Paulo.
Depois de longos quinze anos eu finalmente estou liberto, não me entendam errado, eu sei que precisei pagar pelo meu erro, e não estou aqui para me fazer de vítima, longe disso, errei e paguei por isso.
Mas ninguém merece ficar preso, no meu caso eu mereci mesmo, afinal matei uma pessoa, o motivo? O filho da puta abusou da minha irmã, eu tinha apenas quinze anos e aquele canalha que tinha obrigação de cuidar da neta, abusou dela, eu não fui com a intenção de matá-lo, mas quando eu o peguei em cima da minha irma, peguei a faca e cravei no peito dele sem dó, só depois que eu vi que em seus olhos não tinham mais vida, eu sosseguei e a primeira coisa que fiz foi pedir para a vizinha cuidar da minha irmã, praticamente eu implorei a ela. E ela me atendeu.
Depois disso, eu me entreguei à polícia e permaneci preso desde então, fiquei três anos na fundação casa e paguei o restante na penitenciária.
As coisas que vivemos em uma penitenciária, é de doer o estômago, a superlotação, dez prisioneiros para um cubículo que cabe no máximo 4. Não querendo conforto ou luxo, afinal cadeia é para quem comete erros, mas ainda sim somos humanos, queríamos um pouco de humanidade, ao menos uma água potável.
E eu sei que o fim não justifica os meios, mas eu estava possesso de raiva, não é fácil, um adolescente ver o seu avô sobre uma menina de apenas dez anos, dez anos!
A minha irmã teve sua infância roubada, por conta de um velho que tinha o papel de cuidar dela.
Estupro, quando ouvimos esse tipo de coisa na televisão, nunca achamos que isso poderia acontecer com a nossa família, com alguém que nós amamos, mas nesse mundo não existe apenas pessoas boas, existe muitas pessoas más e muita das vezes pode estar dentro do nosso lar.
Vocês podem pensar, algo aconteceu com seus pais para eles serem criados pelos avós.
Bom, eu e a Gabi ou Gabriela, somos irmãos da mesma mãe, porém pais diferentes.
O meu pai, foi algum cliente da minha mãe e nunca ouvimos falar sobre ele, não que eu precise dele, não agora pelo menos, talvez quando moleque,mas hoje em dia não.
A minha irmã é filha de um marginal e adivinha? Teve filho com uma prostituta de esquina, vulgo minha mãe.
Mas não tenho rancor dela, ou desgosto dela por conta do que ela trabalhava, ela estava botando comida na mesa, de um jeito meio torto, mas estava.
A minha bronca e birra com ela, foi ser mente fraca e cair na conversa do meu "padrasto", se mudou com ele, deixando dois filhos para trás.
Eu era a porra de um adolescente e minha irmã uma criança, o que ela estava pensando?
Consequentemente, tivemos que ficar com o pai dela, o meu avô, eu estava revoltado, odiava ficar na casa dele, quem eu tinha um contato mais próximo já havia morrido, era a minha vó, então no auge da minha rebeldia, eu quase não parava em casa, vivia na casa dos meus colegas jogando videogame e com uma família completamente normal. Uma família de verdade.
Antes eu tivesse permanecido em casa, assim não aconteceria o que houve com a minha irmãzinha. A culpa me corrói e dói dia após dia.
Ou talvez não, como a psicóloga me orientou, O meu avô era um mau-caráter e sem escrúpulos, ele faria mais cedo ou mais tarde, eu estar ou não na casa, não faz diferença.
...Eu me chamo Paulo, tenho 30 anos, e essa é a minha história. ...
Paulo
Nunca achei que fosse tão difícil achar um trabalho depois que você é preso.
Está tudo indo bem, mas é só pedirem meus antecedentes criminais e pronto, perco a oportunidade de trabalho, mas não posso desistir, preciso encontrar um emprego, nem que seja lavando pratos, qualquer coisa.
Encerro mais um dia procurando serviço, e volto para a casa que eu divido com a minha irmã que agora já é uma moça de 25 anos. Ela me abrigou em sua casa.
— Boa noite mano! — Cumprimentou assim que eu entrei.
— Boa noite, Gabi! — Respondi desanimado e sentei no sofá amarelo.
— Que cara é essa? Não encontrou nada?
— Não. Não tem jeito ninguém contrata um presidiário, eles têm medo.
— Calma Paulo, tenho fé que você irá encontrar…
Solto um riso, ela tem tanta fé em mim, queria ter um pouco disso.
— É o que eu espero.
— Dona Emília lhe deu esse terno. Ela disse que talvez você indo assim, consiga um emprego nessas lojas chiques.
