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Herdeira Mezzadri – O Advogado e a Herdeira

Capítulo 01

...Katherine Mezzadri Albertinelli ...

...27 anos....

...Otávio González ...

...30 anos....

...Katherine...

Dois anos atrás...

Eu sempre odiei eventos de gala.

Não me entenda mal, adoro o brilho dos vestidos, o tilintar das taças de cristal, as luzes que parecem pintar de dourado as faces das pessoas importantes. Mas nada disso me encanta como antes. Cresci rodeada de luxo, de grandiosidade, e, com o tempo, essas coisas passaram a perder o brilho. As festas que minha família promove são todas iguais, e eu? Eu sou a filha Mezzadri que ninguém espera ver por lá. A ovelha desgarrada, como meu pai gosta de dizer.

Estou aqui hoje por um único motivo: evitar mais uma discussão com ele. Depois de semanas viajando, fui praticamente "convocada" para este evento. A comemoração de mais um contrato milionário fechado pela Mez'paradise. O orgulho do meu pai está estampado em cada sorriso que ele lança para os convidados. E eu? Eu sou apenas um acessório, o que completa a imagem da "família perfeita".

Passo pelas portas douradas do salão e sinto o peso dos olhares caindo sobre mim. Sempre foi assim. Ser uma Mezzadri significa ter os holofotes voltados para cada movimento. Mesmo depois de anos me afastando dessa vida, de tentar seguir meus próprios caminhos, eles sempre me puxam de volta para essa realidade.

Minha mãe é a primeira a me notar. Ela me observa com aquele olhar avaliador, como se estivesse checando se escolhi o vestido certo, se meu cabelo está impecável, se meu comportamento será adequado. Sorrio para ela e me aproximo, abraçando-a levemente, mas mantendo a distância emocional que sempre existiu entre nós.

— Kat, querida, que bom que veio. — Sua voz soa suave, mas sei que o alívio é o verdadeiro sentimento por trás de suas palavras.

— Claro, mãe. Não poderia faltar, não é?

Ela não responde. Em vez disso, me apresenta a um grupo de investidores que eu nunca ouvi falar, mas que, aparentemente, são essenciais para o futuro da empresa. Sorrio, concordo, faço piadas leves — o que esperam de mim. Minha mente, no entanto, está longe.

— Katherine, este é o Dr. Otávio González — minha mãe continua, me empurrando para outro círculo de pessoas, como se eu fosse um troféu a ser exibido.

Levanto os olhos e encontro o olhar dele. O rosto sério, o terno perfeitamente alinhado, uma expressão que parece esculpida em mármore. E algo mais: um certo desprezo. É tão sutil que qualquer pessoa não acostumada com essas interações nem perceberia. Mas eu vejo.

— Prazer — digo, estendendo a mão.

— O prazer é todo meu — ele responde, mas não há prazer algum naquelas palavras.

Ele me cumprimenta com a educação necessária, mas sem a menor vontade de estar ali. Curioso. Geralmente, homens como ele são fáceis de ler: ambiciosos, interessados em impressionar e se aproximar da família Mezzadri para colher os frutos dessa proximidade.

Mas Otávio González parece diferente. Ele me olha como se já tivesse me julgado, como se soubesse exatamente quem eu sou. Uma herdeira vazia, talvez? Mais uma rica sem propósito?

— Está gostando da festa? — pergunto, num esforço para quebrar o gelo.

— É interessante — ele diz, sua voz baixa e controlada. — Nunca imaginei que negócios pudessem ser tão… glamourosos.

Ah, então é isso. Ele não pertence a este mundo e não faz questão de esconder isso. Por algum motivo, isso me irrita. Talvez porque ele me lembre de quem eu costumava ser. De como, um dia, eu também olhava para tudo isso com o mesmo desprezo. Agora, é apenas parte do meu dia a dia.

— Negócios são sempre assim, se você souber jogar bem — digo, desafiando o tom dele.

— Não tenho dúvidas — ele retruca, seus olhos fixos nos meus. — Mas prefiro o jogo limpo.

Antes que eu possa responder, alguém nos interrompe, puxando-o para uma conversa com meu pai. Fico observando de longe, tentando entender por que ele me incomoda tanto. Talvez seja por ele não ter feito nenhum esforço para me agradar. Ou talvez porque, de algum modo, ele já tenha me condenado sem ao menos me conhecer.

Otávio González. Mais um nome para minha lista de pessoas que preferiria evitar.

Só que o destino sempre tem seus próprios planos, e mal sabia eu o quanto esse homem ainda iria afetar minha vida.

Capítulo 02

...Katherine...

atualmente.

