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Você É Meu Amor

Prólogo

...Benjamin...

7 meses atrás

Estava em uma sexta-feira típica, acordei cedo, eram seis da manhã e já estava indo para o trabalho. Eu trabalho em um restaurante na cozinha, mas não é nada glamoroso, não sou nenhum chef, só lavo pratos. Sou um tanto reservado, então sempre chego e limpo tudo na cozinha, porque gosto que tudo esteja bem limpo. A senhora que é responsável pela limpeza não aguenta mais o trabalho pesado, então sempre chego antes. Só quando estamos nós dois, tiro o grosso, porque ela precisa muito do emprego. Ela sustenta os cinco netos sozinha.

— Obrigado Benjamin, você é um anjo — ela falou sorrindo para mim quando viu que eu já tinha terminado.

— Não precisa agradecer, Helena. Deixa eu ir antes que me vejam — falei entregando as coisas para ela.

— Eu tenho que agradecer sim, e como está a sua irmãzinha? — ela perguntou e ficou meio triste quando lembrei dela.

— A Bia já tem vinte anos, e não sei nada depois que ela engravidou da Lala. Eu nunca mais a vi, ela se mudou e não me manda notícias. Fico preocupado com ela no alemão — falei para ela.

— E a Alexandra, filho? — ela perguntou, mas eu não gosto nem de ouvir o nome dela, principalmente depois do que ela fez com o nosso bebê. — Tem notícias dela? — ela me perguntou. Sou muito reservado, quase ninguém sabe da minha vida, com exceção da Helena e da minha vizinha, que é como uma avó, já que ela me conhece desde menino e ajudou muito a minha mãe a nos criar.

— Não tenho notícias dela, faz mais de um ano que ela simplesmente sumiu, e não quero vê-la — falei colocando o meu avental.

— Então vamos falar de coisas boas. Como anda a sua universidade? — ela perguntou.

— Está indo bem, eu amo o que faço. Hoje vou até em uma palestra da engenharia Taylor Moreira Garcia. Ela é tipo um gênio, é o Albert Einstein da engenharia. Ela é incrível, nem acredito que vou conseguir ir em uma palestra dela — falei meio empolgado. É muito difícil conseguir ir para qualquer evento dela, e tive muita sorte da minha professora me dar o ingresso.

— Que bom, filho. Deixa eu ir trabalhar, e muito obrigada mesmo, Benjamin — ela falou e saiu com o carrinho da limpeza.

Meu dia de trabalho foi normal. Hoje estou tão animado, eu queria mesmo era ter a oportunidade de mostrar o meu projeto para ela, mas isso é impossível.

Fui para casa, bom, não é minha casa. Eu alugo um quartinho no fundo da casa da Dona Lindalva, que é como uma avó para mim. Como ela nunca teve filhos, bom, pelo menos não que eu saiba, ela não gosta de falar do passado dela. Mas ela sempre ajudou a minha mãe a cuidar de mim e da minha irmã. Quando a minha mãe morreu, eu tinha 18 anos e minha irmã tinha 15 anos. Dona Lindalva nos deixou morar lá sem pagar aluguel, e até hoje ela não aceita o meu dinheiro. Ela diz que tenho que investir nos meus estudos, e agradeço, já que a minha bolsa é de 70% e ainda pago 480,00 reais. Para alguém que recebe um salário, tirar esse valor é muito dinheiro.

— Boa tarde, Ben. Você poderia me ajudar? — ela me pediu, e corre até ela. Dona Linda tem um quiosque na universidade, e eu sempre a ajudo lá.

— Prontinho, Dona Linda — falei, depositando um beijo na testa dela depois de ter colocado as coisas no carro do seu José, que a ajuda a ir para a universidade.

Entrei em casa e fui direto tomar um banho. Quando saí do banheiro, ligaram para mim. Não conhecia o número, mas atendi, pensando que era alguma coisa com a Lindalva.

Ligação on

— Olá — falei assim que atendi.

— Senhor Benjamin de Jesus Cruz? — a pessoa do outro lado da linha falou.

— Sim, sou eu. Com quem estou falando? — perguntei, pois já estou achando tudo muito estranho.

— Meu nome é Maria Fernanda, sou assistente social. O senhor é irmão da Bianca de Jesus Cruz? — ela perguntou, e meu coração apertou. Faz tantos anos que não tenho notícias dela.

— Sou sim, aconteceu alguma coisa com a minha irmã? — perguntei preocupado. Será que ela se meteu com drogas ou algo do tipo? Porque, se é assistente social, é sobre a minha sobrinha.

— O senhor poderia vir até o orfanato Paz e Bem? — ela falou, e anotei o endereço.

Ligação off.

Fui o mais rápido possível, o orfanato era um pouco distante. Tive que pegar dois ônibus e uma van. Cheguei no orfanato e me pediram para esperar sem nem saber porque estou aqui. Os minutos pareciam eternos até me chamarem para uma sala.

— Boa tarde, eu sou a Maria Fernanda — falou ela me convidando a sentar.

— Por que me chamou aqui? O que aconteceu com a minha irmã? — perguntei nervoso, sem entender o motivo da convocação.

— Por favor, sente-se, vou te contar — ela falou e só então me sentei.

"Por favor, este suspense está me matando", falei ansioso. Sinto que tem algo muito errado nesta história toda.

"A Bianca e o seu cunhado, o Jonathan, foram baleados ontem à noite. De acordo com o que chegou até mim, o Jonathan está devendo um dinheiro muito grande ao chefe da comunidade. Ele morreu na hora, mas a Bianca chegou com vida ao hospital. No entanto, não resistiu. Ela levou 8 tiros e antes de falecer, pediu para uma enfermeira escrever isso para você", ela falou e as palavras não faziam sentido para mim.

Como assim? Ela morreu? Como ela morreu desta maneira? Fiquei olhando para o envelope na mão dela, mas não conseguia pegá-lo. A dor era insuportável. Ela não, ela também não.

Sem nem perceber, lágrimas já escorriam pelo meu rosto. Sentia como se estivesse caindo em um precipício. Ela colocou o envelope na mesa e saiu. Fiquei ali, encarando-o, até encontrar coragem para enfrentar a realidade.

Carta

"Oi Ben, eu queria te pedir perdão. Eu deveria ter te ouvido, mas não ouvi, e sei que não vou poder te ver de novo. Daria tudo para ter cinco anos de novo e só poder brincar com você. Você sempre cuidou de mim.

