ELISA SANTIAGO
Tudo ficou escuro no momento em que saí da faculdade
debaixo da chuva. Corro pelas ruas, apressada, com medo de que
todos os meus livros fiquem completamente destruídos pela força da
água. Minha mãe não pode me dar novos, e me lembro de que
esses já custaram muito dinheiro.
Piso nas poças, tendo a sensação de que meus tênis estão
descolando. Como eu adivinharia que esta chuva iria cair
justamente hoje, quando o ônibus resolveu quebrar e minha mãe
saiu para trabalhar do outro lado da cidade? Até mesmo um
cachorro latiu feio para mim.
O destino está querendo me pregar uma peça por eu ter sido
desorganizada com minhas roupas no mês passado, deixando de
arrumar bem o guarda-roupa. Isso contribuiu para que as suas
portas ficassem difíceis de fechar, acabando com a chance de eu ter
um armário legal.
Minha mãe se esforça para me dar de tudo, e sempre foi
assim. Somos apenas nós duas, as melhores amigas. Ela é a
pessoa que mais amo nesta vida, a minha guerreira, meu maior
exemplo.
Vivemos no Morro do Alemão. Somos duas mulheres sozinhas
que moram em um barraco pequeno, com uma TV desmantelada e
um telhado pelo qual entra água quando chove. É um lugarzinho
simples, mas é o bastante para nos fazer felizes.
O meu pai abandonou a minha mãe no momento em que soube que ela esperava um filho seu, e minha avó a expulsou de
casa por puro preconceito.
Como uma mulher negra e batalhadora, sem o ensino médio completo, ela precisou largar os estudos para poder me criar, e por isso faz de tudo para que eu siga o meu caminho, para que eu brilhe
e consiga, um dia, chegar longe.
Por eu ser preta, favelada e pobre, o preconceito e a
discriminação sempre se fizeram presentes na minha vida, mas nem
por isso desistirei de todos os meus sonhos. Com meus 21 anos,
estou cursando o quarto ano da faculdade de Direito, na qual
ingressei por meio do ENEM. Em pouco menos de um ano estarei
formada, então poderei, finalmente, conseguir um emprego e
proporcionar uma vida melhor para a minha mãe.
Cogito esperar toda esta chuva passar, debaixo do viaduto
mais próximo, mas acabo desistindo da ideia. Continuo caminhando.
O meu celular se encontra molhado e tudo em mim está
encharcado.
Penso que na última vez em que isso me aconteceu, peguei
um resfriado e levei quase um mês para me recuperar. Não posso
ficar doente, tenho provas importantes para fazer na semana que
vem.
Não acho justo mamãe chegar cansada em casa todos os dias,
portanto, gostaria de poder ajudá-la trabalhando nos fins de
semana, mas ela não aceita a ideia. Por essa razão, faço dos meus
estudos a segunda coisa mais importante da minha vida, porque a
primeira sempre será ela.
Estou quase chegando à entrada do Morro, quando um carro
em alta velocidade passa por mim. Os pneus fazem levantar do chão, na minha direção, uma grande quantidade de água de uma poça bem próxima. Fecho os olhos para me proteger daquela água
suja das ruas. A minha sorte é que a chuva está começando a passar, e agradeço aos céus por isso.
Não vejo a hora de poder chegar em casa, trocar de roupas e ficar aquecida. Minhas mãos estão ficando congeladas. Nesta época do ano, no Rio de Janeiro costuma fazer menos calor, e quando chove, a sensação térmica chega aos 19 graus.
Já estou me afastando da “civilização”. Algumas pessoas
costumam dizer que nós, favelados, somos pessoas violentas e
terroristas. Ainda nos chamam de mais possíveis xingamentos
dessa categoria. “Quem vê cara, não vê coração”. Para nós, esse
ditado tem um significado diferente, pois as pessoas só notam o
nosso exterior e associam a nossa imagem a algo terrível, não
conseguindo enxergar o bem em nós.
Em cada viela pode-se encontrar pessoas boas e
trabalhadoras que lutam para ganhar o próprio pão. Muitos de nós
somos honestos e não estamos envolvidos com a parte criminosa
do local.
Quando eu, finalmente, tornar-me juíza, irei lutar pelos direitos
que nós, moradores de favelas, possuímos, mas muitas vezes são
retirados.
Acabo derrubando o meu celular no chão, então me abaixo
para o pegar, sentindo todo aquele cheirinho de asfalto molhado e
quente invadir minhas narinas. O sol começa a brilhar, mas, no céu,
predominam grandes nuvens escuras.