Recebi a notícia há poucas horas: um vazamento de informações confidenciais da Mez'paradise, envolvendo contratos e negociações que poderiam arruinar a reputação da minha família. A pior parte? Não sabíamos quem estava por trás disso. Tudo estava desmoronando, e o conselho da empresa exigia uma solução rápida. Havia apenas uma pessoa que poderia lidar com esse processo: Otávio.

Soltei um suspiro enquanto a imagem dele se formava em minha mente. Otávio, com sua rigidez inabalável, era a última pessoa que eu queria ver, especialmente depois de tudo o que aconteceu entre nós. Nossa relação foi um constante jogo de confrontos, cheio de desentendimentos e uma atração que ambos relutávamos em admitir.

A verdade é que, depois do último caso em que trabalhamos juntos, nos afastamos por completo. Ele voltou para Berlin, e eu mergulhei de vez na administração da empresa, cuidando de novos projetos na Europa. Achava que esse era o caminho certo, que precisava de distância, de tempo.

Mas agora, o tempo havia acabado.

— Senhorita Mezzadri, chegamos ao aeroporto. – a voz do motorista me trouxe de volta à realidade.

Respirei fundo antes de sair do carro. Minhas mãos seguraram firme a alça da bolsa. A missão era clara: trazer Otávio de volta, convencê-lo a cuidar do processo e, talvez, lidar com a bagunça que havíamos deixado no passado.

Não, esquece a segunda parte.

Entrei no jato particular da minha família e me acomodei em uma poltrona próxima à janela. Tirei meu iPhone da bolsa e procurei na lista de contatos por alguém com quem não conversava há quase dois anos e meio.

— Preciso da sua ajuda. – falei assim que ele atendeu.

— Oww, quem está vivo sempre aparece.

— Não estou com paciência para brincadeiras, minha família precisa de você.

— Sua família ou você?

— Poderia ser um pouco mais profissional? Temos um escândalo para resolver antes que tudo desmorone e minha família entre em colapso.

— Princesinha Mezzadri, não sei se você se recorda, mas eu já trabalhei com vocês uma vez e não costumo repetir clientes.

— Estou indo para Berlim e vou te encontrar! – eu disse antes de desligar o celular e ajustar meu cinto para a decolagem.

Eu e ele não tivemos um relacionamento sério; o que existiu entre nós foi uma atração que não evoluiu. Havia um forte desejo de ambas as partes, e acabamos indo para a cama uma vez. Depois disso, ele desapareceu sem nem se despedir, e até agora não tenho notícias dele.

Eu não estava apaixonada; nossa relação nunca teve envolvimento emocional. Mas, sinceramente, ele poderia pelo menos ter pago pelo motel antes de sumir. A verdade é que, para ser franca, eu nunca gostei dele de verdade.

...[...]...

Cheguei em Berlim quase à meia-noite, exausta. A única coisa que consegui fazer foi reservar um hotel para passar a noite. Mesmo assim, não conseguiria descansar até descobrir onde Otávio estava hospedado.

Contatei a Wanda, uma amiga hacker, para que ela rastreasse a localização dele usando apenas o número do celular. Em pouco tempo, soube onde ele estava escondido.

Não era muito longe do local onde eu estava, e logo ele teria uma surpresa pela manhã. Meu celular tocou, e ao olhar, vi que era meu pai me ligando.

Gregório: Você encontrou o advogado?

— Sim, na verdade, eu sei onde ele está hospedado, mas ainda não fui até lá.

Gregório: E por que não? Kat, seu retorno aos Estados Unidos depende dele vir com você.

— E você pensa que isso é simples? Eu não posso simplesmente forçá-lo a ir comigo para Los Angeles, papai.

Gregório: Arrume um jeito.

E ele desligou na minha cara.

Eu sou a irmã do meio entre três. Rubens é o mais velho, casado e pai de dois filhos, enquanto Louis, o caçula, vive se metendo em encrencas. Meus pais nunca se preocuparam muito conosco; nos colocaram em colégios de elite e nos deixaram nos virar.

Minha mãe viajava tanto que, aos 10 anos, tive que assumir o papel de figura materna para meus irmãos. Ela nunca se importou verdadeiramente com nós, a não ser para posar para fotos. Meu irmão mais novo ficou tão carente de afeto materno que acabou se tornando um alcoólatra emocionalmente instável.

Mas tudo bem, o que importa é manter a imagem de "Família Perfeita".

Capítulo 03

...Otávio...

Observei o relógio Rolex no meu pulso, que mostrava precisamente 09:00 horas. Faltava pouco menos de meia hora para a princesinha Mezzadri chegar aqui, e, claro, eu não estava me ocultando. Poderia ter me escondido na noite passada, quando ela sugeriu que me hackeassem.