Só queria segurar a sua mão porque estou com muito medo.

Você lembra quando fazíamos castelos de areia só para depois vermos as ondas os levarem? Mas tudo mudou e eu segui um caminho que não tenho orgulho. Quando a mamãe morreu, você sempre cuidou de mim. Isso não é sua culpa, mas também não é dos meus filhos.

Sei que vou morrer, Ben. A dor é insuportável. A única pessoa em quem confio para cuidar dos meus filhos é você. Você sempre foi muito bom, doce e amoroso, e eles precisam de amor, um amor que eu mesma não consegui dar. Me desculpa por estar pedindo isso a você, mas não os afasta, eles são pequenos e provavelmente vão me esquecer, mas precisam de um pai de verdade.

Me perdoa por não conseguir cumprir minha promessa, me perdoa por não ser forte.

Ben, por favor, diga a eles que eu os amo. Ensina-os como você me ensinou a falar com a mamãe. Eu te amo."

Abracei a carta com força e apenas deixei as lágrimas escorrerem. Primeiro a mamãe, agora ela. O que fiz de tão ruim para o universo me castigar assim?

Não sei quanto tempo fiquei naquela sala chorando. Escutei a porta se abrir e a assistente social entrou.

— Eu sei que é um momento difícil para você, mas temos que falar da situação dos menores. Falei com a avó paterna mais cedo e ela disse que já cuida de quatro netos e se for ficar, só quer o menino...

— Não, a Bia queria que eu ficasse com eles, e eu vou ficar. Eles são minha única família — falei, limpando o meu rosto.

— É uma responsabilidade muito grande. Você é novo, a Larissa tem dois anos e o Gael não tem nem dois meses...

— Não vou dizer que sei o que fazer, porque eu não sei. Mas não sou de desistir. E por favor, não tire a única família que tenho. Não vou suportar mais essa perda. Eu faço qualquer coisa, mas por favor não faça isso. Eles são pequenos e precisam saber que são amados. Eles precisam de mim e eu preciso deles — falei, entre lágrimas. — Deixa eu vê-los — pedi, com um olhar suplicante.

— Se acalme, que eu te levo até eles. A Larissa não parou de chorar desde que chegou aqui — ela falou, o que não ajudou em nada.

— Ela deixou escrito que queria que você cuidasse deles? — ela me perguntou, e entreguei a carta para ela.

Tentei me controlar. Eu preciso fazer isso, só por eles. Ela ficou olhando a carta por um tempo, lendo.

— Vou te levar até eles — ela falou e me levou até o parquinho onde tinham várias crianças brincando. Logo no cantinho, vi a minha loirinha chorando. Já tem quase um ano que não a vejo, e como ela está linda, grande. Para minha surpresa, ela olhou para mim e veio correndo.

— Benben! — ela gritou, em lágrimas, me pedindo colo. A peguei no mesmo instante.

— Oi, minha princesa linda — falei, abraçando-a apertado e me controlando para não chorar.

— Eu estou com medo, eu quero a minha mãezinha — ela falou, me abraçando com força.

— O Benben está com você, não precisa ter medo, tá bom? — falei para ela, balançando-a de um lado para o outro. Ela deitou a cabeça no meu pescoço, me abraçando.

Não sei como vou fazer agora, mas não vou te desapontar, Bia. Eu vou cuidar deles da melhor forma possível.

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^^^Continua...^^^

Capítulo 1

...Benjamin...

Passei a noite toda estudando hoje, tem prova e não tive muito tempo durante o dia além de trabalhar. Ontem o Gael estava com febre por causa dos seus primeiros dentinhos. Já faz seis meses que sou responsável pelos dois, e sinceramente, eles são meu tudo. Mas não vou mentir que as coisas estão maravilhosas. Na verdade, as coisas estão cada vez piores na questão financeira. Meu salário não está dando para quase nada, e não consegui vaga na creche para o Gael. Por conta disso, ele passa o dia com a Lindalva, que cuida dos dois sempre que eu preciso. Ela é um anjo na minha vida, sem ela eu não conseguiria.

— Papai — saí dos meus pensamentos com a Larissa me chamando. Depois que a coloquei na creche, ela começou a me chamar assim. No começo, eu tentei convencê-la do contrário, mas não teve jeito. Ela só me chama assim, e agora até gosto, afinal, é isso que eu sou: o pai deles.

— Oi princesa — falei pegando ela no colo.

— Hoje tem creche, papai? — ela perguntou.

— Tem sim, vamos tomar um banho, eu não posso me atrasar para o trabalho — falei para ela e a levei para o banheiro.

Dei banho nela, coloquei a fralda e depois uma roupinha, e penteei o cabelo dela. Não fiz nenhum penteado, porque não sei, sou péssimo com essas coisas. Notei que as roupas estão ficando apertadas, as crianças crescem muito rápido, nunca vi.

— Papai, você vai para a escola hoje? — ela perguntou, querendo saber se vou para a universidade.

— Sim, minha princesa, eu vou. Tenho que me formar para conseguir um trabalho melhor e dar um futuro melhor para vocês dois. Então, não me espere hoje, combinado? Você vai obedecer a vovó Lindinha — falei, pois é assim que ela chamava a dona Lindalva.

— Combinado — dei a mamadeira para ela. Sei que ela já tem quase três anos e já deveria ter tirado as fraldas, a mamadeira e o bico, mas tenho pena de vê-la chorando, então acabo cedendo. Peguei o Gael ainda dormindo e dei a mamadeira para ele antes de sair, sem tomar café, porque já estava tarde.

— Ele dormiu bem? — a Lindalva falou, pegando-o do meu colo.

— Não muito, os dentinhos estão nascendo, mas qualquer coisa você me liga que dou um jeitinho. Tenho prova, então não vou conseguir voltar antes...

— Tudo bem, filho. A Mariana vai me ajudar na creche e o Manoel também. E você tem que estudar, vai dar tudo certo — ela falou sorrindo, e não sei o que seria da minha vida sem ela.

— Obrigado — peguei a Larissa no colo, ajeitei a bolsa dela e a minha mochila, e saí o mais rápido possível. Deixei minha filha na creche.

Corre ainda esta semana eu tive que escolher: ou comprava o leite ou as passagens de ônibus. Bom, não fica difícil saber o que eu escolhi, o leite do Gael é muito caro. Quando a Bia morreu, ele só tinha um mês de vida, e por conta disso ele ainda toma a fórmula, já que ele aceita muito os alimentos.

