A ‘Ndrangheta é um proeminente tipo da Máfia Italiana, com sede na região peninsular da Calábria, região localizada no “pé da bota” que é o mapa da Itália. É considerado o grupo de crime organizado mais poderoso do mundo e é caracterizada por uma estrutura horizontal composta por clãs autônomos conhecidos como ‘Ndrina, baseados quase que exclusivamente em laços de sangue.
Seu nome vem do grego, “andragathia”, que significa ‘coragem’ e ‘lealdade’. Sua principal atividade é o narcotráfico, do qual detém quase todo o monopólio na Europa, mas também lida com tráfico de armas, lavagem de dinheiro, extorsão e agiotagem. Suas operações abrangem todos os continentes do mundo e fatura cerca de US$60 bilhões de dólares por ano, com base em uma das regiões mais pobres da Itália.
A ‘Ndrangheta se estabeleceu como a ‘Máfia mais poderosa da Itália’, especialmente após uma forte ação policial contra a Camorra e a Cosa Nostra nas ultimas décadas. A ‘Ndrangheta é capaz de influenciar fortemente a política local e de se infiltrar em grandes setores da economia legal.
Fazer parte da ‘Ndrangheta é ser integrante de uma estrutura que é, em partes, negócios, ordem religiosa e exército. Lendas e códigos são abundantes, sendo utilizados para construir uma identidade coletiva para seus membros. Os rituais são uteis, porque oferecem regras a um mundo que não as possui, tornando-se a organização mais confiável do mundo, uma vez que possui suas próprias leis, voltadas para o comportamento e disciplina nas operações ilegais.
A ‘Ndrangheta está sediada na comuna italiana de San Luca, situada na região da Calábria, província de Reggio Calabria. San Luca é considerada o coração da organização mafiosa mais sanguinária da Itália e será, desde sempre, a capital da ‘Ndrangheta. Percorrer por suas ruas é mergulhar nas vísceras mais profundas da ‘Ndrangheta, a poderosa e ascendente Máfia da Calábria, a rainha do tráfico de cocaína na Europa.
O corpo dirigente da ‘Ndrangheta se chama CRIMINE (CRIME), que é supervisionada pelo CAPO CRIMINE (CHEFÃO DO CRIME). Abaixo dele, encontram-se os coronéis: MASTRO GIORNATA (MESTRE DO DIA), o MASTRO GENERALE (MESTRE GERAL), o CAPO SOCIETÀ (CHEFE DA SOCIEDADE) e o CONTABILE (CONTADOR).
Não existe hierarquia entre os quatro ‘coronéis’ que compõem a CRIMINE da ‘Ndrangheta, apenas o CAPO CRIMINE que é o chefe absoluto.
A CRIMINE é quem controla todos os locais da ‘Ndrangheta ao redor do mundo, devendo todos os membros obedecer à risca cada uma de suas ordens.
ALESSANDRO PIVANI (CAPO CRIMINE): É o líder supremo da CRIMINE da ‘Ndrangheta, conhecido por sua astúcia e sabedoria.
DIEGO MARCHESE (CORONEL - MASTRO GENERALE): É um dos quatro CORONÉIS da ‘Ndrangheta, responsável por supervisionar as operações e garantir a lealdade dos membros.
MARIANO CASTALDO (CORONEL - CONTABILE): É o CORONEL especialista em assuntos ocultos da ‘Ndrangheta. É o responsável pela lavagem de dinheiro, fazendo o dinheiro sujo desaparecer e voltar a circular regularmente na Máfia.
LUCCA BARONI (CORONEL - CAPO SOCIETÀ): É o CORONEL responsável por proteger os interesses da ‘Ndrangheta e garantir a segurança dos seus membros.
ENRICO PALLADINO (CORONEL - MASTRO DE GIORNATA): É o CORONEL encarregado de lidar com as questões mais sombrias da ‘Ndrangheta, bem como responsável pelas execuções.
