A chuva caía pesada sobre a cidade, as gotas formando poças nas ruas desertas. O som ecoava pelos becos, misturando-se com o ocasional som distante de uma explosão ou de vidro quebrando. Anne puxou o capuz do casaco mais para baixo, tentando se proteger do vento cortante que soprava contra seu rosto. A sensação de que algo terrivelmente errado estava acontecendo já havia se instalado em seu peito dias atrás, mas agora, enquanto caminhava pelas ruas desertas, o medo a consumia.
“Anne, temos que nos apressar!”, a voz de David soou urgente ao seu lado, os olhos dele varrendo as sombras ao redor. Ele era alto, com uma expressão dura que não combinava com a suavidade de sua voz. “Eles estão perto. Não podemos ficar parados aqui.”
“Eu sei”, Anne respondeu, tentando manter a calma. “Mas para onde vamos? Todo o centro da cidade está contaminado.”
David hesitou, seu olhar fixando-se em algo ao longe. “O hospital. Talvez ainda tenha alguns medicamentos e, com sorte, um lugar seguro para nos abrigarmos até pensarmos em algo melhor.”
Anne assentiu, mesmo que a ideia de ir para o hospital não a deixasse muito mais tranquila. “Certo, mas precisamos ser rápidos. A contaminação está se espalhando rápido.”
Os dois começaram a correr, os passos ecoando pelas ruas vazias. As luzes dos postes piscavam intermitentemente, aumentando a sensação de abandono. Cada esquina que viravam trazia uma nova onda de incerteza e terror. Em um mundo onde a vida normal parecia ter sido arrancada de suas raízes, qualquer coisa podia acontecer.
“Você acha que ainda há sobreviventes?”, Anne perguntou, sem parar de correr.
“Espero que sim”, respondeu David, sem olhar para trás. “Mas se houver, estarão tão assustados quanto nós.”
Enquanto se aproximavam do hospital, os dois puderam ouvir sons abafados vindos de dentro do prédio. Anne trocou um olhar rápido com David, que balançou a cabeça, indicando que deveriam continuar. Eles se aproximaram da entrada principal, apenas para encontrar as portas de vidro completamente destruídas. Cacos de vidro cobriam o chão, refletindo a luz pálida do luar.
“Devemos entrar?”, Anne sussurrou, mesmo sabendo que a pergunta era desnecessária.
“Não temos escolha”, David respondeu, entrando cautelosamente no hospital. “Fique atrás de mim.”
O interior do hospital estava em um estado de caos absoluto. Macas viradas, papéis espalhados por todo lado, e manchas escuras no chão que Anne não queria imaginar de onde vinham. Um cheiro acre e metálico preenchia o ar, tornando difícil respirar.
“Que lugar é esse?”, Anne murmurou, mais para si mesma do que para David.
“Um lugar que parou de ser seguro há muito tempo”, respondeu uma voz inesperada atrás deles. Anne girou rapidamente, seus olhos encontrando uma figura magra, encolhida em uma das esquinas. Era uma mulher, os cabelos desgrenhados e o rosto sujo, com uma expressão de pavor evidente.
“Quem é você?”, Anne perguntou, tentando não deixar o medo tomar conta de sua voz.
“Sou... era uma enfermeira aqui”, a mulher respondeu, a voz trêmula. “Me chamo Marta. Estava aqui quando tudo começou...”
“O que aconteceu?”, David interrompeu, sem paciência para histórias longas. “Por que a cidade está assim?”
Marta balançou a cabeça, parecendo à beira do colapso. “Eles disseram que era um projeto para proteger as pessoas, para nos tornar mais fortes, mais rápidos... Mas algo deu errado. Muito errado. O que deveria nos salvar, nos destruiu.”
Anne sentiu um calafrio percorrer sua espinha. “Você está falando dos super-humanos?”
Marta assentiu, lágrimas silenciosas escorrendo por seu rosto. “Sim... Mas eles se tornaram monstros. A contaminação... se espalhou. Não apenas entre os super-humanos, mas por toda a cidade.”
David trocou um olhar significativo com Anne. “Precisamos de remédios, algo para nos proteger. Onde podemos encontrar?”
“A farmácia... no segundo andar”, respondeu Marta, a voz quase um sussurro. “Mas... tenham cuidado. Eles estão por toda parte.”
“Você quer vir conosco?”, Anne perguntou, a compaixão tomando conta de sua voz.
