Madison, 39 anos, professora universitária. Mulher forte, mãe, madura, doce, que se encontra muito machucada por ter sido traída pelo ex marido a apenas dois meses atrás.
Daniel, 41 anos, ex marido de Madison. A traiu com a vizinha que vive bem ao lado da casa de Madison.
Alice, 16 anos, filha de Madison e Daniel. Alice, assim como a mãe Madison, sofreu muito e ainda sofre pelo que seu pai fez. Ela diz que nunca irá perdoá-lo por isso.
Adrian, 22 anos, estudante universitário. Sua mãe era dependente química e o deixou em um orfanato quando ele ainda era bebê. Adrian foi adotado por Vicente aos seus oito anos; vive com ele e com sua madrasta Juliana, que mora com eles há aproximadamente quatro anos.
Outros personagens serão apresentados ao decorrer da história.
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...Para quem acredita que a diferença de idade é só um detalhe — principalmente quando o detalhe é o Adrian....
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ALGUNS MESES ATRÁS…
Eu volto pra casa mais cedo, o coração leve do expediente que acabou mais cedo que o previsto. Subo as escadas com a bolsa batendo no quadril e, ao abrir a porta do quarto, a luz da tarde entra como lâmina pela janela. A visão atravessa a minha pele.
Daniel e a Samantha estão no quarto dela. Parados perto da sacada aberta, envolvidos num beijo que não tem pressa, como se o mundo inteiro tivesse sido desligado só para eles. Ele sem camisa; ela, apenas de roupão; e o tecido aberto revela a lingerie por baixo, como uma mentira entregue à janela. Eles se agarram com mãos que já decoraram esse corpo; Daniel quase a engole com a boca.
Fico parada na penumbra do meu próprio quarto, a imagem gravando-se inteira: o perfil do Daniel, a curva do pescoço da Samantha, a luz recortando os contornos. Não sei piscar. Não sei gritar. O mundo vira areia sob meus pés e minhas lágrimas começam a escorrer, uma a uma, quentes, traçando mapas no meu rosto. É como assistir a um pesadelo na primeira fila.
Eles param. O beijo desvanece; trocam palavras baixas; risos que eu não consigo ouvir. Samantha sorri para ele; Daniel a beija na testa. Quando movem os olhos, me encontram. A expressão nos dois é exatamente a minha: congelamento, choque, a boca procurando uma justificativa que não existe.
Sinto um ódio que me invade pelo osso. Limpo o rosto com a lateral da mão, como quem tenta apagar a fumaça. Saio do quarto sem raciocinar e vou até a porta da Samantha. Bato com os nós dos dedos até doer.
— Abre!! Abre essa porta! — grito, dando socos na porta de madeira.
A porta se abre e eles estão ali, em silêncio, as roupas desalinhadas, a respiração ainda ofegante. Não tenho palco para a surpresa: vi tudo com meus olhos. Não há como negar.
Daniel dá um passo à minha frente, as mãos abertas, o rosto pálido.
— Madison…
Antes que termine; dou um tapa na cara dele, seco, com toda a força que o meu corpo ainda encontra.
—Como pôde fazer isso comigo, Daniel?! — As palavras saem em estilhaços. — Não quero ouvir nem uma palavra. Quero que suma da minha vida. Pra já!
Ele permanece mudo, a mandíbula tensa. Samantha está atrás dele, imóvel, o rosto corado, sem resposta.
—E você, Samantha? — eu lanço a pergunta como uma pedra. — Sério? Como você pôde?? Que palhaçada é essa?!
Samantha abre a boca, fecha. Fico olhando para ela, a raiva querendo transformar-se em ação, mas não sou do tipo que parte para a agressão. Não hoje. Não aqui.
—Fica com ele, então — eu digo, e o tom é mais cortante do que qualquer soco. — Ele é seu agora. Comigo ele não fica mais.
Viro de costas e volto para casa. Ouço passos longos atrás de mim; sinto o fôlego dele. Acelero e entro, fecho a porta com força e subo as escadas. Meu corpo treme. Subo dois degraus por vez.