NÃO CONTINUE ANTES DE LER! (Alertas Importantes)
• ATENÇÃO!!! ESTE É O SEGUNDO LIVRO DA SÉRIE 'NDRANGHETA! A HISTÓRIA QUE SERÁ NARRADA É CONTINUAÇÃO DA HISTÓRIA INICIADA NO PRIMEIRO LIVRO, "PROTEGIDA PELO MAFIOSO". PORTANTO, É INDICADO QUE VOCÊ LEIA O PRIMEIRO LIVRO ANTES DE SEGUIR; CASO CONTRÁRIO, PODE SER QUE VOCÊ NÃO TENHA UMA EXPERIÊNCIA COMPLETA DA NARRATIVA.
• Este livro é indicado para MAIORES DE DEZOITO ANOS devido ao conteúdo e à linguagem apresentados.
• A trama deste livro se passa na Máfia Italiana da Calábria, conhecida como 'Ndrangheta, e mistura fatos com ficção. Contudo, os personagens criados são fictícios e não têm ligação com pessoas reais.
• A narrativa apresentada é fruto da criatividade da autora e não tem a obrigação de refletir a realidade. Não existem padrões absolutos sobre o que é certo ou errado. Vale lembrar que a autora não apoia nem tolera comportamentos desse tipo.
• CERTAMENTE, nem tudo que está escrito aqui deve ser imitado na realidade.
• Este romance mergulha no mundo da Máfia e pode incluir cenas de abuso ou uma narrativa bastante sombria, além de abordar temas como consentimento questionável, agressão física e verbal, linguagem ofensiva e conteúdo sexual gráfico que pode incomodar leitores mais sensíveis. Portanto, evite a leitura se você se sentir desconfortável com esses assuntos.
• Se você procura um príncipe encantado, esta leitura não é para você.
• Embora eu não consiga responder a todos os comentários, estou sempre atenta ao que vocês escrevem. Por isso, sintam-se à vontade para comentar, curtir, avaliar e também compartilhar essa história com amigos, colegas, familiares e conhecidos.
Se você chegou até aqui e está disposto a continuar, espero que tenha uma ÓTIMA LEITURA e seja bem-vindo ao mundo da 'Ndrangheta.
Há quatro anos...
Sinto uma dor intensa em minha cabeça enquanto sou arrastada pelas mãos ásperas do meu pai, Mario Rossi. Os olhos dele, que costumam ser severos e meticulosos, agora irradiam um brilho sinistro, enquanto me arrasta com força pela casa até a cozinha.
Peço desesperadamente por ajuda, mas estou ciente de que ninguém estará disponível para me auxiliar.
Não nesta residência.
Não nessa linhagem familiar.
– ME SOLTA! – Minha voz ressoa, carregada de desespero e ira, porém, ninguém me ajuda, nem mesmo minha mãe ou irmãs.
Ao contrário de mim, elas são excessivamente passivas, obedecem a todas as instruções dele sem questionar, deixam-se guiar pelo medo, poder e riqueza que ele detém.
Apenas eu não sou assim nesta casa.
Nascida na Máfia, aprendi que a força, a resolução e a fidelidade são os instintos mais relevantes a serem adotados. Não vou me calar diante das descobertas que fiz sobre ele.
Mário não liga para os meus berros. Ele me arremessa ao solo com violência e, antes que eu consiga me recompor do impacto, remove algumas partes do revestimento de madeira que cobre o solo e abre uma passagem subterrânea que eu desconhecia a existência.
O ar frio e úmido penetra cada parte do meu corpo, levando-me para o interior da escuridão.
– Eu não vou me calar dessa vez! – Reafirmo, e ele apenas ri, um riso cruel e insípido que me faz tremer até as entranhas.
– Sim, você vai. – Sua voz soa como um sussurro frio no vazio que nos rodeia. – Quando criei esta câmara, nunca pensei que seria você a habitá-la. Contudo, diante de todos os desafios que você me apresenta, Antonella, tenho certeza de que fará um uso proveitoso.
O pavor me invade ao perceber o que está ocorrendo. Ele irá me acorrentar. Mario me manterá confinada em algum recanto oculto sob a casa que um dia denominei como meu lar.
Minha mente batalha para entender o que está ocorrendo, preciso achar uma solução, pois uma coisa é evidente: meu pai não tem boas intenções para mim.
– Alessandro vai descobrir! – exclamo, resistindo ao firme aperto das suas mãos no meu braço. – Mesmo que não seja eu, ele vai descobrir de qualquer maneira.
