...O que é biologicamente impossível? No lugar certo e na hora certa, coisas extraordinárias acontecem!...
Por Aspen
Esse povo viveu, adaptou-se durante muito tempo. Algumas coisas tornaram-se completamente difíceis para eles e sobreviver acabou sendo uma questão de sorte.
Naid e Noah estão na Enseada Lunar, pelo menos é assim que a chamam. É como um buraco no meio do oceano. Tem o formato circular, as águas caem sobre ela como uma cachoeira ao redor de um desfiladeiro. No centro, há uma lagoa de pouca água, onde, ao olhar para cima, se vê somente o céu.
Naquele lugar não há ninguém mais, nenhum animal devido à temperatura, a escassez de comida e pelo difícil acesso, nenhum outro ser ou animal consegue chegar lá e sobreviver. Eles só conseguem devido a sua agilidade e mesmo assim não com frequência.
Noah está pronto, não sai do lado de Naid, que se mantém preparada para mudar. Enquanto a lua aparece sobre o círculo do desfiladeiro.
Ele é o macho, tem a aparência animalesca assim como os demais da espécie. A pele é acinzentada, quase azulada e grossa para suportar baixas temperaturas. Tem membranas nas barbatanas e nas mãos, ligando os dedos. A sua cauda não tem discrepância de coloração com o torso, é interligada. E embora a aparência grotesca, é belíssima.
Naid é a fêmea, possui um torso como de uma mulher humana, porém muito mais branca e os seus cabelos longos e escuros. Embora seja similar a uma humana e facilmente confundida com uma, é extremamente atraente de uma forma não natural. Sua pele, diferente do Noah, é lisa e suave, as suas membranas entre os dedos são mais sutis, por causa das fêmeas habitarem lugares tropicais em enseadas na superfície, diferente dos parceiros.
Eles vivem separados e possuem propósitos diferentes, por isso se encontram apenas em algumas ocasiões.
Chegou a hora, a lua está alinhada e, pela primeira vez em um ano, eles têm a oportunidade de acasalar.
Noah começa a se contorcer, aparenta ter dores, a cauda começa a incomodar.
As suas barbatanas se contraem e se dividem em duas. Só naquela noite, dentro de um ano, isso é possível, na época do acasalamento o macho começa a trocar de escamas no período lunar, conseguindo assim se unir à fêmea.
Naid também começa a mudar, porém, de forma diferente, a fêmea consegue se transformar a qualquer momento, desde que não seja com frequência. A cauda é composta por uma camada fina de pele escamosa, que sobrepõe a duas nadadeiras similares a duas pernas. A cada dia elas trocam de pele e escamas. Devido à troca da cauda a parte interna fica a mostra até a substituição da pele, na época de reprodução esse ciclo é prolongado, dando tempo suficiente para o acasalamento.
Eu vejo os minutos se passarem e a lua se mover, logo ela já não ilumina mais a enseada, deixando tudo completamente escuro.
Após o astro já não iluminar aquela região, Noah começa a mudar novamente, sendo impressionante como a luz lunar afeta todas as criaturas e animais, de maneiras distintas.
Ele é rápido, nada em círculos ao redor de Naid, de maneira tão ligeira que só posso visualizar a maré se agitando ao redor, as cachoeiras em volta serem afetadas. As águas que despencam, começam a pesar sobre a enseada, esse impulso gerado os ergue de volta à superfície.
Os machos são treinados desde cedo para caçar, lutar e se exercitar. Possuem um dom incrível para se mover em alta velocidade, tão velozes que a água ao redor deles são afetadas, dando-lhes a capacidade de manipular a água por onde passam. Às vezes, movem as mãos em círculos tão rápidos que geram um leve movimento na água ao redor das mãos, como uma onda circular, com coloração transparente que se assemelha a uma água-viva.
Após isso, ambos nadam de volta, Noah já não poderia mais acompanhar a Naid, pois vivem separados devido aos propósitos designados.
Seus corpos nem sequer aguentariam a pressão da água, a temperatura, e o alimento que os dividem em que estão acostumados.