—Madison! — ele chama do fim do corredor. — Madison, espera!
Entro no quarto, giro a chave com mãos trêmulas, tento trancar a porta; mas ele empurra e entra antes que eu consiga fechar. Sinto o ar se tornar vidro entre nós.
—Madison — ele sussurra, as palmas coladas ao corpo, pedindo perdão já em forma de frase pronta. — Olha eu... me desculpe.
Me viro lentamente. Encaro aquele homem que eu escolhi. “Me desculpe?”
—Me desculpe? — repito, e cada sílaba é pedra. — É isso que você me diz, Daniel?
Ele recua meio passo, os olhos procurando um ponto de fuga.
—Há quanto tempo? — eu pergunto, controlando a voz para que não quebre.
—Há quanto tempo o quê? — ele pergunta, ignorância ensaiada.
—Há quanto tempo você fica com ela? Foi a primeira vez?
O silêncio responde antes que ele abra a boca. O olhar dele diz tudo: não. E eu preciso que a boca dele confirme.
—Fala, Daniel! — meu tom corta.
—Não... não foi a primeira vez — ele admite, a voz baixa, derrotada.
Uma lâmina percorre meu peito. Eu queria que fosse mentira. Queria que fosse um deslize isolado. A verdade, porém, é maior e mais traiçoeira: três meses, ele diz depois, e a frase pesa como chumbo.
Três meses. Três meses em que fui cúmplice involuntária da própria humilhação.
As lágrimas voltam. Daniel estende a mão como se pudesse tocar-me e consertar o que foi quebrado.
—Não chega perto — eu falo. — Não chega perto de mim, Daniel!
—Madison, não significou nada, tá? Eu... eu amo você!
A voz dele é um pedido infantil. Sinto um riso amargo na garganta que se transforma em ódio.
— Amor? — cuspo a palavra. — Me ama é o caramba!
—Madison — ele tenta, e o nome sai como súplica.
—Chega! — eu corto. — Você tem meia hora pra pegar o que precisa e sumir da minha casa. Depois eu levo o restante.
—Você não pode fazer isso! — ele protesta.
—Posso e estou fazendo — respondo. — Meia hora. Nem um minuto a mais.
Saio do quarto correndo pelas escadas, sem destino claro, apenas carregada pela urgência de expulsar o ar viciado daquela casa. Ele vem atrás, insistente.
—Madison, por favor, vamos conversar!
—Se você não sair em meia hora, eu chamo a polícia — eu aviso, a voz firme, sem hesitar.
A discussão se arrasta até o som de uma voz adolescente que nos corta como uma lâmina.
—O que está acontecendo aqui?!
Olho para a cozinha. Alice está sentada no balcão ao lado da Bárbara, a cara confusa de quem não deveria presenciar tanto estrondo. Seus olhos, enormes, se enchem de água num segundo.
—Mãe? Pai? — Ela pergunta, já tremendo.
Daniel abre a boca, fecha. Eu respiro, puxo o ar com força, e decido dizer toda a verdade.
—Alice — digo, um pouco hesitante — seu pai me traiu. Ele me trai há três meses com a Samantha, a vizinha.
Os olhos da minha filha estalam em líquido. Bárbara fica boquiaberta, a mão cobrindo a boca. Alice recua; as pernas não aguentam e ela corre para o quarto, seguida pela amiga.
Daniel coloca as mãos na cabeça, o constrangimento físico de quem perdeu qualquer argumento.
—Madison, não precisava disso — ele murmura. — Olha como ela ficou!
—Uma hora ela ia saber — respondo, e sinto a voz falhar. — Antes que ela descubra de outra forma, prefiro que saiba por mim.
Ele respira fundo, dá um passo para trás.
—Tudo bem. Se quer que eu saia, eu vou. — A arrogância dele é agora uma bagagem vazia.
—Anda — eu digo. — E leva suas tralhas.