Marta hesitou, então balançou a cabeça. “Eu... não posso. Estou muito fraca. Mas... vocês precisam ir. Agora.”
David já estava se movendo em direção à escada. “Vamos, Anne. Não temos tempo.”
Anne deu um último olhar para Marta antes de seguir David. As escadas estavam parcialmente bloqueadas por escombros, mas eles conseguiram passar. Cada passo que davam, o medo de encontrar algo ou alguém crescia dentro de Anne. O hospital, que antes era um símbolo de cura e segurança, agora era um labirinto de medo e morte.
Quando chegaram ao segundo andar, o silêncio os envolveu de forma ainda mais opressiva. As luzes piscavam, criando sombras assustadoras nos corredores. David apontou para uma porta entreaberta ao fundo.
“A farmácia deve ser ali”, disse ele, caminhando cautelosamente em direção à porta.
Quando entraram, Anne soltou um suspiro de alívio ao ver as prateleiras ainda parcialmente abastecidas. Embora muitos medicamentos tivessem sido levados, ainda havia antibióticos, analgésicos e outros suprimentos úteis.
“Isso vai ajudar”, disse David, enchendo a mochila com tudo que conseguia.
De repente, um barulho vindo do corredor fez Anne congelar. Ela segurou o braço de David, que rapidamente colocou o dedo nos lábios, pedindo silêncio. Os dois se esconderam atrás de uma das prateleiras, tentando não fazer barulho.
Passos lentos e arrastados ecoavam pelo corredor, cada um deles aumentando o pavor dentro de Anne. Ela sabia que não podiam se dar ao luxo de serem encontrados, mas também sabia que fugir sem ser visto seria quase impossível.
Os passos se aproximaram, parando bem na frente da porta da farmácia. Anne prendeu a respiração, rezando para que o intruso não entrasse.
A porta foi empurrada levemente, rangendo enquanto se abria um pouco mais. Anne podia ver uma sombra se movendo lentamente pelo chão, e seu coração parecia estar prestes a saltar pela boca. O intruso entrou, os olhos varrendo a sala.
Era um homem, ou pelo menos, o que restava de um. A pele estava pálida e esticada sobre os ossos, os olhos vidrados, sem vida. Seus movimentos eram lentos e descoordenados, como se estivesse lutando para manter o controle sobre seu próprio corpo.
David segurou o braço de Anne, indicando que deveriam se mover lentamente para a porta dos fundos. Anne assentiu, movendo-se centímetro por centímetro, tentando não fazer nenhum som.
Quando chegaram à porta, Anne soltou um suspiro de alívio. Mas antes que pudessem escapar, o homem virou-se bruscamente, seus olhos cravando-se nos deles. Por um momento, tudo parecia parar. Então, ele soltou um grito estridente, um som que parecia vir das profundezas do inferno.
“Corre!”, David gritou, puxando Anne pela mão.
Eles correram pelo corredor, o som dos passos do homem ecoando logo atrás. Anne sentia o pânico crescendo dentro de si, mas sabia que não podia se deixar dominar. Eles tinham que escapar.
Chegaram ao final do corredor, onde uma janela aberta os esperava. Sem pensar, David saltou, puxando Anne junto. Eles caíram no telhado do andar de baixo, rolando pelo impacto.
“Vamos, não podemos parar!”, David insistiu, ajudando Anne a se levantar.
Anne sentiu o joelho doer, mas não havia tempo para pensar nisso. Eles correram pelo telhado, pulando para o prédio ao lado. O som dos gritos do homem ainda ecoava no ar, mas estava ficando mais distante.
Quando finalmente chegaram a um lugar seguro, Anne caiu de joelhos, ofegante. “Isso... isso foi por pouco.”
David assentiu, também tentando recuperar o fôlego. “Não podemos ficar aqui. Eles vão nos encontrar se pararmos por muito tempo.”
Anne concordou, levantando-se com dificuldade. “O que vamos fazer agora?”
“Precisamos encontrar um lugar para passar a noite. Amanhã, veremos o que podemos fazer para sair daqui.”
Anne olhou para a cidade devastada ao seu redor, sentindo uma tristeza profunda tomar conta de seu coração. A cidade que ela conhecia estava morta, e agora, tudo o que restava era tentar sobreviver ao pesadelo que havia se tornado sua vida.
“Vamos”, David disse, começando a caminhar. “Ainda há uma chance de sairmos vivos disso.”