Mas fico muito preocupado porque se me atraso, eu não consigo ajudar a Helena, e ela também sempre me ajuda com as crianças, principalmente quando eu não sei o que fazer.

Cheguei no restaurante e já fui direto colocando o avental. Já são 6:48, e o horário de bater o ponto é às 7. Comecei a limpar o mais rápido possível para, quando a Helena chegasse, não tivesse tanta coisa.

— Bom dia, Ben. Você, como sempre, sendo um anjo. Eu trouxe o café, você comeu hoje? — ela perguntou, mas já sabe a resposta.

— Obrigado, Helena — falei, me encostando e pegando um pouco de café e um sanduíche que ela trouxe.

— Suas olheiras estão piores, não dormiu de novo? — ela perguntou.

— Semana de prova e os dentinhos do Gael estão nascendo, aí ele está enjoado — falei comendo.

— Você é um paizão, mas filho e o coração...

— Está bem, batendo constantemente — falei, e ela revirou os olhos.

— Você sabe do que eu estou falando. E você não está com ninguém depois da Alexandra...

— Eu não tenho tempo para nada disso, Helena. Eu tenho dois filhos, que são basicamente dois bebês, e a universidade. Uma namorada agora só iria piorar minha situação...

— O que iria me ajudar era se o meu dia tivesse 48 horas, para eu conseguir dormir pelo menos umas 6 horas por dia e ficar mais tempo com eles — falei para ela, respirando, e terminei de comer.

— Aí, filho, eu queria poder te ajudar mais do que só com um café, mas...

— Não tem problema nenhum, Helena. Eles são minha responsabilidade. Já basta que eu alugo a dona Lindalva e nem posso pagar nada para ela...

— A Lindalva tem você como se fosse filho dela, ela jamais ia receber por ficar um pouco com os netos, enquanto o pai está lutando muito para sustentá-los — ela falou sorrindo. "Deixa eu ir começar, antes que a dona Silvania chegue mandando em tudo com aquele estresse de sempre", ela falou, e não tive como não revirar os olhos. Ela vive de mau humor, imagina se ela tivesse que lidar com o que muitos de nós passamos.

Comecei o meu trabalho e minhas mãos já estão doendo. Hoje é quinta-feira e não vejo a hora de chegar sábado para poder passar um dia com meus pequenos e relaxar um pouquinho. Dona Lindalva vai para um passeio aproveitando o feriado de segunda-feira, e estou precisando desse tempo para começar um trabalho da universidade.

— Benjamim - escutei alguém me chamando e quando olhei para trás vi seu Geremias, o gerente do restaurante.

— Sim, senhor  — falei, limpando as mãos.

— A senhora Silvania quer falar com você — ele falou, e já estou com medo do que está por vir.

Ela está com raiva de mim por ter faltado ao trabalho na semana passada, mas eu precisava cuidar do Gael, ele estava com febre e tive que ficar com ele no hospital. O Gael tem otite frequente, e é uma coisa horrível, o coitadinho sofre tanto. Estamos na fila para fazer a cirurgia, mas ele só pode fazer quando tiver pelo menos um ano, e por causa disso acabo faltando no trabalho.

Fui até o escritório da dona Silvania e bati na porta antes de abrir.

- Com licença, a senhora me chamou, dona Silvania? - Perguntei a ela.

- Sim, entre - ela falou. - Não gosto de rodeios, sei que você é um bom funcionário, trabalho aqui há quatro anos e sei que agora as coisas estão difíceis para você. Você tem dois filhos, mas você sabe que não suporto que tragam problemas pessoais para o trabalho. Você já falou que seu filho tem problemas e precisa fazer uma cirurgia, mas do jeito que as coisas estão não está dando certo...

- Por favor, senhora, eu preciso desse trabalho. Por favor, eu sempre dou um jeito de pagar minhas faltas, mas eu tenho dois filhos e sou pai solteiro...

- Sua vida particular não me diz respeito...

- Por favor, me dê mais uma oportunidade, por favor, senhora. Eu faço hora extra, mas não posso perder este emprego - nunca fui de me humilhar por nada, mas como vou comprar os remédios do Gael, o leite deles, as fraldas... Se fosse só por mim, eu não faria isso, mas eles precisam de mim.

- Só porque estou de bom humor hoje, vamos fazer assim: vai ter um evento na Toytoy's no sábado. É uma festa de Dia das Crianças, e você vai ser um dos garçons...

- Este sábado, agora? - perguntei a ela.

- Sim, e vou deixar claro: se você não for, não precisa mais voltar para trabalhar - ela falou e mandou eu sair. Voltei para a cozinha e continuei o meu trabalho.

Não sei como vou fazer. Se eu não for, vou perder o emprego, mas com quem vou deixar as crianças se a Lindalva não vai estar aqui no sábado? E não posso pedir para ela ficar, porque ela não sai para se divertir desde que eles chegaram à minha casa. Não sei o que fazer.

- Ben - Helena falou se aproximando de mim - Não me diga que ela te demitiu? Aquela mulher não tem coração - ela falou pegando um pano para enxugar os pratos.

- Ela ainda não me demitiu, mas se eu não for para um evento na Toytoy's trabalhar como garçom, ela vai demitir. Só que não tenho com quem deixar as crianças - falei pensativo.

- Não diga que fica com eles porque eu também tenho que ir. Ela quer que eu vá, todo ano fico responsável pela organização da cozinha. O bom é que o dono é uma boa pessoa e sempre levo meus netos, sem a Silvania saber, é claro. Eles amam e sempre ganham presente. O senhor Garcia nunca reclamou, ele sempre fala que a festa é para as crianças...

- Seus netos são grandes e brincam tranquilamente. Os meus são praticamente dois bebês, se a Silvania descobrir, ela me colocará na rua. Não sei nem o que fazer - falei para ela.

Fiquei um tempo em silêncio pensando no que fazer. Quando deu quatro horas, já tinha terminado tudo. Tomei um banho e me arrumei para ir para a universidade. Fui andando, já que a universidade fica longe. Quando ia de ônibus, tinha que pegar dois, mas não reclamo, pelo menos faço exercícios.

