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MEU SOGRO

1. A GRAVIDEZ E A PERCA DE TUDO

Rebeca

Acordei cedo pois hoje tinha um consulta para confirmar as minhas suspeitas. Depois de 4 anos de casamento eu acho que estou grávida. O Marlon vai amar a notícia, aposto que será um pai excelente para nosso bebê.

Fiz minhas higienes e nem tomei café, pois achei melhor fazer o exame em jejum.

Fui para o hospital que não era longe da nossa casa. Eu e Marlon compramos uma casa linda no asfalto assim que nos casamos, pois decidimos que era hora de viver uma vida tranquila e longe do morro onde crescemos. O pai dele é chefe do tráfico e dono do morro e ficou muito bravo com a nossa decisão de sairmos de lá, porque assim ele ficou sem seu sucessor no tráfico. A verdade é que Marlon nunca quis seguir os paços do pai, e ele mesmo sentia que se ficasse morando lá uma hora ou outra ia acabar sedendo a tudo aquilo. Ele já ajudou muito o pai nesse negócio mas nunca se sentiu bem com isso. Matar pessoas, se vingar quando fazem oque não devem, tudo isso era muito complicado pra ele.

Cheguei no hospital e meu médico já sabia do que se tratava já que falei com ele por telefone antes de vir pra cá. Então fomos direto para sala de coleta.

A enfermeira fez a coleta do meu sangue e me deu os papéis para ver o resultado pelo site e me explicou que o exame ficaria pronto em 6 horas.

Fui para casa e não aguentava de ansiedade. Quando coloquei meus pés em casa meu celular tocou e era o Marlon pensei seriamente em contar a ele as minhas suspeitas pois não aguentava, minha ansiedade estava me corroendo. Mas quando atendi o telefone minha animação se foi no mesmo instante.

📲 Desconhecido: Senhora Rebeca?

📲 Rebeca: Quem fala?

📲 Desconhecido: Aqui é o Emerson, sou socorrista, precisamos que a senhora vá até o hospital San Vitorio, o senhor Marlon sofreu um acidente e peguei seu contato como contato de emergência no celular dele.

📲 Rebeca: Como assim meu marido sofreu um acidente, ele está bem?

Falei já com a voz alterada.

📲 Emerson: Ele está desacordado, iremos levá-lo ao hospital.

Ele desligou.

Chamei um carro de aplicativo e corri para o hospital. Não estava em condições de dirigir.

Chegando lá informei que fui para ver o Marlon que havia chegado numa ambulância. Ela me pediu que esperasse e depois de uns 10 minutos um médico veio falar comigo.

Médico: Olá, senhora..?

Rebeca: Rebeca, meu nome é Rebeca.

Médico: Senhora Rebeca, eu sinto muito, seu marido sofreu um acidente grave. Nós fizemos de tudo, mas infelizmente não foi possível salvá-lo.

Ele disse aquilo como quem diz que perdeu o ônibus, como se fosse a coisa mais natural do mundo.

Rebeca: QUE?

Foi tudo que consegui dizer antes de ver tudo girar e sentir uma dor imensa no meu corpo e de cair no chão. Depois disso, só me lembro de acordar em um quarto de hospital.

Assim que abri os olhos a enfermeira me olhou feliz.

Enfermeira: Que bom que acordou senhora Rebeca, estou feliz que esteja melhor, vou chamar o médico.

Rebeca: Como está meu marido? Ele morreu mesmo? Eu preciso sair daqui.

Falei alterada e nervosa enquanto tentava tirar os acessos do meu braço, não sabia porque estava ali.

Antes que eu conseguisse me livrar daqueles aparelhos e do acesso, ela aplicou um remédio na minha veia e saiu da sala. Fui perdendo as forças e logo eu apaguei, e assim que acordei meu médico estava na sala, o senhor Eduardo. Estranhei vê-lo ali, pois eu havia ido ver meu marido no hospital San Vitorio que era bem longe de onde ele trabalhava.

Eduardo: Rebeca, eu vim pessoalmente conversar com você, devido a toda essa situação. A enfermeira me disse que você começou a fazer perguntas e se agitar muito, então ela lhe deu um sedativo e me chamou. Por sorte você colocou meu nome na sua lista de emergências médicas.

Rebeca: Doutor, me explica oque aconteceu.

Eduardo: Eu preciso que seja forte querida.

- O seu esposo... ele faleceu.

Ele fez uma longa pausa, parecendo procurar as palavras, ou somente queria que eu digerise essa informação para me jogar a outra bomba.

Eduardo: Rebeca... você estava grávida, mas perdeu seu bebê.

Por fim, depois de enrolar um pouco, ele falou na lata, como se não fosse nada. O que há com esses médicos?

Rebeca: E-Eu estava mesmo grávida?

