...Melissa Stefano...
— Vamos, Mel. Ou iremos nos atrasar! — Minha amiga reclama em um tom acima de seu habitual. É raiva. Bate a sola de seu tênis contra o piso de madeira do nosso quarto compartilhado, bem irritada. Ela odeia esperar, perder tempo, e quando os dois se juntam.
— Já estou indo... — Respondo, durante a minha arrumação dos cadarços, totalmente calma, o contrário da garota à minha frente.
— Você está demorando muito!
— Calma, Sofie! Só falta eu colocar meus tênis! — Termino de colocar os cadarços e ponho meus dedos dentro, depois encaixando o calcanhar, fazendo o mesmo com o outro.
— Vamos! Estou com pressa!
— Pressa para o quê? — Ando até ela, que estava parada na porta.
— Você não soube? O Professor Smith se aposentou.
— Ah! Isso é bom. — Sorrio minimamente, pensando no homem que nos deu aula por um longo tempo. Foram-se anos.
— Ele é um idoso e já estava na hora dele sair dessa vida de professor. — Afirmo levemente com a cabeça. Ele é realmente um senhor de idade que já deveria ter se aposentado há algum tempo. Ele merece. — Mas isso não explica a sua ansiedade. Você nem gostava dele.
— Vamos ter um novo professor de matemática!
— E pela sua cara, ele deve ser lindo e atraente. Acertei?
— Provavelmente. Só soube que ele é lindo...
— Por favor, não babe no chão. Eu limpei ele ontem. E com muito zelo, por sinal.
— Podemos ir, agora? — Ela pergunta pela enezima, apontando para a porta.
— Podemos.
Sofie me puxa para fora, à caminho do colégio. Ao entrarmos, ela vai correndo na direção de algumas garotas encostadas nos armários. Abraça uma delas com tanta força, que a garota mudaria de cor se isso fosse um desenho animado.
— Ele já chegou? — ela pergunta às outras.
— Sim! Acabei de ver ele entrando no prédio! — Camila se exalta, dando um pulinho adorável para sua estatura e título de menor do nosso grupo.
— Vocês não estão a exagerar um pouco? — Pergunto, realmente me sentindo deslocada no meio delas. Estão tão cismadas com esse novo professor de matemática, lindo e maravilhoso, como dizem.
— Não estamos, Melissa. Ele é impressionante. — Uma das garotas da minha sala se vira para olhar para mim, eufórica.
— Por que a nossa primeira aula não podia ser de matemática? Quero ver como ele é. — Sofie diz, se apoiando no ombro da garota que abraçou anteriormente.
— Porque deixaram essa aula vaga, graças à professora de italiano que faltou e nos avisou que faria. — Digo, sorridente.
— E eu vou buscar a bola de basquete no meu armário.
— Tantas coisas que poderíamos fazer, como ouvir música, passear por aí, surrupiar uma sobremesa da cozinha, ou até ir à biblioteca. E você quer jogar basquete, Melissa?
— Não reclame, Sofie. Eu tive que recusar uma partida de futebol por sua causa, da última vez. Tive que ficar de vela ainda.
— Tá, vai lá buscar a bola. Eu fico aqui te esperando. Talvez o professor passe por aqui. — Ela apenas acena, como se estivesse me expulsando, enquanto estende o braço ao redor dos ombros da Camila.
— Vou ser rápida para que você não fique esperando à toa.— Ando pelo corredor, na direção onde fica meu armário. E, ao olhar mais adiante, me deparo com o time de futebol do colégio. Gargalham e implicam uns com os outros. Devem ter acabado de terminar um treino.
— E aí, gata? — Diz o capitão do time, sorrindo ao me ver. Ele é alto, loiro dos olhos azuis e tem um belo sorriso, de deixar qualquer uma encantada. Mas não faz meu tipo.
— Gata? Sabe que essa não cola comigo, certo? — Desdenho com um sorriso no canto dos lábios, fazendo alguns dos meninos darem risada. Ai, esses caras. Em um momento eles riem dele, mas se alguém partisse pra cima, virariam os próprios animais selvagens.
— Ok, você é difícil... — Se dá por vencido, passando a mão pela nuca e sorrindo. — Vai jogar com a gente, hoje? Você está nos devendo uma partida, desde que disse em voz alta que joga melhor do que eu. Quero provas, gatinha.
— Adoraria mostrar minhas habilidades, algo que você não tem, mas eu pretendo jogar basquete hoje.
— Vai me enrolar com esse papinho de deixar para uma próxima, de novo?
— Não tenho culpa se você cede tão fácil aos meus pedidos.— Desvio de sua tentativa.