Quando o sol começou a nascer, Noah volta às profundezas onde vive. No caminho de volta imagina a Naid em sua lagoa e reflete sobre as diferenças entre eles.
As fêmeas vivem em grupo na superfície, apenas com a cauda submersa, normalmente habitam em lagoas de água salgada, com conexão ao mar, essas lagoas são raras e normalmente ficam em ilhas, bem no centro delas.
Onde Naid vive é uma ilha isolada, ninguém sabe ao certo onde fica e nem qual ilha é exatamente, por isso evitam sair da ilha e de suas redondezas.
Por Naid
Eu temo pelo futuro dessa pequena, vivemos em um povo onde temos que viver escondidos, repletos de tradições e com propósitos a serem seguidos.
Logo de manhã, nado até a lagoa, estou sozinha, apenas Aspen está aqui. Mas ele sempre está, afinal é o dever dele. Não sei ao certo o que ele é, mas às vezes um desses espíritos aparecem e acompanham alguma de nós. As mais antigas diziam ser espíritos que simbolizam sorte, e por sermos seres espirituais conseguimos vê-los.
Aspen flutua levemente ao meu lado o tempo todo, raramente interferindo no que acontece no nosso mundo, e na minha vida. Somente eu consigo o ver.
Ele me acompanha desde que fui designada ao meu propósito. Se apresentou como um NATSU, disse-me vir de outro mundo, que tem o dever de acompanhar-me e guiar-me enquanto eu precisar, disse que possui grandes poderes e sabe sobre o meu futuro, porém ele raramente me diz nada, e quando fala algo não é concreto e nem muito longo, diz que o futuro é incerto e frágil, que mesmo com o seu dom de modelar o destino só pode interferir em último caso e com muita cautela.
Os seus cabelos são translúcidos como uma água viva, os seus olhos azuis como as águas do oceano e a sua pele branca como as areias dessa ilha que brilha à medida que o sol ilumina. Sim, ele faz jus ao que é. Um espírito de luz.
A princípio duvidei das suas intenções, pois me seguia e se vangloriava dos seus dons, até que o enfrentei, foi quando ele me disse tudo.
Disse que o seu nome verdadeiro é um segredo a ser guardado, pois, é uma das suas únicas fraquezas, o que a liga ao seu mundo, impossível ele morrer, e que os seus dons são maiores que de qualquer ser do meu mundo, exceto somente de um.
Perguntei-lhe se ele era um anjo, pois já ouvi histórias de protetores alados que protegiam os antigos terrestres. Foi quando me respondeu:
— Não, eu sou um espírito, mas não Divino.
Perguntei se era um espírito maligno. Ele respondeu-me:
— Não, eu não sou dessa categoria de espírito, a minha existência nesse mundo se resume a você, a proteger-te e moldar o seu destino. Possuo falhas, defeitos como os antigos terrestres, sou espiritual como o seu povo, porém os meus dons se sobressaem ao de ambos. — Assim que o meu dever aqui acabar, voltarei ao meu mundo e receberei uma vida nova. E não, não faço ideia de qual vai ser. Diferente dos espíritos dos mortos, eu vivo, e diferente dos espíritos divinos e malignos eu sou livre, para fazer escolhas. Eu posso materializar-me no seu mundo, posso interferir, porém, só em último caso.
Se me desviar do meu dever, eu sou levado de volta.
Após isso, fico atónita. Logo veio-me as antigas histórias do meu povo, sobre os NATSU’S, do quanto são raros, como só aparecem para alguns, dos preciosos encantos que teria quem o “possuísse” e do grandioso destino que aguarda quem eles acompanham.
— NATSU? É, posso me acostumar com esse termo!
Que? Ele ouve meus pensamentos?
— Não fique com medo, Naid, sou incapaz de lhe causar mal, estou aqui para lhe proteger.
Finalmente entendi tudo. sinto-me calma... plena... não consigo vê-lo como mal, pelo menos não mais. A sua aura é tão boa!
Aspen acompanha-me desde aquele dia, sinto como se ele fosse uma parte minha, que protege-me e guia-me.
Fico na lagoa um tempo e acho estranho as outras não terem aparecido...