Eduardo: Estava querida. Mas Rebeca, não fique assim, você perdeu seu bebê devido a essa notícia tão forte que recebeu. Mas você é jovem, tem apenas 20 anos, tenho certeza que vai ter vários filhos ainda.

Rebeca: Sem meu marido? Vou ter filhos como doutor?

Falei já alterada e começando a chorar.

Eu não ia te dar alta, pois não queria que ficasse sozinha. Mas seu sogro veio lhe buscar e prometeu que cuidará para que você fique bem com toda essa situação.

XX

2. EMPREGO

Rebeca

Acordei assustada e suando. Droga, sonhei com tudo aquilo de novo. Não sei porque essas lembranças ficam vindo pra mim em forma de sonhos, se é que posso chamar isso de sonho, ta bem mais pra pesadelo, eu fecho os olhos e me lembro de tudo aquilo. Foi torturante perder tudo em apenas um dia. Meu marido e meu filho.

Já fazem 4 anos e mesmo assim tudo isso ainda me assombra. Eu e Marlon crescemos na favela, fomos quase que criados juntos já que nossas mães eram melhores amigas, na verdade minha mãe e a madrasta dele, ja que ela nao era sua mãe sanguínea. Quando eu tinha 15 anos e ele 16 começamos a namorar e quando completei 17 anos nós nos casamos, com 18 fomos morar no asfalto e com 20 anos perdi meus amores e voltei pro morro, não tinha como me bancar no asfalto, ainda mais depois de tudo. Entrei em depressão e sofri de mais. Hoje faço terapia e estou melhorando e aos poucos aprendendo a conviver com a dor.

Infelizmente meus pais já não são mais vivos, tudo que eu tinha era o Marlon. Mas seu pai tem me dado uma força incrível depois de tudo aquilo. Ele me trouxe pro morro e me deu casa comida e tudo que eu precisava pra ficar bem.

A mãe do Marlon largou do marido menos de um mês depois que Marlon faleceu, os dois brigavam muito então ela acabou o deixando e indo embora do morro.

Como ele não parava em casa e falava que não queria me deixar sozinha de jeito algum, ele me trouxe pra morar com ele. Assim, pelo menos sua empregada me faria companhia e ele também quando estava em casa.

Nós nos vemos pouco e conversamos menos ainda. Sei que pra ele também foi difícil perder o filho. E embora o luto eterno que temos vivido, acho que estamos aprendendo a lidar com a dor depois de tanto tempo.

Hoje acordei decidida, quero arrumar um emprego.

Fiz minhas higienes me arrumei e passei uma maquiagem leve, e logo desci pra tomar café.

O senhor Tales já estava na mesa comendo quando cheguei.

Tales: Nossa, aonde vai assim bem vestida e toda arrumada?

Rebeca: Vou procurar emprego.

Tales: Emprego Rebeca? Mas aqui você tem tudo, sabe que oque quiser é só comprar. Te dei aquele cartão pra isso.

Rebeca: Não é pelo dinheiro senhor Tales, é pra ver se trabalhando me distraio mais. Eu fico só enfurnada nessa casa, preciso de um ar.

Tales: Tudo bem, mas tome cuidado. E procure um emprego no morro, não quero você andando pelo asfalto desprotegida.

Rebeca: Pode deixar.

Sai e desci o morro, logo cheguei a uma padaria e lá chamei a dona Lourdes, que estava no telefone, mas que logo veio falar comigo.

Conversei com ela e expliquei que estava em busca de emprego. Ela me contratou na mesma hora. Fiquei radiante de felicidade, nem acredito que consegui emprego na primeira tentativa.

Minha felicidade durou míseros minutos, até eu perguntar oque eu faria e ela simplesmente não sabia o que dizer. Pelo que pude perceber ela não precisa de ninguém, todos que tinha ali já supriam as necessidades da pequena padaria.

Rebeca: Dona Lourdes, me fala a verdade, porque está me contratando se claramente não precisa de mim aqui?

Dona Lourdes: Eu preciso senhorita, é só que....

Rebeca: Dona Lourdes.

Mudei meu tom de voz e olhei séria para ela.

Dona Lourdes: Tudo bem... o senhor Tales ligou, mandou que lhe contratasse, disse que soube que a senhorita entrou aqui e que se me pedisse emprego era para eu aceitar imediatamente.

Sai dali enfurecida, nem ao menos respondi a senhora.

Subi para boca, porque a essa hora Tales já está lá, já que quando sai de casa ele já estava terminando seu café.

Chegando lá entrei e vi vários garotos mexendo com drogas.

Alguns me olharam torto, outros com desejo, mas fingi não perceber. Fui entrar na sala mas me barraram.

Rebeca: Saiam da minha frente, preciso falar com Tales.

