Personagens:
Ali Nejat.
Aaliyah.
P.O.v.S AALIYAH
Arábia Saudita
Um casamento arranjado, assim seguia eu. Não havia tido escolha, não conhecia a família da qual eu iria pertencer daqui para frente e nem sequer imaginava como era o meu esposo.
Como muçulmana, eu sabia dos meus deveres e valores: precisava dedicar, daqui para frente, a minha vida ao meu casamento e aos filhos que teria. Esse era o meu dever como esposa.
Não sabia expressar se eu estava feliz com aquilo. Digamos que eu me considerava uma pessoa de mente " aberta"; não aceitava todas as normas empregadas pelo islã e queria lutar por mais direitos.
As mulheres eram bem restritas aqui na Arábia Saudita. Só saímos de casa acompanhadas por algum parente homem que fosse da família e tínhamos que usar abaya para cobrir todo o corpo, era uma regra do país.
— Aaliyah, sente-se nervosa? — meu tio cutucou a minha mão e sobressai dos meus pensamentos.
Olhei de canto de olho o mais velho. Ele era a única família que eu possuía. Eu era órfã quando ele me acolheu, após o falecimento dos meus pais.
— Saiba que daqui para frente você pertencerá à família do seu esposo. Seja obediente a ele, seja uma boa esposa e que Alá te dê muita sabedoria para cuidar da casa, Aaliyah.
— Inshallah, tio, que assim seja!
Curvei a cabeça diante a sua mão em sinal de respeito e pedi para que ele me abençoasse. Por mais que eu estivesse com medo naquele momento, eu não tinha o direito de insultá-lo ou ir contra o meu casamento.
Precisava ser forte e aceitar que este era o destino que Allah preparou para minha vida. Eu teria que conviver com estranhos, mas eles faziam parte da religião e com certeza não eram pessoas ruins.
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Fui colocada em um dos cômodos da casa; entrando no quarto, possivelmente eu passaria a noite com o meu marido naquele aposento. Eu estava muito nervosa e não tinha ideia do que fazer.
"Seria a primeira vez que ficaria sozinha na presença de um homem."
Ouvi algo batendo e virei para trás, assustando-me pelo barulho.
Eu estava paralisada, confesso, com uma sensação que fugia completamente dos costumes da minha religião. Era normal sentir aquilo? Sentir como se houvessem várias borboletas no estômago, por um completo estranho?
É como se quando os nossos olhos se cruzaram, eu tivesse a certeza de que meu tio realmente havia me casado com aquele homem que estava ali, e eu teria que passar o resto da vida.
Será que haveria amor?
Será que aquele casamento arranjado daria certo?
A primeira coisa que o homem fez assim que parou na minha frente foi abaixar o olhar, desviando-o logo em seguida.
Meu peito subia e descia, meus lábios estavam entreabertos e havia muita tensão naquele momento. Parecia que o mundo tinha parado no tempo e não haveria ninguém que me ajudasse.
Eu estava prometida a passar a noite com um desconhecido que eu nem sequer sabia o nome. Tio Ali nem ao menos quis revelar o nome do meu prometido.
— Aaliyah.— ao contrário de mim, o tom rouco que fluía de sua voz sabia muito bem quem eu era. — Aaliyah. — seu tom soou mais firme, não em um sussurro dessa vez.
Levantei o olhar timidamente, pois teria que obedecê-lo daqui para frente.
— Não precisa sentir vergonha de mim. Shúfi. — pediu calmamente para que eu olhasse.
Engoli em seco e assenti, com os meus olhos até ao homem que estava parado a alguns metros de distância.
— Não sinta medo, Aaliyah, eu estou aqui para ser seu amigo e proteger você. —sua mão tocou em meu braço e esquivei-me, afastando-me do toque. Não era apropriado um homem tocar em uma mulher. Mesmo nós sendo casados, não tínhamos intimidades para tal ato. — Me desculpe — ele percebeu o quanto aquilo me incomodou e rapidamente consertou o mal-entendido. — Você parece ser uma mulher de muitos valores, eu gosto disso — afirmou, sentando-se na cama de casal.
Permaneci em pé, parada, respirando fundo.
Seria essa a hora de me entregar...
— Não se sinta forçada a nada — seu tom alastrou-se de um modo compreensivo, e, logo ao ouvir me surpreendi com a sua atitude.
Aquilo fugia dos costumes; onde ele me dava total liberdade para eu escolher. Olhei em sua direção e tomei coragem:
— Por que você está fazendo isso por mim? — questionei em dúvida.
— Eu não queria me casar com você. —sua revelação me fez ficar chocada. — Também fui forçado. E entendo como é ser obrigado a casar com quem não ama. Foi assim com a primeira, e será assim com você, habibti.
Seus olhos me fitaram bem lá no fundo, como se essa situação fosse um enorme erro.
Pov's Aaliyah.
Arábia Saudita.
