Itálico - Pensamentos de Jinx
Itálico e negrito - Pensamentos de Caitlyn
Para Jinx o pior que poderia ter acontecido em sua tarefa de explodir a universidade de Piltover era ficar trancada com a xerife entre os escombros de sua gigantesca obra de destruição, mas para Caitlyn era uma vitória finalmente ter conseguido prender a criminosa mais procurada de ambas as nações vizinhas.
Aproveitando-se de um bloco de concreto que caíra sobre o tornozelo da garota, rapidamente a comandante da força policial a algemou em uma barra de ferro da estrutura.
O espaço em que estavam era pequeno e mal cabia a oficial de pé em um dos pontos, cheio de poeira e nenhuma ventilação, era provável que logo o ar ficasse escasso, mas tinha certeza de que seus homens trabalhariam incansavelmente até tirá-las do subterrâneo do prédio despedaçado.
Para a mais velha era um alívio que a garota presa não estivesse sangrando tanto, então tinha uma chance de que seus ferimentos não fossem graves.
— Pare de andar de um lado a outro, eu não quero ter que ficar sem ar por sua causa, chapeleira estúpida — a voz irritante e aguda se fez presente muito tempo depois.
Caitlyn apenas direcionou um olhar sério para a garota de cabelo azul claro, mas não achou que valeria alguma resposta.
— Até posso ver porque a minha irmã me trocou por você, daqui posso sentir o cheiro perfumado da burguesia imunda que enriquece à custa dos ratos de Zaun, você realmente cheira bem — sem obter resposta, mas ainda destinada a irritar a sua única companhia, Jinx continuou — E analisando bem é compreensível que ela queira uma garota mimada com aparência de uma boneca de estante para foder incansavelmente com gemidos agudos, a cena não me parece tão ruim agora.
Recebeu um olhar de reprovação da policial dessa vez, que deu um sinal claro de que estava começando a se irritar travando sua mandíbula, fazendo a outra até arriscar que logo diria algo.
— Quem diria que a xerife teria um fetiche por ser humilhada na cama por mãos enormes — a mais nova abriu um sorriso, se divertindo ao ver que a mulher estava prestes a perder o controle.
Não demorou até que recebesse um olhar mais sério da outra, assim como o seu tom de voz grave.
— E o que a faz pensar que eu, que comando os homens da força policial de toda Piltover, sou quem recebe as ordens em um quarto?
— Ah, não? Tem cara de quem gosta de ser espancada.
Caitlyn fechou o punho por um momento, contendo sua irritação ao ver que não valia a pena e que Jinx fazia de propósito, mas a garota de Zaun continuou.
— Não? É, talvez você seja certinha demais pra isso mesmo, tem razão.
— Por que parece tão interessada na forma como faço sexo?
Dessa vez Jinx gargalhou, fazendo o som abafado de sua risada ecoar pelo pequeno ambiente vazio.
— Como você deve ter notado, xerife, eu não tenho muito o que fazer porque você me algemou! Além disso, estou completamente certa — a criminosa tentou imitar o tom de voz mais grosso e sério da outra mulher — "Por que parece tão interessada na forma como faço sexo" Quem fala assim? Parece que estou lendo um livro de biologia daqueles de quando as crianças estão prestes a entrar na puberdade e precisam aprender sobre isso com termos científicos. Olhe só onde Vi se "meteu" se é que me entende! Que piada!
A policial mordeu o lábio por dentro e desviou o olhar, voltando a andar devagar com a única intenção de esconder seu rubor, enquanto refletia o fato de que tivera uma educação mais requintada, mas que as realidades eram outras na periferia e agora se sentia de certa forma humilhada por uma garota mais jovem, que parecia muito mais descolada no assunto que tratavam.
— E por acaso importa o jeito como falo? Pensei que as ações pesassem mais nessa questão — finalmente deixou escapar a de cabelos azul escuro, mas sem perder o tom sério para não demonstrar que aquilo a atingira de alguma forma.
Por outro lado, Jinx se divertia muito e exibia o mesmo sorriso doentio, enquanto encarava a outra de uma forma quase sádica.
— Vocês não dizem nada? Sério? Fazem isso em silêncio? Minha nossa! É pior do que eu imaginava. Deve ser mais interessante a diversão com uma porta!
Nada fez a xerife além de cruzar os braços e revirar os olhos, transparecendo seu tédio ao ter decidido que não continuaria com aquela discussão sem sentido. Mentalmente, tinha que admitir pra si mesma que era melhor que Jinx falasse qualquer coisa, já que não tinha qualquer sinal de que estavam tentando resgatá-las no silêncio absoluto que aparentava ter o lado de fora.
— Diga você então, não quero morrer de tédio nesse lugar — bufou a de cabelo mais claro.
— Bom, tenho certeza de que a Vi não está do meu lado por esse motivo, embora o sexo seja incrível também — Caitlyn respondeu com um sorriso malicioso dessa vez, afirmando que não se deixaria levar pela conversa de um criminoso e mostrando destreza mesmo na situação em que estava.
A jovem arqueou uma sobrancelha, mostrando que havia sido também tomada pelo tédio com o que acabava de ouvir. Respirou fundo e desviou o olhar, mantendo o silêncio por algum tempo.
— Você é chata — confessou por fim.
— Ah, é mesmo, Jinx? Que coincidência, penso o mesmo! Acho que vou arrumar alguma coisa para tampar sua boca enquanto estamos aqui — assim que terminou, a xerife já fez alguns movimentos procurando algo em si mesma.
— Não, não, não... Está bem, eu vou me comportar! Prometo não falar mais sobre como minha irmã a trata como a cadelinha obediente que você é na cama! Eu juro!
Jinx fechou os lábios e os pressionou, com uma expressão que parecia pedir desculpas pelo que fizera, mas ainda com um olhar travesso de quem queria rir.
A policial avançou na direção da mais nova, segurando seu pescoço com uma das mãos de forma que lhe faltasse o ar e pela primeira vez mostrou os dentes, realmente com raiva.
— E eu juro que se disser mais uma palavra, a cadelinha acorrentada aqui será você! Ninguém vai ligar de conferir a sua integridade física depois de todas as vidas que você tirou, eu posso garantir isso!