Através da poça de água, posso notar o reflexo de um homem
bem diante de mim. Encaro o sujeito que usa um sobretudo preto,
um relógio grande de pulso e sapatos também pretos. Seus cabelos
são da mesma cor, penteados e alinhados, com todos os fios
devidamente em seus lugares. Notando os muitos anéis de ouro que
ele possui, tenho a certeza de que ele não é morador da favela.
Também não se parece em nada com um bandido. A não ser que
esteja disfarçado.
Levanto-me rapidamente. Os óculos de sol no seu rosto não
me permitem ver a cor dos seus olhos, mas posso apostar que são
escuros. Digamos que sua aparência é assustadora. Não que ele
não tenha beleza alguma, pelo contrário, seus lábios vermelhos são
incrivelmente carnudos e os músculos em seu corpo parecem ser torneados. Suas mãos estão nos bolsos da calça e ele aparenta ser bem calmo.
Não entendo por que ele está me olhando de uma maneira
como se pudesse ver através da minha alma. Sinto um arrepio
percorrer todo o meu corpo e dou um passo para trás. Conforme o
vejo se aproximando de mim, o sol fica escuro, parecendo que ele
tem poder sobre o tempo.
Percebo que alguns homens de preto chegam perto de nós.
Acho que são seguranças particulares do homem que me olha de
forma intrigante.
Continuo caminhando para trás, agarrada à minha mochila,
parecendo uma coelhinha assustada.
Será que isto é alguma emboscada? Como eles podem, muito
bem, estar se confundindo, resolvo dizer algo ao sentir que estou
com as costas em alguém. Bastante assustada, noto que o tal cara
está mais próximo de mim do que eu imaginava. Ele me analisa com
muita atenção.
Um círculo de homens se forma ao meu redor e do senhor,
sem deixar espaço para que eu saia, então percebo que esta
situação é mais séria do que eu poderia imaginar.
— O que está acontecendo aqui?
— Finalmente será minha, bela morena — sua voz é tão rouca,
que me causa um grande arrepio por toda a espinha.
Ele parece um caçador em busca de sua presa fácil. No caso,eu mesma.
— Não sei o que está acontecendo aqui, mas, por favor, me
deixe sair. Não fiz nada.
— Você fez sim: insultou-me no momento em que meus olhos encontraram os seus e me fez querê-la tanto, que agora estou aqui para levá-la comigo.
— Levar? Mas para onde?
Não sobra tempo para que eu fale mais nada, pois, de repente,
sinto me pressionarem um lenço com alguma substância forte capaz
de me causar uma terrível dor de cabeça. O homem atrás de mim é
incrivelmente forte e logo estou perdendo todos os meus sentidos,
desmaiando em seus braços.
ELISA SANTIAGO
Acabei de despertar em um ambiente totalmente iluminado e
estou deitada sobre uma enorme cama de casal, a qual parece ser
maior do que todo o barraco onde moro. Minha cabeça está doendo
e eu me sinto cansada, sonolenta. Há um lençol sobre o meu corpo
para me aquecer e o ar-condicionado do lugar deixa o clima muito
frio.
Observo cada detalhe do vasto quarto de luxo em que estou e
minha mente começa a recobrar tudo que aconteceu antes que eu
pudesse desmaiar. Lembro-me da chuva e de estar voltando da
faculdade, quando fui abordada por um homem que usava roupas
pretas. Será que fui sequestrada? Meu pensamento questiona essa
possibilidade. Mas se foi realmente um sequestro, que diabos estou
fazendo neste quarto que mais parece um palácio, de tão luxuoso?
Tento me levantar da cama, mas é em vão. Levo as mãos à
cabeça e noto que tudo dentro dela está girando igual a um
carrossel sem freio. Fecho os olhos, tentando controlar a tontura.
Minha mãe me ensinou que nunca devemos nos entregar aos
nossos problemas.
Pouco tempo depois, felizmente, consigo me sentir melhor e
posso me levantar. Noto que estou usando uma linda camisola de
seda da cor rosé, muito macia. Eu nunca tinha sentido nada assim
antes. Ela vai até a altura dos joelhos e tem um pequeno decote e
alças finas. Definitivamente, não é minha. Nada aqui é meu.