05:00 AM
Não havíamos consumado o casamento, ele optou em respeitar o meu momento e falou que não iria me obrigar a nada. Inclusive optou em dormir no chão do quarto e eu na cama.
Levantei vagarosamente para não causar nenhum barulho. Já estava tocando o primeiro toque para o início da oração. Todo muçulmano tinha que orar cinco vezes ao dia.
Cubri os meus cabelos com hijab, e me aproximei de onde o meu esposo estava deitado de mal jeito. Ajoelhei-me e cutucei o seu braço de leve:
— Ali Nejat.— pronunciei o seu nome, baixinho.— Ali Nejat. — apenas se virou para o outro lado, seu sono estava pesado demais.
Me retirei do quarto, não conhecia muito bem a casa. Era dois andares; resolvi descer para andar de baixo em busca de achar um tapete.
Oravamos de joelhos e sempre em direção a Meca, a cidade sagrada.
O profeta Muhammad para nós muçulmanos foi o último profeta enviado por Alláh. Através dele foi fundado o Islã. E no alcorão havia cinco pilares que todo muçulmano deveria seguir, e um deles era:
"Não existe outro Deus há não ser Alláh, e o profeta Muhammad é o seu mensageiro. "
Fechei os olhos e me curvei de joelhos, na sala de estar. Li um versículo do Alcorão, fazendo minha oração.
Assim que terminei, fui direto para cozinha. Estava conhecendo um pouco mais da casa que seria minha.
Sabia cozinhar muito bem, desde de pequena fui ensinada a fazer tudo. Eu gostava de arrumar casa, limpar, cozinhar.
Eu estava feliz naquela manhã, estava sorrindo e animada para preparar o café da manhã pro meu esposo.
Montei a mesa, estava ansiosa esperando-o descer.
Ouvi o som dos seus passos apressados e meu coração começou a bater acelerado, quase querendo sair pela boca.
E assim que apareceu, sorri:
— Bom dia.
— Bom dia!— o cumprimentei, sorridente.
Ele nem sequer olhou para aquilo que havia preparado, somente pegou uma fruta na geladeira e saiu comendo.
O acompanhei até porta, estava chateada, mas talvez estivesse atrasado para o trabalho.
Seus olhos escuros olharam para mim. Estávamos sem saber o que fazer na presença um do outro.
— Você pode lavar a minha roupa?
— Uhum.— assenti.
— Volto à noite. Tchau!— deu um beijo na bochecha, me deixando corada.
— Tchau, habibi. — acenei.
— Não me chame de habibi.— me cortou.— Estou brincando, Aaliyah. — exibiu um sorriso, me arrancando uma risada espontânea— Pode me chamar do que quiser, habibti. — segurou em minha mão, acariciando.
Encarei o gesto, sentindo um frio na barriga. Enquanto nos olhávamos com o brilho nos olhos, sorríamos.
— Ali Nejat.— a voz autoritária soou no fundo.— A incompetente da sua nova esposa, tá fazendo o quê aí parada na porta?
Estremeci totalmente quando viramos....
Engoli em seco, abaixando a cabeça de forma submissa. Senti o meu marido apertar ainda minha mão, como se quisesse me passar segurança.
— Mãe, Aaliyah tava se despedindo de mim.
— O lugar dela é na cozinha.— o repreendeu.— Vá toma conta da casa. Yalla! Yalla! Não quero esposa preguiçosa dentro desta casa.
Sai rapidamente e quando passei ao seu lado, apertou o meu braço, na frente do seu próprio filho e disse;
— Saiba o seu lugar. Caso ao contrário, ele irá te repudiar como fez com a primeira e te jogará no vento. Ele não se apaixona por muçulmanas, só por estrangeiras.
— Mãe, não fale besteira.— a advertiu.
— E não é verdade, Ali Nejat? Irá trazer aquela firanghi estrangeira para dentro desta casa, jogará o nome da nossa família ao vento.
Enchi os meus olhos de lágrimas, ficando mal ao ouvir aquilo.
Eu não tinha a menor chance.
Pov's Aaliyah.
Arábia Saudita.
07:00 AM.
Me encontrava sozinha na cozinha, cumprindo com as minhas obrigações. Sei o que meu tio jamais escolheria o pior para mim, mas... Eu me sentia silenciada.
Essa casa não era mim, a minha sogra havia deixado bem claro. Fui humilhada na frente do meu esposo e ainda me sentia atormentada com tudo que ouvi mais cedo.
Por um momento a tampa da panela escorreu da minha mão e caiu no chão. Me curvei para pegar, foi bem na hora que:
— Nadira já te fez chorar também? — a voz fina soou no cômodo.
Ergui o olhar assustada e sequei rapidamente as lágrimas que desciam pelo meu rosto.
— Quem é você?— interroguei confusa, ao vê a muçulmana.
— Me chamo, Khadija, sou esposa do irmão do Ali Nejat. Prazer!
— Prazer.— a cumprimentei de volta, estando triste.
