Julia recolheu todas as roupas que estavam espalhadas pelo quarto do Alfa.
Há alguns meses ela nunca imaginaria que estaria ali, naquele quarto. Mas respirou fundo, terminou de juntar tudo, abriu a janela do quarto e jogou tudo pelos ares.
Alexandre era o líder da alcateia Lua Nova, que estava escondida em uma área do interior de São Paulo. Era uma cidade pequena que passava desapercebida para qualquer humano que estivesse por perto, mas que tinha todo tipo de tecnologia e conforto para seus membros. Muitas dessas maravilhas ficavam escondidas entre a mata, em espaços subterrâneos ou dentro da caverna que ficava na cidade. Obviamente que essa caverna era desconhecida
da população, sendo utilizada apenas pelos lobos da cidadezinha.
O Alfa era um bom homem. Ele trabalhava incansavelmente para que todos estivessem sempre seguros, confortáveis e felizes.
Porém sua Luna, Emily, era bem diferente.
Desde crianças, Emily e Julia eram muito amigas. Os pais de ambas trabalhavam para o antigo alfa, Antônio. O pai de Emily era o beta e o pai de Julia era o secretário pessoal dos dois. Assim, as meninas sempre eram vistas brincando juntas, passeando pela cidade e estudando na mesma sala. Alexandre era cinco anos mais velho. Ele não brincava com as duas, mas estava sempre por perto, como um irmão superprotetor.
Quando o alfa Antônio morreu, Alexandre assumiu em seu lugar. Estava com seus 22 anos de idade e se sentia preparado. Tinha estudado a vida inteira por isso e a transição foi muito tranquila. Toda a alcateia o aceitou com alegria. As meninas ainda não tinham encontrado suas lobas, pois não haviam ainda completado seus dezoito anos.
Alexandre havia se tornado um homem muito bonito. Era alto, forte, com os cabelos negros e olhos castanhos. Sua pele morena trazia algumas tatuagens que cobriam seu ombro direito e parte do braço. Tinha um sorriso lindo, que sempre distribuía gratuitamente para quem o cumprimentasse pela manhã.
As meninas também se tornaram lindas mulheres, mesmo sendo muito diferentes entre si.
Enquanto Julia tinha seus cabelos castanhos ondulados, o corpo com curvas nos lugares certos e os olhos cor de mel que exalavam bondade, Emily era loira, alta e esguia, com olhos verdes penetrantes e jeito de modelo.
Julia sempre dizia para a amiga o quanto ela era linda, e depois de um tempo, Emily fazia questão que a amiga lembrasse disso.
No último ano do Ensino Médio, os rapazes começaram a perceber a existência das duas amigas. Pediam o telefone, mandavam bilhetes e faziam questão de acompanhá-las em todos os lugares. Inclusive Alexandre. Ele
era um perfeito cavalheiro com as meninas, carregando as bolsas, abrindo a porta do carro, dando o braço para que elas se apoiassem nele. Toda vez que ele chegava na escola era um verdadeiro rebuliço.
Julia sempre se mantinha mais reservada com relação as investidas que recebia, preferindo dispensar os rapazes com educação e bondade. Já Emily fazia um escândalo a cada novo bilhete que recebia. Algum tempo depois, os caras simplesmente pararam de enviar qualquer coisa que fosse para ela, com medo da reação. Porém, continuavam tentando conquistar Julia.
Mas a garota se mantinha reservada, pois seu coração já estava ocupado. Ela percebeu que amava Alexandre há alguns anos. E desde então, esperava pelo dia em que encontraria sua loba, e descobriria se eram companheiros ou não.
Ele não demonstrava nenhum favoritismo entre as garotas, pois se considerava amigo de ambas. Mas o carinho e a atenção que dava às duas, faziam com que Julia sonhasse cada vez mais com ele, torcendo para que o destino e a deusa os unissem.
Hoje, mais uma vez, Alexandre veio nos encontrar no final da aula. Puxa, se ele soubesse o que eu sinto...
Mas tenho certeza de que não é adequado. Ele já me disse que está esperando sua companheira destinada pela Deusa da Lua. Ah, Selene, por favor, me dê a chance de ser essa escolhida!
Assim que Alexandre chegou na porta da escola, Emily saiu correndo na minha frente e pulou no colo dele. Eu amo minha amiga, mas não me sinto bem vendo ela agir dessa forma.
Eu contei sobre o que eu sentia há alguns dias. Ela me disse que eu preciso esperar minha loba surgir, para que eu possa saber se sou a companheira do alfa. Depois disso, emendou uma longa conversa sobre como o último salão acabou com o lindo cabelo dela e sobre como ela precisou gritar com a manicure para que ela fosse mais ágil ao fazer suas unhas.
- Olá Julia! – Alexandre me cumprimentou assim que eu cheguei próxima dos dois. Emily já estava pendurada nos braços dele e me lançou um longo olhar de inocência. Por que eu não conseguia acreditar nela?
- Olá\, Alfa! – Respondi com um sorriso e um aceno de cabeça.
- Qual é\, Juju! Você sabe que tem a liberdade de me chamar pelo nome. A Emily aqui\, já entendeu isso.
- Claro que entendi Alêzinho!
Emily enroscou o braço nos ombros dele enquanto respondia.
Baixei meu olhar, constrangida com a situação.
- Vamos meninas\, vou deixar vocês em casa\, antes de ir para o meu escritório.
Antes que eu pudesse abrir a porta do passageiro, ao lado do motorista, senti Emily puxar meu braço para trás.
- Amiga\, deixa eu ir na frente. Você sabe que eu enjoo...
- Tudo bem\, Emily...