Anne olhou para ele, vendo a determinação em seus olhos. Ela sabia que não tinha outra escolha a não ser seguir em frente, lutar para sobreviver, mesmo que a esperança fosse escassa.
E assim, os dois seguiram pela cidade, em busca de um abrigo, sabendo que cada passo poderia ser o último.
Anne e David avançaram pelo telhado, tentando não pensar no que deixaram para trás. Cada passo era acompanhado por um zumbido crescente de ansiedade. A noite estava fechada, e o vento parecia sussurrar segredos sombrios sobre a cidade devastada. Ao longe, o som de sirenes e explosões ecoava, misturado com os gritos indistintos de quem ainda lutava para sobreviver.
Eles chegaram à borda do prédio e pararam para observar o terreno abaixo. Uma rua deserta, iluminada apenas por postes piscando, se estendia na frente deles. Do outro lado, havia outro prédio que parecia estar em melhor estado do que os demais.
“Devemos tentar descer?”, Anne perguntou, o medo refletido em sua voz.
David balançou a cabeça negativamente. “É melhor ficarmos aqui por enquanto. Lá embaixo, estaremos mais expostos.”
Ela olhou ao redor, tentando encontrar um lugar que pudesse oferecer algum abrigo. Seus olhos pousaram em uma estrutura metálica, possivelmente uma antiga torre de ventilação.
“Acho que podemos nos esconder ali”, sugeriu ela, apontando.
David seguiu o olhar de Anne e assentiu. “Parece bom. Vamos.”
Os dois se moveram silenciosamente pelo telhado, tomando cuidado para não fazer barulho. Quando chegaram à torre, perceberam que era pequena, mas sólida, com espaço suficiente para eles se acomodarem. Anne puxou a porta de metal, que rangeu em protesto, mas se abriu. Eles entraram rapidamente, fechando a porta atrás de si.
O interior da torre era escuro e abafado, mas, pelo menos, estava protegido dos perigos externos. David colocou a mochila no chão e se encostou na parede, deixando escapar um suspiro cansado.
“Não acredito que tudo isso está acontecendo”, disse ele, a voz carregada de cansaço e descrença.
Anne sentou-se ao lado dele, abraçando os joelhos. “É surreal. Há alguns dias, eu estava indo para o trabalho, pensando nas coisas mais comuns... E agora... isso.”
Ela passou a mão pelo cabelo, sentindo a sujeira e o suor acumulados. A realidade do que estavam vivendo ainda parecia um pesadelo do qual ela não conseguia acordar. A cidade que ela amava, as pessoas que conhecia, tudo estava destruído ou perdido. E agora, o futuro era uma incógnita, um borrão de incertezas e perigos.
David, que até então estava calado, quebrou o silêncio. “Anne, você acha que a contaminação pode ser contida?”
Ela balançou a cabeça. “Não sei. Tudo depende de como ela está se espalhando e de quem está por trás disso. Mas, pelo que vimos até agora, parece que o controle foi completamente perdido.”
David olhou para ela, seus olhos cheios de preocupação. “E se não conseguirmos sair daqui? E se...”
“Não vamos pensar nisso agora”, interrompeu Anne, colocando a mão sobre o braço dele. “Precisamos focar em sobreviver, um dia de cada vez. Amanhã, planejamos nossa próxima jogada. Talvez haja alguma comunicação funcionando ainda, ou alguma parte da cidade que esteja menos afetada.”
David assentiu, mas o olhar dele dizia que as palavras de Anne não eram suficientes para dissipar seus medos. Ainda assim, ele forçou um sorriso e mudou de assunto. “E quanto a você? Como está lidando com tudo isso?”
Anne deu de ombros, tentando não parecer tão abalada quanto realmente estava. “Estou... fazendo o melhor que posso. Não é fácil, mas, comparado ao que outras pessoas devem estar passando... acho que não tenho do que reclamar.”
David observou-a por um momento antes de responder. “Você é mais forte do que pensa, Anne.”
Ela sorriu, embora soubesse que suas forças estavam se esvaindo rapidamente. “Só espero que seja o suficiente.”
Eles caíram em um silêncio desconfortável, ouvindo apenas o som abafado do vento lá fora. Anne sabia que precisava descansar, mas o medo e a adrenalina a mantinham acordada. Seus pensamentos vagavam, tentando encontrar algum sentido em meio ao caos.