Caminho em direção à porta e vejo que, pelo menos, ela não está trancada. Passo as mãos nos meus cabelos, que não estão mais molhados da chuva e parecem ter sido hidratados como nunca
antes. Os fios cacheados estão controlados nos seus devidos
lugares e a maciez se faz presente neles.
Não posso deixar de perceber que, no quarto, há algumas
roupas para que eu me troque, certamente. Acabo ignorando tudo
isso, a fim de tentar encontrar alguém que possa me dizer alguma
coisa.
Será que estou na casa da patroa da minha mãe? Aqueles
homens que me abordaram podem ter sido os seguranças
particulares da senhora Vilar. Se foram eles, logo encontrarei
mamãe. Tento não ficar nervosa, pois não sou mais uma garotinha
para não encarar a realidade.
Que tipo de pessoa precisa lhe dopar para que você a
acompanhe até algum lugar? Criminosos fazem isso, pessoas de
bem não.
Fecho a porta do quarto e começo a caminhar por um corredor,
onde há quadros pendurados nas paredes escuras. Percebo que
estou com os pés descalços, pisando sobre um longo tapete
vermelho que parece ir até o fim do corredor. O lugar é muito
elegante.
Este não é um sequestro normal, porque não fui raptada para
morrer rapidamente e meus órgãos ainda estão devidamente nos
seus lugares. Pelo menos é isso que penso. Toco em mim mesma,
um pouco assustada, e, enfim, sei que nada de ruim me aconteceu
até agora. Está tudo em seu lugar. Então percebo uma pequena
cicatriz no meu antebraço. Ela é tão minúscula, que há apenas um
único ponto.
Assustada, passo as pontas de alguns dedos sobre o local e o
sinto doer um pouco, como se a ferida tivesse sido aberta há poucas
horas. Posso sentir que há algo pequeno dentro de mim, durinho, de
uma textura sólida e resistente. O que é isso? Por Deus!
Corro até uma porta rapidamente e tento abri-la, mas não encontro o trinco. Ela pode ser aberta apenas com um escaneamento ou um cartão.
Estou presa. Alguém quer me manter aqui dentro. Mas quem
seria tão cruel a esse ponto? Tento me lembrar de alguém que
poderia me fazer algum mal, então constato que não tenho
inimizades, nem mesmo com o dono do Morro. Os chefes e
bandidos da favela sempre me respeitaram e os vapores nunca
tocaram um dedo sequer em mim. Não faço ideia de quem está por
trás de tudo isso.
Começo a chorar, apavorada. Por que a porta não abre? Tento
colocar minha impressão digital, só que é em vão, e bato várias
vezes contra ela. Penso até em gritar, mas sei que seria perda de
tempo, já que ninguém me ouviria.
Corro até uma grande janela de vidro na sala e quase caio
para trás ao ver a vista lá fora. Não é possível! Esta cidade não é
nada parecida com o Rio de Janeiro. É incrivelmente moderna,
repleta de arranha-céus, a tecnologia se faz presente em cada parte
dela e a arquitetura é variada, demonstrando luxo e poder.
Estou em Nova Iorque. Aquele prédio à minha frente é o
Empire State Building, um dos mais famosos arranha-céus de todo o
mundo. Com fachada de calcário e colunas de aço, ele é localizado
no centro de Manhattan, na cidade de Nova Iorque, e possui 102
andares, para eu ser mais exata. A ilha é conhecida como “a cidade
dos milionários”. Como já fiz uma pesquisa sobre a cidade no tempo
de escola, posso afirmar que quem vive neste centro são pessoas
com muito dinheiro.
Minha ficha caiu por terra agora. Não estou mais no Brasil, e
sim nos Estados Unidos da América, na América do Norte. Por Deus! Como isso foi acontecer? Quem me trouxe para cá? Eu dormi por mais de 24 horas? Óbvio que sim.
A fome me fez despertar. Estou tão faminta, que juro que não
como nada há mais de um dia.
A minha mãe!
Preciso lhe avisar onde estou. Ela deve estar morrendo de
preocupação por minha causa.
Procuro algum telefone pela sala e encontro um fixo.
Rapidamente, digito o número dela, mas então percebo que a
ligação não irá se completar, pois não há nenhum tipo de sinal que
indique alguma conexão.
Preciso manter a calma, não perder o controle. Quem está por
trás de tudo isso elaborou um plano infalível, pensando até mesmo
nos mínimos detalhes, como cortar a conexão do telefone fixo.
