...Caros leitores,...
...Esta história foi escrita na minha adolescência enquanto ainda estava no ensino médio. Ela foi criada seguindo as diretrizes de um concurso literário da escola, por isso não contém cenas de sexo tão explícitos, como alguns talvez esperem. Se você procura uma história com grande foco em "intimidade", talvez esta não seja a mais adequada para você. Este é um conto mais simples , onde a interação entre os personagens ganham destaque....
...Desde já, agradeço sua compreensão...
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Desde pequena, sentia as sombras do passado a envolverem-me, como se cada murmúrio e cada olhar gélido que recebia em Havenswood carregassem um segredo que nunca deveria ser revelado. A mansão, majestosa e intimidadora, mantinha-se num silêncio envolvido em tristeza. O frio nas paredes parecia sussurrar algo além do visível, algo que, sem compreender totalmente, pesava no meu coração.
Os corredores, longos e escuros, pareciam labirintos sem fim, onde cada passo ecoava numa melodia melancólica. As janelas estreitas e altíssimas deixavam apenas um fecho de luz pálida, quase como se receassem iluminar por completo o chão de mármore. As tapeçarias nas paredes mostravam cenas de batalhas e caçadas antigas, intensificando a atmosfera de hostilidade. Até mesmo o grande salão, repleto de candelabros dourados e móveis luxuosos, mantinha-se frio e severo. O perfume da cera misturava-se ao das flores já murchas, como se a própria vida estivesse presa entre o passado e o presente.
Meu pai, o Duque de Havenswood, era um homem de presença esmagadora. Seu olhar, sempre distante e duro como o gelo, passava por mim como se eu fosse apenas uma sombra. "Lissara," ele dizia em tom ríspido, "mantenha-te comportada." Essas palavras ressoavam como uma sentença, pesando sobre mim com a mesma frieza das pedras sob os meus pés. Era como se ele desejasse que eu não ocupasse espaço — uma culpa silenciosa que eu mal compreendia, mas que já moldava cada instante da minha vida.
Alden, meu irmão mais velho, refletia as atitudes do nosso pai. Com oito anos, já mostrava traços do homem severo que se tornaria. Seus olhos, tão azuis quanto o mar e tão indolente quanto os do nosso pai, observavam-me com um misto de curiosidade e desprezo, como se eu fosse uma intrusa no sofrimento da nossa família. Ainda que ele nunca o dissesse, eu sabia que, em seu íntimo, ele me culpava pela dor que habitava nossa casa. Era o olhar de alguém que me via como um fardo involuntário, uma presença que trazia lembranças indesejadas.
A ausência da minha mãe era uma ferida invisível que dilacerava nossa casa. Ao passar pelo retrato dela no salão principal, um vazio tomava conta de mim. Ela era linda, com cabelos negros como os meus, mas os olhos que eu conhecia apenas pela pintura brilhavam com uma suavidade desconhecida. Lady Eleanor, a governanta, contava-me histórias sobre a minha mãe — histórias de riso e alegria. Mas, ao olhar para mim, percebia no fundo de seus olhos a mesma frieza contida em palavras gentis.
Naquela tarde, enquanto observava a chuva cair pela janela da biblioteca, sentia que o peso de tudo aquilo me prendia à terra como uma âncora. As gotas martelavam o vidro em um ritmo suave, como se o céu compartilhasse dos segredos que me rodeavam. A biblioteca era imensa e repleta de livros que iam do chão ao teto, mas nem mesmo suas histórias eram capazes de me transportar. O mundo fora daquelas paredes parecia um sonho distante, e o mundo dentro delas, um pesadelo silencioso e palpável.
Ouvi passos ecoando pelo corredor e senti um aperto no coração. Era meu pai, que entrou na sala com a mesma expressão severa de sempre. Ignorou-me por alguns instantes, examinando os livros sobre a mesa com uma seriedade quase obsessiva. Eu observava-o com expectativa e receio.
"Lissara," disse ele finalmente, num tom cortante que fazia ecoar a frieza de sua alma. "Espero que compreendas o que significa ser uma Havenswood."
Aquelas palavras eram um lembrete constante do que eu deveria ser, mas também uma acusação silenciosa de que eu jamais seria suficiente. Queria perguntar-lhe, entender o porquê de seu tratamento, mas o medo travava minhas palavras. Limitei-me a assentir, os olhos fixos no chão.
"Não há espaço para fraquezas nesta família," continuou ele, com a voz grave e implacável. E saiu, deixando atrás de si uma ausência tão pesada quanto sua presença.
Após a porta se fechar, aproximei-me do espelho ao lado da lareira. A menina que olhava de volta para mim tinha os mesmos cabelos negros de minha mãe, mas os olhos... os olhos eram os dele — tíbios e desprovidos de brilho. Naquele instante, decidi que, se esperavam força de mim, seria essa força que eu lhes mostraria. Porém, sabia que isso teria um custo, algo que se esvairia de mim para sempre.