Depois de alguns minutos, David quebrou o silêncio novamente. “Lembra quando falamos sobre sair da cidade? Antes de tudo isso acontecer?”
Anne riu baixinho, lembrando-se da conversa que haviam tido meses atrás, quando a ideia de deixar a cidade era apenas um devaneio. “Sim, lembro. Pensamos em ir para o interior, construir uma vida tranquila, longe de toda a correria.”
David sorriu com tristeza. “Engraçado como as coisas mudam. Agora, sair da cidade é uma questão de sobrevivência.”
Anne assentiu, refletindo sobre a ironia daquela situação. “Acho que nunca damos valor suficiente às coisas simples... até que elas nos sejam tiradas.”
O silêncio voltou a cair entre eles, mas desta vez, era um silêncio de resignação, de aceitação de que não havia respostas fáceis. A única certeza que tinham era que precisavam continuar lutando.
“David?”, Anne chamou baixinho, após algum tempo.
“Hm?”, ele respondeu, já meio adormecido.
“Você acha que... se tivermos uma segunda chance, conseguiremos reconstruir? Não só a cidade, mas... tudo?”
David abriu os olhos e olhou para ela, vendo a esperança tímida que ainda persistia. “Não sei, Anne. Mas se tivermos uma segunda chance, prometo que farei tudo o que puder para tentar.”
Ela sorriu para ele, apreciando a sinceridade em suas palavras. “Eu também.”
E com essa promessa silenciosa, Anne finalmente se permitiu relaxar um pouco, seus olhos pesados se fechando enquanto ela caía em um sono inquieto. David permaneceu acordado por mais alguns minutos, refletindo sobre tudo o que havia acontecido e sobre o que ainda estava por vir.
Quando finalmente fechou os olhos, a última coisa que passou por sua mente foi a imagem de uma cidade limpa, reconstruída, onde o passado devastador seria apenas uma lembrança distante. Ele sabia que aquele sonho era frágil, mas era tudo o que tinham agora. E isso seria o suficiente para mantê-lo lutando por mais um dia.
Na manhã seguinte, Anne foi a primeira a acordar. A luz do amanhecer filtrava-se pela fenda na porta da torre, iluminando o espaço escuro onde estavam. Ela se espreguiçou lentamente, sentindo as dores acumuladas do dia anterior em seu corpo. Por um momento, pensou que tudo havia sido um sonho ruim, mas ao olhar ao redor, a realidade voltou a se impor.
David ainda dormia, sua expressão mais tranquila do que Anne se lembrava de vê-lo nos últimos dias. Ela decidiu não acordá-lo ainda. Precisava de alguns minutos sozinha para processar tudo.
Levantando-se devagar, ela abriu a porta da torre e saiu para o telhado. A cidade estava silenciosa, como se o caos da noite anterior fosse apenas uma memória distante. Mas ela sabia que a calmaria era enganosa. O perigo ainda estava por toda parte.
Ela respirou fundo, sentindo o ar fresco da manhã, que parecia carregar um pouco da esperança que tanto precisavam. Lá embaixo, as ruas ainda estavam vazias, mas havia sinais de vida aqui e ali — uma fumaça subindo de um edifício distante, o movimento furtivo de alguém nas sombras.
“Bom dia”, a voz de David a surpreendeu.
Anne virou-se e viu que ele estava parado na porta, olhando para ela com um sorriso cansado. “Bom dia”, respondeu ela, tentando sorrir de volta.
“Está tudo bem?”, ele perguntou, se aproximando.
Ela deu de ombros. “Acho que sim. O mais bem que podemos estar, dadas as circunstâncias.”
David assentiu, olhando para o horizonte. “Temos que continuar. Vamos explorar um pouco e ver se encontramos algum lugar mais seguro para nos abrigar, ou pelo menos alguma comida.”
“Concordo”, disse Anne. “Também precisamos pensar em como sair daqui. Não podemos ficar na cidade para sempre.”
Os dois ficaram em silêncio por um momento, contemplando o que o dia poderia trazer. Embora estivessem exaustos, sabiam que não tinham escolha a não ser seguir em frente.
“Acho que devemos procurar pelo norte”, sugeriu David. “Talvez haja menos contaminação naquela direção, e se conseguirmos chegar aos limites da cidade, poderemos encontrar algum veículo.”
Anne concordou. “Certo. Vamos pegar nossas coisas e sair logo.”