A realidade, no entanto, é que eu desejava que ela me encontrasse. Queria ver seu rostinho encantador mais uma vez. Ela achava que estava no controle, que seus joguinhos eram suficientes para me pegar de surpresa, mas o que a princesinha Mezzadri não sabia era que eu já conhecia todas as suas cartas. E talvez, só talvez, isso a fizesse ainda mais irresistível.

O restaurante do hotel estava quase vazia, exceto por um casal distraído no canto e o barista que trabalhava calmamente atrás do balcão. A xícara de café à minha frente já estava esfriando, mas não importava. A adrenalina pulsava nas minhas veias com a expectativa do encontro iminente.

Às 09:25, os passos firmes de um salto alto ecoaram pelo chão de mármore. Meu olhar foi automaticamente em direção à entrada, e lá estava ela. Katherine Mezzadri, impecável como sempre, envolta em um casaco de lã elegante e óculos escuros que não escondiam sua expressão afiada. Ela sempre soube como fazer uma entrada dramática.

Ela tirou os óculos lentamente, me encarando. Seus olhos, frios e calculistas, eram como lâminas prontas para cortar qualquer um que atravessasse seu caminho. Só que, dessa vez, eu estava preparado para o corte.

— Você está se divertindo? – Ela perguntou, sua voz suave, mas cheia de veneno. – Porque eu, definitivamente, não estou.

— Ah, Kat, sempre tão direta. – respondi com um sorriso. – Achei que fôssemos brincar um pouco antes de irmos ao ponto.

Ela se aproximou da mesa, puxando uma cadeira e sentando-se sem ser convidada. Seus movimentos eram precisos, controlados. Cada detalhe, desde a maneira como ajeitou o casaco até o olhar que lançou ao redor, mostrava que ela não deixava nada ao acaso.

Ela sorriu, um sorriso frio que não alcançou seus olhos.

— O que você quer, afinal?

— Otávio. – respondeu com uma calma que eu sabia ser apenas fachada. Havia algo de urgente em seus olhos, algo que ela tentava disfarçar enquanto se aproximava da minha mesa.

Eu me inclinei para trás na cadeira, observando cada movimento dela. Ela respirou fundo, cruzando os braços como se aquilo a protegesse de mostrar qualquer fraqueza.

— Eu vim porque preciso da sua ajuda.

— Minha ajuda? –  Eu arqueei uma sobrancelha. Aquilo estava ficando interessante. – E por que eu ajudaria você, Katherine?"

Ela deslizou um envelope sobre a mesa. Seu olhar encontrou o meu, firme, mas eu conseguia ver a tensão ali. Havia algo mais acontecendo.

— Alguém está vazando informações sobre a minha família. Coisas graves, Otávio. E se isso continuar, pode destruir a reputação do meu pai e acabar com a nossa empresa.

Peguei o envelope, mas não o abri de imediato. Queria ouvir mais da boca dela.

— E você acha que eu sou o cara certo para descobrir quem está por trás disso?

Ela assentiu.

— Você é o melhor no que faz. E eu sei que não se envolve em joguinhos. Se pegar esse caso, é porque acredita na verdade, na justiça.

Parei por um momento, tentando decifrar o que ela estava realmente dizendo. Não era só um pedido de ajuda. Katherine sempre foi boa em esconder o que sentia, mas dessa vez, ela estava nervosa. Não só pelo caso.

Levantei-me e caminhei até a janela enorme, deixando as palavras dela ecoarem na minha cabeça. Claro, poderia pegar o caso. Mas isso implicaria em mais do que eu estava preparado para lidar. Eu sabia que, se entrasse nessa, coisas do passado viriam à tona, e nem tudo seria agradável de reviver.

— Não acho que você veio até mim só por causa da minha experiência. – disse sem olhar para ela. – O que mais você está escondendo, Katherine?"

Silêncio. Eu me virei para encará-la, vendo-a morder o lábio por um breve segundo. A máscara dela estava começando a cair.

— Porque, além de tudo, acho que você é a única pessoa em quem minha família pode confiar.

Aquelas palavras me atingiram mais do que deveriam. Confiança? Depois de tudo que nossas famílias passaram? Eu não esperava ouvir isso dela. Mas o olhar nos olhos dela me disse que não era uma jogada.

Suspirei, caminhando de volta para a mesa.

— Tá bem. Eu aceito. Mas se eu for investigar isso,  vai ter que ser do meu jeito.

Ela assentiu, parecendo aliviada.

— Não esperaria menos de você.

Eu sabia que não seria simples, mas algo me dizia que aceitar esse caso era mais do que uma questão de trabalho. Talvez fosse o começo de algo que nós dois ainda não estávamos prontos para encarar.

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