— Tão doce quando um limãozinho... E eu adoro uma balinha de limão... — Ele diz tudo com um lindo sorrisinho.
— A culpa é de vocês por terem me nomeado como a “Princesa”. Me subiu à cabeça.
— Tudo bem, temos culpa. — Ergue as mãos como se estivesse se rendendo. — Mas eu ainda te acho uma princesa. — Ele faz um biquinho e se aproxima de mim. Sinto os lábios dele na minha bochecha, seguido de uma algazarra de seus amigos que presenciaram a cena. — Pode continuar com o que estava fazendo.
— Sério? — Questiono pelo beijo repentino que recebi. — Prometo ver como está a minha agente. Quem sabe, eu possa encaixar uma partida de futebol para esse mês... Não garanto.
— Não faça promessas que não pode cumprir. Sabe que vamos cobrar todas elas.
— Está bem! Nos vemos por aí, meninos! — Volto meu caminho pelo corredor, agora correndo, pois já tinha demorado demais.
Essa conversa com o Thiago me atrasou. Já saí vinte minutos depois do horário de início das aulas, porque teríamos uma aula livre da professora de italiano, agora gastei quase dez minutos de conversas aleatórias no corredor com as meninas e o time.
E aquele beijo?
Por que ele me beijou? Com certeza foi para se mostrar na frente dos amigos. “Amigos”, com aspas mesmo. Aposto que eles não fazem ideia de que o capitão do time é gay. Eu não tenho nada contra. Sei desse fato há um pouco mais de dois anos, quando o peguei beijando um homem mais velho, atrás de um carro, no escuro. Espera. Na verdade, tenho sim. Tenho algo contra o pensamento dele, de que o capitão do time pode perder o respeito dos outros jogadores se soubessem de tudo. Já disse que é bobagem. Mas ele prefere assim. Afinal, é seu último ano escolar.
— Ai!
...Melissa Stefano...
Me trombo com alguém quando virava o corredor e caio no chão, após o impacto.
— Olha por onde anda! Não cruze o corredor como se fosse o único transitando! — Vocifero, massageando acima do meu ombro, onde me choquei contra o que parece ser um homem pelo pouco que consegui ver. Estou com dor de um lado da bunda.
— Você que bateu em mim, garota! — Retruca com uma voz grave, cheia de raiva, enquanto balança a cabeça.
— Droga... Esquece. — Levanto-me do chão e arrumo o meu uniforme, tirando a poeira da parte de trás até que esteja limpo. Viro-me para o garoto caído no chão, o encarando por alguns segundos, já que não está a usar o uniforme padrão, mas de roupas formais. Não consigo reconhecê-lo, e olha que eu conheço uma boa parte desse colégio. — Levanta. — Estendo a minha mão para ele, que a olha fixo, antes de olhar para mim diretamente. O ouço bufar, seguida da mão dele, que agarrou a minha.
— Ok, foi só um acidente. — Se levanta com o meu apoio e pega as suas coisas do chão. Pastas e papéis? — Você está bem? — Pergunta a mim, ajeitando a sua roupa e cabelo.
— Estou. Eu não me machuco fácil. — Respondo sem dar muita atenção a ele, e sim para as roupas que está a vestir.
— Por que estava correndo? — Me olha fixamente, com a cara fechada, ao mesmo tempo, subindo sua mão até a gravata, ajeitando e apertando o nó. — Poderia machucar alguém e, principalmente, se machucar.
— Como estou em aula livre, decidi ir buscar a minha bola de basquete. Estava correndo para não desperdiçar tempo.
— Ah, você joga basquete? — Sua expressão muda, nascendo um pequeno sorriso nos lábios.
— É... — Eu respondo, mas com desconfiança, franzindo as sobrancelhas. Esse garoto realmente não deve ser daqui. — Você não me conhece? Sabe, os caras me chamam de Princesa, durante as partidas, sabe?
— Não. — Responde com objetividade, me medindo da cabeça aos pés como se eu fosse uma piada ambulante. — Eu sou novo aqui, então, não sei muita coisa sobre o pessoal que frequenta esse colégio. — Isso tá mais do que óbvio.
— Acho que você vai gostar daqui. Recomendo que vá para a área de esportes. É o melhor lugar do colégio. — Sorrio, afirmando cada palavra que estou dizendo.
— E as aulas? Você não gosta de estudar?
— Eu até que gosto, mas hoje, eu fiquei sabendo de uma coisa não muito agradável... — Bufo de descontentamento, cruzando meus braços só de lembrar das baboseiras que minhas amigas estavam falando. E também, estou sentindo que falei demais com um estranho.
