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Curando Cicatrizes No Campo

PRÓLOGO

Respiração forte, a adrenalina correndo pelo meu corpo, injetando toda a energia possível para realizar a minha fuga.

Os meus pulmões estão a todo o vapor.

Estou a suar frio.

Eu preciso conseguir, eu preciso…

— Oh! Deus, ajude-me.

Sinto o meu rosto inchado, ainda sinto cada golpe na minha pele.

São 7 horas da manhã, o tempo está fechado com o início da chuva. Isso é ótimo, assim as pessoas não ficam nas ruas, ajudando mais ainda o meu disfarce. Ninguém vai me ver a perambular nas ruas. Ninguém vai observar o meu rosto deformado. Ninguém vai saber que eu estou a fugir daquele monstro.

Chego na Rodoviária local de Ohio e peço uma passagem para o primeiro ônibus que está de partida. A atendente só me olha atravessado, como se quisesse saber quem fez aquilo comigo.

Para minha sorte, ela só entrega a passagem e diz que o destino era Indiana. Recolho os meus documentos e acomodo-me no ônibus, rezando para que ninguém me veja. O meu dinheiro é limitado, não tive tempo de seguir o plano, mas o que tenho será o suficiente para sair do radar.

Enquanto o ônibus vai para a estrada, a minha mente relembra cada momento.

(Noite anterior)

- Boa noite minha querida esposa.

Meus pelos eriçaram porque eu sinto o veneno nessa voz.

- Sente-se que eu vou servir o seu jantar.

Usei a minha voz mais doce, tentando esconder o tremor dentro de mim.

Iniciamos o jantar com calma, até o momento que a campainha toca:

- Quem nos infernos vem perturbar-me a essa hora?

- Deixa que eu vou.

Ao abrir a porta recebo o Agente da Polícia Federal. Desejando falar com o meu marido, que é Investigador do Estado.

- Entre policial, vejo que estão me procurando.

Ele responde, chegando atrás de mim.

- Senhor, trago essa intimação oficial do Gabinete do Setor de Operações Especiais.

- Algum problema?

- A ordem é que o Senhor se apresente às 7 horas em ponto, amanhã. Recomendo chegar com 1 hora de antecedência. O superintendente não aceita atrasos.

- Considere a intimação cumprida policial.

- Boa noite, Senhor e Senhora.

Nessa hora o meu coração parou, porque se tem algo que o meu marido é especialista é ser corrupto dentro das suas funções como investigador.

Peguei algumas conversas ao longo do nosso casamento. Ele sempre vendia informações privilegiadas. Mas agora o meu medo estar diante dos meus olhos.

Ele está se transformando na fera, os seus olhos estão frios e assassinos. Oh! Deus me proteja.

- Parece que ficaram sabendo de alguma coisa, minha querida esposa.

Ele torce os meus cabelos atraindo o meu rosto para receber o primeiro tapa.

- Não faça nada comigo.

O Pânico corre no meu corpo, na expectativa do que virá em seguida. Ele joga-me com toda força no chão da sala, eu atinjo o meu corpo na mobília.

- Pensa que eu tenho medo deles?

Ele berra enquanto me machuca.

Tudo que faço é tentar-me proteger e chorar.

- Eu não sei de nada, acredita em mim. Não sei de nada.

Após alguns chutes no meu rosto e nas minhas costas, sinto a minha energia vital se esgotando. Sentindo o choque após toda a surra, desmaio na sala.

E enfim escuridão.

Capítulo 1

Minha mente acordou mas não tinha forças para abrir os meus olhos. O suor salpicava na minha pele, trazendo ardência nos cortes nos meus lábios. Minha cabeça doía enquanto eu tentava abrir os meus malditos olhos.

Um som de respiração agonizante enchia o ambiente. Parecia que tinha um animal ferido na sala. Após uma batalha infinita conseguir mexer os meus braços e abrir os olhos.

Para o meu desespero, o animal ferido era eu.

A sala estava fria, percebi que já era manhã. Mas não tinha calor nos reflexos de luz que penetrava a janela. Levantei com muito esforço.

A dor irradiava todos os meus membros. Mas o latejar entre as minhas pernas era o mais assustador.

- Desgraçado.

Andei com dificuldade até visualizar o relógio. Era 6:45 da manhã, ele já havia saído para cumprir a intimação.

Ao ficar de frente para o espelho, não segurei o grito. Eu estava completamente deformada.

Tinha inchaço no meu rosto, lábios cortados, hematomas espalhados em toda a minha face. Cabelo desgranhado e aquele olhar. O olhar de culpada. A vergonha de ter permitido alguém fazer isso comigo, por tantas vezes.