Naquele dia, uma nova Lissara começou a nascer, uma gatota disposta a erguer muros ao redor de si para proteger-se. Havenswood continuaria a ser um lugar sombrio e gélido, mas eu me tornaria inabalável. Com o tempo, a dor transformar-se-ia em resiliência, algo que ninguém ousaria questionar.
Enquanto as gotas de chuva corriam pela vidraça, senti-me a desfazer aos poucos, mas escondi isso no fundo do coração. A partir daquele momento, eu começaria a construir minha própria armadura, impenetrável e silenciosa, pronta para enfrentar o mundo — e eu mesma.
Quando completei dezoito anos, fui finalmente apresentada à sociedade. Havenswood, em contraste com sua atmosfera usual, estava deslumbrante naquela noite, transformada para o grande baile de debutantes em minha honra. As velas cintilavam em profusão, refletindo-se nos espelhos dourados e nos lustres de cristal, criando um espetáculo de luz e sombra que parecia dançar com o próprio salão. Mas, apesar do brilho e da pompa, não conseguia afastar o peso que pressionava meu coração.
Naquela noite, vesti o mais belo vestido que já havia possuído, uma seda azul-escura quase negra, contrastando com a palidez da minha pele. Os bordados dourados que adornavam a cintura e o decote eram delicados e exalavam um toque de riqueza e mistério, reminiscentes das tapeçarias ancestrais que adornavam a biblioteca. Meus cabelos, negros como a meia-noite, estavam presos em um penteado elaborado, com pequenas pérolas que cintilavam sob a luz das velas. Eu sabia que estava linda, mas a imagem que via no espelho era mais uma prisão do que uma bênção, um fardo tanto quanto um dom.
O salão estava repleto de nobres, todos em trajes exuberantes, observando-me enquanto sussurravam entre si. Sentia o peso dos olhares sobre mim, o julgamento silencioso daqueles que me viam apenas como a filha amaldiçoada de Havenswood. Os olhares pareciam dizer: "Ela é bela, mas é também um enigma sombrio."
Enquanto cruzava o salão, era impossível ignorar o desconforto oculto nas expressões que me seguiam. Eu era anunciada com grandiosidade, mas, para muitos ali, não passava de uma figura a ser temida ou desprezada. O peso da culpa, um sentimento que carregava desde a infância, parecia se intensificar em cada olhar que me era lançado.
E então, em meio a todos os rostos no salão, meus olhos encontraram os dele. O Príncipe Theodore, herdeiro do trono, estava do outro lado da sala, imerso em uma conversa. Era exatamente como os rumores diziam: alto, de porte imponente, com cabelos castanho-escuros e olhos que refletiam inteligência e uma força silenciosa. Quando nossos olhares se cruzaram, senti um estranho silêncio interno, como se o mundo ao meu redor tivesse ficado suspenso no tempo. Ele me observou por um instante que pareceu prolongar-se infinitamente, e em seus olhos percebi algo que nunca tinha visto antes: uma curiosidade genuína, quase desarmante.
Mas o momento foi breve. Antes que eu pudesse interpretar o que vi, Lisbet, a noiva prometida do príncipe, aproximou-se dele, tocando-lhe o braço de forma possessiva. Ela representava tudo o que uma futura rainha deveria ser: delicada, com cabelos loiros e olhos verdes que irradiavam uma doçura calculada. Sua presença ao lado dele era como uma lembrança de que, por mais que eu desejasse, jamais poderia pertencer a aquele mundo. Ela sorriu para mim, mas seus olhos não espelhavam o gesto. Era como se dissesse: "Lembra-te de onde é o teu lugar."
Seguiram-se as danças, uma série de valsas e cortesias formais. Cada cavalheiro que se aproximava elogiava minha aparência e minha graça, mas os elogios soavam ocos e desinteressados, como palavras proferidas apenas por cortesia. Eu sorria, trocando algumas palavras com cada parceiro, mas por dentro sentia uma muralha se erguendo ao meu redor. Sabia que aqueles elogios, embora educados, eram pontuados por uma sombra de desconfiança.
Durante uma breve pausa, aproveitei para me retirar à varanda, buscando alívio no ar fresco da noite. Lá fora, o jardim de Havenswood estava iluminado por lanternas dispersas, e a luz da lua cheia lançava um brilho prateado sobre as flores, que pareciam tão vivas e vibrantes em contraste com a escuridão que carregava dentro de mim.
Fechei os olhos, permitindo-me sentir o peso da solidão que sempre me acompanhava. A beleza que todos admiravam era apenas uma máscara, uma armadura para proteger o que verdadeiramente sentia. A dor de ser sempre a figura isolada e culpada era um peso que carregava em silêncio.
