais rolar nada entre a gente.
— Ah, por causa dela, não é? — Ela me olha com desgosto e eu sorrio forçadamente.
— Isso mesmo, eu estou com ela e estou mais do que feliz, então, por favor, não confunda as coisas.
Tento me convencer de que ele é um cara legal e, mesmo sendo um relacionamento falso, ele manterá o mínimo de respeito pela minha pessoa, mas sei que talvez ele esteja falando isso porque estamos na empresa.
As portas se abrem e Isabella se afasta dele. Ela é inteligente o suficiente para se jogar para cima dele, mas manter distância quando estamos com público, ela estaria arruinada, se descobrissem que ela é a amante do CEO.
— Clara-
— Vou indo, aproveitem o jantar.
Ele segura meu braço numa tentativa de falar comigo, mas me solto rapidamente.
— Com licença.
Saio bufando e ligo para Bruno, para vir me buscar. Após alguns minutos esperando, eu saio do saguão, suspirando ao ver Isabella e Ryan entrando no carro atrás do meu. Ótimo.
— Olá, senhora Scott, como vai?
— Bem, obrigada por perguntar.
— Deseja ir para onde?
— Para casa, por favor.
— Certo.
Enquanto ele dirige, fico olhando para o celular com a esperança de que ele poderia me ligar ou até mesmo mandar uma mensagem. O que obviamente não aconteceu.
Chego na enorme e vazia casa e suspiro. Não imaginava que morar em uma casa bonita e espaçosa pudesse ser tão solitário.
Me despeço do Bruno e vou para o meu quarto, faço um alongamento após ficar horas em frente ao computador sentada e escolho um vestido confortável.
Bocejo e fico sentada em frente a minha janela olhando as estrelas. Quando era criança acreditava que as estrelas viviam com cadernos e canetas mágicas controlando a vida das pessoas, por algum motivo, eu acreditava nisso. Criança boba.
Fecho as janelas quando começa uma ventania e decido ligar a televisão, observando a repórter em frente a um restaurante italiano.
— “Estamos falando diretamente do restaurante mais famoso da cidade, e não vão acreditar no que acabamos de ver.” — ela diz, aproximando a câmera da porta de entrada do restaurante e mostrando Ryan com Isabella rindo e tomando vinho. Solto uma risada sem humor nenhum e vou até a cozinha, pegando uma garrafa de vinho.
Volto para a sala e me sento, aumentando o volume da televisão.
— “Parece que, mesmo tendo assumido um compromisso com sua secretária, Clara Reid, ele não deixa de se encontrar com suas amigas. Bom, parece que, segundo o jeito que eles estão próximos, talvez seja mais do que uma amiga. Mas a pergunta que não quer calar é: Onde está Clara agora? Será que esse relacionamento é mesmo real ou é apenas uma fachada para desviar os olhos da imprensa desse escândalo no qual a Ethereal Style se meteu? Bom, só podemos esperar neste momento.”
Desligo a televisão, solto um suspiro ao olhar para o anel milionário que ele me comprou apenas para esse disfarce. Bom… ele deveria se esforçar mais.
Vou para o meu quarto e fico de frente para o meu computador, abro o bloco de notas e começo a escrever tudo o que estou sentindo, uma espécie de diário.
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