Ele sobe, silencioso. Fecho os olhos e deixo as lágrimas rolarem de novo, desta vez sem controle. Por que ele fez isso? Por quê?
Hoje, doismeses depois...
O divórcio saiu há poucas semanas. Agora a casa respira silêncio; só eu e a Alice.
No começo, foi estranho. Um espaço vazio na mesa, outro no sofá. A toalha dele que não some mais do banheiro. Mas com o tempo o corpo acostuma. A mente também; ou finge.
Alice ficou do meu lado desde o primeiro instante. A decepção com o pai foi imediata, feroz. Ela ainda fala com ele às vezes, por obrigação, mas o olhar muda de tom toda vez que o nome dele aparece. Eu entendo. Ela tem dezesseis anos, mas já conhece a dor das rachaduras.
Hoje é o primeiro dia de aula dela e o meu retorno à universidade.
Acordo uma hora antes. O despertador toca e ecoa pelo quarto, mas aposto que Alice ainda dorme como se o mundo estivesse em pausa.
Tomo banho, escovo os dentes, visto uma calça social preta e uma blusa leve, prendo o cabelo num coque rápido. Na cozinha, o cheiro do café se mistura ao som distante dos passarinhos e ao vazio que ele deixou.
Por mais que eu tente ser racional, ainda sinto falta.
Falta do barulho dele pela manhã, da xícara esquecida na pia, do toque distraído no meu ombro antes de sair. São detalhes, mas são esses detalhes que costuram os dias.
Não sei se ainda o amo; talvez só me falte o costume da ausência. Mas pensar nele ainda dói, e essa dor insiste em aparecer nas horas mais banais.
Subo as escadas com uma caneca de café na mão. No quarto de Alice, o despertador toca estridente ao lado da cabeça dela, e ela dorme como se não houvesse som algum.
Desligo o aparelho e me aproximo, encostando de leve no ombro da menina.
— Alice, filha… acorda.
— Hm… mãe… — ela resmunga, sem abrir os olhos.
— Como você consegue não ouvir o despertador nessa altura, hein?
— Ele tocou? — pergunta, a voz rouca de sono.
— Tocou! Vamos, levanta, toma café. É o primeiro dia, não vai se atrasar!
— Tá…
Ela se senta na cama devagar, os cabelos bagunçados, o rosto ainda meio escondido entre as mãos.
— Bom dia, filha.
— Bom dia, mãe. Você vai me levar?
— Vou sim. Se arruma e desce pra tomar café, tá? Eu não posso me atrasar também.
— Tá bom, já vou.
Dou um beijo na testa dela e deixo o quarto.
Pego minha bolsa e o computador, volto pra cozinha e reviso uns arquivos enquanto espero. Quase meia hora depois, Alice desce, já desperta e com o uniforme arrumado.
— Pronta?
— Pronta!
Tomamos café juntas, e depois seguimos pro carro.
— Mãe, dá pra pegar a Bárbara e o Jonathan? Eles estão esperando lá na casa dela. Falei que íamos juntos.
— Tá bem, pegamos os dois.
Bárbara e Jonathan são inseparáveis dela desde o oitavo ano; uma trindade barulhenta e doce. Agora, começando o ensino médio, parecem adultos de mentira, cheios de sonhos e playlists.
Paramos em frente à casa de Bárbara. Os dois já esperam na calçada, mochilas nas costas e sorrisos largos.
Jonathan, 17 anos( amigo de Alice)
Bárbara, 16 anos( Amiga de Alice)
— Oi, tia! — gritam em coro.
— Oi, meus queridos! Ansiosos?
— Um pouco! Primeiro dia, né...
— Imagino! Entrem logo, vamos antes que o trânsito acorde.
Assim que entram, Jonathan se inclina pra frente, animado.
— Coloca uma música, tia Madison!
— Já falei pra vocês que ela não gosta que chamem de tia — brinca Alice.
— Ah, mas de vocês eu gosto — digo rindo. — Me acostumei! Vai, DJ, o que quer ouvir hoje?