O sorriso divertido voltou aos lábios de Jinx, acompanhando seu olhar doentio e assustador.
— É mesmo? Então a xerife agora tem desejos por mim também? O que diria seu pessoal, hum? E sua família que a criou tão bem, se eles existissem? O que diriam de sua filhinha tão comportada agora — questionou e em seguida fez um tom de voz ainda mais fino, beirando uma inocência encenada — Com você assim querendo se aproveitar de uma garotinha algemada e indefesa, que nem tem ideia se já atingiu a maioridade ou não — brincou com outro sorriso nos lábios.
— Você me parece bem madura ao cometer todos esses crimes por anos, não tem nada de indefesa.
— Poxa, agora você me pegou, mas ainda continuo algemada e portanto não poderia me mover, se você resolvesse agir contra a lei que tanto defende tocando nesse corpinho.
Caitlyn já não a encarava e permaneceu em silêncio, a última coisa que queria era alimentar a mente lunática a sua frente.
— Sabe esse ferimento que tenho na altura da costela bem aqui — a garota apontou com o queixo para o local, tendo por um instante a atenção da mulher mais velha — Eu consigo sentir o sangue escorrer lentamente e já frio, isso tá me enlouquecendo, sério — Caitlyn já pegava em seu traje um lenço que trazia, quando a fala da outra a interrompeu — Adoraria ver você passar sua língua quente nele, limpando tudo e deixando um rastro brilhante de saliva bem devagar, é uma ótima visão.
Uma respiração pesada escapou de Caitlyn, enquanto desviava o olhar, confundindo Jinx com uma possível expressão de tédio novamente, ou apenas desconforto, mas sua pele estava visivelmente arrepiada, de repente.
— Hmmmmm, parece que a xerife também aprova a ideia. Viu? Eu sabia que você adorava bancar a submissa também.
— Eu prefiro sufocar até a morte aqui mesmo.
— Você perde a linha tão fácil — a voz de Jinx mudou, tornou-se séria, até parecendo normal, enquanto falava com os olhos violeta fixos na mais alta — Consigo tirar você do sério com tão pouco! É verdade que você é reservada, apesar do gosto que tem por mulheres, tão ridiculamente discreta e respeitável, que ninguém nunca ousaria questionar sua autoridade, ou profissionalismo, mas agora sei que seus desejos estão guardados aí dentro dessa carcaça de prudência e raciocínio, mesmo que bem fundo. Você é um ser desprezível e nojento!
Era do conhecimento da xerife que a garota faria de tudo para a atingir enquanto estivesse presa e em desvantagem, mas sua mente era altamente treinada para a ignorar também, então suas palavras não tinham efeito em sua mente, mesmo que seu corpo a traisse em alguns momentos.
A mais nova tinha cessado com as provocações por um tempo e cantava algo muito baixo e incompreensível, quando outra placa de concreto desabou, derrubando Caitlyn, que teve a coxa perfurada quase completamente por outra fina barra de ferro da estrutura. Com um gemido alto de dor, a mulher agora se via no chão, pressionando o membro atingido com força e tentando movê-lo.
Assim que passou pela surpresa da cena, Jinx se colocou a rir do que via descontroladamente. Não demorou mais do que alguns segundos para deixar as algemas que já havia conseguido abrir de lado e se aproximar para ver melhor a criatura irritada e ferida com quem dividia o confinamento forçado.
— Você... Você escapou! Estava com o tornozelo e os pulsos livres todo esse tempo — reclamou a xerife com indignação e cansaço, ao ver Jinx se aproximar mancando.
— Não pretendia estragar a surpresa tão cedo, apenas quando estivéssemos livres pra que eu pudesse fugir, mas... Tan daaaan — abriu os braços com um sorriso, mas logo sua expressão trocou para nojo e desprezo — Arrgh, isso parece horrível! Está sangrando como uma vaca no abatedouro.
Caitlyn constatou que realmente sangrava ao tencionar o músculo e rapidamente tirou o cinto, prendendo sua coxa com o máximo de força que conseguia para impedir o sangue de circular.
— Legal, talvez você morra mais cedo e vou ficar sozinha nesse inferno de lugar! Ótimo — Jinx bufou mais uma vez.
Estavam sentadas relativamente perto agora e a criminosa encarava a outra mulher, que suava e parecia cada vez mais fraca. Era divertido ver como parecia que sua alma tinha deixado o corpo, ou seu cérebro não mais funcionava, mas de repente, a cabeça pendeu de forma que a policial parecia perder os sentidos aos poucos.
— Não, não, não!! Não morra ainda, sua imbecil! Se tivesse ficado perto da coluna onde eu estava, teria escapado. Foi assim que conseguimos nos manter vivas, mas seu traseiro rico e desprezível não quis se aproximar de mim e olha onde está agora!
Com uma das mãos, a mais nova tentava segurar o queixo de Caitlyn e mantê-la acordada, mas só recebia alguns olhares perdidos.
— Como eu vou sair daqui sem a sua ajuda, han? Sua viada de elite com essa bunda branca rica — logo depois de xingar, os olhos violeta aguardaram atentos, mas a outra já não tinha mais consciência — NÃO!!! GRRRR... Tá bem, eu vou deixar só o viada de elite, até porque sua bunda deve ser menos branca do que a minha! Olha, eu nem me importo em que traseiro você enfia esse maldito rosto bonito, só... — dessa vez a voz saiu histérica, do fundo da garganta e entre os dentes pontiagudos de Jinx — ME TIRE DESSA MERDA DE LUGAR SUA XERIFE INÚTIL!
A garota sacudiu o corpo inerte sem qualquer resposta e só então passou a encarar a barra de ferro que atravessava a coxa da policial.
— Use a droga de um desses seus aparelhos para pedir ajuda, ou grite com algum imbecil sem cérebro lá fora, mas tire a gente daqui!!!
Sem perder tempo, a criminosa vasculhou os pertences da xerife, encontrando nada além de sua pistola pessoal. Apontou a arma para o rosto sereno desacordado, ouvindo vozes que diziam para matá-la ali mesmo.
"Essa infeliz inútil atrapalhou seus planos por tempo demais! Ela tem uma mira realmente boa e um rosto muito perfeito, mas nada daria mais prazer do que matá-la agora!"