Aspen diminui a altura e flutua um pouco mais baixo que o normal.
— O que foi Aspen?
— Você há de carregar consigo uma pequena, sinto a presença energética dela, forte como uma onda.
— Mas o cruzamento só tem alguns dias!
— A energia surge antes mesmo da formação. Vejo um futuro turbulento para sua pequena.
Suas palavras atingem-me como uma rajada de calor ardente.
Por Noah
Não posso pensar, nem questionar, não posso resistir e muito menos ir contra o meu propósito. Todos temos funções e seguimos fielmente para não sermos penalizados. Naid é a fêmea que me foi concedida, não pude escolher, não posso trocar. Porém, nós entendemos, temos dores semelhantes, o fato de não escolhermos o nosso destino e de vivermos a carregar um fardo crescente nos aproxima.
Uso a minha agilidade. O meu dom, em que treino desde pequeno, para transitar entre as colônias. Como é o meu grupo que realiza a caça de alimentos, devo transportar comida pelas colônias, vou levar para Naid e as outras, alimentos para ajudar na gestação. Normalmente elas comem alimentos da sua região, porém no seu período gestacional elas necessitam de comidas mais nutridas como carne de foca e lontras.
Na metade do caminho, observo a diferença entre as nossas colônias divididas por dois elementos: profundidade e temperatura, também sinto a diferença no ambiente a medida que vou a subir a superfície. A ilha onde a Naid e sua colônia vive é linda, as águas que a circulam são cristalinas, são cobertas por uma neblina que surge sobre a superfície da maré, dando a sensação de se estar a nadar em nuvens.
Ela é isolada, o local mais próximo daqui é a 3 meses.
Os ciclos são como nós medimos o tempo. Um ciclo é um ano, nós o medimos devido às baleias.
Quando as baleias migram, se completou um ano desde o último ciclo migratório.
A ilha é linda, tem um formato oval. A colônia das fêmeas fica no centro, onde possui uma lagoa de água-marinha onde cumpre o seu propósito. Essa lagoa é redonda e grande, à sua volta existem rochas que definem o seu formato. A água da lagoa é morna devido a sua temperatura, e o único meio de entrada e saída é um buraco que liga o oceano ao fundo da lagoa.
Esse buraco é estreito, na medida que eu nado através dele consigo sair das profundezas e nadar até a lagoa da Naid na superfície. Ele é repleto de obstáculos, rochas, curvas e outros inconvenientes que acabam por dificultar a locomoção, porém eu passo facilmente com a minha agilidade. Por já conhecer o caminho, não arrisco encontrar nenhuma surpresa. Meu corpo é adaptado a profundidade, pressão e temperatura, elementos que impedem as fêmeas e outros animais de prosseguirem por muito mais fundo.
Faço o caminho até a lagoa, levo comigo a caça de hoje: carne de foca. Para minha sorte, a foca estava sozinha em um recife de corais, fácil de capturar.
Estava escuro, mais do que estou acostumado devido a passagem que levava para lagoa, enfrento algumas curvas e desvio de algumas rochas no caminho. E enfim chego até meu destino.
Vejo Naid boiando na lagoa, ela conversa com alguém, mas não consigo ver quem é, também não consigo ouvir o que ela diz.
— Com quem estava falando? — pergunto.
— Ninguém, estava apenas pensando alto
Em seguida ela corre até os meus braços, sabe que não posso ficar muito tempo na superfície, caso contrário posso morrer, por isso entrelaça os seus braços sobre mim e mergulha, me levando junto até mais fundo.
Sinto a energia que a ronda, é uma energia forte, deduzo que ela está... Como se diz?...
— Você está...
— Sim, acredito que vai ser uma pequena
— E o que te faz acreditar nisso?
— Intuição!
Em seguida sinto meu ar diminuindo, sou tomado por uma onda quente que não estou acostumado, ela entende e me dá um sinal para que eu vá como todas as outras vezes.
Vou embora a deixando, no caminho de volta aproveito para pensar a respeito da pequena.
Como ela será? Qual será seu propósito? E qual será seu destino?
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