Mário sorriu mais uma vez, desta vez, um sorriso tão sombrio e perverso que me faz revirar o estômago de pavor.
– Você sempre foi muito falante, filha. – Suas palavras são como espadas afiadas. – No entanto, nunca senti tanto desejo de calá-la para sempre como agora.
Sinto que ele vai me aniquilar, pôr fim à minha breve vida. Sempre percebi que Mário era uma pessoa má, mas nunca pensei que seria capaz de ferir alguém que carregasse seu sangue nas veias.
Ele me arrasta para um compartimento semelhante a uma prisão, uma câmara de tortura disfarçada de sótão. Correntes pendem das paredes e do solo, enquanto uma mesa semelhante à de necrotérios se encontra próxima à parede.
– Isso, me destrua. Mostre quem você realmente é. – Em um ato desesperado de rebeldia, persisto em enfrentá-lo, desejando que tudo isso termine logo. No entanto, minha voz é um sussurro fraco, repleto de desafio e desespero.
– Tragam linha e agulha... – ele sorri, um sorriso que antecipa dor e angústia. – Prometi que a calaria, Antonella, mas não será através da morte.
Assim, ainda que viva, sou lançada no inferno, condenada a padecer nas mãos de quem deveria me proteger. Mário me obrigou a batalhar pela minha existência em um lugar onde a luz e a esperança parecem ter desaparecido para sempre.
A câmara escura ressoa o ruído metálico das correntes vibrando contra o chão, enquanto meu pai me acorrenta sobre a mesa de metal.
Percebo quando os guardas se aproximam, trazendo a agulha e a linha segundo o pedido dele. Ao me dar conta do que está à beira de acontecer, meus olhos se arregalam de puro pavor.
Tenho lutado, mas é em vão.
Eles me agarram fortemente, prendendo meus pés, mãos e cintura com faixas de couro, enquanto Mário se aproxima com um sorriso malicioso nos lábios.
– Isso irá ensiná-la a manter a língua escondida nos lábios, minha querida Antonella – ele murmura, a maldade esvoaçando em seus olhos como chamas de demônio.
A ponta fina resplandece à luz fraca da câmera, enquanto ele a maneja com mãos que há muito perderam a humanidade. Questiono até mesmo se ele realmente foi humano em algum ponto de sua existência.
Ele me obriga a fechar os lábios pressionando um contra o outro, suas mãos ásperas e geladas se agarram firmemente à minha pele.
Percebo a ponta aguçada da agulha penetrando no meu lábio superior, cortando a carne com uma dor quase insuportável. Grito, mas as mãos de Mário sufocam o som, numa tentativa inútil de abafar minha angústia enquanto executa seu trabalho cruel.
A linha corre por minha pele como uma serpente negra, costurando minha boca fechada, ponto por ponto, dor por dor. Cada nova incisão é um tormento, a cada toque da agulha, um pedaço da minha alma se vai.
Os meus olhos ardem com lágrimas caindo incessantemente enquanto combato o desespero que ameaça me devorar. Recuso-me a ceder, a curvar-me perante a crueldade de Mário. No entanto, mesmo com minha determinação inabalável, reconheço que esta é uma luta que não consigo vencer.
Mário está decidido a despedaçar cada parte de mim, desintegrando-me aos poucos até que não sobre nada. Não tenho ideia de quanto tempo vou permanecer neste local, mas estou segura de que existe uma grande possibilidade de eu não sobreviver.
Finalmente concluído após longos minutos. Minha boca está costurada, como o túmulo onde ele me jogou.
Vejo-me espelhada no olhar de Mário. Sim, Mário, pois ele está longe de ser um pai. Percebendo o triunfo em seu olhar, ele se afasta, ordenando que as portas de aço da prisão sejam trancadas, me deixando presa e sozinha na escuridão.
É neste ambiente assustadoramente sombrio que entendo o real sentido do desespero; o frio úmido e a angústia me envolvem como um manto de desespero.
À medida que a escuridão me consome, agarro-me à esperança como a uma tênue luz no final de um túnel sem fim. Asseguro a mim mesma que não permitirei que o desespero me domine, que não permitirei que ele me destrua totalmente.