Eles voltaram para dentro da torre, pegaram a mochila com os medicamentos e outros suprimentos que haviam coletado, e se prepararam para partir. Anne verificou rapidamente o joelho, que ainda doía, mas não parecia estar gravemente ferido.
“Pronta?”, David perguntou, já com a mochila nas costas.
Anne assentiu, e juntos, eles desceram cuidadosamente para a rua. O silêncio era ainda mais opressor do que na noite anterior, mas a luz do dia oferecia uma falsa sensação de segurança. Eles seguiram pelas ruas desertas, sempre atentos a qualquer movimento.
À medida que avançavam, os sinais de destruição ficavam mais evidentes. Carros abandonados, vitrines quebradas, lojas saqueadas. O cheiro de queimado pairava no ar, misturado com o odor de decomposição que fazia Anne enjoar. Eles tentavam não olhar muito para os corpos espalhados pelo caminho, mas era impossível ignorar o horror do que havia acontecido ali.
“David...”, Anne chamou de repente, parando ao ver algo à frente.
David seguiu o olhar de Anne e viu o que a fez parar. À frente, na esquina da rua, havia uma figura curvada sobre um corpo. À primeira vista, parecia um sobrevivente tentando ajudar alguém, mas algo estava errado. O movimento era irregular, e o som que vinha da figura era perturbador, como um rosnado baixo e contínuo.
“Não pode ser…”, murmurou David, os olhos arregalados em choque.
A figura levantou a cabeça, revelando um rosto deformado, com a pele rachada e olhos vazios. O que estava ali não era mais humano, mas um dos contaminados. Ao perceber a presença de Anne e David, a criatura soltou um grito agudo e animalístico, antes de se levantar com movimentos descoordenados e começar a correr na direção deles.
“Corre!”, gritou David, puxando Anne para longe.
Eles dispararam pela rua, o som das passadas da criatura se aproximando a cada segundo. O medo pulsava nas veias de Anne, cada batida do coração ecoando em seus ouvidos. As ruas pareciam um labirinto interminável de escombros, e cada esquina que viravam parecia levar a outra rua deserta, sem saída aparente.
“Ali!”, David apontou para uma porta de aço entreaberta em um prédio à frente. Eles correram em direção à entrada, e David forçou a porta a se abrir um pouco mais, permitindo que ambos passassem por ela.
Uma vez dentro, ele fechou a porta com um estrondo, trancando-a com todas as forças. Anne caiu de joelhos, ofegante, enquanto o som de pancadas do outro lado da porta indicava que a criatura estava tentando entrar.
“Temos que nos afastar daqui!”, disse David, puxando Anne para o interior do prédio.
Eles correram por um corredor estreito e escuro, os passos ecoando nas paredes úmidas. O prédio parecia uma fábrica antiga, com maquinário enferrujado e caixas de madeira empilhadas em todos os cantos. O cheiro de mofo e óleo velho invadia o ar, tornando a respiração ainda mais difícil.
“Precisamos achar um lugar onde possamos nos esconder até isso passar”, disse David, olhando ao redor com pressa.
“Lá em cima!”, Anne apontou para uma escada de metal que levava a um andar superior.
Eles subiram correndo a escada, que rangia sob o peso deles, e encontraram uma pequena sala no topo, cheia de arquivos e móveis antigos. David empurrou uma grande estante para bloquear a porta, enquanto Anne tentava acalmar sua respiração.
“Isso foi por pouco”, disse Anne, ainda tentando processar o que havia acabado de acontecer.
David assentiu, esfregando as têmporas como se tentasse afastar o cansaço. “Essas coisas… estão ficando mais rápidas. Não podemos mais subestimar o quão perigosos eles são.”
Anne olhou pela janela suja, que dava para a rua abaixo. A criatura ainda estava lá, batendo inutilmente na porta de aço, como se sua única missão fosse alcançá-los. O que antes era uma pessoa agora era um monstro, completamente dominado pela contaminação.
“Precisamos de um plano melhor”, disse Anne, virando-se para David. “Não podemos continuar correndo assim. Temos que encontrar um lugar onde possamos nos organizar, pensar em como realmente sair daqui.”
David suspirou, sentando-se no chão, exausto. “Eu sei. Mas onde? A cidade inteira está um caos, e não sabemos quão longe essa contaminação se espalhou.”
