NovelToon NovelToon

Eclipse Vol.1

Capítulo 5

Após uma longa explicação, ambos deixaram a biblioteca. Kiran sentia uma dor de cabeça latejante depois de ter decorado tantas palavras. Por outro lado, Munihr irradiava uma alegria contagiante, mesmo não possuindo uma luz própria. Seu sorriso brilhava como um diamante, embora um leve cansaço fosse perceptível em seu semblante. Talvez fosse apenas uma impressão passageira.

À medida que caminhavam, chegaram a uma imponente porta que parecia ser a saída. Munihr sugeriu dar uma volta pelo reino, e a ideia agradou o jovem solariano, embora ele mantivesse uma certa desconfiança em relação às intenções de Munihr.

— Como você espera que eu faça isso? — Kiran franziu a testa — Não posso sair durante a noite.

Munihr sorriu enquanto se posicionava junto à porta, no limiar da escuridão.

— Pegue a minha luz.

— Como assim?

— Embora eu não possua luz própria como você, posso guardar e emanar luz quando necessário. Então, pegue o que precisa. Vamos!

Kiran sentiu-se intrigado, mas decidiu confiar plenamente no lunar. Tocando suavemente a lateral de seu rosto com as mãos, ele fechou os olhos e permitiu que uma onda de calor percorresse seu ser. Sua luz interior ressurgiu, irradiando um brilho intenso e resplandecente. Ao abrir os olhos, percebeu que o fulgor do lunar havia desaparecido. Seus cabelos outrora radiantes agora eram como fios de prata, seus olhos haviam perdido sua tonalidade. Ele parecia ter se despojado do pouco que lhe restava. Seus lábios, pálidos e trêmulos, no entanto, mantinham um sorriso inalterado.

Nesse momento, o solariano contemplou a beleza paradoxal de Munihr, cujo esplendor havia se dissipado, mas cuja serenidade interior permanecia. Era como se a própria essência do lunar brilhasse através de sua alma, transcendendo a aparência física. Uma luz etérea e delicada, que se manifestava no sorriso que se mantinha nos lábios do lunar.

— Não se preocupe comigo. Agora, ponha a mão no meu ombro.

— Como assim?! — Kiran engoliu em seco, sentindo seu coração acelerar de repente.

— Mesmo que você tenha recuperado sua forma, a escuridão pode roubar sua luz. Eu irei refletir seu brilho de volta para você mesmo. — explicou — Ou prefere que seguremos as mãos? — riu.

Kiran revirou os olhos e fez bico. Embora achasse tudo aquilo desnecessário, atendeu ao pedido dele. Com a mão no ombro do lunar, saíram juntos pela porta. Ao emergirem na escuridão, Munihr resplandeceu no meio das trevas. Seus olhos brilhavam com a mesma intensidade de antes, e seus cabelos levemente azulados cintilavam como uma cabeleira solitária de cometa.

Kiran ficou impressionado com a transformação diante de seus olhos.

— Como você...

— A noite é o meu domínio, esqueceu?

— Claro.

E assim, envolvidos por aquela nova luz que o lunar emanava, eles caminharam juntos, explorando o território sombrio que se estendia à sua frente.

Banhado pela luz mística da lua, o Reino do Mortos ou também conhecido como "Cidade Lunar" erguia-se majestosamente em meio a um deslumbrante cenário noturno. Sua beleza era marcada pela fusão entre a poesia e o esquecimento, um lugar onde os destinos abandonados encontravam um novo propósito.

As muralhas da cidade eram construídas com pedras prateadas, que brilhavam suavemente sob o luar, emanando uma aura de mistério e encantamento. Torres altas e esguias se erguiam em meio às muralhas, pontuando o horizonte com silhuetas elegantes. Cada torre, adornada com delicados arabescos e finas filigranas, parecia alcançar as estrelas, como se buscasse tocar o céu noturno.

Ao adentrar as portas da cidade, revelava-se um emaranhado de ruelas estreitas e sinuosas, iluminadas por lamparinas negras que pendiam dos postes. O chão era revestido por paralelepípedos gastados pelo tempo, testemunhas silenciosas das histórias que ali se desenrolavam.

As construções da Cidade Lunar exibiam uma arquitetura singular, uma mescla de estilos que pareciam ter sido tecidos pelos sonhos esquecidos. Palácios de cúpulas prateadas e minaretes curvilíneos se misturavam a casas de contos de fadas, com telhados pontiagudos e janelas adornadas por rendas sutis. Cada edifício contava uma história, e as paredes, gastas pelo tempo, pareciam sussurrar segredos esquecidos.