Cheguei na universidade às seis horas e fui para a praça de alimentação. Fui direto para a lanchonete da dona Lindalva, sorrindo quando vi meu bebê no colo do Manoel. Ele ajuda a Lindalva na lanchonete e mora perto de lá. Ele tem 16 anos e a irmã tem 18, e eles ajudam muito a dona Lindalva. O pai deles, o senhor José, sempre ajuda levando e buscando.

- Olha quem chegou, Gael - o Manoel falou, e o bebê esticou os bracinhos gordinhos para mim.

- Oi, meu amor, como você está? - Perguntei a ele.

- Ele está enjoadinho, mas não teve nada. Eu já vou para casa, a Lala está com a Mari... - a Lindalva falou.

- Ele parece melhor! E que brinquedinho é esse? - perguntei, notando que ele estava colocando um carrinho amarelo na boca.

- Foi uma moça, ela disse que ia ajudar com a dor dos dentinhos nascendo, e depois que ele começou a morder, ele parou de chorar - a Lindalva falou sorrindo.

- E quem é essa moça? - perguntei a ela.

- Não sei o nome dela. Ela sempre chega aqui umas 4 horas e fica fazendo alguma coisa no notebook. Ela é muito reservada. Desta vez, ela viu que eu estava sozinha e perguntou se podia pegar ele. E você sabe que ele não vai para qualquer um, mas ficou se jogando nos braços dela...

- Não gosto que estranhos fiquem com ele - era para ser um pensamento, mas acabei falando.

- Ela ficou com ele na minha frente. Ela só queria ajudar. Se ela aparecer de novo, eu pergunto o nome dela. É que ela é muito reservada, sempre chega aqui umas 4 horas e fica fazendo alguma coisa no notebook - ela falou e chamou o Gael. À noite, o Manoel e a Mariana ficam responsáveis pela lanchonete. Dei um último beijo na cabeça do Gael e entreguei ele para ela.

- Já tenho que ir. Vou tentar revisar a matéria antes da prova - falei, beijando o Gael novamente, e saí.

Fui para a biblioteca para pegar uns livros que vou precisar para amanhã. Não tenho condições de comprar essas coisas, então faço meus trabalhos aqui. Não tenho computador, então tento me virar como posso. Mesmo com minhas dificuldades, sou um aluno com uma média impecável.

Fui para a sala de aula e já encontrei o Fernando, que é um dos meus raros amigos.

— Está preparado para a prova? — ele perguntou.

— Espero que sim — falei, me sentando, não muito confiante.

— Cara, você tá acabando — o André falou, sentando ao nosso lado, constatando o óbvio.

— Obrigado por me dizer algo que o meu espelho fala todos os dias — falei, arrumando minha mesa. Sempre fui assim, arrumo minhas canetas na mesa, gosto de ter tudo em ordem, para me ajudar a me concentrar.

— Você precisa se divertir um pouquinho. Amanhã nós vamos a um barzinho, vai ter a galera... — o André começou, e mesmo eu querendo muito me distrair sei que não seria fácil e muito menos possível

- Não posso...

— Estou convidando, eu pago — ele falou sabendo que as minhas condições financeiras não são as melhores.

— Vamos, cara! Uma noite só. Você nunca sai — o Fernando falou.

— Não posso, vocês sabem...

— Isso é por causa da Alexandra ou dos meus filhos? — o Fernando perguntou.

— Verdade, você não saiu mais para se divertir depois dela...

— Eu não posso sair porque eu tenho dois bebês me esperando em casa. Eu sou pai agora, e da Alexandra eu quero distância eu já esquece dela — falei para eles, e o professor entrou na sala e eu agradeci mentalmente não sei porque as pessoas sempre me lembram dela.

A prova não estava tão complicada afinal de contas, eu me preparei muito para fazê-la e mesmo cansado eu consegui fazer a prova tranquilamente. Entreguei a prova e fiquei esperando pela segunda aula.

Fui para a minha outra sala e tinha um aviso na porta dizendo que a prova seria feita no bloco H, sala 28. Achei estranho pois o bloco H, eu nem sei quais são os cursos do bloco H, sempre fiquei no meu bloco que é o E. O bloco H fica um pouco longe, subi e quando cheguei lá, olhei pelo vidro da porta e vi que ainda tinham alunos fazendo provas, então fiquei esperando.

Uma garota parou do meu lado, mas era unicamente para olhar pelo vidro e eu nunca tinha visto ela na universidade durante os meus 9 períodos aqui. Ela estava com uma coturno preta, uma calça preta colada, uma blusa branca com uma jaqueta de couro preta. Os cabelos loiros com cachos apenas nas pontas soltos, mas o seu perfume preencheu o pequeno espaço em segundos, era um aroma tão doce. Ela se afastou poucos segundos depois e sentou no chão. Ela provavelmente nem me notou, estava mais concentrada em um papel. Com toda certeza, é uma garota mimada que quer ser a rebelde.

— Velho, que prova difícil foi aquela? — ouvi a voz do André e ele vinha se aproximando com o Fernando os dois com uma expressão chateada no rosto.

— E que loucura foi essa de nos mandarem para o bloco H? — perguntou o Fernando nitidamente aborrecido pela caminhada.

— Não sei também, não entendi nada — falei.

— Quais cursos são ministrados nesse bloco?  — perguntou André, olhando a sua volta.

— Não faço a menor ideia — respondeu o Fernando.

— Administração, ciências contábeis e RH — a garota nos respondeu sem nem olhar para gente — Então, falem mais baixinho, o pessoal está fazendo prova — ela falou prestando atenção aos seus papéis.

— Desculpa, não sabíamos que ia te incomodar a nossa conversa — o André falou com um tom provocativo.

Ele não sabe a hora de ficar calado, mas ela não disse nada, apenas continuou fazendo o que estava fazendo.

— Então, vai para o bar? —  ele perguntou, falando alto de propósito e achei uma palhaçada.

— Você não é surdo? O pessoal está fazendo prova, e não, eu não vou para lugar nenhum. Eu tenho muita coisa para estudar — falei e ele revirou os olhos.

O corredor perto da porta já estava cheio, mas aquela garota parada na frente da porta me chamou atenção de uma tal maneira que estou até agora olhando ela fazer não sei o que com os papéis. Nem prestei atenção no que o André e o Fernando falavam.

Um garoto que eu conheço, ele faz engenharia. Já fizemos algumas aulas juntas e ele se sentou ao lado dela e começou a conversar com ela.

— A baba está escorrendo — o Fernando falou rindo — Você está olhando para a intocável! — olhei para ele sem entender.