Na cozinha deve ter algum, só preciso encontrá-lo. Há algumas
portas aqui, mas uma grande e preta é a mais chamativa. Ela é
coberta de madeira maciça e seus detalhes e símbolos de cavalos
conseguem prender minha atenção.
Será que... Não custa tentar.
Consigo abrir a porta, que estava destrancada, e a primeira
coisa que vejo é um telefone fixo branco em cima da mesa do
luxuoso escritório. O piso de madeira brilha, de tão limpo, e o
perfume do ambiente exala um cheiro amadeirado que faz com que
meu nariz arda, de tão forte que é. Ao lado do telefone, há uns
charutos com as iniciais “M. L.” Nunca nem ouvi falar dessa marca.
Ou será que já? Pelo menos não de charutos, e sim de joias.
O telefone fixo daqui também está sem conexão alguma.
Droga! E agora? O que irei fazer?
— Não é possível! Que droga! — Assusto-me comigo mesma,
já que nunca havia falado nenhuma palavra de baixo calão em toda
a minha vida. Minha mãe não permite. — Eu preciso sair daqui.
— Nem por cima do meu cadáver, isso irá acontecer, senhora Lansky.
Meus olhos fitam o homem alto de terno preto, lábios vermelhos e olhos azuis. A personificação perfeita da palavra “beleza” se enquadra nesse cara forte e másculo. É o mesmo que
me abordou quando eu estava voltando da faculdade.
Meu corpo entra em alerta com sua presença. Não sei nada
sobre ele, apenas que é o responsável por eu estar aqui neste
momento. O homem mantém um olhar gélido sobre mim. Sua pele
pálida combina perfeitamente com seus olhos claros e seu olhar é
capaz de me causar medo.
Nunca temi ninguém em toda a minha vida como temo ele.
Eu devolvo o telefone para o gancho, e o cara nem ao menos
pisca, como se tudo em mim chamasse a sua atenção. Seu olhar
penetrante faz eu me sentir completamente exposta. É como se ele
conseguisse ver todo o meu corpo nu, mesmo eu estando coberta
pela camisola. Lembro-me de que o decote dela é bem visível e,
rapidamente, cubro-me com as duas mãos, fazendo uma barreira. O
sorriso de lado em seu rosto é incrivelmente sexy.
— Acha mesmo que isso vai me impedir de fazer alguma
coisa? — Ergue uma das sobrancelhas.
O homem falou como se fosse capaz de me forçar a fazer algo.
Certamente, acha que possui esse poder só porque está em seu
país e, possivelmente, em uma propriedade em seu nome. Pelas
roupas que ele veste, é possível notar, de longe, que ele não é uma
pessoa como eu: pobre. Tudo nele grita “dinheiro”.
— Você fala como se fosse um doente.
Nunca fui de esconder meus pensamentos. Sempre fui uma
menina sincera, e se algo me incomoda, falo imediatamente.
— Tem a língua bastante afiada. Não será nada bom para você
continuar assim — seu tom é ameaçador.
Sua voz rouca tem um sotaque português muito diferente do meu. Logo percebo que ele não é brasileiro, como eu. Deve ser americano, já que estamos na América do Norte.
O homem me olha como se eu fosse um pedaço de carne.
Um maníaco.
Meu corpo treme só de eu pensar nessa possibilidade. Tento
não demonstrar isso, mas, como falei, sou péssima em esconder as
coisas.
— O que estou fazendo aqui? Por que me trouxe para outro
país?
— Nota-se que é muito inteligente. Não é à toa que estava
cursando Direito.
— Por que nunca responde às minhas perguntas?
— Por que sempre está fazendo perguntas?
Esse foi o estopim para acabar com toda a minha calma. Esse
homem está pensando o quê? Que é algum rei? Um presidente?
Alguém que merece respeito? O cara pode até ser rico, porém isso
não lhe dava o direito de me trazer à força para outro país. Isso é
crime. Segundo a Constituição Brasileira, ele pegaria de quatro a
dez anos de cadeia, e por me manter em cárcere privado, de cinco a
oito anos. Um bom tempo para aprender que não é o dono do
mundo.
— Tudo bem se não quiser me responder, mas fique sabendo
que eu vou te denunciar para as autoridades. A embaixada
brasileira irá tomar todas as medidas cabíveis para que você pague
pelos seus crimes. — Ele me observa tranquilamente. Nada o
abala? — Não vou ficar mais nem um segundo aqui, você não tem o
direito de me manter presa. E se tentar fazer alguma coisa contra
mim, juro que vai pagar caro por isso.