Segui para o banco de trás, segurando minha bolsa e meus livros com cuidado. O caminho todo se resumiu em Emily emendando um assunto após o outro e me cortando quando ia dar minha opinião ou fazer algum comentário. Alexandre estava tão absorto na conversa que nem percebeu minhas tentativas inúteis de participar também.
Alexandre me deixou na porta de casa e seguiu com Emily até a casa dela.
Senti uma dor enorme vendo os dois seguirem juntos. Mas não deveria fazer nada. Eu sabia que ele se manteria fiel a sua decisão de aguardar sua companheira. Em menos de um mês eu faria 18 anos e receberia minha loba, e
finalmente saberia se éramos companheiros destinados ou não.
Eu pude ver o carro se afastando, e Emily gesticulando loucamente.
Quando entrei em casa, minha mãe, Paula, me esperava com o almoço pronto.
- Como foi hoje\, pequena?
- Bem\, nada diferente...
- Alexandre foi buscar vocês?
- Sim\, e agora ele está levando Emily para a casa dela...
Minha mãe me olhou com um sorriso no rosto e disse:
- Filha\, eu sempre ouvi dizer que Selene leva em consideração nossos sentimentos\, quando vai escolher nosso companheiro! Tenha fé!
Olhei para minha mãe e tentei capturar um pouco do otimismo dela...
"Selene, se você realmente levar em consideração o que eu sinto, você já sabe quem pode ser meu companheiro, tá!?".
Um mês se passou. Hoje é meu aniversário de 18 anos.
Meus pais me acordaram com um lindo café da manhã na cama.
Recebi muitos carinhos e palavras de amor.
Minha mãe me deu um lindo colar, com um delicado pingente de
safira.
- Filha\, a safira é a pedra da sabedoria! Espero que você
seja muito sábia!
- Obrigada, mamãe e
papai!
O dia correu junto com os preparativos para o recebimento da
minha loba.
Meus pais organizavam todos os materiais que seriam
utilizados na cerimônia, repassavam o nome dos convidados e ligavam para
aqueles que ainda não haviam confirmado a presença. O bolo estava esperando na
geladeira, pois fazia parte da noite uma pequena comemoração pelo meu
aniversário.
Durante o dia, eu deveria me alimentar bem, para garantir
força física para a minha primeira transformação, descansar bastante e tentar
me conectar com a Deusa Lua, para ampliar meu canal de ligação com minha loba e
com a matilha.
Passei quase uma hora relaxando na banheira, quando ouvi
minha mãe bater na porta.
- Filha\, está na hora. Vamos nos arrumar. Sua roupa está na
cama.
Me levantei da banheira, enrolei na toalha no corpo e segui
para meu quarto, onde encontrei um lindo vestido branco em cima da cama. Era
tradição que na primeira transformação, chegássemos usando uma roupa branca,
para simbolizar o início da nossa transformação. Em rituais essa cor era
destinada apenas aos que seriam transformados pela primeira vez na ocasião. Completei
o look com uma sandália baixa de tiras, e minha mãe ajudou a prender o meu
cabelo em um penteado meio preso, que fez com que as ondas do meu cabelo ficassem
muito bonitas. Fiz uma maquiagem leve.
Recolhemos nossas coisas, e seguimos para o carro, em
direção da entrada da floresta.
Lá estavam Alexandre, seu beta e sua família, além dos meus
parentes e Emily ao lado de todos, com um vestido azul tão claro que quase se
confundia com branco. Minha mãe lançou um olhar de desaprovação para minha
amiga, ouvi sua loba rosnar baixinho, mas manteve a postura e seguimos em
frente.
Começamos a noite comemorando meus 18 anos e assim que a lua
atingisse seu ponto mais alto no céu, iniciaríamos a cerimônia.
Comemos o bolo, brindamos e assim que percebemos a lua
atingindo seu ápice, nos dirigimos à clareira que ficava na beirada da
floresta. O ambiente estava todo iluminado por velas, que formavam um círculo adornado
por pedras, flores e cristais. Dentro do círculo, uma manta vermelha estava
dobrada no chão.
Após todos tocarem em minha testa desejando uma
transformação perfeita, me dirigi ao centro do círculo, onde Alexandre me
esperava.
Respirei fundo quando ele me olhou com um sorriso e tocou
minha testa, como os outros fizeram.
- Você está linda Juju. Sua loba será linda\, com certeza.
- Obrigada\, alfa... quer dizer\, Alexandre.
Ouvi no fundo alguém bufando, mas optei por ignorar.
- Ju\, a primeira transformação sempre é mais difícil\, mas
estou aqui. E vou te ajudar!
- Obrigada. Estou pronta.
Alexandre olhou para todos que estavam ao redor do círculo.
- Esta noite iremos receber mais uma loba em nossa matilha.
Todos aqui irão ajudar sua adaptação a forma lupina, e acolher em nossa
alcateia?
- Sim\, Alfa! – Todos responderam em voz alta.
- Que a natureza receba também mais essa loba\, com as
bençãos de Selene.
As velas ao redor do círculo aumentaram as chamas, os
cristais brilharam e as flores exalaram mais perfume pelo ar.
- Julia\, como Alfa dessa matilha\, a Lua Nova\, convido sua
loba a sair e se apresentar a todos nós.
Senti meus ossos estalarem e quebrarem. Em minha cabeça pude
ouvir minha loba falando comigo.
“Julia, sou sua loba, Ceci. Me receba”.
Caí no chão e senti o manto vermelho ser colocado sobre mim,
de maneira que minha transformação fosse preservada apenas para mim. Quando
menos esperei, senti os cheiros mais fortes que o comum e minha audição estava
muito melhor. Pude ouvir todos os outros presentes se transformando junto
comigo.
Assim que senti que estava pronta, saí debaixo da manta
vermelha e olhei ao redor, para todos aqueles lobos e lobas que estavam junto
do círculo.
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