Me chamo Marianne Scott, tenho 18 anos, atualmente moro em São Paulo. Sou filha de Davis e Doralice Scott. Há poucos meses morava em San Francisco - EUA, mas tudo mudou tão de repente que mal consigo acreditar.
Me lembro bem como tudo começou, às vezes fecho os olhos e ainda consegui ver aquele dia, como se estivesse vivendo tudo de novo.
Era uma bela manhã, quando meu pai me acorda logo cedo, eu abro os olhos e o vejo parado na porta do meu quarto com um calibre doze nas mãos.
— Daddy (papai), ainda é muto cedo.
— Você disse, que queria ir comigo, filha, levanta vamos, estou indo para o campo de treino.
Tinha esquecido disso, realmente que queria muito ir, adorava acompanhá-lo nos campos de treinamentos, passávamos a manhã inteira treinando tiro com os lançadores, eu tinha apenas 16 anos e já atirava muito bem.
Às vezes passávamos horas no clube de tiro e isso me trouxe muito conhecimento sobre armas e munição que certamente seriam uteis no futuro, um que eu nem imaginava estar.
— Querido, não gosto quando leva Mari para esses locais.
— Não se preocupe, é seguro lá.
Meu pai era um policial aposentado, tinha sido afastado após levar um tiro na perna, mas como devem imaginar virar as costas e largar o que mais ama é muito difícil.
Após retornar do campo devido uma chuva inesperada, a porta dos fundos estava aberta, o que chamou a atenção do meu pai, pois o vento fazia com que molhasse a cozinha.
— Mari, fique atrás de mim.
Ele falou pegando sua pistola e dando passos leves e cuidadosos em direção à casa, começamos a entrar e logo vimos minha mãe caída no chão sob uma poça de sangue.
— Doralice?
— Mom?
— Fique aqui Mari,
Eu sentia um aperto no peito em ver minha mãe ali caída, aparentemente sem respirar, ele se aproximou e tocou seu pescoço e gesticulou de uma forma que já percebi que ela estava morta.
— Pegue seu celular, Mari, chame a polícia.
Ele continuou a caminhar em direção à sala, eu me virei enquanto fazia a ligação, quando um homem usando capuz apareceu, eu arregalei os olhos.
— Daddy (papai)!!!
Eu escutei um tiro certeiro que pegou na cabeça do homem, meu pai gritou para eu correr, no telefone ouvia a voz da moça da emergência, mais dois tiros seguidos, vi meu pai caindo e comecei a correr, meus batimentos cardíacos estavam acelerados.
Logo na esquina uma viatura quase me atropelou, eu mal conseguia falar quando um dos guardas desceu.
— Meu pai, alguém atirou no meu pai.
— Espere aqui, girl (moça).
Ele pegou a arma e correu para a direção que apontei, o outro pediu que ficasse no carro, quase cinco minutos depois mais duas viaturas estacionara na frente da casa.
Eu apenas estava sentada com os olhos cheios de lágrimas, coloquei as mãos no ouvido com medo do que poderia ouvir, era atormentador, saber que quem mais a gente ama poderia estar correndo algum risco, em minha mente o corpo de minha mãe e a dúvida se ela estava viva ou não.
Então pouco tempo depois ele voltou e me deu a notícia que mudaria minha vida para sempre, abriu a porta e se apoiou na porta.
— Você tem parentes, moça?
— Que aconteceu com meus pais?
— Moça, I am really sorry (eu sinto muito), mas seus pais foram assassinados, a polícia vai precisar te interrogar, por isso preciso saber se tem parentes aqui.
— Não, minha tia mora no Brasil, mas não a conheço.
Levei as mãos no meu rosto e percebi o vazio, a solidão de sentir uma dor tão grande e não ter ninguém para abraçar, para chorar.
Aquele policial, um senhor, tenente Peter me olhou, eu o abracei e chorei, fique ali por alguns minutos e logo um assistente social apareceu, vi os carros parados na porta de minha casa.
Pouco tempo depois estávamos numa casa enorme, tinham muitas crianças e adolescentes, eu estava num orfanato, uma senhora me levou até o quarto onde pude me deitar e chorar.
— Querida, vamos entrar em contato com sua tia, logo ela poderá vir te buscar ok? Pois devido a sua idade não pode ficar aqui.
— Está bem.
Durante a noite, eu ouvia as crianças chorarem, talvez pelo mesmo motivo que eu, saudades da família, dos pais, aos poucos o silêncio ia tomando conta do local, mas eu ainda sim não conseguia dormir, aquela dor era ainda maior.
Quando amanheceu, eu estava na mesma posição, sentada e com a cabeça apoiada nos braços, uma menina estava parada com os olhos fixados a mim.