Anne mordeu o lábio, pensando. “Talvez... se conseguirmos chegar a uma zona militar ou uma base de pesquisa, possamos encontrar informações ou até ajuda. Eles devem ter tentado conter isso de alguma forma.”
David considerou a ideia. “Pode ser. Mas precisamos de mais suprimentos antes de fazer uma jornada assim. Não sabemos quanto tempo vai levar para encontrar um lugar seguro.”
“Então vamos começar aqui”, Anne decidiu, já se levantando. “Vamos explorar este prédio. Talvez encontremos algo útil. E também precisamos ver se conseguimos achar um mapa da cidade, para planejar uma rota de fuga.”
David assentiu, sentindo um renovado senso de propósito. “Certo. Vamos começar pelo andar de baixo e ver o que encontramos.”
Eles desceram a escada com cautela, o som dos passos ecoando pelos corredores silenciosos. Cada sala que verificavam era como uma cápsula do tempo, abandonada no momento em que o caos começou. Encontraram algumas ferramentas, como uma chave de fenda e um canivete, que David guardou em sua mochila. Mas comida e água eram escassas.
Quando chegaram ao porão do prédio, encontraram algo inesperado: uma sala trancada com cadeado, com uma placa que dizia “ARMAZÉM”.
“Isso pode ser bom ou ruim”, disse David, examinando o cadeado.
“Não sabemos até tentar”, respondeu Anne, entregando-lhe a chave de fenda que haviam encontrado.
David tentou forçar o cadeado, mas ele era resistente. Após alguns minutos de esforço, ele finalmente conseguiu quebrá-lo. Anne empurrou a porta devagar, e uma onda de poeira foi lançada no ar, fazendo-a tossir.
O interior do armazém estava escuro e apertado, com prateleiras abarrotadas de caixas. Anne tateou até encontrar um interruptor e ligou a luz, que piscou antes de acender completamente.
“Meu Deus…”, sussurrou Anne, seus olhos se arregalando ao ver o que havia dentro.
As prateleiras estavam cheias de suprimentos: caixas de alimentos enlatados, garrafas de água, medicamentos e até algumas armas e munições. Era um verdadeiro tesouro, algo que eles nunca esperaram encontrar.
“Isso pode nos manter vivos por um bom tempo”, disse David, ainda atordoado pela sorte inesperada.
Anne se aproximou de uma das prateleiras, passando a mão por uma lata de comida. “Isso pode ser a chance de sobreviver até encontrarmos uma saída.”
Eles começaram a inspecionar o que havia disponível, separando o que poderiam levar consigo. Cada item era um lembrete de que, apesar do caos, ainda havia esperança. Ainda havia uma chance de sobreviver, de lutar por uma vida fora daquela cidade desolada.
Enquanto enchiam as mochilas, Anne encontrou algo que a fez parar. Era um mapa, enrolado em um canto da prateleira. Ela o desenrolou e o colocou sobre uma mesa de madeira, chamando David para ver.
“É um mapa da cidade”, disse ela, os olhos correndo pelas ruas e bairros marcados.
David se aproximou, examinando-o atentamente. “Aqui está o hospital onde estivemos. E aqui está o prédio onde estamos agora.”
Anne seguiu o dedo de David enquanto ele traçava uma rota no mapa. “Se seguirmos para o norte, podemos tentar alcançar o perímetro da cidade. Se conseguirmos passar por aqui”, ele apontou para um parque próximo, “talvez possamos evitar as áreas mais contaminadas.”
Anne assentiu, vendo pela primeira vez uma rota clara para sair dali. “Parece arriscado, mas é nossa melhor chance.”
“Vamos descansar um pouco, e depois seguiremos esse plano”, decidiu David, fechando a mochila. “Precisamos estar preparados para o que quer que esteja lá fora.”
Eles voltaram para a sala no andar superior, que agora parecia um pouco mais segura sabendo que tinham suprimentos e um plano. Enquanto se preparavam para descansar, Anne não pôde deixar de pensar em quantas outras pessoas estariam tentando fazer o mesmo — lutando para sobreviver em meio ao caos.
Mas, por enquanto, eles tinham uma chance. E isso era tudo o que precisavam.
Ao cair da noite, a cidade lá fora parecia ainda mais sombria, mas a pequena sala onde Anne e David se abrigavam estava cheia de uma determinação silenciosa. Sabiam que o caminho à frente seria difícil, mas estavam prontos para enfrentá-lo. Juntos.
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