"Não, não... Matá-la enquanto consciente seria melhor, vendo seus olhos amedrontados diante da morte e sabendo que eu seria a responsável, mas se é só isso o que temos, melhor aproveitar."
"Claro que seria muito melhor atirar em sua cabeça com uma das minhas armas, elas esperaram por isso tanto quanto eu, merecem isso... Grrr..."
Com os olhos fechados em meio aos braços, Jinx se contorceu e golpeou a própria cabeça algumas vezes, tentando afastar os pensamentos atraentes de Caitlyn com um buraco bem no meio da testa.
Sua mente trabalhou rápido, quando olhou ao redor, calculando as possibilidades. Até tentou cerrar a barra de ferro com uma pedra, mas gastar o metal levaria muito tempo e energia, então começou a gastar o concreto, que já não era muito firme e se esfarelava, conforme raspava a pedra nele. Logo conseguiu soltar o concreto da barra de ferro, mas não sabia ao certo quanto tempo tinha se passado.
Demorou muito até que Caitlyn finalmente acordasse, a mais nova chegou a pensar que estava morta, mas ouviu um sussurro baixo.
— Obrigada...
— Hã? Isso não fui eu. O concreto quebrou com a queda. Essa biblioteca subterrânea já é bem velha, sabe lá quanto tempo tem.
Era notável o esforço da de cabelo azul claro em tirar as pistas do que havia feito, mas a policial encarava os dedos empoeirados de um cinza claro da garota com seu esmalte gasto. Era fato que as unhas compridas e mal pintadas estavam também tomadas pelo pó do concreto e Jinx percebeu o olhar em si.
— É que preciso usar você pra sair daqui viva, seu cadáver ambulante!
Uma completa escuridão tomou conta do lugar quanto a lanterna de Caitlyn apagou.
— Ah, mas... Não! Que droga! Você não recarregou essa coisa antes de trazer?
— Sim, estava carregada. O que significa que devemos estar aqui por mais de 8 horas.
— Eu estava pensando em usar ela pra fritar seu corpo, quando estivesse com fome, agora vou ter que devorar você assim mesmo.
— Tem um isqueiro e algumas barras de cereais em algum compartimento na lanterna, usava quando ia caçar. Você pode comer, ou usar o isqueiro pra me fritar, tanto faz — a voz da xerife era desanimada, como se tivesse desistido.
— Hmmmm, não! Prefiro destruir esse rostinho perfeito com um monte de balas que vou enfiar na sua cara quando sairmos daqui! Vi vai ter outros buracos disponíveis pra brincar.
— Rostinho perfeito, é?
Caitlyn respondia enquanto tentava manter sua mente acordada depois da exaustão do seu corpo submetido à dor intensa por tanto tempo e por isso preferia conversar, mesmo que coisas sem sentido.
— Você escondeu analgésicos, comida e isqueiro dentro de uma lanterna? Sério? Como? Que tipo de bestas você caçava?
Jinx estava admirada, mas agradeceu mentalmente pelo que encontrou.
— Como sabe que são analgésicos?
— E o que seria? Remédio pra doidos? Eu já tentei, não funcionaram.
— Pode ser veneno, eu não recomendo ingerir.
— Diz isso porque os quer. Deve estar se contorcendo de dor com essa coisa na perna.
— Na verdade não sinto nada, mas estou começando a ficar com fome.
— Quem disse que vou dividir os chocolates? Eu peguei primeiro.
— Não, tudo bem. Posso morder alguma parte sua. Você mesma disse o quanto era saborosa horas atrás, lembro bem.
— Sua pervertida maluca! Não encosta em mim, toma o seu chocolate!
Sem hesitar, a mais nova jogou uma das barrinhas de cereal na policial, que embora não tivesse emitido nenhum som, tinha certeza de que estava se contendo para não rir.
— E só fiz isso porque tive muito trabalho para tirar você desse bloco de concreto, não quero que vire uma múmia aqui embaixo depois de tanto esforço da minha parte, então coma.
— Aham!
Não demorou muito para que a policial perdesse a consciência de novo. Tantos dias de trabalho exaustivo e noites sem dormir investigando um caso difícil cobravam seu preço, ao Caitlyn levar seu corpo ao limite.
Estar sozinha fez com que Jinx perdesse o controle. A garota esguia sentou sobre o corpo deitado no chão, segurando entre suas mãos o rosto frio da mais velha.
— Você não pode morrer, eu mesma vou matar você. Como posso fazer isso se estiver morta, hum?
Uma das unhas deslizou pela carne da detetive, deixando um rastro de sangue conforme a maluca afundava em sua pele pela extensão da bochecha.
Sem qualquer um de seus planos em vista de funcionar, a de cabelos claros se colocou a agir por outros meios. Rapidamente tirou as roupas de Caitlyn e as vestiu, deixando a policial com suas próprias vestes bem mais apertadas, já que Jinx era mais magra.
— Como eu vou tirar esse animal estúpido daqui? Grrr... Não! Não me agrada nem um pouco que outra pessoa tenha tido essa vitória. Nem foi uma pessoa, foi a porra de um bloco de concreto — a jovem falava consigo mesma, uma forma simples de não se deixar levar pela situação e funcionava muito bem.
De forma ágil, tirou a pólvora de cada uma das balas que Caitlyn trazia e logo fez um pequeno explosivo com o que tinha restado da lanterna, tudo sem enxergar, mas seus olhos viam apesar de tudo em sua mente criativa, que despertara uma genialidade incomum que a fizera escapar de situações até mais difíceis no passado. O explosivo funcionou perfeitamente com o isqueiro, que só lembrou de ter em sua posse depois.
— Você é mesmo um jegue, ainda bem que essa outra imbecil não viu nada! Fez a porra toda no escuro podendo iluminar tudo! Bom, eu não teria mãos suficientes pra tudo mesmo assim — sorriu vitoriosa.
Ao detonar a pequena bomba no canto vazio do espaço em que estavam, mais escombros caíram, revelando uma pequena entrada de ar. Encarando a abertura, Jinx conseguiu ver parte das escadas que certamente dariam acesso ao andar de cima, que se tivessem sorte, estaria menos destruído.