— Duvido muito que uma roupa dê sorte. — Eu já estava desanimado a verdade era essa.
— Custa nada tentar mano! Joga essa energia negativa para lá. — Ela olhou o relógio e se levantou. — Bom, eu tenho que ir, hoje é aula do professor Nelson, se eu me atrasar, ele irá me dar uma bronca, tchau mano!
Fico sozinho nessa casa, nem um bichano pra fazer companhia.
Um terno vai me dar uma oportunidade, duvido muito, nem de roupa social eu gosto.
Tomo um banho e vou dar uma volta pelo bairro, a minha irmã mora em um bairro de classe média, são casas bem ajeitadas, bem melhor que o muquifo onde crescemos.
Dona Paulina fez um ótimo trabalho cuidando da minha irmã, pena ela não estar mais entre nós, nem pude me despedir dela, já que ela não era minha parente, não pude sair da prisão. Mas jamais esqueci dela, ela sempre me visitava com alimentos, roupas limpas, produtos de higiene, e trazia cartas da minha irmã, nunca quis que Gabi visitasse aquele lugar, aquilo não era para ela.
Fui andando sem direção, quando vi já havia parado em um bairro de ricos. Essas pessoas todas de narizinho em pé, chegam a me dar asco.
Fui fazer o caminho de volta, quando ouvi uma voz, que automaticamente me fez parar.
— Para, pai. Eu vou ser sempre a sua filhinha… — Era uma morena, que olhos incríveis, que voz doce.
— É serio, meu amor. Preciso de você amanhã na empresa. Seu irmão está me deixando louco.
— Pai, até parece que não conhece o Arthur, ele nasceu para nos perturbar. — Disse e olhou em minha direção, nossos olhares se cruzaram.
O que deu em mim? Ficar escutando conversa alheia.
— Ei rapaz o que faz aqui? — O seu pai perguntou.
— Nada, senhor. Já estou saindo.
Sai sem olhar para trás, não queria intrigas, ou coisa parecida.
Voltei para a casa da minha irmã, arrumei a casa, já que eu não trabalho, não estudo, custa nada eu limpar a casa, até porque nós dois usamos o ambiente.
Fiz o jantar e finalmente a minha irmã chegou quando coloquei a travessa de lasanha na mesa.
— Hum… Que cheiro bom. A mulher que casar com você. Está feita. Casa limpa, comida na mesa, um sonho de consumo.
— Deixa de bobeira, eu não fiz nada demais. Vai lá tomar um banho para a gente comer.
A minha irmã entrou em seu quarto e eu terminei de ajeitar tudo. Nos sentamos para comer, eu preferia comer no silêncio, mas a minha irmã tinha outros planos.
— Paulo, eu estava conversando com a minha amiga de faculdade, e ela disse que lá na empresa do pai dela, está precisando de faxineiro. Porque você não tenta, você é bom com limpeza.
— Não sei, Gabi. Será que me contratariam quando souber meus antecedentes?
— Se você não tentar, nunca vai saber.
— Tem razão. Eu só quero um emprego.
— Vai conseguir, vai com o terno para te dar sorte. — Sugeriu e eu ri.
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Porque eu não deveria tentar? Afinal, o não eu já tenho mesmo, eu preciso correr atrás do meu sim, fui até a empresa que a minha irmã falou.
Fragrances é o nome da empresa, uma empresa de perfumes, eles importam nacional e internacionalmente.
— Com licença. Fiquei sabendo de uma vaga para faxina. Posso deixar o meu currículo aqui?
— Só um momento… — A moça pegou o telefone e ligou para alguém. — Na verdade, a Senhorita Luísa já pode entrevistar você. — A recepcionista falou.
— Verdade? — Perguntei surpreso.
— Sim, é só ir ao primeiro andar, terceira porta à direita.
— Obrigado.
Entrei no elevador, e apertei o primeiro andar.
A terceira porta a esquerda, abri e vi um homem em cima de uma mulher, transando.
— Desculpa… — Fechei a porta rapidamente.
Acho que não era a terceira porta a esquerda, deve ser a direita. Dessa vez eu bati, não queria ter outra surpresa.
— Entre, por favor.
Eu entrei, e a senhorita estava atrás de uma mesa.
— Você veio atrás da vaga de faxineiro? — Perguntou
— Sim, senhora.
— Pode me dar o seu currículo, por gentileza?
— Claro… — Eu entreguei na sua mão.
— Senhor, Paulo, né? — Eu assenti. — Vejo que não possuí nenhuma experiência recentemente. A última foi como pintor há muitos anos atrás.