— Não chora, moça.
— Há quanto tempo você está aqui?
— Eu não sei, mas as tias são legais.
Pouco tempo depois, dois policias apareceram, a assistente social me acompanhou até a delegacia onde contei como tinha acontecido, perguntava o que teria acontecido, mas ninguém me contava nada, apenas ficavam se olhando.
— Quero ver meus pais.
— Calma, Mari, eu vou te levar para fazer o reconhecimento ok?
— Quando poderei enterrar meus pais? Quem matou eles?
— Estamos investigando ainda, mas os homens que invadiu sua casa, um deles foi morto, acredito que outro fugiu.
Saímos dali para o IML onde vi meus pais pela última vez, tudo parecia um pesadelo, eu desejava fechar os olhos e acordar, mas não tudo estava da mesma forma, dona Emma foi comigo até minha casa, onde pude pegar minhas roupas e alguns objetos pessoais.
Na verdade, eu peguei muito mais do que isso, mas ela não precisava saber, entrei no quarto dos meus pais enquanto ela esperava na sala, meu tinha um cofre e uma parede falsa, peguei alguns documentos que estavam ali.
— Mari, falei com a polícia alguns objetos poderá enviar por navio ok?
— Thanks (obrigada).
Pegamos algumas caixas, levadas por um entregador, acredito eu solicitado por ela, onde coloquei fotos e os objetos que havia pegado, pois me lembro do meu pai ter comentado com minha mãe, que ninguém poderia saber.
— Falei com sua tia, ela pediu que a enviasse para o Brasil, ela vai te buscar no aeroporto.
Agora era esperar poder enterrar meus pais e partir para uma nova vida…
Em São Paulo, comunidade Iporanga, era um dia comum, onde um líder e membro da facção, após se reunir com seus parceiros, retornava para casa. Pirata como era conhecido, liderava a comunidade a quase 30 anos.
Ele era casado com Joana e juntos tinham dois filhos, Samuel (Chupim) e Lívia, o sonho de Pirata era que o filho assumisse seu lugar e contava com isso.
Samuel (Chupim) 24 anos
Lívia 22 anos
Samuel, já conhecia toda a rotina do seu pai, todo esquema e muitas vezes o ajudava nas negociações e a resolver os problemas na comunidade.
Ter nas costas a responsabilidade de ser o novo líder, lhe trazia muito benefícios, como ter todas as mulheres que desejava e ser temido por muitos.
Pirata chegava em casa perguntando do filho, já era noite e ele sabia como era perigoso se expor e por mais que avisasse não adiantava em nada.
— Puta que pariu cadê aquele moleque?
— Eu avisei centenas de vezes, Augusto, mas Samuel está deslumbrado com essa vida, vive nas festas, não sei como Beatriz ainda não se envolveu com um desses bandidos.
— Cala sua boca, mulher, já disse para não me chamar de bandido.
Não muito longe, Samuel estava com seu melhor amigo Fernando, mais conhecido por “Bocão”, estavam numa festa privada com mulheres e muita droga. Sentado e sem camisa, ele embolava um baseado, quando uma das moças se aproximava dele usando um vestido super curto.
— E aí Chupim, quando assumir a comunidade, pretende ter uma fiel? Pois espero que se lembre de mim.
— Eu com fiel, acorda piranha rsrsrs, vem aqui e faz o que sabe.
Fala ele a puxando pelos cabelos e abrindo o zíper de sua calça, Chupim jogava sua cabeça para trás, fumava seu baseado enquanto a jovem se ajoelhava e fazia um boquete.
Em casa, irritado com a falta de responsabilidade de Samuel, seu pai termina o banho, pega sua pistola e sai acompanhado de um segurança.
— Vamos atrás daquele infeliz Peixe, mas ele me paga dessa vez.
Estava tarde, o carro do pai de Chupim andava em alta velocidade pelas ruas da comunidade até que é cercado por carros da polícia, eles param engatilham suas armas e ele questiona.
— Por que os fogueteiros não avisaram sobre a invasão?
— Como vou saber chefia?
No carro a frente, um dos oficiais abre a porta com sua arma em punho, ele dá a ordem de prisão.
— Pirata, desce do carro, você está preso, por formação de quadrilha e tráfico de drogas.
— Filho da puta é aquele delegado desgraçado.
— O que a gente faz, patrão?
— Para a prisão eu não volto.
Na casa onde estava Chupim, um dos homens entra correndo e interrompe a pequena festa privativa.
— Chupim, os meganha cercaram teu velho.
— Porra, sai daí sua puta do caralho, bora resolver isso.