— Vai dizer que você nunca tinha visto ela? — o André perguntou.

— Ele nunca sai do nosso bloco não duvido nada que ele nunca tenha visto ela — o Fernando falou

— Só saia de cena. Ninguém é bom o suficiente para ela, nem como amigo, nem nada. Tirando o Carlos, só tem mais a Daniela, que faz direito, e a Clarissa, que faz medicina, são as únicas pessoas que ela conversa. Então, se você não é nenhuma destas pessoas, nem se aproxime — André falou, e como imaginei, ela deve ser uma filhinha do papai.

— Ainda não liberaram a sala? — a professora Fernanda perguntou.

— Ainda não  — responderam.

— Vamos para a sala 29  — ela falou, entrando na sala, e logo entrei também.

A aula terminou às 22:15 e saí o mais rápido possível. Estava chovendo, então peguei o guarda-chuvas que carrego na mochila. A chuva só parecia que ia piorar, mas não tinha outro jeito, não vou morrer por me molhar um pouco. Já tinha andado três quadras quando parei para atravessar a rua e um carro passou por mim, me dando um banho. Era só o que faltava para deixar o meu dia ainda pior, e o vento foi tão gentil que na hora em que fui tentar tirar um pouco da água do rosto, o guarda-chuva voou.

O carro que me molhou parou no acostamento, a porta do motorista se abriu e não podia acreditar em quem era a motorista ou melhor, a motorista."

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Continua......

Capítulo 2

...Ana Laura (Analu)...

— Bom dia, meu amor. Você está babando no notebook — Acordei sentindo um beijo no topo da minha cabeça e ouvindo a voz do meu pai.

Meu corpo inteiro está doendo, e o sono ainda me dominava.

— Só mais um minuto — pedi ainda com os olhos fechados, estou muito cansada ainda.

— Filha, vai para a cama. Hoje você vai trabalhar? — ele perguntou.

— Você sabe como meu chefe é exigente e não posso faltar, muito menos me atrasar — Falei levantando meu rosto e abri meus olhos com dificuldade. Mesmo trabalhando na Toytoy's ( empresa do meu pai), não gosto de ser vista como a filha do chefe, e o senhor Edy o chefe  do meu departamento faz questão de me ter lá como uma estagiária qualquer, mesmo eu trabalhando bem mais — Eu não acredito que dormi de novo desse jeito...

— Se você quiser eu falo com o seu chefe para...

— Não, papai — Falei bocejando — Eu não quero nada de mão beijada. Não é porque sou uma Garcia que vou ter privilégios — falei limpando o rosto, mas estou com muita sono.

— Amo que você seja assim, mas a empresa é sua e das suas irmãs. Mas você é a minha primogênita. Fora que você ama tudo aquilo desde pequena, e filha eu sei que você está cansada — ele falou segurando meu braço.

— Eu amo muito aquela empresa, mas eu amo a área de desenvolvimento de brinquedos. Então, estava pensando em fazer um curso no próximo mês...

Meu pai me interrompeu ele sempre se preocupa por eu sempre me cobrar muito e sempre fazer muitos cursos.

— Tudo bem, lembre que sábado é a festa de Dia das Crianças. E como andam os produtos da linha para bebês? — ele perguntou. Não é o trabalho que mais gostei de fazer, bebês não dá para explorar 100% da minha criatividade, mas estou fazendo o possível.

— Está tudo caminhando perfeitamente para o sábado. Mas mudando de assunto, a mamãe falou com o senhor? Eu tentei falar com ela e não consegui — falei arrumando meus livros que estavam espalhados na mesa de jantar.

— Eu falei antes de dormir, mas o que foi? Só servia à sua mãe? — ele perguntou puxando a cadeira para sentar.

— Sim, papai, só servia à mamãe. Era sobre assuntos femininos — falei e ele me olhou por um tempo. — Mas não se preocupe, depois eu tento falar com ela. Se duvidar, ela já está em um avião. Ela disse que se conseguisse um voo mais cedo, ela trocaria — falei salvando meu TCC que comecei a desenvolver.

— E sobre o que é? — ele perguntou curioso, mas ao mesmo tempo com um tom de medo na voz. — Menstruação, namorado, sexo...

Revirei os olhos quando ele começou a dar alternativas do que eu queria falar com minha mãe.

— Papai, o assunto é com a mamãe, e não se preocupe, não é nada para se preocupar. Era só um desabafo mesmo...

— E eu não sirvo? — ele perguntou de boca aberta.

— Não, é capaz de todos saberem antes de eu sair de casa — falei.

Antes que ele pudesse reclamar, a Ariel desceu correndo as escadas, com a cara fechada claramente chateada.

— Papai, deste jeito não dá, fala com a sua filha, por favor — ela chegou fazendo drama.

— Bom dia, papai. Dormiu bem? Dormiu, Ariel? — meu pai falou, me fazendo rir.

— Paizinho, por favor, a Aurora está no banheiro há mais de meia hora. Você sabe quanta água ela já gastou? E eu preciso me arrumar para a escola — Ariel falou com todo o dengo do mundo.

— Usa o meu banheiro, meu amor — O meu pai falou.

— E o meio ambiente, paizinho? Um banho de 30 minutos é um absurdo. Ela está gastando mais 243 litros de água. E sabe quanto custa no bolso um banho desse? É uns 30 reais na conta de água. Com esse dinheiro, uma família se alimenta durante sete dias em vários países na linha da miséria. Neste exato momento, uma criança está com sede porque a sua filhinha está acabando com a água do mundo — ela falou com um senhor drama digno de novela das nove. Errada ela não está, mas o drama dela reina.

— Eu vou falar com a sua irmã —  meu pai falou, e ela sorriu. — Analu, você ajuda o papai com as suas irmãs — ele pediu.

— Eu tenho escolha? — perguntei rindo e pegando minhas coisas.

—  Quem foi que queria muito ter irmãs mesmo... — meu pai começou a me passar na cara, mas logo o interrompi.

— Eu pedi duas, não quatro — falei subindo a escada.

Fui direto para o meu quarto, nossa casa grande e o meu é o último quarto do corredor, e assim que eu entrei já fui colo colocando o meu material na escrivaninha e olhei para minha cama.

— É, eu também queria muito ficar com você, mas o problema não é você, o problema sou eu — falei para a minha cama, passando a mão no meu edredom fofinho, e saí do quarto. Antes de chegar no quarto das menores, ouvi o meu pai falando com a Aurora.