Os habitantes eram seres peculiares, como fragmentos de memórias esmaecidas. Lunares de todas as formas e tamanhos perambulavam pelas ruas, cada um com sua própria história de abandono e redenção. Esqueletos vestidos com roupas desbotadas flutuavam graciosamente, suas expressões refletindo uma melancolia serena. Almas errantes, envoltas em véus diáfanos, vagavam em busca de sentido, deixando um rastro de nostalgia no ar. Figuras sombrias, sombras vivas de antigas lendas, percorriam os becos escuros, sussurrando segredos ao vento.

A atmosfera da cidade era carregada de uma aura melancólica, mas também de esperança. Era um refúgio para aqueles cujas histórias haviam sido esquecidas, um lugar onde encontravam acolhimento e a oportunidade de resgatar sua identidade perdida. Ali, as feridas da alma podiam ser curadas e os sonhos reavivados, pois cada ser naquelas ruas compreendia a dor do abandono e a busca por um novo começo.

No coração da cidade, situava-se uma praça ampla e iluminada, adornada por uma fonte de prata que jorrava água cristalina em cascata. Era ali que os lunares se reuniam, compartilhando suas histórias e encontrando força na união. O som suave de violinos e pianos ecoava pelos arredores, envolvendo a cidade em melodias que acariciavam as almas e despertavam emoções adormecidas.

Aquele lugar era um berço para aqueles que foram esquecidos, um lugar onde as memórias perdidas encontravam um novo lar. Era uma ode à resiliência humana, onde a luz da lua guiava os passos dos abandonados, iluminando o caminho rumo à redenção e à renovação.

No éter mágico da cidade, um mosaico de raças díspares se uniam em harmonia, tecendo uma morada para as aberrações. Nesse berço de singularidades, os guardiões, como Kiran, encontravam seu propósito divino, erguendo-se contra as sombras do mal.

Cada ser trazia consigo uma peculiaridade ímpar, e, embora Kiran brilhasse como um sol ambulante, sua presença parecia pequena, quase esquecida, na vastidão da multidão.

Sozinho, o frio gélido percorria as mãos do solariano, preenchendo-o de angústia, especialmente cercado por inimigos multifacetados, impotente diante da impossibilidade de lutar.

— Algum problema? — indagou Munihr, por cima do ombro.

— Não.— respondeu.

O lunar fitou os olhos de Kiran, mergulhando nas profundezas de sua alma.

— Está tudo bem. — disse.

E aquela voz bastou para acalmar o coração de Kiran.

Despojando-se de sua capa sombria, Munihr a depositou sobre os ombros do ruivo, deixando-o perplexo, inebriado por tamanho gesto.

— Você é um guardião, quase considerado como um deus aos olhos de muitos. — disse, enquanto ajeitava o capuz sobre sua cabeça — Assim, não precisará temer ser reconhecido.

O solariano sentiu o peso da capa sombria sobre si, como se fosse um manto sagrado. Um véu que o envolvia, ocultando sua verdadeira identidade.

Com um aceno silencioso, Kiran expressou sua gratidão, desviando o olhar. E então, com Munihr ao seu lado, os dois voltaram a caminhar pelas ruas iluminadas pela luz da lua.

...

Capítulo 6

À medida que Kiran e Munihr se aproximavam da feira, uma sinfonia de cores, sons e aromas envolvia seus sentidos. Tendas vibrantes, com suas lonas desgastadas pelo tempo, se alinhavam em um cenário encantador. Bandeiras coloridas tremulavam no ar, revelando símbolos místicos e padrões intricados.

A atmosfera era impregnada com a fragrância hipnotizante de incenso, que se misturava com os aromas exóticos de especiarias e alimentos preparados na hora. O som de músicas e risadas preenchia o ar, criando uma sensação de alegria e celebração.

Caminhando pelos corredores movimentados da feira, o solariano se maravilhavam com a variedade de barracas e expositores. Joalheiros habilidosos exibiam suas criações brilhantes, com gemas reluzentes capturando a luz do sol e emitindo um brilho mágico. Artefatos místicos eram apresentados em estandes adornados com símbolos antigos, cada um carregando histórias de poder e mistério.