Não vou resistir!
Embora eu esteja preso fisicamente por correntes e tiras de couro, reconheço que a verdadeira detenção reside na minha mente. No entanto, reconheço que, mesmo estando aqui, mesmo após ser detida por Mário, ainda tenho a possibilidade de ser liberta.
Possibilidade de sonhar com o dia em que finalmente me livrarei deste tormento. Permitido para visualizar um futuro além das barreiras de aço e pedra que me circundam.
Mário silenciou a minha voz, porém não conseguiu silenciar a minha resolução. Mesmo considerando quase impossível, prometo a mim mesmo que vou superar isso, sair desta prisão e fazer com que ele pague por cada gota de sofrimento que me causou até agora e pelas muitas outras que imagino que ainda me causará no futuro.
Atualmente...
Os dias aqui se estendem como as correntes de ferro que me acorrentam. Já faz algum tempo que perdi a percepção do tempo, não consigo mais discernir entre o dia e a noite, cada instante é uma eternidade de angústia e desespero.
Desde que fui confinada nesta câmara gelada, onde apenas a escuridão me acompanha, a dor é o único sinal de que continuo viva.
Meu pai me introduziu aqui há tanto tempo que nem consigo lembrar quantos anos se passaram. Certamente, foram muitos. Ainda dói perceber que o homem que deveria me resguardar se transformou no meu mais feroz opressor.
Minha mente frequentemente me leva ao passado, recordando as recordações que me permitiram respirar. Recordo-me de, ainda na infância, ter aprendido que a Máfia sempre deveria prevalecer sobre qualquer interesse e que a fidelidade ao meu líder era mais valiosa do que o próprio sangue.
É irônico que essa mesma lealdade tenha me lançado nesse poço de angústia ao qual fui sentenciado.
Cresci em um contexto onde a infidelidade era punida com rigor e onde as relações familiares eram estendidas ao extremo pela cobiça, ambição e poder.
Meu pai, Mário, sempre se apresentou como uma figura distante e indiferente em nossa residência. Como líder da Máfia Italiana de maior importância, ele é temido e respeitado por todos que o conhecem.
No entanto, sob a aparência de autoridade, fidelidade e respeito, sempre se desvendou um homem impiedoso e impiedoso, pronto para sacrificar qualquer coisa para atingir suas metas pessoais.
Identifiquei o seu lado traidor e fui penalizada por isso. Desde a infância, presenciei as ações violentas e manipuladoras do meu pai, sem que ele expressasse qualquer sinal de arrependimento.
Minha mãe sempre se apresentou como uma mulher subjugada e vulnerável, incapaz de resistir ao controle de Mário. Ela se submetia à sua vontade, renunciando à sua dignidade pessoal em prol da suposta proteção da nossa família.
Vi-a padecer silenciosamente, seus olhos sem vida espelhando a melancolia de uma existência desperdiçada ao lado de um homem cruel. Simultaneamente, diante dos demais, ocultava seus sentimentos e emoções, exibindo apenas o que desejava que os demais percebessem.
Construíamos a família ideal, fiel ao seu líder e comprometida com os objetivos do nosso clã. Um espetáculo dirigido por Mário e fielmente seguido por todos os personagens que ele concebeu e moldou... menos por mim.
Magda e Magnólia, minhas irmãs, seguiram o exemplo de nossa mãe, aceitando seu destino com resignação e até mesmo com satisfação. Elas se transformaram em instrumentos nas mãos do nosso pai, seus corações endurecidos pela mesma crueldade que moldou a nossa casa.
Eu as amava, mas também tinha medo, pois entendia que sua fidelidade a Mário ultrapassava qualquer vínculo sanguíneo e até mesmo a Máfia, à qual fomos instruídas a servir e proteger acima de nossas vidas.
Então, eu era a rebelde que se recusava a se submeter às vontades do meu pai. Desde a juventude, questionei a autoridade de Mário, questionei suas escolhas ao notar que ele pretendia trair Alessandro e, num gesto de rebeldia e insanidade, questionei suas diretrizes.
Eu me tornei uma exceção em nossa casa, a única peça do seu jogo sombrio que ele não conseguia dominar.