— Aurora, por favor, sai desse banheiro. Sua irmã precisa tomar banho também...

Entrei antes de ouvir o resto. Aqui em casa, toda manhã é muito agitada. Afinal, somos seis mulheres na mesma casa. Tenho até dó do papai, às vezes é muito hormônio feminino junto.

Entrei no quarto das minhas irmãs mais novas, o quarto delas como todos da casa deixa muito claro as suas personalidades a Alice ama explora e estudar insetos já a ali a unicórnio e tudo que for rosa assim que entre constatei que Alice e a Ally ainda estavam dormindo e com certeza elas dão muito fofinha dormindo. Fui primeiro na Alice e beijei sua bochecha.

— Bom dia, minha exploradora. Hoje é um belo dia para explorar o mundo — falei, e ela abriu os lindos olhos azuis, e sorriu para mim.

— Bom dia, Analu. Me diz que hoje é sexta, por favor — ela pediu, e eu sorri.

— Também queria muito que fosse, mas hoje é quinta — falei, e ela sentou na cama coçando os olhos.

— A mamãe chega amanhã, né? — ela perguntou.

Eu já me acostumei com o trabalho da mamãe; afinal, ela trabalha nesta empresa há 15 anos, e ela precisa ir para o Japão. E eu amo Tóquio, sempre que ela pode levar a família vamos todos, mas essa é a primeira vez que a mamãe vai sem a Ally, por ela ser a mais nova e ter sido uma gestação muito complicada a mamãe tinha muita dificuldade de deixá-la.

E fora que ela diz que o papai não conseguiria lidar com as cinco, mas a empresa e o trabalho, mesmo eu sendo muito mais velha que as minhas irmãs, a minha mãe não quer me dá tanta responsabilidade, afinal eu ainda não tenho os meus filhos.

—  Sim, amanhã. Agora já para o banho, se não vamos nos atrasar — falei, e ela saiu correndo.

Fui para a outra cama e tirei o cabelo do rosto da Ally.

— Meu amorzinho, já está na hora de ir para a escolinha — falei, mexendo no seu cabelo.

— Eu não vou hoje, estou doente — ela falou de olho fechado.

— Doente? Mas doente de quê? — Perguntei a ela.

— De saudade, eu quero a mamãe — ela disse com voz de choro, e a peguei no colo fazendo carinho.

— A mamãe já está voltando para casa. Ela chega amanhã — falei, abraçando e a tirando da cama.

— Faltam muitas horas ainda — ela falou manhosa.

— Mas se você for para a escola, passa mais rápido. Vai brincar muito com seus amigos, e eu prometo que à tarde levo você e a Alice para o parquinho. Vai ser divertido...

— Não é divertido desde que a mamãe viajou — ela falou triste.

— Se a mamãe escutasse isso, estaria chorando. Ela faz tudo por nós cinco, ou melhor, seis. — falei lembrando do nosso pai.

Eu pensei o que falar para acalma a minha irmãzinha a Ally só tem quatro anos eu tinha dezenove anos quando a mamãe engravidou dela, então eu sempre ajudei a minha mãe em tudo e tenho um carinho muito grande.

— Que pena. Eu vou tomar sorvete de chocolate com calda de chocolate e cheio de M&M, apenas com a Alice —  falei, para ver se com uma pequena chantagem ela melhorada o humor.

— Com muitos M&M? — ela perguntou.

— Com bastante — falei, e ela parou um pouco para pensar e logo abriu um lindo sorriso.

— Alice bonitona, sai logo para eu tomar banho também — ela falou, e não tive como não rir.

Ajudei ela a tomar banho e depois a arrumei com o uniforme. Fiz um gatinho no cabelo, colocando dois laços, e ajudei a Alice a pentear o cabelo e fiz um rabo de cavalo, colocando uma tiara.

— Pronto, as duas já estão bonitonas. Vão lá tomar café com o papai, que eu vou me arrumar — coloquei uma calça jeans, uma camisa de frases branca ("não é não") e coloquei uma jaqueta jeans e um saltinho básico.

Quando coloquei o pé na escada, pude ouvir vozes. Eu adoro essa agitação. Meu pai já tinha feito o café da manhã e Ariel estava dando um belo discurso ou melhor uma palestra sobre a importância de não desperdiçar água.

— O chuveiro não estava ligado, Ariel. Eu estava me arrumando, você sabe quanto tempo eu preciso para passar meus cremes e fazer minha maquiagem. É um processo... — Aurora indicou a se explicar.

Revirei meus olhos mentalmente. Sempre amei o fato delas serem tão diferentes em algumas coisas, e acho que gêmeos são sempre assim, mas amo minhas irmãs. Cada uma tem sua personalidade bem definida desde pequenas.

— Papai, eu não quero cereal — Ally falou.

— Mas tem muitas coisas! Tem pão com requeijão que você ama e as frutinhas... — papai começou a falar com ela.

—  Não, eu quero algo saudável — ela pensou por um momento. — Que tal pizza? — ela disse e papai revirou os olhos.

— Tudo bem, à noite o papai compra pizza, mas agora coma as frutinhas — ele disse cortando as frutinhas e dando na boca dela, meus pais tratam a Ally com uma bebezinha.

Meu pai é um ótimo pai, nem se compara ao homem que conheci há 16 anos atrás. Sim eu conheci meu pai quando eu tinha 7 anos e minha mãe e a minha mãe biológica faleceu e tive que morar com meu pai que nem gostava de mim na época, mas depois ele mudou muito e se casou com a minha mãe que é uma mulher fantástica. Mesmo que mamãe só vá às vezes para Tóquio, o lugar dela vazio ainda é estranho. Ela é muito mais do que minha mãe.

— Analu — Aurora falou, pegando em meu braço. — Eu estava falando com você — ela disse e eu estava tão distraída pensando na mamãe que nem ouvi.

— Desculpa, eu não estava prestando atenção — falei olhando para ela.

— Você pode nos levar antes de ir para a universidade ou hoje você vai de moto...

— Não, eu levo. Papai ainda não devolveu a chave da minha moto — falei olhando para o meu pai. — Afinal, minha moto é um transporte prático...

— E perigoso... — meu pai me interrompeu ele odeia que eu ande de moto e muito mais que eu pratique motocross.