Pequenos frascos de vidro contendo poções encantadas reluziam em cores vibrantes, emanando uma aura mágica e convidando os visitantes a desvendar seus segredos. Em outra parte da feira, gaiolas protegidas por feitiços abrigavam criaturas fantásticas, desde pássaros de plumagem multicolorida até vagalumes em potes de vidro, cada um exibindo sua majestade e exotismo.

Ao caminharem pelos corredores, podia ouvir as vozes animadas dos vendedores fantasmagóricos, entoando cantigas para atrair a atenção dos visitantes. A troca de moedas, o tilintar de joias e o som suave de pergaminhos sendo desenrolados compunham uma sinfonia peculiar.

A cada esquina, havia algo novo e fascinante para descobrir na feira da Cidade Lunar. Pinturas mágicas que ganhavam vida, estátuas que contavam histórias antigas e ervas raras com propriedades curativas eram apenas algumas das maravilhas que Kiran podia encontrar em sua jornada naquele mundo novo.

Enquanto se aventuravam pela feira, o solariano sentia-se cada vez mais envolvido por uma energia elétrica, uma sensação de que nesse lugar mágico qualquer coisa era possível. Ele sabia que teria que se manter vigilante, mas também estava ansioso para explorar e se encantar com os tesouros e mistérios que a aquele lugar tinha a oferecer.

No entanto, algo em uma barraca específica chamou a atenção de Kiran. Uma caveira ambulante, adornada com bijuterias e vestida com trajes coloridos que lembravam os anos 90, vendia uma coleção de objetos curiosos. Seus olhos vazios brilhavam com um tom espectral, e sua voz ecoava de forma assombrosa, mas intrigante.

Kiran sentiu um arrepio percorrer sua espinha enquanto observava a caveira ambulante. Seus olhos se arregalaram de surpresa e um leve medo se instalou em seu coração. Se perguntava como algo aparentemente inanimado poderia exibir tanta vida e personalidade.

Munihr percebeu a expressão do ruivo e soltou uma risada suave, como se soubesse exatamente o que estava passando pela mente do solariano.

— Não se preocupe, meu sol. Marod é apenas mais um dos personagens peculiares que você encontrará aqui no Reino dos mortos. Ele não representa uma ameaça real.

— Mas... como ele pode se mover? E falar? É... assustador.

Munihr sorriu indulgentemente.

— Aqui, o inexplicável é comum. Muitos seres aqui possuem habilidades únicas e surpreendentes. É um lugar onde tudo se torna possível.

Notando a expressão cada vez mais apavorada de Kiran, não conseguiu conter uma risada divertida.

— Qual é dessa cara? Até parece que nunca viu uma caveira antes. Este é o senhor Marod, um dos homens mais engraçados que já vi. — Munihir cumprimentou a caveira com um aceno.

A caveira, que atendia pelo nome de Marod, fez uma pose engraçada e exibiu seus ossos.

O solariano observou a cena com os olhos arregalados, sentindo-se horrorizado e desconfortável com a presença sobrenatural daquele ser.

— Temos aqui um indivíduo bem peculiar? — perguntou Marod, aproximando-se de Kiran para olhá-lo de perto com seus olhos vazios. Enquanto o solariano recuava instintivamente, sentindo-se cada vez mais aflito. — Amigo seu?

Munihr olhou para o príncipe e assentiu em resposta.

A caveira olhou diretamente para ele com seus olhos brilhantes e emitiu uma risada arrepiante, enquanto esfregava as mãos esqueléticas e apontou para sua bancada repleta de objetos diversos.

— Aproxime-se meu jovem! Vejo que você está intrigado com minhas mercadorias. Posso lhe mostrar algo especial? — convidou Marod.

Kiran olhou para o Munihr em busca de orientação, e o lunar apenas assentiu levemente, encorajando-o a prosseguir.

Com cautela, se aproximou da bancada da caveira ambulante. Enquanto examinava os objetos, sua apreensão começou a ceder espaço à curiosidade. Ele ficou fascinado com a variedade de itens, desde amuletos encantados até artefatos antigos de aparência sinistra.

Enquanto Marod explicava as propriedades de cada item, Kiran sentiu seu medo se transformar em fascinação. Ele começou a entender que nem tudo o que era assustador à primeira vista representava uma ameaça. A Cidade Lunar era um lugar onde o incomum se tornava normal, e a magia fluía livremente.

Munihr observava com divertimento a expressão de Kiran, sabendo que o solariano estava começando a superar seus receios.