Vapor: Aqui a senhorita não entra sem autorização do patrão.

Rebeca: Eu vou entrar nessa merda sim.

Assim que falei a porta se abriu.

3. DESAFIANDO

Tales: Que porra tá acontecendo aqui?

Vapor: A garota, senhor, queria entrar na sua sala sem ser anunciada.

Tales: O que faz aqui Rebeca? Sabe que não gosto que suba aqui.

Rebeca: Quero conversar com o senhor.

Rebeca

Ele me olhou dos pés à cabeça me analisando.

Tales: Entra.

Falou bem sério.

Passei por ele e entrei na sala, me sentei e ouvi a porta batendo, e logo ele deu a volta na mesa e se sentou na minha frente.

Tales: Agora me diz oque faz aqui caralho?

Rebeca: Porque obrigou a dona Lourdes a me contratar?

Tales: Velha fofoqueira dos infernos. Vou dar um jeito na língua dela.

Rebeca: Não, você não vai.

Falei bem séria.

Rebeca: Que porra, me deixa viver. Depois de 4 anos é a primeira vez que me sinto bem e segura pra viver de novo.

Tales: Você parece melhor mesmo.

- A anos não me desafiava, Rebeca.

- Até estava estranhando a nossa convivência tranquila.

- Sabe, de verdade não sei como não te matei até hoje.

Gelei ao ouvir aquilo, mas não abaixei a bola pra ele.

Rebeca: O que quer dizer?

Tales: Quero dizer que sou o dono de toda essa merda e você age como se fosse a dona de tudo e estivesse em casa. Se acha ao extremo e acha que pode mandar em mim e em tudo por aqui.

- Se enxerga garota. Quantas vezes mandei meu filho fazer as coisas pra mim no morro pois queria que ele aprendesse como trabalhar aqui e você me desautorizava já chegou a gritar na minha cara que meu filho só seria dono dessa porra por cima do seu cadáver.

- Você se acha mano, e eu não sei porque porra eu nunca te matei.

Rebeca: O senhor gosta de mim. Sempre me protegeu. Não creio que me mataria.

Ele deu uma risada alta.

Tales: Eu te protejo em respeito ao meu filho, porque ele gostava muito de você. Agora eu gostar de você? Uma fedelha mimada? Jamais. E se não parar de achar que pode tudo eu vou esquecer que meu filho te amava e vou te mandar pra vala sua pirralha.

Rebeca: Se não gosta de mim e tem vontade de me matar, porque estava tão preocupado que eu arrumasse um emprego?

Tales: Pra ter certeza que a fedelha ia arrumar o que fazer e me deixar em paz um pouco.

Rebeca: Vou fingir que acredito senhor Tales. Agora vou descer e vou pra casa.

Tales: Como você é difícil fedelha. E quanto ao emprego?

Rebeca: Perdi a vontade, já que não consigo um emprego sozinha, vou deixar isso pra outro momento.

Tales: Você adora me desafiar garota e uma hora isso vai dar problema pra você.

Rebeca: Se o senhor diz.

Sai pela porta rumo à nossa casa.

Tales

Essa garota adora me desafiar. Fedelha mimada do caralho. Ela havia parado com isso um pouco, devido ao luto e a depressão que enfrentara, mas agora, parece que voltou com tudo. Eu perdi minha esposa por causa dessa mimadinha e ainda assim ela continua na minha casa. Mas porque inferno eu já não a mandei pastar? Sinceramente tenho me feito essa pergunta a anos e nem eu mesmo sei responder.

Quando meu filho faleceu, eu a trouxe pra casa e a minha esposa surtou, falou que jamais aceitaria outra mulher em casa e ficou com ciúmes falando que eu ia comer a pirralha.

Magina eu, com 39 anos, na época, comendo uma garota 19 anos mais jovem do que eu.

Não gostei da forma como a Bruna me desafiou, falando que era ela ou a Rebeca, a menina precisava de ajuda, ficou muito abalada com a morte do meu filho e eu também estava.

Já a Bruna, por outro lado, não estava nem ai pra isso. Mesmo ela criando o Marlon desde que ele era bebê, ela jamais amou meu filho, fazia tudo pela grana e o status de fiel.

Eu ajudei a Rebeca porque sei a dor que é perder alguém que se ama. Não foi fácil perder a mãe do Marlon quando ele nasceu, depois meu irmão se foi e também teve a morte do Marlon, foi tudo muito difícil. O Marlon era meu único filho, meu bebê. Perde-lo foi uma dor imensa, e embora eu me faça de forte, eu compartilhei da mesma dor que ela. Não conseguiria deixar aquela menina mal criada na mão, nem se eu quizese. Mas agora já se passaram 4 anos, e essa garota precisa aprender a me respeitar e a deixar a dor de lado e viver a vida dela.

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