Ele continua firme, observando-me de maneira eficiente. Algo que me irrita tanto.
Caminho em direção à saída, temerosa. E o que eu temia, acontece: ele me segura pelo braço direito com muita força,fazendo-me parar de andar bruscamente. Sua mão é grande o
suficiente para me fazer querer chorar de dor. Prendo as lágrimas
que se formaram.
— Você não vai a lugar algum, Elisa.
Como ele sabe o meu nome?
Assustada, encaro os seus lindos olhos azuis sombrios. Ele
parece ser a própria morte, um enviado do demônio para me
destruir.
O homem me faz ficar de frente para o seu corpo musculoso e
forte. O meu queixo bate abaixo do seu ombro. Ele é muito alto, e
eu com meu 1,60 m pareço uma anã diante dele, que aparenta ter
quase 2 metros de altura.
— Como você sabe o meu nome?
— Eu sei tudo sobre você, morena.
Ele parece ser muito possessivo.
— O meu braço... por favor.
— Você não vai sair deste apartamento nunca. A partir de agora, será minha mulher e fará de tudo para me agradar e me obedecer fielmente. Se houver desobediência, haverá consequências: punições severas. Portanto, sugiro que seja uma boa garota e que esteja disposta a colaborar comigo. Caso seja uma boa esposa, terá seus privilégios: uma vida confortável e regalias de
princesa.
O que esse cara disse é uma loucura. Ele não pode me tomar como sua mulher. Não dessa maneira. Não sou nenhuma prostituta de luxo para que ele me possua em troca de dinheiro e de uma vida
confortável. Ele não tem o direito de fazer isso comigo.
— Só pode ser um daqueles psicopatas. Não vou ser sua mulher. — Solto-me dele. — Prefiro morrer a ter que passar uma noite com você. Quem pensa que sou, para querer me tomar como
uma vadia?
— Você... — Puxa-me pelos cabelos e me prende em seu
corpo forte. O impacto foi tão grande, que me machucou. — É muito
abusada, garota. Eu sabia que seria assim no início. Por isso, quero
que veja uma coisa. — Solta-me, fazendo com que eu tenha acesso
à saída.
A porta está aberta e eu posso correr neste momento. Estou
prestes a fazer isso, quando ouço uma voz vindo atrás de mim. É a
minha mãe. Fico congelada, sem mover um músculo sequer,
paralisada.
— Tem certeza de que não quer ver como sua mãe está,
morena?
Olho para trás e vejo um grande telão que não estava ali antes.
Ele, certamente, apertou algum botão e esse negócio apareceu de
repente. A imagem mostrada é da minha mãe sentada no velho sofá
da nossa pequena casinha, chorando, enquanto um homem de,
aparentemente, uns quarenta e poucos anos está conversando com
ela.
Ele implantou uma câmera lá? O quão perigoso esse homem
é? Seria mesmo capaz de fazer mal à minha mãe? Meu Deus! Ela
está correndo perigo.
— Hoje faz dois dias que minha filha não me dá notícias. Elisa não é como essas garotas que saem de casa sem avisar. A minha filha está correndo perigo e a polícia parece não querer fazer nada
para encontrá-la.
Minha mãe está usando uma calça jeans rasgada e uma blusa branca, surrada, que eu lhe dei de aniversário há dois anos e se tornou a sua favorita.
Meus olhos se enchem de lágrimas quando vejo a dor no semblante da minha rainha. Seus olhos estão vermelhos de tanto ela chorar.
— Calma, senhora. Sou um delegado de polícia e estou aqui
para a ajudar.
O homem me encara com muita satisfação no olhar. Ele sabe
que esse é o meu ponto fraco.
— Carlos é o meu homem de confiança. Ele se infiltrou na
polícia com o objetivo de atrapalhar as buscas por você. Vê como
sua mãe está preocupada?
— Você é um monstro! Não vê que ela está sofrendo?
— Ela pode sofrer ainda mais. Isso vai depender de você.
— Não faça mal a ela, eu lhe imploro.
Ele sorri, satisfeito.
— Carlos — ele fala em um pequeno ponto que tem em uma
das suas mãos. — Toque no ombro da senhora Santiago.
Volto a olhar para a imagem na televisão. O tal Carlos faz
exatamente o que lhe foi pedido. Isso é monstruoso.
— Eu faço o que o senhor quiser, só não machuque a minha
mãe. — Não consigo controlar as lágrimas, que escorrem pelo meu
rosto.