Depois de algum tempo de contemplação, Kiran finalmente escolheu um pingente em forma de caveira, adornado com pequenas pedras brilhantes cravadas em metal maciço.

— Oh, boa escolha, meu jovem! — exclamou Marod. — Este pingente pertenceu a um dos grandes piratas da Era dourada.

Kiran olhou para o objeto em suas mãos, fascinado com sua beleza e história. Munihr então tirou uma moeda do bolso e a jogou para a caveira.

— Custa uma moeda de um morto, não é? — perguntou.

Marod assentiu com seu sorriso de caveira.

— Aceite-a como pagamento. — disse Munihr.

— Obrigado, criança. — agradeceu. — Mande lembranças aos seus pais, por mim.

— Pode deixar! — respondeu o lunar, sorrindo enquanto deixavam a barraca.

Kiran olhava para Munihr com perplexidade estampada em seu rosto, tentando compreender a situação incomum em que se encontrava.

— Você tem pais? — perguntou, com curiosidade e confusão.

Munihr, por sua vez, olhou para o ruivo com surpresa evidente em seus olhos. Ele não esperava que tal pergunta absurda fosse feita.

— Claro, você não?

A resposta que recebeu apenas aumentou a perplexidade de Kiran. Como poderia Munihr ter pais se ele parecia ser uma pessoa viva em meio a todas as entidades espirituais e aberrações que havia encontrado durante o caminho?

O príncipe continuou a olhar para o lunar, tentando encontrar pistas que o ajudassem a entender a natureza de seu inimigo. Munihr não se assemelhava às entidades mortas que povoavam aquele lugar. Ele parecia completamente vivo, com expressões faciais, movimentos e uma aura de vitalidade que Kiran não esperava encontrar em meio àquele ambiente sobrenatural.

A confusão de Kiran aumentava ainda mais diante dessa aparente contradição. Ele se perguntava o que Munihr estava fazendo na Cidade Lunar e como ele se encaixava naquela realidade peculiar.

Enquanto a perplexidade dominava o solariano, ele sentia uma mistura de fascínio e inquietação.

— O que você é? — questionou Kiran.

Munihr apenas sorriu e respondeu casualmente:

— Eu sou um lunar. Você já sabe disso.

Sua resposta natural e despretensiosa deixou Kiran ainda mais irritado. Obviamente, não era a resposta que ele esperava.

Munihr riu, apreciando a reação de acompanhante.

— Foi a primeira vez que você viu algo assim? — perguntou.

— Já enfrentei demônios e espíritos antes, mas uma caveira que fala? Foi estranho! — Kiran ainda parecia perplexo.

Munihr continuou sorrindo.

— E no final, você acabou comprando um pingente de caveira. Irônico, não?

Kiran olhou para o objeto em formato de caveira em suas mãos, observando-o com fascínio e um toque de descrença em seu rosto.

— Pois é... — murmurou ele, ainda tentando assimilar tudo o que havia vivenciado naquela feira extraordinária — Aquilo que você usou para pagar isso...

O lunar franziu a testa, tentando decifrar o que ele estava querendo insinuar.

— Ah, você diz as moedas?

Kiran olhava para as moedas que Munihr havia tirado dos bolsos com uma expressão de desdém misturada com curiosidade. Já estava se acostumando com as peculiaridades daquele reino, mas ainda assim achava estranho o fato de as moedas serem provenientes de mortos.

— O que você disse mesmo sobre elas? — franziu a testa, buscando esclarecer sua memória.

— São moedas de um morto. E é o que usamos para pagar objetos aqui. — explicou o lunar.

Pela primeira vez, Kiran não ficou surpreso com essa informação.

— Claro... tinha que ter essas bizarrices aqui. — murmurou o solariano, revirando os olhos.

Munihr, percebendo o desdém sobre a face do ruivo, ofereceu-as a ele como um presente. Kiran aceitou, pegando as moedas e olhando para elas com atenção.

— E o que eu faço com isso? — perguntou, ainda demonstrando certo ceticismo.

— Guarde para tomar uma bebida. — sugeriu o lunar.

Kiran o encarou incrédulo. Ele não esperava que a sugestão fosse tão mundana e trivial em meio a um lugar tão repleto de magia e mistério como aquele.

Com um suspiro, guardou as moedas em seu bolso, considerando a idéia de realmente pegar uma bebida. Já estava preso ali naquele mundo, o que mais tinha a perder?