A questão é que a minha insurgência teve um custo excessivo para mim, tornando-se agora algo que não consigo mais tolerar, por isso compreendi que não há mais alternativa.
Joguei a toalha... Abandonei a vida...
Quando descobri os planos do meu pai para matar a esposa de Alessandro, o nosso chefe da Máfia, estava ciente de que não podia me calar.
Declarar que revelaria todos os seus planos foi uma traição intolerável para Mário. O problema é que, internamente, eu tinha consciência de que não poderia permitir que meu pai cometesse um delito tão atroz.
Seria uma infidelidade séria e intolerável e, no final, todos nós seríamos penalizados por suas atitudes.
Confrontei-o, supliquei que abandonasse seus planos, mas ele se negou a me atender. Ao contrário, ele me confinou aqui, nesta câmara escura e gelada, me condenando a uma vida de tortura e angústia.
Agora, ao encarar mais um dia de sofrimento e desespero, um fragmento de mim anseia pela morte como uma forma de libertação. No entanto, uma parte mais forte e resoluta se recusa a abandonar a esperança. Às vezes, sinto um desejo de apagar essa tênue chama de esperança, mas não consigo.
O meu corpo sofreu tantas agressões que mal consigo recordar, tornando-me um objeto nas mãos de Mário; ele me despedaçou enquanto sorria para seus homens.
A primeira penalidade, os lábios costurados, se tornou um hábito. Eu percebia o prazer cruel ao ordenar que seus homens descosturassem para, meses mais tarde, prendê-los novamente.
Lutei o máximo que pude contra as amarras que me aprisionavam: as visíveis e as ocultas também. Desafiei a escuridão que tentou me consumir tantas vezes que já não consigo me recordar, mas agora não existe mais uma alternativa, não para mim, não após tanto tempo.
Agora, só anseio ardentemente pela morte como libertação, mas também estou ciente de que, mesmo nas profundezas do inferno, ainda existirão sentimentos de raiva e dor ardendo em meu interior. E, enquanto essa chama persistir, continuarei desejando que Mário pague pelos seus erros, independentemente do preço.
Os dias aqui são um turbilhão de sofrimento e angústia, uma repetição constante de aflição e temor. Em algumas ocasiões, questiono-me se um dia serei salvaguardada, se alguém me descobrirá nesta prisão obscura e me libertará.
A esperança a cada dia se torna mais tênue, uma luz minúscula batalhando para persistir na obscuridade do meu pensamento.
As paredes testemunham em silêncio toda a minha angústia. Elas guardam os segredos mais íntimos do meu espírito, os gritos sufocados da minha angústia, as lágrimas que secam antes mesmo de tocar o chão gelado.
Em algumas ocasiões, ao fechar os olhos, consigo me transportar para uma era mais simples, antes de me ver presa neste pesadelo sem fim. Recordo das minhas gargalhadas na infância, das histórias contadas em volta da lareira do meu quarto, das brincadeiras com minhas irmãs.
Atualmente, essas recordações são como fantasmas, desvanecendo gradativamente sob a pressão da minha realidade. Os flashbacks me atormentam, momentos de uma vida que eu gostaria de esquecer, pois é ela que me mantém viva.
É impossível esquecer o olhar frio de Mario quando me agarrou e me torturou em todas as ocasiões, o prazer estampado em sua face ao me desmantelar quando me viu como um obstáculo aos seus planos.
Recordo cada palavra cruel que você disse, os insultos e ameaças que me atingiram tão profundamente quanto a sua faca em outras ocasiões.
Mesmo com todo o meu sofrimento, por um período, existiu uma fagulha de esperança ardendo intensamente dentro de mim. Uma voz suave que murmurava ao meu ouvido, garantindo que, um dia, eu alcançaria a minha liberdade e que, quando esse dia chegasse, Mario arcaria com todas as suas ações.
Esperei por esse instante incerto por um período extenso demais. Agora, deixei para trás qualquer esperança que ainda existia em mim. Nos últimos dias, não estou comendo nem bebendo, e Mario voltou a costurar meus lábios como castigo pela minha falta de alimentação.
Não ligo mais para a dor.