Demorou para retirar toda a pilha de concreto, mas conseguiu se libertar e até respirar melhor. Jinx já estava subindo os primeiros degraus quando olhou para trás e viu as botas da xerife com seu corpo ainda imóvel.
— Arrrrgh... E como você pensa que conseguiria subir as escadas carregando um hipopótamo desse tamanho, gênio?
Falava com sua própria voz em sua cabeça ao se ver voltando para onde Caitlyn estava ridiculamente vestida com suas roupas apertadas, mas mantendo ainda as botas que usava cobrindo acima do joelho com grandes fivelas de bronze.
Foi com uma dor latente e insuportável em sua perna que a xerife acordou, se sentindo ainda tonta e enjoada pela sensação do ferimento, mas demorou muito a conseguir abrir os olhos. A visão turva não reconhecia o teto cheio de vigas de metal, mas mais parecia uma fábrica abandonada e cheia de ferrugem. Seus olhos não conseguiam se manter abertos, mas encarou a própria coxa desnuda com o ferimento aparentemente fechado, antes de adormecer completamente mais uma vez.
Da segunda vez que acordou, Caitlyn já estava um pouco mais desperta, embora parecesse sob o efeito de alguma medicação que a deixava mole e sonolenta. Conseguiu se sentar devagar e constatou que estava nua e sozinha. Nas linhas costuradas em sua pele, responsáveis por fechar a ferida podia-se ler "HA HA HA HA" com o cordão preto formando letras. Lembrou-se vagamente do desabamento onde ficou presa com Jinx e por um momento constatou que deveria ser a responsável também por tirá-la de lá.
— Você tinha que ver a sua cara — o jeito irritante e estridente de falar foi reconhecido pela morena que levantou seu olhar para as vigas novamente, encontrando a figura pálida com deboche — Foi uma ótima ideia deixar você pelada, mesmo não precisando. A cara de alguém vulnerável, confusa e assustadinha foi impagável.
Caitlyn tentou puxar seus braços, mas dessa vez era ela quem se encontrava algemada em um cano de metal que fazia parte do sistema de água ou gás do antigo prédio.
— Você me salvou — disse a xerife com voz fraca, quase inaudível.
— Salvar você? Não — Jinx riu — Uns caras salvaram você e depois roubei você deles pra me divertir — mentiu — Já viu quanto você pesa, girafa peituda?
Travando a mandíbula outra vez, a policial tentava não pensar tanto no quanto sentia sua coxa doer, mesmo que a aparência do local estivesse horrível, arroxeada e visivelmente inflamada.
— Ah sim, eu ia roubar morfina pra trazer também e deixar você viciada em algo que te fizesse dormir pelo resto da vida, mas suas expressões de dor são UMA DELÍCIA!
Puxou o ar com dificuldade entre os dentes antes de sua tentativa de se levantar, no começo, totalmente falha, mas Caitlyn insistiu.
Assim que sua perna machucada tocou o chão e o peso de seu corpo foi colocado sobre o músculo danificado, soltou um grito contido, mas não seria suficiente para pará-la. Andou até uma mesa que havia por perto, verificando as medicações ali, assim como um bisturi, agulha e um vidro de álcool.
"Desde quando aquela maluca tem algum conhecimento sobre medicina? Bem, parece útil com todos os buracos de bala que já deixei no seu corpo."
Os passos que deu até a janela pareceram durar uma eternidade, que a cada vez que seu pé tocava o chão, fazia a dor se espalhar por todo o corpo de forma quase insuportável, provocando sons involuntários, gritos, urros, rosnados desesperados.
Embora a policial pensasse estar sozinha, a outra garota a encarava de cima no escuro, permanecendo sentada nas estruturas metálicas do teto alto.
Seus olhos acompanhavam a morena e estavam atentos para o quanto a xerife parecia destruída. Machucada, dopada, com fome, com frio pela sua nudez de forma que sua pele ganhava uma leve coloração azulada, mas ainda assim ela tentava escapar com determinação.
"Talvez não seja assim tão inútil."
Jinx deitou o rosto para o lado, admirando as ações, mesmo que inúteis da mulher de cabelos escuros até que viu a xerife se jogar na saída de lixo intencionalmente, o que dava para muitos andares abaixo do lado de fora, segurando apenas um pano onde se enrolou no momento da queda.
— CAITLYN!!!
O grito de Jinx pareceu até desesperado, enquanto segurava nas barras de metal para pular no piso. Era a primeira vez que pronunciava aquele nome, mas havia saído sem que pensasse a respeito.
Do lado de fora, a mais velha já estava um pouco distante de onde havia caído com os lixos da fábrica, que por sorte, eram mais tecido empoeirado. Caitlyn andava com a mesma determinação, mesmo que não conseguisse correr. A mais nova a seguiu, gritando em sussurros e gesticulando a sua frente, enquanto andava de costas.
— Você enlouqueceu? Aquele chapéu pressionou seu crânio por tempo demais? Mais da metade dessa cidade quer a sua cabeça e a outra metade usaria com prazer o seu corpinho rico e cheiroso, sua maldita imbecil! Por que acha que vai conseguir qualquer coisa saindo nesse estado?
Kiramman se apoiou na parede por um momento, recuperando o fôlego que sua respiração ofegante acusava entregando seu esforço físico, mas os olhos azuis ainda encaravam a figura esguia da jovem com uma fúria quase palpável.
— Quer saber? Senti como se fôssemos iguais dentro daquele maldito buraco de ratos onde ficamos presas porque nenhum daqueles porcos estúpidos vieram ao seu encontro pra te salvar e não é como se alguém também fosse procurar por mim lá dentro — a de cabelos azul claro colocou as mãos na própria cintura e se inclinou, aproximando do rosto da xerife — Ninguém vai vir atrás de você, eles já teriam feito isso antes, não é como se você tivesse sido sequestrada, o prédio apenas desabou onde você tinha acabado de ser vista. Eles querem você morta, sei lá por qual motivo, mas nenhum daqueles idiotas tinha intenção de te ajudar!
— Eu preciso encontrar os desaparecidos — Caitlyn se limitou a dizer com certa dificuldade.