— Boa menina. Morena, não há necessidade de chorar. Não
sou tão cruel quanto você deve estar pensando. Está colaborando
comigo. Como avisei, serei legal com você se resolver ficar ao meu
lado, sendo a minha mulher.
— Por que eu? — pergunto cabisbaixa, chorando.
O que faria um homem como ele se interessar por uma garota
sem graça como eu?
Uma mão sua toca no meu queixo, erguendo o meu rosto.
Seus olhos azuis estão repletos de luxúria.
— Porque tinha que ser você. — Solta o meu queixo. — Quero
que volte para o nosso quarto. — Arregalo os olhos. — Isso mesmo,
nosso quarto. Será nosso a partir de hoje. Irei buscar o papel que
falta para que você assine, e assim que o assinar, será minha
esposa e poderemos, finalmente, consumar a nossa união.
Engasguei-me quando ele disse que consumaríamos o
casamento, ou seja, sexo com um estranho, com alguém que eu
nunca tinha visto na vida. Acabamos de nos conhecer por meio
deste sequestro, e ele me disse que serei sua esposa. Como
assim? Estou tremendo, apavorada. O que farei para escapar desse
homem lindo e louco? Posso ver, em seus olhos azuis, que ele me
deseja ardentemente. Mas mesmo que ele seja lindo, estou assustada.
Ele é um doente, um homem sem coração, que foi capaz de
usar a minha mãe para me obrigar a casar. Por que isso está
acontecendo justamente comigo? O que ele viu em mim, que as
demais mulheres desta cidade não têm? Essa história de casamento é uma grande loucura.
— Seja bem-vinda à sua nova vida, princesa, ao lado do seu
futuro marido, Matthew Lansky. Prazer, querida esposa.
MATTHEW LANSKY
Poder sempre foi o meu ponto mais forte. Sou um homem
respeitado por todos, até mesmo pelos meus inimigos, que
passaram a me temer após eu conseguir derrubar a distância que
controlava a máfia jamaicana por quase nove décadas. Não perdoo
traição em nosso mundo. Já fui traído pelo filhinho mimado do
Corréu, e isso acabou em uma invadida à base de controle deles,
resultando na morte do líder na época, um inconsequente que
estava se expondo demais perante a sociedade comum e se
envolvendo em conflitos públicos. Os demais líderes, das máfias
russas e italianas, passaram a nos apoiar depois disso.
Hoje sou considerado o mais poderoso entre todos, o orgulho
da família Lansky, o que, finalmente, está escrevendo seu nome
entre os grandes. Meu pai foi um grande líder, até que foi derrotado
em um ataque há dez anos, deixando toda a sua fortuna e poder
para mim, que sou seu filho mais velho.
Minha mãe sempre se dedicou a mim de uma maneira intensa,
a ponto de causar incômodo na minha irmã. Como se ela nunca
tivesse sido mimada também. Culpa sua ou não, fui acostumado a
ter tudo nesta vida e todos os meus desejos sempre foram
atendidos. Sendo assim, nunca passei vontade com nada, seja com
algo material ou físico.
Preciso acertar umas contas com o Tito, atual dono do Morro
do Alemão, no Rio de Janeiro. Meus negócios se estenderam pelos
países da América do Sul e eu consegui implantar carregamentos
de armas que passam pelas fronteiras brasileiras em direção à
Guiana Francesa. Não há um só lugar que eu não tenha dominado.
Ninguém pode comigo. Tenho chefes de estado nas minhas mãos, e
o governador do Rio de Janeiro, o Marcos Valério, é um deles.
Mantemos um acordo milionário que beneficia ambas as partes.
Estou no Rio há dois dias. Esta é uma cidade quente que só
me faz querer voltar para casa o mais rápido possível. A única coisa
que me agrada aqui são as belas mulheres que desfilam na orla de
Ipanema, com suas belas curvas que me atraem tanto, que me
fazem querer um ménage.
Carlos me providenciou cinco belas mulheres para essa noite,
acompanhantes de luxo, para a minha pequena festa particular. Mas
antes preciso encontrar o Tito. Marcamos de nos ver na orla de
Ipanema, perto do hotel onde estou hospedado. Quero um relatório
sobre meu carregamento de armas, que deveria ter passado pela
cidade há 15 dias. Um caminhão com rastreamento via satélite não
desaparece do dia para a noite, então alguma coisa aconteceu para
colaborar com esse incidente.