Ainda na feira daquele cidade, além das maravilhas mágicas, o solariano também notou uma rica presença da cultura humana. Era fascinante ver como elementos e referências do mundo mortal encontravam seu lugar naquele ambiente místico.

Em uma das barracas, Kiran avistou um expositor que exibia antigas pinturas retratando paisagens deslumbrantes, retratos de pessoas famosas e cenas históricas. Essas obras de arte capturavam a essência da cultura humana, transmitindo emoções e contando histórias através de pinceladas e cores vibrantes.

Outra barraca chamou sua atenção com uma coleção de livros antigos e pergaminhos. Kiran folheava as páginas amareladas e cheias de sabedoria, encontrando contos épicos, poesias encantadoras e ensinamentos de filósofos e pensadores. Cada obra era um tesouro que preservava a herança cultural da humanidade.

Enquanto explorava mais profundamente a feira, logo se deparou com um palco onde músicos e artistas se apresentavam. O som de instrumentos familiares, como violinos e guitarras, misturava-se com melodias exóticas e batidas ritmadas. A dança dos artistas evocava movimentos fluidos e graciosos, trazendo à vida tradições culturais de diferentes partes do mundo humano.

No entanto, ao perceber que a maior parte dos visitantes e moradores eram mortos que já tinham vivido algum dia, Kiran sentiu uma mistura de fascinação e inquietação. Ele compreendeu que aqueles que agora habitavam a Cidade Lunar ainda carregavam fragmentos de suas vidas passadas, suas histórias e conhecimentos.

Os vendedores espirituais, com suas aparências etéreas e voz sussurrantes, compartilhavam histórias e experiências do mundo humano. Eles traziam consigo a sabedoria e a riqueza cultural que haviam acumulado durante suas existências terrenas. Era como aquele reino fosse um lugar de encontro entre o mundo dos vivos e dos mortos, onde a cultura humana continuava a ser valorizada e celebrada.

Kiran sentiu uma mistura de respeito e curiosidade em relação ao seres das sombras. Reconhecendo que, embora fossem seus inimigos, eles estavam conectados à sua humanidade passada, trazendo consigo uma essência única que enriquecia ainda mais a experiência cultural daquele novo mundo descoberto por ele.

...

Capítulo 7

Juntos, avançaram pela cidade até encontrarem um estabelecimento ao ar livre, onde mesas se espalhavam como notas musicais em uma partitura, algumas abrigadas no aconchego do interior. No entanto, a aparente hospitalidade do lugar era contrastada por um caos encantador, como se um tornado tivesse passado por ali, revirando tudo em sua passagem.

— Isso é... — Kiran começou a dizer, incapaz de descrever o que via.

— Meu bar preferido! — Munihr completou com entusiasmo, sentando-se à mesa e indicando o assento vago ao lado.

Kiran olhou para o lunar, incrédulo.

— Desde que permaneça ao meu lado, ficará tudo bem. — disse Munihr, com um sorriso tranquilizador.

Enquanto se acomodavam, o bar parecia ganhar vida própria. O ambiente exalava uma atmosfera mágica, como se os móveis e objetos estivessem impregnados de histórias e memórias. O dono do estabelecimento, um espectro translúcido envolto em névoa, acolheu-os com um aceno amigável, trazendo uma bandeja com duas xícaras fumegantes de chocolate quente e biscoitos.

— Obrigado. — Munihir agradeceu ao homem de meia-idade — Espero que aprecie o sabor do chocolate.

— Comida do mundo humano? — questionou o ruivo, ceticamente. — Biscoitos e chocolate? Você é uma criança?

Munihr sorriu, compreendendo a perplexidade do solariano. Ele sabia que as aparências podiam enganar e que, por trás da simplicidade aparente, havia um universo de experiências e sabores a serem explorados.

— Pode ser que acredite que uma civilização tão abandonada como a nossa não ostente grandiosas construções e comércios vibrantes — ponderou. — Embora sejamos reservados e pouco comunicativos com o exterior, percebe-se que vocês, os solarianos, experimentam a ignorância.

Kiran franziu o cenho, imerso em uma reflexão profunda, enquanto saboreava o chocolate quente com a mente mergulhada nas ondulações daquele sabor reconfortante. Enquanto a bebida aquecia sua alma, seus olhos vagavam pelo ambiente, capturando os movimentos em um balé suave e silencioso.