— Olha só pra você, faraó depois de enterrado! Não consegue dar um passo sem gemer!
Sem esperar uma resposta, a garota se aproximou, tentando levantar Caitlyn ao colocar um braço por trás de suas coxas, mas a tentativa de levantar a mulher foi totalmente frustrada, arrancando até uma risada da policial. Jinx a largou e encarou séria o riso fácil que agora a xerife tentava controlar.
— O que foi? Eu sou forte! Você é que anda comendo muitos doces naquela delegacia! Talvez eu esteja só um pouco cansada, sem dormir e sem comer quase nada, mas meu lança mísseis pesa mais do que você!
A resposta só fez a policial rir mais, mas logo parou e voltou para uma expressão leve de dor.
— Muito engraçado! Fica aí então, vai se foder!
Sem dizer mais nada, a jovem deu as costas, pegando um caminho diferente que a deixava cada vez mais distante da fábrica.
Não demorou muito para que os arruaceiros de Zaun encontrassem Caitlyn quase desnuda e machucada, como um alvo fácil. Os três sujeitos cercaram a mulher, a fitando dos pés a cabeça em meio a risadas cheias de malícia.
— Olha só se não é a xerife de Piltover em uma situação bastante conveniente — o primeiro disparou, mas sem se mover.
Já era noite e o perigo era quase tangível nas ruas escuras, mas nem estando cercada, a policial se intimidou, mostrando um olhar concentrado e ao mesmo tempo esnobe.
Inicialmente Jinx, que o tempo todo a acompanhava por cima dos telhados, achou a cena curiosa e engraçada, recebendo a situação com um sorriso travesso.
Os homens tentaram golpear Caitlyn, mas ela acertou de forma habilidosa o cano de sua pistola por baixo do queixo do primeiro, acertando sem dificuldade uma cotovelada no que tinha tentado se aproximar por trás. Mesmo que não os tivesse derrubado de forma definitiva, isso os havia deixado furiosos e Jinx ainda mais curiosa.
O terceiro homem, em vez de tentar golpeá-la, levou a mão até o tecido que permanecia em volta de seu corpo nu na intenção de revelar sua nudez ali mesmo. Os olhos da de cabelos claros estavam arregalados, misturados em sua expressão com um sorriso doentio outra vez.
"Isso seria tão incrível! Esses porcos colocando suas mãos na xerife bem na minha frente! O que será que fariam com ela?"
Os delírios da jovem trouxeram ao ambiente suas risadas altas, que agora eram perceptíveis por todos. A bala perfurou em um tiro muito preciso a mão que se aproximava da morena e só depois a criminosa se revelou das sombras.
— Sinto muito, rapazes, mas esse brinquedinho é meu — disse a garota segurando o queixo de Caitlyn e colando os lábios aos dela por um instante em um selinho bem breve — Tenho certeza que não vão querer encrenca. Não é?
— Eu tenho tudo sobre controle — a xerife respondeu séria.
— Shhhhhh... Cãozinho mau — Jinx disparou as palavras sem olhar diretamente para Caitlyn, mas olhando em sua direção por cima do ombro — Acontece que essa aquisição é minha e me custou bastante, então não pretendo dividir — agora os olhos violeta encaravam os três homens novamente.
Com apenas um dos braços, a mais nova enlaçou a cintura da de cabelos escuros e a colocou deitada em seu ombro, sustentando seu peso sem problemas movida pela raiva.
— Vocês ouviram, seus trastes! Esse traseiro enorme da xerife é todo meu! Caiam fora — Jinx começou a atirar, sem contar que Caitlyn esperaria os outros saírem de cena para atingir sua captora com uma arma de choque.
Teve que admirar mentalmente a resistência da garota, que demorou a perder os sentidos com a descarga elétrica e mesmo assim a encarou e sussurrou enquanto seu corpo caía.
— Você... Você roubou uma das minhas armas... Mas que vagabunda!
Foi inevitável para a mais velha deixar que o sorriso moldasse seu rosto dessa vez, encarando a outra perder os sentidos bem diante de si já no chão.
Ao acordar, foi Jinx que se viu algemada e sentia sua cabeça doer de leve. Encarou a figura de Caitlyn sentada a sua frente e bufou instantaneamente.
— Você escapou das malditas algemas, o que te faz pensar que não consigo — perguntou a mais nova, irritada.
— Não estou pensando que você não consegue escapar. Já vi o quanto você pode ser...
— Posso ser o quê — Jinx insistiu em ter a continuação do que parecia ser um elogio, sentindo até certa ansiedade a dominar — O que você ia dizer?
— Não vale a pena.
— O que era? Diz logo, sua imprestável! Grrrr... Você ia dizer que sou surpreendente? Incrível? Extraordinária? É, eu já sei! Eu posso ser genial! VAI, CONFESSA!
— Eu ia dizer chata, insistente, teimosa, insuportável!
— Mentirosa! Você parou porque estava prestes a me dar um elogio! Eu sei!
— Se você analisar bem, não sou eu que te beijei e falei do seu traseiro na frente de outras pessoas, foi?
Caitlyn lançou um sorriso divertido, apesar de as dores ainda a incomodarem.
— Analisando bem você precisa me mim até pra se alimentar, já que não consegue ir até a esquina sem cair. Já pensou nisso, detetive? Como pretende se livrar disso?
Foi Jinx quem sorriu, sustentando o olhar da mais velha.
— Você tem um bom ponto, eu admito, mas... — a morena deixou seu corpo escorregar até deitar na cama improvisada com os vários tecidos velhos — Eu tenho algo que você quer muito e não direi onde está até estar segura no meu apartamento!
Novamente a xerife dormiu, mas Jinx se encontrava muito longe de conseguir descansar. Em vez disso, encarava a mulher em seu sono tranquilo, tendo pequenos espasmos, que a faziam rir baixinho com a visão que tinha de si mesma passando a lâmina do bisturi pela pele uniforme e pálida daquela que a acompanhava.
Seus olhos continuaram vidrados nos desenhos dos quais o sangue escorria por todo o corpo da xerife, onde depois imaginou pintar com um spray rosa neon, que para Jinx parecia mais bonito e atrativo.