— Foi assim com a primeira, será assim com você, se abaixar a cabeça para tudo que aquela naja diz.— a encarei de relance, surpresa.— Nadira quer os filhos só para ela, se Faruk não me amasse, ele já teria me devolvido assim como Ali Nejat fez com a primeira.
— Ele devolveu a primeira?— soei incrédula.
— Sim, na manhã seguinte da noite de núpcias. Esse assunto não é tocado nesta casa, mas coitada, foi jogado ao vento por nenhum motivo.
— Será que ele fará isso comigo também?— sussurrei, com aquele sentimento de medo.
— Torça para que isso não aconteça.— disse, andando até o fogão.— Uma mulher sem marido não é nada.
– Tem razão.— concordei.
– KHADIJA!— a voz da mais velha gritou do outro cômodo.— Traga o meu chá! Yalla!
— Já vai sogra.— respondeu e em seguida murmurou:— Cobra! Todo dia é um inferno. Alláh Alláh! Me dê paciência — reclamou, enquanto colocava a xícara na bandeja.
— Quer que eu leve?— me ofereci.
— La! É capaz dela querer jogar esse chá quente em você.
Encolhi os ombros, receosa. Pela forma de como falava, dava até medo.
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17:00 PM.
Khadija e eu havíamos nos tornado confidentes, ela havia me contado muitas coisas do que acontecia entre a família.
Descobri que o seu marido e Ali Nejat possuíam uma loja de tecidos, eles eram comerciantes. Ela também me contou que nem Faruk e nem Ali Nejat gostavam de demonstrar sentimentos.
Minha cunhada ligou o som e estava me ensinando a dançar.
— Terá que tirar o hijab, mas não se preocupe.
Fechou a porta do quarto, para que ninguém entrasse. Embora eu estivesse timida, atendi o pedido.
Ela começou a me ensinar os movimentos, para quando eu fosse dançar para o meu marido, ele sentisse o prazer de me ver dançar para ele.
Enquanto girava e seguia o ritmo da música árabe, o sorriso transparecia em meu rosto. Me sentia livre, era como se eu pudesse através da dança aliviar todos os sentimentos.
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19:30 PM
Quando foi a noite, esperei Ali Nejat chegar. Me encontrava no quarto, o aguardando.
Havia colocado o meu traje; o meu melhor hijab. Queria agradá-lo, queria que ele me visse com outros olhos.
E assim que entrou, todo o meu sorriso se desfaz, quando percebi que o seu semblante não estava bom.
— Salaam Aleikum.— o saudei, querendo ouvir o som da sua voz.
Mas nem sequer me notou, era como se eu fosse invisível naquele momento. E quando seus olhos cansados percorreram em meu direção:
— Arrume suas coisas.
— Minhas coisas?
— Sim, suas coisas.
O meu coração ficou tão partido. As lágrimas se formaram.
— Você vai me devolver?— tive a coragem de perguntar, soando com o tom embargado.
— Lógico que não.... habibti.— se aproximou— Por que pensou uma coisa dessas?
— Nada, só tive medo.
– Não tenha medo, você é a minha esposa. Não é?— assenti com a cabeça.— Pois então, habibti. Não quero te vê chorar.— carinhosamente secou as minhas lágrimas. —Olhe para mim, está tudo bem, certo?
— Certo.
Sua atenção admirava cada detalhe do meu rosto. Nossos olhos cheios de brilhos refletiam no fundo um do outro. A troca de olhar, fazia o meu coração bater tão forte dentro do peito. Minhas pernas estremeciam ao estar em sua presença.
— Iremos viajar, Aaliyah.
— Pra onde vamos?
— Irei te levar para fazer peregrinação em Meca.
— Está falando sério?
— Seu tio me contou que você nunca foi a cidade do profeta.
— É o meu sonho! É o sonho de todo muçulmano ir pelo menos uma vez na vida a Meca. Shukran, Ali Nejat.— o agradeci tão feliz, que o abracei no calor do momento.
A minha atitude não era nada apropriada. E logo me afastei:
— Me desculpe.
— Sem problemas.— sorriu, e vi que também estava sem graça.— Comprei um presente para você.
— Pra mim?
— Vai combinar com a cor dos seus olhos.— me encarou, exibindo o colar.
— Mashallah, como é bonito!— elogiei, sem me sentir digna para merecer aquilo.
— Posso colocar em você?— pediu e balancei a cabeça, me virando.
Seus dedos macios posicionaram o objeto em volta do meu pescoço e ele ficou alguns segundos, me mirando. Sentia o contato dos seus olhos, sobre a minha pele.
— Ficou mais linda. — sussurrou no canto do meu ouvido, com o seu tom rouco.
— Shukran.
— Posso te pedir uma coisa, Aaliyah?
— Sim, o que quiser.
— Eu quero um beijo.
Meus olhos ficaram balançados, os nossos rostos estavam tão próximos. Nunca havia beijado ninguém, ele seria o meu primeiro.
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