Há alguns anos eu tracei um plano. Juntaria dinheiro escondido, e fugiria para um lugar distante, falsificaria uma identidade para ficar irreconhecível. Abriria uma empresa ou seria autônoma. Faria qualquer coisa para me manter. Mas ainda não tinha juntado o dinheiro. Ele nunca me dava e sempre se encarregou de fazer as compras e pagava no cartão.

Mas agora eu não tinha mais tempo, sabia que era o momento de partir. Caso a reunião dele fosse ruim eu seria o saco de pancadas.

Peguei uma mochila com documentos, alguns suprimentos e saí. Rezando para ninguém me ver. A minha alma estava tão devastada que apesar de conseguir sair daquela casa, eu não sentia esperanças.

Aquele monstro destruiu todos os meus sonhos e não tinha ninguém para me apoiar. Pior de tudo, é que ele tinha capacidade de rastrear-me para qualquer lugar que eu fosse.

(No ônibus)

Adormeci por alguns instantes. Abandonei a viagem algumas vezes, trocando de ônibus por ônibus. Tudo com a intenção de dificultar ser rastreada.

Sempre que descia nas rodoviárias, ficava atenta para me camuflar o máximo possível, olhando igual a uma paranoica se havia câmeras espalhadas.

Após horas e horas de viagem, cheguei a um interior muito distante, no estado do Texas. As minhas economias estavam se esgotando mal dava para continuar a viagem ou ao menos alimentar-me.

A cidade parecia cenário de filme de época, com aparência pitoresca. Após descer do ônibus, ainda sem decidir o que fazer com os meus míseros centavos, decidi entrar em uma cafeteria.

Sentei em uma mesa de canto, assim não chamava a atenção de ninguém. Pelo menos era o que eu achava.

- Espero que você tenha arrancado as bolas desse cafajeste.

- O quê?

Levantei o olhar, e vi a garçonete segurando uma jarra de café.

- Eu espero que você tenha dado o troco no infeliz que fez isso na sua cara.

- Eu bem que queria, mas sou covarde demais.

Ela despeja café em uma caneca. Nessa hora tento protestar, pois eu não posso gastar nem um centavo.

- É por conta da casa.

- Será que por conta da casa, você não teria algum emprego para mim.

- A coisa está difícil, assim?

- Você não faz ideia.

- Olha, aqui na cidade é difícil achar alguma coisa. Nesse período tem a molecada que está de férias e ocupa todos os cargos de meio período. Mas penso que você teria mais sorte em alguma propriedade da região.

- Tem alguém com quem eu posso falar?

- Me dá o seu telefone. que se aparecer eu te aviso.

- Não tenho mais celular.

- O endereço, então.

Pela minha expressão, ela pode notar o quanto o meu caso estava difícil. Sem telefone, sem teto e sem recurso. Ela suspirou.

- Credo! Pior do que imaginei. Vamos fazer assim, meu turno encerra daqui a 2 horas. Fica me esperando lá nos fundos da cafeteria. Que eu tento ver alguma coisa.

Nessa hora meu peito aqueceu. Uma mão ajudando, era tudo que eu precisava.

Como combinado fiz o que ela mandou. Duas horas depois a vejo saindo da porta dos fundos da cafeteria

- Vamos? Eu não tenho muito, mas posso te ajudar por umas duas noites.

Seguir minha nova amiga, Suzana. No trajeto soube que o sonho dela era ter um salão de beleza e que não conseguia se apegar com homem nenhum. O apartamento dela tinha apenas dois cômodos, mas a água quente que eu usei para tomar banho e o sofá pequeno com o cobertor cheirando a roupa recém lavada, parecia a Pousada dos Deuses.

No dia seguinte levantei cedo, mas ela me aconselhou a ficar no apartamento. Disse que o meu rosto estava muito desfigurado para andar pela cidade.

Prometeu voltar algumas horas depois do expediente.

Em reciprocidade fiz faxina no apartamento. Enquanto estava nos afazeres, percebo que Suzana retorna antes do horário.

-Mercedes você não vai acreditar. Achei um serviço para você.

-Sério?

- Pega suas coisas, ele está te esperando na cafeteria, queria te ligar, pra você ir até lá. Mas tive que vir, já que você não tem telefone.

Capítulo 2

Excitação preenchia o meu peito. Quais as chances de conseguir algo tão rápido. Um abrigo, uma amiga e um trabalho. Mas instantaneamente o que parecia felicidade transformou em frustração. Minha alma estava tão ferida que suspeitei do milagre, porque pessoas como eu não merecem coisas boas.

A angústia cresceu dentro de mim.

- Credo garota! Que cara horrível é essa? Como você vai pedir emprego desse jeito?

- Suzana, eu nem sei por onde começar. Não posso assinar carteira. Não sei fazer nada que preste e não tenho referências de nada.