Eu desisti!
Abandonei a mim mesmo, a vingança, tudo...
Até mesmo desejei a morte como um escape deste tormento sem fim.
Os desejos já não têm mais espaço em mim.
Em momentos de clareza e obscuridade, percebo o tempo passar devagar e, quando tudo parece sem solução, sinto que o momento chegou.
A perda, a redenção, a almejada liberdade...
Os passos ressoam nos corredores frequentemente vazios e me reconduzem à realidade. Não é a morte que almejei, mas sim o meu carrasco se aproximando e rompendo o silêncio opressivo que impera neste local.
A porta da minha cela é aberta com um impacto intenso e surdo, enchendo a sala com uma luz fraca. Não me mexo, permaneço na mesma posição: deitada, com as costas apoiadas no chão frio, mãos unidas ao peito, pernas estendidas e olhos fixos no teto, esperando o que está por vir.
Outra tortura... Mais um sofrimento... Mais uma dor... Talvez, finalmente o término.
Se aproximam passos decididos. Uma figura majestosa se posiciona ao meu lado. Pela sombra, reconheço que não se trata de Mário e suponho que seja um de seus guardas. Ainda não tomei nenhuma ação.
Esperando...
– Alessandro, você precisa descer aqui. – Ouço uma voz grossa, mas não é do homem que está parado ao meu lado, mas de alguém que está mais longe.
Minha mente busca entender quem é o indivíduo. Alessandro é a nossa autoridade máxima. Ele me encontrou? Identificou os planos de Mário? Será que ele foi assassinado?
– Trata-se da filha mais nova do infeliz. Ela está viva, Boss. – Uma vibração cada vez mais imponente permeia meu corpo. – Vamos seguir o mesmo destino dos outros? – A questão é fria e desprovida de emoção.
Talvez seja isso, seja o momento do castigo que eu sempre previ, todos nós seríamos penalizados pelos erros de Mário. Por fim, uma bênção após todo o meu sofrimento, o final que tenho ansiado nos últimos tempos.
– Ela não viria aqui se não fosse relevante para ele. – Uma voz terceira me alcança, parece que estamos isolados no espaço, sem Mário. Eu reconheço que essa voz é de Alessandro, pois o indivíduo ao meu lado o chamou de Boss. – Talvez ela possua alguma informação que possa nos auxiliar.
Quero declarar que não tenho conhecimento de nada, que vivi confinada nos últimos anos, que Mario me odeia tanto quanto a eles, mas permaneço em silêncio, esperando passivamente a sua decisão... a minha sentença final.
– Nessa condição? – O indivíduo murmura e se ajoelha ao meu lado. Lentamente, elevo a cabeça e o encara. Identifico o indivíduo, Diego, como um dos subchefes do clã. Recordo vagamente de tê-lo visto em algumas das poucas festas que frequentei. – Se quiser obter qualquer informação, precisamos subi-la, a garota necessita de assistência imediata.
– Hum, hum, hum. – Tento expressar-me, mesmo consciente de que não serei compreendida devido à costura nos lábios.
– Relaxe, eu vou te auxiliar – O homem fala com uma voz tão delicada que me causa surpresa.
Ele se move com destreza e, utilizando uma pequena navalha, remove as cordas que prendem meus lábios.
– Você... - sussurro com dificuldade - veio me socorrer. – Minha voz sai seca, com a garganta doendo devido à escassez de líquidos nos dias recentes.
– Menina, não sou o herói, trouxe a morte para sua casa. – Ele agarra meu corpo com força em seus braços, me erguendo do chão.
– Isso. – Insisto enquanto ele corre pelo corredor escuro e gelado que me protegeu nos últimos anos. – A morte – apenas o essencial, preservando o restante da minha energia. – É a redenção. Solicito sua compaixão, ansiando ardentemente pelo término da minha agonia.
Sem mais dor, sem mais tormentos, sem mais lábios costurados, apenas a tranquilidade que surgirá após o término.
– Puta que pariu. – Escuto seu murmúrio e cerro os olhos, me rendendo finalmente à escuridão.
Durante muito tempo, ansiei por ser salva, mas só agora compreendo que não posso salvar o que sobrou de mim.
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