— Senhor, temos algumas pistas de que tenha sido um roubo.
Os suspeitos são mafiosos de uma máfia argentina. Não se
preocupe, iremos dar um jeito.
— Espero que sim. Sabe, Tito... Não estou a fim de sujar
minhas mãos com você, pois seria muita falta de consideração por
tudo que já fez por mim.
Ironia sempre foi o meu forte. Ele engole em seco.
— Senhor, antes mesmo de você voltar para Nova Iorque,
iremos rastrear os infelizes e aplicar as devidas punições.
— Ótimo.
Encerramos nosso assunto.
Preciso relaxar, encontrar prazer no sexo, sentir garotas
agonizarem de dor. Sempre gostei da maneira que elas suplicam
para que eu pare. “Não me machuca”. “O senhor é um monstro”. As
vozes irritantes das mulheres me fazem querer acabar com as vidas
delas antes mesmo de terminar o sexo.
Mas, primeiramente, tenho um encontro ao meio-dia com o governador. Aquele sim estará com os dias contados se não
conseguir o apoio do presidente para os nossos negócios. Ele já
está há três anos no poder, graças ao dinheiro que investi nele.
Passou da hora de ele me dar retorno em alguma coisa. Por sorte,
minha pistola está devidamente carregada, pronta para o matar,
caso tudo não saia da maneira que desejo.
Meu motorista dirige pelas ruas movimentadas da Cidade de
Deus, que está mais para “cidade dos ladrões”. A criminalidade
cresce cada vez mais e os desgraçados dos políticos nada fazem. O
que é bom para pessoas como eu, que estão envolvidas no mundo
do crime.
Em meu celular, leio algumas mensagens de WhatsApp,
totalmente entediado, quando, de repente, algo me faz querer olhar
para a frente: uma bela morena que me faz paralisar diante de sua
beleza. Seus cabelos são crespos e ela está usando uma linda saia
jeans na altura dos joelhos e uma blusa regata com um casaco
jeans. Ela possui uma cintura perfeita e sua pele morena tem um
tom único, jamais visto por mim antes em toda a minha vida.
Ela é a perfeição em mulher.
— Diminua a velocidade — ordeno ao motorista.
Posso notar que ela está distraída, segurando uma mochila
nas costas e alguns livros nas suas mãos delicadas. Suas pernas
são incrivelmente torneadas. O meu pau despertou no momento em
que a vi. Não consigo controlar meus desejos por aquela morena.
Parece um exagero eu afirmar que me encontro totalmente
obcecado por ela, só que não consigo ao menos piscar. A garota
despertou em mim um sentimento jamais experimentado antes,como se fosse amor à primeira vista, mas, no meu caso, nuncaamo, apenas transo.
Aquela morena será minha.
Ordeno para que o motorista dê o retorno. Descobrirei onde aquela mulher mora. Nós a seguimos sem que ela perceba alguma coisa e eu a vejo entrando no Morro do Alemão. Mas que grande
coincidência. Isso só facilitará ainda mais as coisas para mim.
Cancelo o meu encontro com o governador. Ele que se dane.
Preciso saber tudo sobre aquela garota. Assim, telefono para o Tito,
pedindo uma ficha completa sobre ela.
Em menos de uma hora, estou sentado em uma poltrona de
couro super confortável, tragando um dos meus charutos mais
famosos. Investimos em todos os ramos: bebidas, cigarros, roupas,
construções e, principalmente, joias. Também beberico um gole do
meu famoso uísque.
O relatório sobre a minha morena está sobre a mesa de vidro
do meu escritório. Analiso as preciosas informações atentamente.
“Nome: Elisa Santiago.
Data de nascimento: 28.06.2001.
Idade: 22 anos.
Filiação: Débora Santiago.
Ensino médio completo.
Atualmente cursa Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro (há 4 anos).
Tipo sanguíneo: O. Estado civil: solteira.”
— Elisa — saboreio o seu nome como se estivesse tendo um delicioso orgasmo.
Minha futura esposa será uma advogada. Interessante. Uma mulher que conhece as leis precisará ser domada da maneira mais severa que existe, pois, caso contrário, daria muita dor de cabeça
para mim.
Posso estar exagerando quando digo que quero me casar com
ela, mas um casamento no momento irá me beneficiar muito, já que
preciso de herdeiros, mesmo que eles não sejam brancos, assim
como eu. Não me importo com a cor da pele, diferentemente da
minha mãe e irmã, que pensam que as pessoas negras devem ser
escravas, e nada mais.