— Nós já conversamos, papai. A moto é minha, eu comprei com meu dinheiro. Eu amo motos, do mesmo jeito que você gosta do seu iate... — peguei.

— Mas filha, moto é um transporte perigoso e se acontecer alguma coisa com você...

— Papai, só pelo fato de eu estar viva, pode acontecer alguma coisa — falei frustrada.

Eu deixei a moto para trocar o pneu na oficina do filho do seu José e o Pablo acabou trazendo a moto aqui para casa e deu as chaves justamente para o meu pai. Mas nada que a minha mãe não resolva.

— Eu tenho uma reunião agora, tenho que ir. Obrigada, Analu, por tudo — ele falou dando um beijo em cada uma.

— Tchau papai — falamos as cinco juntas e depois rimos pela confusão.

— Acho melhor nós cinco irmos logo — falei e comecei a arrumar as coisas. O lado bom da minha mãe ser um gênio é que ninguém precisa limpar nada. — Melhor amigo limpeza na cozinha e sala de jantar — falei para o aparelho na parede. Os pequenos robôs começaram a fazer o trabalho.

As meninas foram pegar suas coisas e eu subi para escovar os dentes e pegar minha bolsa. Quando desci, saímos correndo. Coloquei Ally na cadeirinha e fomos cantando músicas. Primeiro deixei Aurora e Ariel no colégio de Elite onde elas estudam, o mesmo onde estudei no ensino médio. Depois, levei Alice e Ally para o mesmo colégio onde estudei junto com Carlinhos. Meus pais podem ser ricos, mas não nos fazem conviver com os ricos metidos, exceto no ensino médio. Minha mãe quis me colocar na melhor escola e foi lá que aprendi a não confiar nas pessoas.

Depois de deixá-las, fui trabalhar. Entrei na empresa já assumindo outra postura. Não é porque sou fria ou algo do tipo, mas a maioria dos funcionários me enxerga como uma menininha, mesmo que eu praticamente trabalhe aqui desde os meus 7 anos. Afinal, tenho 23 anos e mais de 200 produtos patenteados em meu nome. Sempre gostei de fazer brinquedos com meu pai.

— Atrasada — Edy falou assim que pisei no andar. Olhei para meu relógio e não acredito que ele estava estressado por eu ter me atrasado um minuto.

— Bom dia, senhor Edy — falei indo para minha mesa.

— Espero que os produtos que você esteja desenvolvendo não atrasem nem um só minuto — ele disse, e como eu odeio esse cara. — Afinal, você só está aqui por ser filha do dono, você não é  uma ninguém — ele gritou para todo o andar. Eu aceito críticas, aceito reclamações, mas isso não.

— Não, eu não estou aqui porque sou filha do dono. Estou aqui porque sou uma grande designer de brinquedos. Afinal, desenvolvo brinquedos há 16 anos, tenho mais de 200 patentes e 90% dos meus produtos são sucesso de vendas. Então, não venha querer me diminuir por ser filha do seu chefe. Eu nunca te desrespeitei na frente de ninguém. Eu sempre cheguei aqui, fiz meu trabalho e vou continuar fazendo — falei me sentando e ligando o computador.

— Sabe, mudança de planos. Eu quero isso até hoje, até a meia-noite de hoje — ele disse e saiu. Que raiva desse cara.

Por conta disso, minha manhã foi uma correria. Fora que bebês não são a minha praia. Acho um trabalho muito chato. São sempre as mesmas coisas e não tenho como criar muito, gosto de explorar a criatividade.

À tarde, levei Alice e Ally para tomarmos sorvete. Odeio quebrar promessas, então tentei passear rapidamente e voltei para casa. Meu pai já estava ocupado, mas pela quantidade de papel, a noite seria longa.

Corri para meu quarto, tomei um banho rápido e me arrumei para ir para a universidade.

Sai do quarto indo para o quarto ao lado e bati na porta.

— Já estão prontas? — perguntei a minhas irmãs e a Ariel olhou para a porta do banheiro.

— Aurora, eu estou com pressa, adiante por favor — falei me jogando na cama da Ariel ao lado dela.

— Bem-vinda ao meu mundo — Ariel falou, se jogando para trás.

— Se eu fechar os olhos, eu durmo — falei olhando para o teto.

— Deste jeito, sua cama vai pedir divórcio — ela falou e comecei a rir.

— Ariel, qual cor você está? — a Aurora gritou.

— De que cor você está? — ela repetiu a pergunta.

— Azul — ela gritou.

— Vou trocar de roupa — revirei meus olhos. Isso resume 15 anos da minha vida.

— Então, eu já estou prontinha — Aurora pegou a bolsa e colocou algumas coisas. —Não dorme, Analu — ela falou quando meus olhos começaram a se fechar. Então, me levantei.

— Já troquei — a Ariel falou e eu não entendo quem se confunde com elas. Elas não são idênticas, só parecidas.

— Que bom, vamos antes que eu desista...

— Até parece você, nunca faria isso com a gente — a Aurora falou e a Ariel me entregou o celular para guardar.

Elas brigam, mas se eu, que sou a irmã, falar de uma delas para a outra, é como estourar uma bomba. Eu acho muito bonitinho esse relacionamento de irmãs que elas têm.

Fomos para o carro, deixei as duas e fui para a universidade. Eu sempre fico no quiosque mais afastado. Não é que eu seja antissocial nem nada do tipo, mas cansei de pessoas se aproximarem de mim por causa do meu sobrenome ou da conta bancária dos meus pais. Então, prefiro ficar com os amigos que sei que são verdadeiros: o Carlos, a Clarissa e a Daniela. Como está cedo, o Carlos e a Dani não chegaram ainda. A Clarissa é igual a um zumbi estudando; ela faz medicina, então é bem raro ela ter tempo às 16h da tarde.

Estou no meio dos desenhos com alguns modelos que vamos lançar na mesa. Toda vez que eu venho mais cedo, eu vejo a senhorinha que vende as coisas no quiosque com um bebê. Mas hoje, o chorinho dele estava mais agudo e eu não estava conseguindo fazer meu trabalho porque sei que aquele chorinho é de dor. A Ally fica assim quando os dentinhos estão nascendo. Lutei com todo o meu eu para ir até lá. Normalmente, eu entro e saio da universidade sem falar com quase ninguém, só a tia Marli que trabalha na limpeza lá no bloco e os professores.