Do outro lado da mesa, Munihr que havia terminado de comer, sereno como uma estátua de ébano, apoiou-se sobre os cotovelos e fixou seu olhar no príncipe. Seu rosto, normalmente impassível, parecia esconder um mundo de mistérios e emoções indizíveis.

Um silêncio prolongado envolveu-os, como uma partitura pausada, esperando a nota perfeita para ecoar. Kiran sentiu o incômodo crescer dentro de si, agitando sua mente e fazendo com que as palavras brotassem com um toque de irritação.

— O que foi? — indagou.

O lunar permaneceu em silêncio, seus olhos profundos e misteriosos fixos em Kiran, como estrelas brilhantes escondidas em uma noite nublada.

O vento sussurrou entre eles, trazendo consigo um ar de mistério. As sombras dançavam ao redor, como se o próprio universo estivesse esperando pela resposta que brotaria dos lábios de Munihr.

Então, com a serenidade de um rio fluindo, ele finalmente quebrou o silêncio poético. Sua voz, suave como um sussurro etéreo, deslizou pelas palavras como notas musicais.

— Você não me parece muito contente. O que trás esse olhar abatido, meu sol? — disse.

Kiran baixou o olhar, sentindo-se vulnerável diante das palavras do lunar. A expressão de irritação em seu rosto se desfez gradualmente, substituída por uma melancolia momentânea.

— É como se houvesse um peso em meu coração. — confessou, suas palavras saim por vontade própria, carregadas de uma tristeza profunda. — Tenho buscado respostas, mas elas parecem escapar por entre meus dedos. Sinto-me perdido, como se estivesse vagando em um labirinto de incertezas.

Munihr inclinou-se ligeiramente para a frente, enquanto sua presença era envolta em compreensão e empatia.

— Os caminhos da vida são muitas vezes intricados e desconcertantes.

As palavras do homem lunar penetraram nas camadas mais íntimas da alma de Kiran, trazendo um vislumbre de suas várias noites de insônia.

— Mas como posso encontrar o caminho certo? — questionou o ruivo, buscando o brilho reconfortante das estrelas nos olhos de seu inimigo.

Munihir sorriu gentilmente, como se conhecesse os segredos do universo.

— A certeza nem sempre se encontra em respostas claras e definidas.

O solariano ergueu seu olhar cansado, encontrando um lampejo de serenidade nos olhos profundos de Munihr. Sua presença, tão marcante quanto as estrelas em uma noite enluarada, despertou uma centelha de esperança dentro do coração atribulado de Kiran. No entanto, mesmo diante dessa presença reconfortante, as dores que o assombravam não se dissiparam por completo.

Um sorriso forçado adornou os lábios de Kiran, uma tentativa frágil de esconder as cicatrizes que o tempo e as adversidades deixaram em sua alma.

Os problemas pareciam se acumular sobre seus ombros, pesando como uma carga insuportável. Noites sem sono haviam se tornado constantes, enquanto as responsabilidades de seu papel como guardião da luz o sobrecarregavam. Solaria havia sido atacada, o campanário que tanto amava agora era apenas uma ruína, e a vergonha de sua derrota iminente diante de seu inimigo persistia. Ainda assim, uma pitada de ironia permeava sua derrota, pois fora seu inimigo quem o resgatara. Agora, diante dele, estendia-se um mundo sombrio e desconhecido, um Reino dos Mortos que o impedia de retornar ao seu lar até o amanhecer. Kiran carregava a culpa de suas falhas, envergonhado diante de si mesmo. E diante de tantos problemas, o que estava fazendo? Tomando chocolate e passeando como-se não houvesse o amanhã.

As lágrimas ameaçavam transbordar, quando, de repente, Munihr se ergueu e segurou a mão de Kiran, puxando-o com determinação.

— Hey! — protestou o ruivo, com resistência enquanto era arrastado por Munihr. — Para onde você está me levando?

— Venha comigo. — respondeu o lunar, com sua voz suave e envolvente.

— Você vai me arrastar pela cidade novamente? — Kiran perguntou, nítida a irritação em suas palavras.

Munihr se virou, encarando o ruivo com um olhar intenso, como se lesse seus pensamentos mais profundos.

— Hoje, meu sol, você é meu convidado. — disse. — Não posso permitir que se afunde no tédio e na angústia assim. Já se esqueceu que sou o seu guia?