Foi então que ouvi passos leves atrás de mim. Abri os olhos e me virei, apenas para encontrar o Príncipe Theodore. Ele havia deixado a festa para vir até a varanda, e seus olhos fixavam-se em mim com uma intensidade que fez meu coração acelerar.
"Lady Lissara," disse ele, com uma voz suave, mas cheia de autoridade. "Estavas a admirar os jardins?"
"Sim, Vossa Alteza," respondi, tentando controlar o nervosismo. "Eles são belos, não são?"
"Sim, belos," concordou ele, mas seus olhos não estavam nos jardins. Havia algo em seu olhar, uma curiosidade inquietante que me deixou desconcertada, como se ele estivesse tentando enxergar além da minha fachada.
Antes que pudesse dizer algo mais, Lisbet apareceu na porta, chamando-o com uma doçura que soava ensaiada e meticulosa. Theodore lançou-me um último olhar, uma mistura de curiosidade e um estranho sentimento de renúncia, e então afastou-se, retornando ao mundo que sempre seria dele, mas que nunca poderia ser meu.
Permaneci ali, sozinha, sentindo o frescor da noite envolver-me como um manto de realidade. Por mais que tivesse desejado ser notada, sabia que a atenção de Theodore seria passageira, uma faísca efémera. A minha beleza, embora me tornasse objeto de olhares, não despertava em ninguém um interesse verdadeiro e duradouro.
O baile prolongou-se até altas horas, mas para mim o encanto já se desfizera. Mesmo após minha apresentação oficial à sociedade, continuaria sendo a filha amaldiçoada de Havenswood, aquela que todos observavam com desconfiança.
Quando a última música cessou e os convidados começaram a se retirar, voltei para o meu quarto, exausta e vazia. O espelho me devolveu o reflexo de uma jovem atraente, mas tudo o que eu conseguia ver era a solidão nos meus próprios olhos. Minha beleza, longe de ser um presente, era um fardo que me separava dos outros, uma máscara que me fazia desejada, Mas jamais verdadeiramente amada.
Naquela noite, ao apagar as luzes e deitar-me na cama de dossel, compreendi que, para sobreviver numa sociedade que me rejeitava, teria que continuar vestindo minha máscara e escondendo quem realmente era. Havenswood podia brilhar em luz e esplendor, mas sabia que, no fundo, as sombras sempre prevaleceriam — e eu, Lissara de Havenswood, teria que aprender a viver entre elas.
A grande corte do rei Teodor III resplandecia em luz e grandiosidade naquela noite, iluminada por candelabros que cintilavam ao lado de tecidos finos, pendendo com graça das colunas de mármore. O burburinho das conversas animadas misturava-se ao suave murmúrio da música, preenchendo o ar com um encanto de luxo e fascinação. Mas, para mim, a beleza da noite parecia apenas realçar a ansiedade que latejava dentro do meu peito.
O salão estava repleto dos membros mais influentes da nobreza, todos em trajes exuberantes, cada detalhe cuidadosamente escolhido para impressionar. Meus passos sobre o mármore polido eram quase inaudíveis, mas em minha mente ecoavam como o anúncio de um destino inevitável. O vestido de veludo vermelho profundo que usava abraçava minha pele como uma segunda camada, destacando minhas curvas contra minha palidez. Sentia o peso dos olhares, assim como o das expectativas que pareciam me envolver como uma névoa opressora.
Assim que entrei no salão, meus olhos foram atraídos para o centro — onde ele estava. O Príncipe Theodore. Seu porte, inconfundível, era o de alguém que carregava o peso de todo um reino nos ombros. Ele usava um casaco preto com detalhes dourados, e sua postura ereta refletia a dignidade de sua posição. Mas o que realmente capturou minha atenção foi a maneira como ele dominava o ambiente, como se o próprio ar ao seu redor o reconhecesse como soberano.
Ele conversava com um grupo de nobres, seu sorriso cortês irradiando uma confiança natural, mas havia algo em seu olhar que me fez hesitar. Era um brilho, uma profundidade silenciosa, que parecia ocultar segredos. Senti meu coração disparar, e por um instante, uma parte de mim desejou virar as costas e sair daquele lugar. Mas outra parte, uma parte mais profunda, ansiava por aquele encontro, um desejo incontrolável que me impulsionava a ficar.
Movida por uma força invisível, permaneci no salão, cumprimentando aqueles que me dirigiam a palavra, embora meus olhos continuassem a procurar Theodore, atraídos como por um ímã. E então, finalmente, nossos olhares se encontraram. O tempo pareceu congelar, o som ao redor dissipando-se. Havia apenas nós dois, separados por uma multidão, mas conectados por algo inexplicável.