***Narrado por Chupim***
Ao saber que meu pai estava cercado pelos meganha, me levantei empurrando a cadela que me chupava, fechei minha calça, peguei a pistola e sai acompanhado de Bocão e mais dois homens, subimos em nossa moto e descemos a comunidade em alta velocidade.
Estamos a alguns metros, largamos as motos e descemos a pé, mandei um rádio para os demais ordenando que subissem para cercar a polícia, mas poucos segundos depois escutamos tiros.
— Caralho, Chupim.
— Corre porra, corre.
Quando avistamos o grupo eu vi meu pai caído e do outro lado estava o Peixe, começamos a atirar contra a polícia e derrubamos um a um.
— Pai! Caralho pai fica comigo porra.
Olhei para o lado e Peixe ainda respirava com dificuldade, os homens pegaram ele e colocaram no carro que saia em alta velocidade, Bocão se aproximou e alertou do perigo.
— Anda Chupim, você precisa sair daqui, porra, daqui isso estava cheio de viatura, bora caralho.
Mal tive tempo de me despedir de minha mãe, entrei no carro e seguimos até Heliópolis onde um dos membros da facção iria me proteger, fui levado até o alto da comunidade, no chão havia um alçapão, desci e apenas ouvi o barulho do trinco.
Me senti culpado pela morte de meu pai, certeza que ele estava indo me buscar, deveria estar puto, como pude ser tão principiante?
— Eu juro pai, que nunca mais vou me perder por drogas ou piranha.
Fiz um juramento com lagrimas nos olhos, jurei a mim mesmo que nunca ais iria deixar que nada desviasse do meu caminho, me levantei e senti o sangue ferver em minhas veias, eu precisava me transformar.
Não pude enterrar meu pai, tinha uma missão liderar a comunidade e descobrir o porquê dos fogueteiros não terem visto a polícia invadir.
Foram dias ali, preso, comendo coisa enlatada, água quente, mijando e cagando em latas e enterrando para poder não sentir o mau cheiro, quando a porta se abriu, a luz do sol doía em meu rosto.
— Vamos Chupim, chegou a hora de você assumir o lugar de seu pai.
Foi colocado uma escada, por onde sai, no lado de fora, cinco homens fortemente armados, um deles entregou a corrente que meu pai usava e uma pistola automática.
— Como foi o velório do meu velho?
— Como tinha que ser, agora é hora de você ser batizado e assumir o seu lugar, vamos porque os irmãos estão te esperando.
Me levaram para uma casa, onde pude tomar banho e comer decentemente, quando o grupo resolveu me levar já era noite, entramos numa chácara, onde carros estavam estacionados e alguns homens reunidos em círculo.
Era madrugada quando saímos daquele lugar, enfim pude voltar para minha comunidade onde fui recebido por fogos e tiros, na porta de casa minha mãe e minha irmã, com o rosto inchado de tanto chorar.
— Voltei mãe, agora vou cuidar de vocês.
Em San Francisco, após alguns dias após o enterro dos pais, chega o momento de Mari ir para o Brasil, naquela manhã com a ajuda da assistente ela enviou algumas caixas por navio, quando chegou a noite era hora de ir para o aeroporto e dar adeus a tudo que tanto lhe deixou triste.
Ao ver o avião decolar, ela colocou a mão no vidro, se despedindo e, ao mesmo tempo, desejando que logo as coisas voltassem ao normal, apesar dela saber falar bem o português.
Horas depois ela pousou em guarulhos, no saguão, sua tia Beatriz, uma mulher bem vestida, que a recebeu muito bem.
Minha tia Beatriz 50 anos
— Mari, que bom que chegou querida, vem aqui, eu queria dizer que sinto muito por tudo que aconteceu, mas infelizmente não tinha como ir ao enterro.
— Tudo bem, tia, tenho certeza que minha entenderia seus motivos.
As duas pegam um táxi e seguem para a casa onde Mari deveria morar dali parta frente, ao chegar no condomínio fechado, chamou a atenção da jovem o fato da tia morar num local tão luxuoso.
Na sala, um homem usando uma calça jeans, fumando um baseado, ao ver a bela jovem se levantou de imediato, irritando Beatriz.
Fred 40 anos
— Isso é jeito de receber minha sobrinha, vá colocar uma camiseta, desculpa querida, esse é Fred, meu marido.
— Satisfação princesa, foi mal aí pelos seus pais.
— Tia, será que posso ir para o quarto, estou um pouco cansada, please (por favor).
— Claro querida, vamos, você só trouxe essa mala?
Assim que entraram no quarto, Mari olhou os móveis e a decoração eram muito mais confortáveis que na casa onde morava, o que chamou a atenção de Mari pela tia informar sobre as condições de viajar, principalmente ao enterro da única irmã.