— Desculpe me intrometer, mas eu posso? — perguntei olhando para o bebê e ela ficou me analisando por um tempo. Mas estava tão sobrecarregada atendendo que ela me entregou o menino.

Eu devo estar louca, sair por aí pegando o bebê dos outros, mas ele ficou olhando para mim. Ela deixou eu entrar no quiosque, então lavei o mordedor de carinho com um gel anti-inflamatório. Só quando eu dei para ele que ele parou de chorar e então entendi melhor o que eu estava fazendo ao produzir esses produtos.

— Você gostou, anjinho? — falei limpando o rostinho dele e ele sorriu mostrando os dois dentinhos. — Então, o que você achou do produto? Está aprovado? — perguntei e ele voltou a morder. — Vou dizer que isso é um sim — falei e ele deitou a cabeça no meu ombro.

Sorri com esse gesto. Minhas irmãs sempre fizeram isso, mas não sei, esse gesto mesmo tão pequeno encheu meu coração e fez minha cabeça fervilhar de ideias. Quando notei, ele tinha colocado a mão dentro da minha blusa e estava com a mão no meu seio direito.

— Ei, rapaz, como assim? Você já vai com essa intimidade toda? Nem me levou para um jantar primeiro — falei. Ia tirar a mão dele, mas ele apertou com força o meu peito e acabei gritando de dor.

— Gael — a senhora o repreendeu e ia tirá-lo de mim, mas ele agarrou o meu pescoço.

Ele tinha muita força para um bebezinho e pelo visto tinha gostado de mim.

— Desculpa, moça, ele nunca fez isso — ela falou toda sem graça e sorri pela carinha que ele fez.

— Gael, esse não tem leite e não pode fazer isso. É feio. Primeiro, você paga pelo menos um sorvete, e tem que pedir permissão. Não pode sair por aí fazendo essas coisas. Você é um bom menino — falei e ele prestava atenção em mim. Dei um beijinho na cabeça dele.

— Vem com a vovó —  ela falou, chamando o menino que me olhou por um tempo, olhou para a senhora, mas não saiu.

— A tia tem que ir, meu anjinho — falei, entregando-o para ela.

— Este brinquedo — a senhora perguntou.

— Desculpa, nem perguntei se podia dar. É um mordedor com gel anti-inflamatório, ajuda com o nascimento dos dentinhos. O coitado está com dor, né anjinho — falei sorrindo para ele.

— Obrigada, pelo visto o Gael adorou. E ele gostou de você — ela falou, porque ele estava me chamando.

— Eu queria ficar, meu anjinho. O papo com você é ótimo, mas eu tenho um chefe muito chato. É Gael, ele é um porre, e se eu não entregar um projeto ainda hoje, eu estou ferrada. Mas eu sempre venho aqui. Adoro o café de sua vovó. Podemos conversar mais vezes, né? Não te dou meu número porque você não deve ter um celular — eu falava com ele e, pior, é que ele prestava atenção. Não resisti e dei outro beijinho.

— Obrigada e quando quiser ver o Gael, estamos aqui — a senhorinha falou e meu celular começou a tocar com o Edy me enchendo de mensagens.

— Vou indo mesmo. Foi um prazer, Gael — falei e ele riu.

Arrumei minhas coisas e fui para o meu bloco. Estava com umas ideias e precisava colocá-las no papel antes da prova.

A prova era de estatística avançada, e é uma matéria que eu tiro de letra. Depois de fazer a prova, fui para a sala 28 tentar falar com o professor Flávio. Estou em um projeto com a professora Fernanda, onde vão fazer uma junção de cursos, e me jogaram para engenharia, justo com a tia Fernanda. É só um trabalho, mas não quero ter que aturar um bando de machos escrotos. Como vi que ele estava em prova, me sentei no chão da frente da sala. Sabia que ia demorar, e como não tenho mais aula hoje, vou tentar aproveitar para desenvolver o brinquedo no papel, a parte funcional fora a aparência.

Tive uma curta diálogo com uns idiotas e quando eu vi o Carlos, já sabia que todos eles eram da engenharia. Aí eu tive mais um motivo para ficar o mais longe possível deles.

— Por que você não respondeu às conversas no grupo hoje? — Carlos perguntou sentando ao meu lado.

— Não tive tempo. O idiota do Edy quer adiantar o trabalho e estou correndo contra o tempo. Estou tentando falar com o Flávio — falei desenhando.

— Ah, não faz isso. É uma oportunidade de fazermos o trabalho juntos. Vai, por favor — ele pediu implorando, e fazendo biquinho.

— Você sabe que eu não fico calada para ninguém...

— Vai, por favor — ele pediu.

— Ok, você está de carro? — perguntei.

— Não, vamos de aplicativo...

— Avise no grupo que estou de carro, eu levo vocês — falei me levantando. A professora dele já tinha entrado.

— Vou esperar na biblioteca — falei pós sabia que se fosse para casa não ia conseguir trabalhar. E estava pensando no Gael.

Depois de um tempinho ali, consegui terminar. Já passavam das 10 quando mandei para o Edy. Esta noite, eu preciso dormir.

Saí da biblioteca e estava chovendo muito. Encontrei Clarissa na frente do carro.

— Oi, sumida — falei. Ela estava com uma cara acabada.

— Me fala que hoje é sexta? — ela pediu.

— No Japão sim, aqui ainda não — falei e ela revirou os olhos. Abri o carro e joguei minha bolsa dentro. — Cadê o seu irmão? Eu tenho um encontro...

— Você tem um encontro, conta tudo — ela falou animada.

— Com a minha cama — falei rindo da cara dela.

— Que cara, está Clarissa? — a Dani perguntou, vindo com o Carlos correndo, já que eles não estavam na cobertura.

— Nada, vamos logo — ela falou, sentando no banco de trás.

A Dani também entrou e o Carlos sentou do meu lado. Liguei o carro. A chuva estava muito forte, atrapalhando minha visão. Quando percebi, tinha acertado um buraco e dado um banho no rapaz que estava atravessando a rua. Parei o carro imediatamente.

— O que você vai fazer, Ana Laura? — o Carlos perguntou.

— Saber se ele está bem. Eu dei um banho no rapaz...

— Você está louca, Analu — a Clarissa falou.

— Se ele estiver com raiva e tentar alguma coisa...

— Eu não vou dormir pensando nisso. É melhor eu saber se ele está bem — falei, abrindo a porta do carro e saindo.

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^^^Continua...^^^

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