"Agora sim, muito melhor! Você está realmente bonita nesse tom, detetive! Muito melhor mesmo! O rosa combina bem, mas ESSE rosa, não o rosa de manoplas gigantes e bizarras!"
— EU DISSE PRA VOCÊ QUE ERA INÚTIL!
Caitlyn custou a acordar mesmo com os gritos, mas assim que o fez, foi tomada por um choque intenso, que a fez travar os dentes com força.
— EU TE DISSE, SUA VADIA MISERÁVEL!!! DISSE QUE IRIA ME SOLTAR DAQUELE PEDAÇO DE METAL INÚTIL — o sorriso da garota se alargou vendo que a xerife já "dormia" — E agora nós podemos finalmente brincar! Não é, bebezinho — perguntou encarando o bisturi em sua mão com o qual demonstrava cuidado.
Com um breve empurrão usando o pé, a garota de Zaun verificou que o corpo de Caitlyn não respondia e logo aproximou o bisturi de seu rosto. Apesar de ter certeza do que via, sua cobaia não estava desacordada e segurou o pulso de Jinx com força, o torcendo até que largasse a arma.
— Mas que menina má! Eu... Eu... Enchi você de choques! Nem pra desmaiar serve!
Surpresa, mas também irritada, a mais nova caminhou de costas alguns poucos passos. Já Caitlyn levantou cambaleando, completamente desorientada em seus movimentos.
— Eu não vou cair no seu truque... De novo!
A morena queria se manter firme, mas sua visão começou a embaçar de novo. Enxergava as luzes turvas acima de sua cabeça e começava a perceber que não estaria de pé por muito mais tempo.
Não importava mais o que aconteceria, o fato era que a xerife já tivera seu ego ferido o suficiente ao ser superada em muitos aspectos por uma garotinha, pior do que isso, uma garotinha completamente insana, que tinha escapado do buraco que pensou que daria fim a sua vida, mas não era tudo.
Seu treinamento com armas desde a infância, em seguida o treinamento militar que colocara seu corpo a todo o tipo de prova física e mental, tudo o esforço de seus quase 30 anos para no fim, ser vencida por uma menina magrela que não fez mais do que viver nas ruas de uma comunidade pobre, onde o crime se alastra como uma praga.
Isso era demais para o seu raciocínio lento do momento, mas rapidamente se lembrou das mãos da garota sujas com o pó de concreto que desmanchou incansavelmente para que pudesse salvá-la, as unhas pintadas alternadamente de azul e rosa como uma adolescente, embora Jinx já não fosse uma, demonstrando sua determinação em não aceitar uma derrota que ela própria já havia aceitado. Havia algo de admirável na criminosa que perseguiu pelos últimos anos, a encarando de perto e vendo como trabalha.
Caitlyn pensou que perderia o equilíbrio quando apoiou uma das mãos no ombro da mais nova, mas logo escorregou a mão para sua nuca e a puxou para um beijo, colando os lábios aos da garota de uma forma bem mais firme do que ela havia tentado fazer consigo na rua.
Sem demora, a língua molhada deslizou pelos lábios finos e bem desenhados, deixando claras suas intenções com o beijo que não durou muito, ainda que intenso a ponto de fazê-la perder o ar.
— Mas que porra você tá fazendo — perguntou a jovem confusa ainda com a atitude inesperada.
— Obrigada — o agradecimento escapou dos lábios de Caitlyn de forma mansa e completamente sincera, levando a mais nova a ficar com seu olhar ainda mais perdido sobre ela — Eu estaria morta agora, se não fosse por você.
— É agora a parte que você me elogia — perguntou Jinx com um sorriso, deitando a cabeça para o lado, agora muito mais calma do que se mostrava antes — Eu sei que você está louquinha pra me elogiar!
— Não!
— Pode admitir que sou bastante atraente com essas tatuagens estilosas e que você não resistiu, estava querendo me beijar esse tempo todo.
Caitlyn já estava com cara fechada quando se afastou e cruzou os braços, se jogando na pilha de tecidos e encostando as costas na parede.
— Não me atrai nem um pouco interações íntimas com uma maluca, que não faz ideia do que é carinho porque certamente nunca teve isso.
As imagens de Vi invadiram a mente tumultuada da garota de Zaun, mais especificamente de sua infância, quando era cuidada pela irmã mais velha, mas aquela não era mais ela. Jinx soltou um rosnado alto, mostrando os dentes com a terrível sensação de ter a única pessoa que tinha sendo roubada pela mulher na sua frente.
O mesmo olhar insano voltou à face da jovem com tudo o que passava em sua cabeça, aquela era a sua inimiga. Por um momento, a de cabelos claros sacudiu a cabeça, tentando afastar tantos pensamentos inconvenientes.
— Eu sei, mas não preciso! Você é fraca, estúpida! Por isso fica presa em lugares que não consegue sair! Arrrgh... Patético!
— A trégua acabou — Jinx sabia pelo olhar da xerife que ela falava sério, por isso deixou que falasse — É sério! Assim que eu levantar daqui, vou levar você comigo, nem que tenha que matá-la. Então é melhor que saia daqui antes disso.
— Sabe que eu prefiro que você se recupere antes de ter que te enfrentar de novo! Não preciso que facilite as coisas pra mim — a mais nova deu uma piscadela junto com o sorriso divertido que exibia — Além disso você é um saco! O melhor que faço é ficar bem longe de toda essa chatice mesmo!
Assim que tocou o pé no chão, a menina ouviu o disparo da pistola de Caitlyn, mas a fez rir o quanto a bala passou longe.
— Espera! Você errou? Fez isso de propósito! Você não quer me matar! Outro beijinho talvez — questionou de forma travessa e provocativa, antes de saltar pela janela ainda rindo.
Mesmo já estando de pé, Kiramman não desfez sua expressão séria e esta apenas deu lugar a um sorriso ao constatar o quão longe Jinx já estava.
É verdade que a mataria facilmente o maior problema de Piltover, que já havia matado centenas, mas tinha uma estranha sensação ao passar mais do que alguns minutos na companhia da garota, podendo assim ver vários estágios diferentes de sua insanidade tão de perto e isso começou a intrigar a xerife mais do que qualquer caso que já tivesse resolvido.