— Sim, eu andei fora do mercado de trabalho, mas eu estou disposto a trabalhar, eu tenho disponibilidade de horário, sou rápido, pró ativo, e aprendo fácil.
— Certo, o trabalho será mais braçal, varrer, passar pano, lavar janelas, tirar o pó, se precisar de você para limpar algo, você precisa ir imediatamente, essas coisas. Acha que consegue, senhor Paulo?
— Com certeza, eu sou muito caprichoso, senhora.
— Ótimo, o salário é condizente a vaga, mil e seiscentos, damos vale transporte, e você tem direito a comer no refeitório da empresa.
— Tá perfeito, para mim, senhora.
— Certo. Gostei de você Paulo. Me traga toda documentação e a vaga é sua.
— Eu fico imensamente grato, senhora. — Aperto a sua mão.
Ela me entrega o papel com os documentos que eu vou precisar trazer e também o exame admissional.
Olhei a lista e quase não acreditei quando eu vi que eles não pedem antecedentes, será que foi um erro?
Bom, se foi, a culpa não é minha. Eu saí de lá feliz.
Paulo
A noite contei a novidade a minha irmã, que vibrou comigo, colocou um pagode e comprou umas latinhas de cerveja para comemorar.
Mas não ficamos comemorando por muito tempo, pois precisaríamos trabalhar, eu trabalhava como pedreiro como bicos, e enquanto eu não tinha nada fixo, era isso que eu conseguia sobreviver.
Na manhã seguinte, eu levei toda a documentação que me foi pedido, fiz o exame admissional, logo depois eu peguei no batente.
Enquanto eu tinha o meu horário de descanso, eu recebi a ligação, eu poderia começar a trabalhar amanhã mesmo.
Fiquei tão feliz que chutei o balde de água do canteiro de obras. Fazendo molhar o meu pé, eu ri, pois nada podia estragar a minha alegria.
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— Eu tô tão feliz por você irmão… — Gabi me abraçou, quando contei a novidade para ela.
— Eu também estou feliz. Foi o terno… — Brinquei, ou talvez foi mesmo, Coloquei uma casinha na maquete.
Estava ajudando a minha irmã a montar a maquete dela, Gabi faz faculdade de arquitetura e urbanismo. Ela trouxe um trabalho para casa, montar uma maquete do bairro onde cresceu. Ela pensou nos lugares que costumávamos ir, ela fez tudo desde os bonequinhos até a casinhas de tijolos, eu apenas ajudei a montar.
Finalizamos a maquete já perto da meia noite, então fui dormir, pois acordava cedo.
Me apresentei para o trabalho às sete da manhã em ponto. Luísa me deu o uniforme com a logo da empresa e já coloquei, assim como me deu o carrinho de limpeza.
Ela me passou a prancha com os lugares que eu teria que limpar, e ir marcando para no final entregar tudo para ela. Comecei pela sala de um dos chefes.
Senhor Rodrigo, aproveitei que estava vazia a sala e já fui limpar, coloquei um fone de ouvido, esperava sair do mesmo jeito que entrei, sem ser visto.
Tirei o pó, limpei o chão e estava saindo da sala, quando dei de cara com uma mulher. Era a mesma que eu havia visto conversando com o pai no outro dia, seus olhos são muito mais lindos de perto.
— Desculpa! Não queria te assustar. — Falei, pois ela deu um pequeno salto, colocando a mão no peito.
— Sem problemas, eu estava distraída. Sou Serena… — Ela estendeu a mão para mim.
— Paulo… — Apertei a mão delicada dela, tão diferente da minha que era áspera.
— Muito prazer Paulo. Você já terminou? Não quero atrapalhar…
— Serena, o pai já… — Um homem entrou na sala falando mas parou quando me viu. — Tá fazendo o que aqui, faxineiro? — É o mesmo homem que eu vi transando com a mulher, outro dia.
— Arthur! — Serena ralhou com o rapaz e ela parecia chateado com ele.
— Sem problema, senhorita… — Falei. — Já estou saindo, senhor. — Fechei a porta, assim que passei o carrinho da limpeza.
Sai da sala, pois eu não era uma pessoa muito calma, e eu precisava desse emprego, eu contava com ele para pelo menos conseguir sair da casa da minha irmã. Ela precisa da privacidade. E se eu ficasse correria o risco de eu pular no pescoço dele. Isso ia não ser nada bom pra ele e muito menos para mim.
Fui para outro andar da empresa, pois tinha muita coisa para limpar.
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