- Calma mulher. Já desistiu antes de tentar? Vamos encontrar o Sr. Humberto na cafeteria. E lá ele te explica o serviço. Mas é melhor você mudar essa atitude.

- Tem razão. Desculpa. Que mal agradecida eu sou.

- Anda, deixa de ser desesperada.

Ao chegarmos na cafeteria, vou ao encontro de um senhor na faixa de seus 60 anos. Muito simpático.

- É essa a moça que eu lhe falei.

- Cruzes minha filha. Mas o que aconteceu com você?

- Bom dia, senhor. É uma longa história que precisa ficar no passado. O meu nome é Mercedes e estou precisando muito trabalhar.

- Olha minha filha, não posso deixar de tocar nesse assunto. Até porque não quero arrastar problemas para mim e nem pro meu patrão.

Nessa hora, sentir que havia perdido a chance. Quem contrataria uma desconhecida fugitiva?

- Senhor, eu não tenho pra onde ir, nem como me sustentar. Mesmo que o contrato seja por um dia eu realmente aceito. Por que não tenho mesmo de onde tirar o meu sustento.

O senhor só suspirou, incrédulo sobre isso ser um bom negócio. Mesmo sentindo pena da moça. Ele sabia que cada marca continha uma história sombria por trás. E sendo o responsável pela fazenda e o funcionário de confiança do seu patrão, ele não queria fazer besteira.

Mas um dia ou talvez dois dias de serviço poderia vir a calhar.

- Vamos fazer assim, eu te levo pra fazenda hoje. Se a Graça quiser seus serviços, aí tudo bem, mas se não, eu trago você de volta.

Graças à Deus, uma chance. Suspirei aliviada. Peguei meus pertences e agradeci a Suzana por tudo.

- Boa sorte mulher. Espero que você encontre a paz que precisa.

— Obrigada Suzana. Você não faz ideia do quanto sou grata por sua ajuda.

Peguei a carona com o Sr. Humberto e seguimos em direção a fazenda. 40 minutos de viagem entre uma propriedade e outra.

No trajeto pude ver algumas plantações e criações.

Quanto mais nos aproximávamos, mas aumentava as batidas no meu coração. Percebi que as crises de ansiedades ficavam mais frequentes depois que saí daquela casa.

A voz do Sr. Humberto despertou-me dos meus pensamentos

- Aqui é um lugar seguro minha filha. Ninguém invade as terras de ninguém sem levar um tiro nos peitos. Apesar de que nesses dias tem uns moleques aprontando nas propriedades. Se eles não tomarem cuidado vão amanhecer com formiga na boca.

- Formiga na boca?

- É quando a pessoa morre de boca aberta.

Enquanto ele ria da piada sinistra, eu ficava com os meus pensamentos a mil.

- Sr. Humberto, qual seria o meu serviço?

- Ah, minha filha. Eu vou ter um neto, sabe. Isabele, minha filha caçula, está com o buxo enorme. Sempre trabalhou com a mãe dela na casa do patrão. Mas agora que está perto de ganhar neném não pode mais trabalhar. E Graça, minha esposa, não tem mais condições para fazer tudo sozinha.

- Entendi.

- Olha, chegamos.

Nesse momento avistei uma porteira de madeira, com uma placa com escrita talhada a mão. Rancho Selene.

O lugar era lindo. Dava para ver de longe a criação de gado e caprinos. Um riacho a esquerda com belo pomar a direita.

Quando decemos do carro ele mandou esperar fora da casa. Enquanto ele entrava.

Pude observar os detalhes da casa. Casa não, Mansão. Uma verdadeira Mansão na fazenda.

Colunas de madeira maciça, detalhes entalhados nas portas e janelas. Uma varanda imponente. Porém tinha algo estranho naquela paisagem. Não conseguia dizer o que era. Mas a sensação era de que faltava algo.

Enquanto permanecia com os meus pensamentos, vejo uma senhora de cabelo no coque, vindo na minha direção.

—Você é a Mercedes?

— Sim senhora.

Ela me olhava de solsario. Desconfiada da minha procedência.

— Certo. Preciso que limpe umas suítes no primeiro andar.

— Tudo bem, senhora.

Segui até a despensa, recolhi o material de limpeza e fui ao local do trabalho. Prometi para mim mesma que aquela seria a melhor limpeza da minha vida. E assim eu fiz.

Ocasionalmente Dona Graça aparecia para conferir o serviço. Ela não falava nada e também não me fazia perguntas.

Em poucos minutos encerrei a limpeza e ela me passou outra tarefa. Ao chegar o final da tarde eu praticamente havia limpado toda a casa, lavado algumas roupas, colhido verduras da horta e ainda ajudei na preparação do jantar.

Passei o dia recebendo ordens e só abri a boca para falar: Sim senhora.

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