Uma vez mais, Kiran se viu sem palavras, incapaz de resistir à determinação de Munihr. Uma mistura de curiosidade e resignação encheu seu coração, permitindo-se ser guiado por esse ser misterioso que parecia entender as profundezas de sua alma.

...

No coração da Cidade Lunar, cercado por sua paisagem encantada, erguia-se um castelo em ruínas, um testemunho silencioso de grandiosidade perdida. Suas torres altas e imponentes, antes orgulhosas, agora se curvavam em angústia, suas paredes marcadas pelas cicatrizes do tempo.

Apesar de sua decadência, o castelo ainda emanava uma beleza melancólica. Arcos quebrados e janelas vazias permitiam que a luz prateada da lua penetrasse, criando uma atmosfera de mistério e encanto. Efeitos de heras entrelaçadas subiam pelas paredes, como se a natureza buscasse abraçar e curar as feridas da estrutura.

Kiran se perguntava como não havia avistado aquela maravilha antes. Ele havia desperdiçado tempo demais, envolto nas preocupações que assolavam aquela cidade de monstros e seus mistérios.

No pátio interno, um jardim outrora exuberante era agora dominado pelo manto verdejante da natureza selvagem. Flores exóticas desabrochavam e plantas raras floresciam, criando uma sinfonia de cores e perfumes que se misturavam ao ar noturno. No centro do jardim, uma fonte de pedra, outrora viva, agora permanecia seca, guardando memórias de dias em que a água dançava e refletia a luz lunar.

Kiran e Munihr avançaram com cuidado pelos corredores do castelo em ruínas, cada passo ecoando a história esquecida que ali repousava. As paredes desgastadas pareciam sussurrar contos antigos de reis e rainhas, de batalhas épicas e amores perdidos. A atmosfera enigmática do castelo despertava curiosidade e reverência, como se estivesse prestes a revelar segredos há muito ocultos.

Em meio ao silêncio e ao eco de suas próprias respirações, Kiran contemplou a majestade desvanecida do castelo. A beleza em ruínas era um lembrete poderoso de que tudo na vida é efêmero, sujeito ao fluxo do tempo. No entanto, mesmo em sua decadência, o castelo ainda mantinha vestígios da grandeza que um dia possuíra, uma lembrança eterna de um passado glorioso.

Após adentrarem o jardim, o único refúgio onde as cores ainda prevaleciam, seguiram por um caminho curto que os conduziu a um lago de águas turvas. Nesse espelho líquido, onde os contornos eram indistintos

No jardim dos encantos, onde as cores bailavam em perfeita harmonia, Kiran e Munihr trilharam um caminho sinuoso que os conduziu à margem de um lago de águas turvas. Naquele espelho líquido, onde os contornos se dissolviam como sonhos fugazes, Kiran hesitou, envolto pelas incertezas que afloravam em seu coração.

Um suspiro escapou de seus lábios, ecoando no silêncio tranquilo daquele lugar enigmático. Ele questionou a razão pela qual Munihr o havia guiado até ali, em meio àquela paisagem onírica, onde a realidade e a fantasia se entrelaçavam.

O lunar ergueu os olhos em direção ao céu e um sorriso sereno desenhou-se em seus lábios.

— Olhe. — disse ele, com suavidade.

Aos poucos, os primeiros raios de luz despertavam além do horizonte adormecido, derramando-se como ouro líquido sobre a superfície plácida do lago. A magia do amanhecer começava a se desdobrar diante dos olhos de Kiran, transformando as águas turvas em um espelho encantado.

Com cautela, aproximou-se do lago, sentindo o coração pulsar em sintonia com o ritmo da natureza. Seu reflexo ondulante fundia-se com as cores do novo dia, criando um quadro vivo de emoções e sensações. Naquele instante, a realidade se confundia com os sonhos, e Kiran encontrava-se imerso em um universo de encanto e descoberta.

Como um dançarino seduzido pela melodia dos primeiros raios de sol, o príncipe sorriu, seus olhos brilhavam como estrelas cadentes. Munihr, silencioso observador, testemunhou a transformação que ocorria em seu convidado, sabendo que aquele momento era uma dádiva única, um vislumbre da magia que permeava o Reino dos Mortos.

E assim, ao som sutil de uma melodia distante, cujas notas flutuavam no ar como pétalas de rosas, o solariano mergulhou profundamente na atmosfera envolvente do lago, trazendo a si, uma sensação nostálgica de tempos passados.

Para mais, baixe o APP de MangaToon!

novel PDF download
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!