— Katy Perry, claro! “The Part of Me”! E se puder, aumenta o volume!
— Pedido aceito!
A voz da Katy invade o carro, e logo os três começam a cantar, desafinados e felizes. Eu me junto a eles, batendo os dedos no volante, sentindo o ar leve.
Por alguns minutos, esqueço tudo. Só existe aquele refrão e o riso da minha filha.
Quando estaciono em frente à escola, eles ainda cantam.
— Chegamos, jovens estrelas!
— Obrigada, mãe. — Alice se inclina e me dá um beijo rápido.
— Valeu, tia! — dizem os dois rindo.
— Boa aula, meus amores!
Dou um último sorriso, observo-os correrem até o portão e sigo direto pra universidade, ainda com a música repetindo.
Katy Perry cantando sobre recomeços. E eu, tentando acreditar que o meu também começou.
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...ADRIAN:...
Faz um mês que me mudei pra cá. Nova cidade, novas pessoas, o mesmo vazio.
Moro com meu pai adotivo, Vicente; o homem que me tirou do orfanato quando eu tinha sete anos. Nunca conheci meus pais biológicos; minha mãe era dependente química, meu pai, um mistério que ninguém quis resolver. Vicente sempre fez de tudo pra preencher esse espaço, e, de certa forma, conseguiu. Hoje ele é casado com a Juliana, médica, paciente, bonita, um equilíbrio ambulante pro caos dele; e o meu.
É o meu primeiro dia na universidade nova. Segundo ano. Pra ser honesto, eu nem queria estar aqui. Estudo por ele, pra dar orgulho. Vicente sempre repetiu que eu tinha “um potencial enorme”, e que “um diploma abriria todas as portas”. Eu só queria abrir as minhas próprias, no meu tempo.
O despertador toca e eu levanto na primeira badalada. Banho rápido, roupa jeans, jaqueta preta. Desço pro café e encontro os dois já na mesa.
Vicente, 43 anos( Pai adotivo de Adrian)
Juliana, 42 anos( Madrasta de Adrian)
— Bom dia, filho.
— Bom dia, pai. Bom dia, Juliana.
— Bom dia, querido. Come alguma coisa, não vai querer passar o dia só com café.
Sento e tomo um gole, fingindo fome. A rotina deles é calma, quase ensaiada; ele lendo o jornal, ela mexendo no celular, os dois trocando sorrisos mornos.
Depois, saímos. Cada um pro seu caminho. Pego o carro, coloco uma playlist qualquer e enfrento o trânsito infernal. Claro que chego atrasado.
Corro pelos corredores da universidade, procurando a sala. Quando finalmente acho, bato à porta; e ela se abre.
Por um segundo, o mundo se apaga.
A mulher que me encara tem olhos intensos e uma postura serena. Cabelos presos, expressão firme. Linda pra cacete. Deve ser a professora.
— Desculpe, cheguei um pouco atrasado. O trânsito tava impossível.
— Tudo bem — responde ela, com a voz calma e segura. — Entre, escolha um lugar pra se sentar.
Entro. Sento logo na frente. O perfume dela ainda flutua no ar, doce e discreto.
— Bom, todos já se apresentaram. Você, o rapaz que chegou atrasado; pode se levantar e dizer seu nome e idade?
Levanto, ajustando a mochila no ombro.
— Adrian. Tenho vinte e dois anos.
— Prazer, Adrian. Sou a professora Madison, e vou orientar vocês em Ciências da Natureza e suas Tecnologias.
Ela fala com convicção. O tipo de mulher que segura uma sala só com o olhar.
A aula começa; eu não entendo nada do que ela diz e, pra ser sincero, nem quero. Estou ocupado demais observando o jeito que os lábios dela se movem, o brilho discreto nos olhos, a voz que parece feita pra me distrair. Mulher madura. Trinta e poucos, talvez. Do jeito que eu gosto.
Tô vendo que essa professora vai ser o meu novo problema.
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