"Não, é claro que não! Da próxima vez que colocar as mãos nela, vai estar atrás de enormes barras de aço de uma cela!"
Foi com esse pensamento que Caitlyn chegou de volta ao trabalho no dia seguinte, mas para a sua surpresa, as buscas por ela eram mínimas, além de ter sido diretamente levada a prestar contas com a lei.
Estando fora por dois dias, seu trabalho já havia sido realizado por outras pessoas e uma foto de seu beijo com Jinx estampava alguns jornais sem a sua autorização, levando a caçadora a levantar muitas outras questões sobre sua realidade.
"Nenhum daqueles porcos estúpidos veio ao seu encontro pra te salvar."
"Ninguém vai vir atrás de você, eles já teriam feito isso antes. Eles querem você morta."
"Nenhum daqueles idiotas tinha intenção de te ajudar!"
As palavras de Jinx atingiram Caitlyn como um forte golpe no estômago e por um momento a xerife se perguntou o quão realmente insana ela era.
— Eu já disse que não sei onde ela está — insistiu a morena, já perdendo a paciência com o que antes era um de seus homens e agora a ameaçava, como se estivesse prestes a usar violência em seu interrogatório, mesmo que estivesse algemada à mesa — Vocês tem os exames e eu estava sob efeito de medicações que causam alucinações. Isso está comprovado no laudo!
— Esse laudo — perguntou o sujeito, tocando uma pasta com vários papéis e logo entregando um deles para Caitlyn, onde se lia facilmente todas as substâncias encontradas em seu sangue, praticamente limpo.
— Eu não entendo. Não tem como ter removido uma barra de ferro que quase atravessou minha coxa sem anestésicos sem que eu tivesse sentido nada — os olhos azuis inquietos percorriam a folha ainda mais confusos.
— Olha, Caitlyn, eu quero muito te ajudar, mas você não está me deixando alternativas pra isso.
Em outros momentos a mulher não teria se incomodado com o barulho das grades da cela se fechando, enquanto as encarava de seu interior, afinal era fácil resolver qualquer mal entendido, mas dessa vez as coisas haviam se complicado muito. Um agente jovem e recém contratado tinha evidências físicas de ter prendido Jinx pouco antes de ela desaparecer, junto de Caitlyn, que logo depois foi vista a beijando nos lábios.
Com a cabeça encostada na parede, a policial encarava a cela escura, já sentindo seus olhos pesarem pela medicação que recebeu pelo seu ferimento, quando a figura da garota pálida se fez no corredor acompanhada de sua risada de deboche que tanto odiava.
"— Eu disse! Eles não ligam muito pra você, fotografaram a gente e nem se deram ao trabalho de te resgatar. Eu quase tenho pena de você!"
Ao ver Jinx desaparecer, Caitlyn já não tinha certeza se era sua própria consciência projetando a imagem da garota, ou só os efeitos da droga que acabava de ingerir.
Nos primeiros dias, o responsável por comandar as forças policiais trouxe à mulher algumas pistas para que tivesse ajuda com os casos ainda em andamento e a morena até ajudou, mas logo a rotina aprisionada tirou toda a paciência que a restava. Tendo seguido a lei rigorosamente por anos, trazendo os culpados à justiça, não era aceitável que estivesse presa em uma situação tão embaraçosa e incomum como aquela, então Caitlyn se recusou a dar qualquer resposta. Não demorou para que, sem que a ex xerife se mostrasse útil, os novos responsáveis agissem com violência para ter as informações que buscavam sobre Jinx.
Já era madrugada quando um sujeito grande adentrou a cela sem muitas perguntas, esperando encontrar Kiramman sonolenta pelo horário para surpreendê-la com sua intervenção física, mas ao contrário do que pensava, os olhos da atiradora o encararam furiosos ao ser colocada contra a parede. Ela já estava preparada para o golpe que receberia no abdômen e tencionou os músculos, cerrando os dentes até que o homem a largasse para aplicar a arma de choque na lateral de sua cintura. A adrenalina sentida por Caitlyn era ainda maior que a descarga elétrica, que mesmo tendo queimado sua pele e a desorientado um pouco, não foi suficiente para a derrubar.
— A arma dela é mais potente que as suas — disparou a mulher, falando entre os dentes antes de acertar entre as pernas do grandão, que caiu na hora — Amadores!
A policial precisou agir rápido ao roubar as roupas do agente para que pudesse escapar, mas seu plano funcionou perfeitamente, já que conhecia cada canto, não só da delegacia, como da cidade.
Não tinha muitos lugares que pudesse ir para escapar das viaturas que logo estariam a sua procura, mas desejava mais do que qualquer coisa encontrar a garota dos olhos violeta em um desses lugares, entrar em sua mente tão inusitada e compreender melhor o que a fazia tão distante da realidade, que agora também parecia distante para Caitlyn.
Com esse pensamento que a caçadora seguiu direto para a fábrica abandonada onde havia estado da última vez, carregando apenas seu rifle.
Como já era esperado, o lugar estava vazio e ainda mais empoeirado, mas a energia ainda funcionava e tudo era exatamente da forma que conseguia se lembrar. Também não era seguro ficar muito tempo por ali, onde tinha sido tirada a foto que a trouxe tanta encrenca.
Jinx sentiu a enorme onda de excitação a invadir ao se aproximar da janela, contemplando o desenho gigantesco feito em azul neon no alto de um reservatório de água em meio aos prédios de Zaun. Aquilo não tinha sido feito por ela, mas era sua identidade ali e mais do que isso, ao ver de perto, tinha certeza de que era um chamado.
Embora Caitlyn estivesse atenta no alto da estrutura com seu rifle de alta precisão, as lentes não puderam captar a forma silenciosa com que a menina se aproximou, atirando uma armadilha que a prendeu facilmente em uma rede de metal equipada com um sistema de choque, ainda inativo. As tranças longas caíram quase nos pés da morena, quando Jinx sentou próximo a ela com uma postura despreocupada, chupando um doce que segurava por um palito, segurando com a outra mão uma de suas armas.