— Olha Mari, eu sinto muito pelo que aconteceu, porem com você aqui os gastos aumentam, então preciso saber sobre a conta de seus pais, se for o caso consultar um advogado para que eu possa administrar o dinheiro.
— Don't worry (não se preocupe), tia, eu ainda não sei quando dinheiro tinha, a gente levava uma vida simples, depois que meu pai se feriu.
Beatriz não gostou muito, mas naquele momento não quis discutir com a jovem que havia acabado de chegar e ainda por cima perdido os pais. Após deixar Mari no quarto, ela desce e comenta sobre a tentativa frustrada de administrar o dinheiro da sobrinha.
— Acredita que aquela garota teve coragem de dizer que os pais não têm dinheiro?
— E agora genia, vai colocar ela para fora? Caso contrário, ela pode nos prejudicar.
— Não se preocupe, logo nos livramos dela, só preciso ter acesso às contas e verificar o que mais ele sabia, desgraçado.
No quarto, Mari, que apesar da idade não era nada boba, esperou a tia sair e do corredor escutou parte da conversa dela com o marido, depois retornou e pensou com ela mesma numa forma de sair dali.
— Preciso dar um jeito de me cuidar sozinha, pelo visto aqui não é um bom lugar para eu ficar.
Depois ela trancou o quarto e foi para o banho, teria exatamente quase um mês para isso, até que suas coisas chegassem de navio, certamente sua tia iria querer saber o que tinha nelas.
Era noite quando Mari despertou, ela desceu e não tinha ninguém em casa, na cozinha uma senhora que se assustou ao vê-la.
— Sorry (desculpe) senhora, eu só queria tomar algo, estou com fome. Sou a Marianne, mas pode me chamar de Mari.
— Você deve ser a sobrinha que mora no estrangeiro. Sou Lúcia, prazer.
— Yes, mas não devo ficar por muito tempo, só preciso arrumar um trabalho e um lugar para ficar.
— Aqui as coisas são bem difíceis, menina, eu mesma tenho hora para entrar e sair, ou me colocam para fora.
— Aonde a senhora mora?
— Não vai querer morar onde eu moro, é uma comunidade, dominada por bandidos.
Mari, pega um suco servido por Lúcia e um sanduíche de presunto e queijo, enquanto come ela comenta sobre a morte dos pais, deixando Lúcia comovida.
— Sinto muito querida, realmente não deve ter sido fácil.
— Pois é, eu não sei se deveria, mas não me sinto confortável aqui e olha que cheguei tem menos de um dia rsrsrs.
— Sabe onde minha tia e o marido foram?
— Não, mas estou indo embora também, não posso chegar tarde em casa e se voltarem e estiver aqui dona Beatriz faz um escândalo.
— Eu posso ir com a senhora? Não quero ficar aqui sozinha, prometo não incomodar.
Lúcia de alguma forma se identifica com o jeito de Mari, como morava sozinha achou até bom ter uma companhia, mas se preocupou o que a tia poderia pensar, então sugeriu que ela não comentasse que teria ido para uma comunidade.
— Não se preocupe, vou deixar um bilhete dizendo que fui visitar uma amiga e dormi lá rsrsrs.
Mari, pega duas trocas de roupa já que seria final de semana, queria conhecer a comunidade e quem sabe encontrar um local para ficar, mas o final de semana prometia muito mais do que ela imaginava.
Elas saem logo para não correr o risco de Beatriz retornar, chegam já a noite na comunidade e ao entrar Mari observa os homens armados logo na entrada e se segura no braço da senhora que mal conhecia, mas que lhe trazia confiança.
— E aí Dona Lúcia, quem é a princesa com a senhora?
— Minha sobrinha, espero não ser um problema.
— Que isso, leva ela no baile amanhã rsrsrs.
Elas sobem a rua da comunidade, com Mari observando tudo, alguns rapazes descem de moto sem capacete e em alta velocidade, elas chegam numa casa muito simples que Beatriz abre o portão e a convida para entrar.
— Venha Mari, só não repare, a casa é bem simples.
— I liked (eu gostei), será que eu não consigo algo assim para mim aqui?
— Filha, aqui não funciona assim, primeiro terá que pedir permissão para o líder da comunidade. Você é muito nova, não tem medo de morar sozinha?
— Eu peço, além disso, não tenho medo, preciso dar um jeito de me virar, acho que o dinheiro na conta dos meus pais dá para pagar e vou conseguir um trabalho também.
— A gente vê isso depois, como o bocão mesmo disse, amanhã tem baile, então esquece esse tipo de coisa agora.
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