O príncipe manteve o olhar por um longo momento, seus olhos castanho-claros revelando uma mistura de surpresa e... algo mais, talvez interesse. Ele desviou o olhar primeiro, voltando-se para responder a alguém ao seu lado, mas o impacto daquele momento permaneceu comigo, como uma marca impossível de apagar.
Sabia que correr atrás desse sentimento seria arriscado. Theodore estava prometido a Lisbet, e eu, apesar de minha posição, não passava de uma figura periférica, uma sombra aos olhos de muitos ali presentes. No entanto, algo em meu íntimo rejeitava essa lógica, recusava-se a render-se à razão. Um desejo inexplicável de conhecê-lo, de desvendar os mistérios escondidos por trás de sua fachada perfeita, inflamava-se dentro de mim.
A música então começou a tocar novamente, uma melodia suave que anunciava o início de outra dança. Eu estava prestes a me retirar para o refúgio da sacada quando ouvi a voz dele, clara e inconfundível, atrás de mim.
"Lady Lissara, permitiria-me a honra desta dança?"
Meu corpo inteiro ficou imóvel, uma onda de calor subindo até meu rosto. Virei-me devagar, e ali estava ele, de pé diante de mim, com o olhar fixo no meu, carregado de uma intensidade que me fez perder o fôlego. Por um momento, fiquei sem palavras, mas então, como que envolta em um manto de formalidade, assenti com um leve sorriso.
"Seria uma honra, Vossa Alteza," respondi, minha voz firme apesar da tempestade de emoções que fervilhava dentro de mim.
Ele segurou minha mão com delicadeza, e o toque de seus dedos contra minha pele enviou um arrepio pelo meu corpo. Conduziu-me ao centro do salão, e senti os murmúrios ao nosso redor se intensificarem. Sabia que todos estavam observando, mas isso apenas tornava a tensão entre nós mais palpável. Quando ele colocou sua mão em minha cintura e começou a guiar a dança, tive a sensação de que o mundo inteiro havia desaparecido, deixando-nos sozinhos naquele momento.
A música era lenta, quase etérea, e nossos movimentos estavam em perfeita harmonia. Theodore dançava com uma graça que parecia parte de sua própria essência, e apesar de sua postura rígida, havia uma suavidade em seus gestos que dizia mais do que qualquer palavra. Enquanto dançávamos, nossos olhares se cruzavam repetidamente, e a cada encontro sentia uma conexão crescendo, uma corrente silenciosa de compreensão que passava entre nós.
Mas, apesar de toda essa proximidade, uma distância intransponível permanecia. Eu podia sentir a muralha invisível que ele mantinha ao redor de si. Seus olhos transmitiam desejo, mas também uma reserva profunda. Era um homem dividido entre o dever e seus sentimentos, e eu estava ali, presa no meio desse conflito.
Durante a dança, ele se inclinou ligeiramente em minha direção, o suficiente para que suas palavras fossem apenas para mim. "Você tem sido motivo de muitas conversas, Lady Lissara," ele murmurou, sua voz profunda enviando uma onda de calor pela minha espinha. "Mas vejo que há mais em você do que os rumores sugerem."
Meu primeiro instinto foi responder com uma cortesia distante, mas em vez disso, algo dentro de mim se rebelou. "Os rumores raramente revelam a verdade, Vossa Alteza," disse suavemente, sem desviar o olhar. "Eles apenas tocam a superfície."
Ele sorriu, mas seus olhos permaneciam sérios, como se refletissem algo mais profundo . "Talvez um dia eu descubra o que está sob essa superfície," respondeu, e sua voz carregava uma promessa que me fez estremecer.
Antes que eu pudesse reagir, a música chegou ao fim, e o instante entre nós quebrou-se como vidro. Ele soltou minha mão, fazendo uma leve reverência, que retribuí com uma mesura graciosa, apesar da confusão que suas palavras haviam causado dentro de mim. Ele afastou-se, retornando para junto de Lisbet, que o aguardava com um sorriso calmo, alheia ao que havia acabado de acontecer.
Fiquei ali, no centro do salão, enquanto o burburinho da corte retomava ao meu redor. Mas, dentro de mim, algo havia mudado. Aquele encontro, breve e carregado de tensão, plantara uma semente de sentimentos que eu sabia serem imprudentes. Mas era tarde demais para voltar atrás. O desejo de desvendar o príncipe, de entender o homem por trás da máscara, havia-se infiltrado em minha alma, mesmo que ele fosse inalcançável.
Com o coração pesado e a mente fervilhando de pensamentos contraditórios, recuei para as sombras da corte, sabendo que aquela noite marcaria o início de algo que eu não poderia controlar — algo que, se deixasse crescer, poderia me destruir ou me salvar.
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