— Quer saber, antes de matar você, vou ter que confessar que gostei muito do que disse nessas imagens ridículas que estão rodando por todo o canto em Piltover de quando você espancou o grandão pra escapar da delegacia. Como era mesmo — a garota balançava os pés, que não tocavam o chão — "A arma dela é mais potente que as suas, amadores!" Ok, eu adorei e você tem razão! Eles não chegam perto dessas belezinha aqui — A zaunita se aproximou um pouco, sem encostar na policial — Que estranho, você não tem mais aquele cheiro bom, tá até fedendo a suor, os dias na prisão devem ter sido difíceis, mas até a porra do suor é um pouco cheiroso. Seu cabelo também tá horrível!
Apesar de estar imobilizada, Caitlyn sorriu com o pensamento de que seus planos tinham dado certo e Jinx estava agora bem na sua frente. Seria fácil escapar também, ainda que mais difícil do que escapar da prisão.
— Você pode me matar depois, mas primeiro tem uma coisa que quero saber.
— Ei, chapeleira doida, você não tá nem um pouco em posição de fazer as perguntas aqui — a de cabelos claros se movia de um lado a outro, movendo também os braços ao falar, até parar novamente em frente à mulher e acertar seu rosto com o cano da arma que segurava.
A policial inclinou a cabeça pra trás com o impacto e fechou os olhos com força, sentindo a ardência atingir o seu ápice, mas em seguida se dissipar gradativamente. Quando baixou o rosto, sentiu o líquido quente deixar seu nariz com velocidade, escorrendo pelo queixo, mas já não doía tanto. Respirou pesadamente por entre os dentes, encarando a mais nova com a mesma raiva que Jinx conseguia trazer tão fácil. Por trás de suas costas, Caitlyn já usava um pequeno canivete para cortar as redes de metal, mesmo que demoradamente, por isso precisava manter a atenção de sua adversária.
— O pior de toda essa confusão é que estão falando que você se aproveitou de mim, só porque é mais velha, como se eu fosse algum tipo de garota inocente — a voz de Jinx se tornou estridente e raivosa — E que VOCÊ me ajudou a escapar, como se não tivesse sido bem o contrário! Arrrrrgh! Eu odeio você! ODEIO!!! Acabar com a reputação que construí durante anos!
Imaginando que dizer algo enquanto estivesse presa apenas iria piorar tudo, Caitlyn ouviu em silêncio, mas ainda encarava a criminosa diante de si com uma mistura de raiva e concentração, movendo os olhos para acompanhá-la, enquanto ela continuava falando sem parar.
— E ainda foi um beijo horrível, credo! Que nojo! Você foi... — os olhos ainda mais raivosos que os da mulher presa procuravam as palavras — Foi gentil... Quem beija assim — Jinx aproximou ainda mais seu rosto, admirando o sangue que escorria do nariz da xerife e sorriu — Mas com o gosto do seu sangue me parece muito mais atraente agora, como a cadela obediente que você é — a língua da mais nova deslizou devagar do queixo de Caitlyn até seu nariz, sorvendo o líquido avermelhado em uma única lambida demorada.
Caitlyn já tinha as mãos livres em um enorme buraco na rede quando sentiu a língua quente contra seu rosto, mas só conteve a respiração e esperou que Jinx se afastasse para jogar longe a armadilha que a manteve presa. Rapidamente pegou o rifle e saltou tendo apoio nos próprios ombros da garota a sua frente, colocando-se atrás dela, enquanto pressionava o cano de sua arma na garganta da menor, puxando-o pra trás na intenção de a sufocar ainda mais.
— E agora? Estou em posição de perguntar algo?
— Deus! Eu odeio como você tem uma voz estupidamente sexy, mas ainda é nojenta e patética demais! Me larga! Grrrr... !!!
— Devia ter trazido mais alguém — pontuou Caitlyn se referindo ao fato de ter escapado facilmente sem que Jinx notasse.
— NÃO GOSTO DE SURUBA, SUA PERVERTIDA! ME SOLTA, PORRA!
A policial sorriu com a vontade de rir do que a mais nova havia dito, mas o fez apenas porque ela não podia ver. O sorriso durou pouco, logo a caçadora foi surpreendida com a arma de choque na cintura em um golpe certeiro. Sua mente constatou que era mesmo mais forte, enquanto perdia o equilíbrio e por pouco não a consciência, mesmo assim sentiu seu peso por cima das costas da garota, afrouxando o cano de seu rifle no pescoço de Jinx, enquanto caía sobre o corpo pequeno debaixo do seu. A de cabelos claros já contava sua vitória, imaginando o peso da xerife inconsciente sobre ela, mas antes de atingirem o chão, a bota de Caitlyn apoiou em uma coluna de metal bem a frente delas.
— Essa droga ainda dói — sussurrou a mais velha, virando o rosto pro lado e fechando os olhos por um momento — Mas as tiras de borracha fizeram seu trabalho e agora você vai me dizer porque me querem morta!
— Arrrgh! Então a policial certinha que não fala palavrão e nem beija direito agora se vê traída pelo seu pessoal imbecil e a culpa é minha? Dá um tempo — Jinx respirou fundo com certo esforço para manter Caitlyn sobre seu corpo, estando ainda totalmente inclinada pra frente, mesmo que de pé com a xerife nas suas costas — É muito bom te ver assim desesperada, mas não foi nada além de um palpite, um palpite óbvio, que você como detetive não foi capaz de enxergar de tão idiota!
Não podia estar mais certa a última frase da jovem e por isso o rifle foi puxado com mais força ainda por Kiramman, que ainda o segurava com determinação contra o pescoço da garota, que a golpeava incessantemente nas costelas e coxas, tentando sair. Chegou a sentir as unhas afiadas rasgarem sua pele onde pôde alcançar em seu tronco, mas não recuou.
— Eu juro que se não me soltar, vai ter uma morte muito lenta e dolorosa, chapeleira com nome de campainha de armazém!
Dessa vez a mais velha, que a encarava de lado por cima de seu ombro ganhou uma expressão confusa, deixando claro que não tinha entendido a piada, o que Jinx rapidamente compreendeu e explicou.
— Caitlyn... tlyn... tlynnnn....
O tédio veio sem demora na face da policial, embora a garota risse sem se importar, a de cabelos escuros lançou um sorriso completamente forçado e irônico, antes de empurrar a menor com força, irritada por não ter respostas.
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