Quem escolherá a minha esposa será eu, e Elisa Santiago é a
mulher mais perfeita que existe em toda a face da Terra. Ela é
delicada, sexy e incrivelmente atraente. Seu tom de pele é
fascinante e eu amo os seus cabelos enrolados, a curvatura da sua
cintura e o tom moreno dos seus lábios carnudos. A morena será
minha Preciso aliviar minha tensão sexual em alguma coisa: sexo.
As cinco acompanhantes de luxo são muito bonitas. Eram. Eu
matei todas depois de fodê-las duro e forte. A beleza delas era
artificial, com silicones exagerados nos seios e nos bumbuns. Nem
as cores dos seus olhos eram naturais e algumas usavam lentes de
contato. A morena foi a que mais me agradou, só que os cabelos
dela não eram tão perfeitos quanto os da minha doce Elisa. Aposto
que ela ainda é virgem, posso afirmar que é intocada. Seus traços angelicais são tão perfeitos, que eu não poderia desejar uma mulher mais bonita. Beleza não me faltará. Talvez uma pequena ferinha
esteja prestes a cair nas minhas mãos.
Consigo imaginar a surpresa de todos ao me verem casado com uma negra. Irão pensar que enlouqueci. A começar pela minha mãe, pois, segundo ela, devo me casar com alguma filha de um
mafioso importante. O que não é necessário, já que todos estão nas
minhas mãos.
Billie, minha assessora pessoal, encarrega-se de todos os
detalhes para o meu casamento acontecer assim que
desembarcarmos em Nova Iorque. Agora só falta eu colocar meu
plano em ação.
Nunca imaginei que passaria a noite em claro pensando em
como raptar aquela garota, mas minhas olheiras valeram a pena,
porque tenho o plano perfeito para, enfim, conseguir tomar o que é
meu.
Elisa se tornou minha propriedade a partir do primeiro
momento em que meus olhos encontraram os seus. Ela não sabe
que seu destino está traçado, que em breve será minha esposa, a
futura senhora Lansky, e, quem sabe, a dona do meu coração. Creio
que não levará muito tempo para isso se concretizar.
Aqui estou em frente ao espelho, preocupando-me com o
perfume que devo usar para ir ao encontro da minha morena. Algo
amadeirado sempre é uma ótima escolha, já que todas as mulheres
se derretem por esse aroma. Vesti meu sobretudo preto e estou
usando óculos escuros para não mostrar minhas olheiras, resultado
da noite em claro pensando em como sequestrar Elisa.
O plano será usar a dona Débora como o meu ponto forte,minha arma principal. A ligação das duas é forte de tal maneira, que a morena será capaz de fazer qualquer coisa para que eu não machuque sua mãe.
Já estou preparado para que ela se negue a mim, porque ninguém fica satisfeito por perder sua liberdade e isso gera revolta,
mas com a vida de Débora em risco, conseguirei qualquer coisa da
minha princesa. Elisa será minha.
Meu celular vibra no bolso da minha calça. É o meu primo da
Ucrânia, Hades. Acredito que ele tenha ligado para conversarmos
sobre negócios. Estive com ele alguns dias antes de colocar meu
plano em prática. Aposto que ele também já está casado com a filha
do seu inimigo. É Milena o nome dela.
Pelo que compreendi, alguém sequestrou a garota.
Provavelmente, os seus inimigos, os Yakuza. Na família Schneider
contra os Yakuza é olho por olho, filho por filho. A irmã mais velha da moça, da qual não me recordo o nome, era a prometida do meu primo, mas a infeliz fugiu e todos acreditam que ela foi morta pelos
Yakuza. Portanto, Hades deseja se vingar da família Schneider.
Quando o pai de Milena procurou por Hades, pediu que ele localizasse a filha dele, e, em troca, meu primo pediu Milena como sua propriedade. Pelo que ele acabou de me contar, ela agora lhe pertence.
— Quando se casa, meu primo? Serei convidado para a cerimônia?
— Faremos uma visita a você. E Elisa já é sua esposa?
— Será minha em todos os sentidos.
Que diabos está acontecendo comigo? Mal consigo controlar meus instintos. Estou duro como um adolescente cheio de hormônios.
— Não vá ficar apaixonado — zomba.
— Nem você pela filha do seu inimigo. Aposto que se casará com ela em vez de tê-la somente como amante.
Ficamos conversando por mais alguns minutos, e depois encerro a ligação.
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