— O que seria tão repugnante?
— Temos um novo professor de matemática e as meninas estão babando, dizendo que ele é lindo e sei lá mais o que...
— Descruzo meus braços, levando uma mão até minha nuca, enquanto apoio a outra na minha cintura, suspirando. Agora que já engatei, por que não continuar? — Tenho quase cem porcento de certeza de que ele não é tudo isso que elas dizem.
— Ah, você acha que não? Talvez esteja o subestimando.
— Sei que não estou. Bem... Eu não vou com a cara de qualquer pessoa que pareça transpirar superioridade sobre os outros ao redor. Isso serve para professores também, sem exceções. — Cruzo meus braços, franzindo as sobrancelhas para confirmar o meu desprezo pelo desgraçado, que nem vi ainda. — Espero que esse professor tenha boas respostas para as garotas, as mesmas que eu sei que vão se declarar para ele. — Suspiro, dando por vencida. — Se eu ficar sabendo que ele magoou alguma garota, usando palavras rudes, não vou me arrepender dos meus atos.
— Você parece ser durona... — Me mede da cabeça aos pés novamente com aquele olhar sério, mas que, de repente, é influenciado pelo pequeno sorriso que nasce em seus lábios.
— Ameaçando alguém assim, sem mais nem menos...
— Nem sempre. Mas isso não importa. Eu... — Interrompo minha frase, levantando meu rosto e olhando vagamente para o relógio na parede. — Droga! O sinal já vai tocar?! — Me pergunto, lembrando os horários das aulas. — Perdi a minha partida de basquete... — Resmungo baixinho, sentindo meus ombros pesarem em decepção, enquanto à minha frente, o cara permanece estático, me encarando. — Eu já vou indo. Nos vemos por aí. — Recuo meus passos.
— Só uma pergunta, garota. — Atrai minha atenção de volta para ele, que lambe os lábios, terminando com uma mordida e um pequeno sorriso que me deixou desconfiada. — De qual turma você é?
— Terceiro C. — Respondo.
— Hum... Nos veremos, então.
— Certo... — Desconfio bem mais agora, mas não presto muita atenção porque tenho mais o que fazer. — Tenho que ir agora, nunca se sabe se o novo professor é rigoroso com atrasos. — Me viro e corro de volta pelo corredor, mas acabo me virando para trás, após me dar conta da minha falta de educação com um completo desconhecido. Esqueci de me apresentar formalmente. Mas não o vejo mais. — Ah. Ele já foi. Nem pensei em perguntar o nome dele... — Dou de ombros. — Tenho que perguntar quando o vir novamente. — Continuo meu trajeto e entro em minha sala, vendo a Sofie já sentada em nossos lugares habituais. Vou até ela.
— Pensei que os nossos armários estivessem na parede do primeiro corredor à direita, não no segundo prédio do colégio. — Debocha sem olhar para mim, só encarando seu celular.
— Desculpe. Eu sei que demorei, mas muita coisa aconteceu no meu caminho.
— Tipo o quê? — Finalmente me olha, arqueando uma das sobrancelhas para me questionar.
— O time de futebol apareceu, conversamos sobre o mesmo assunto de sempre e eu fui embora depois de trocar algumas palavras com eles. Depois, no meu caminho até os armários, eu trombei com um cara e caímos no chão.
— Deixe-me adivinhar, você caiu em cima dele?
— Você assiste filmes adolescentes demais... — Prendo uma risada. — Mas não, só ficamos conversando. Se posso chamar aquilo de conversar. Por isso que demorei. — Deito meus braços na mesa e apoio meu rosto, com os olhos fechados.
...Melissa Stefano...
O sinal toca.
— Ele está vindo!
Abro os meus olhos com todo aquele alvoroço, observando as meninas próximas a mim, retocando as suas maquiagens e arrumando os cabelos.
— Vocês não estão exagerando um pouco com esse lance de professor gato?
— NÃO! — Um grande grupo de meninas responde-me alto e em bom som, dando até um sustinho em mim.
— Eu tentei. — Levanto o meu capuz e cubro a minha cabeça, também cobrindo parte do meu rosto e deitando-me novamente.
— Ah. Meu. Deus. É ele... — Ouço tal murmurinho contente mais adiante.
— Olá, pessoal. Chamo-me Alex Spencer, mas podem se referir a mim como Senhor Spencer. Serei o professor de matemática de vocês por um tempo indeterminado, até o momento.
Levanto o meu rosto e olho para frente só por curiosidade pela voz que jurava já ter ouvido antes.
— Ah, não... — Arregalo os meus olhos de tanta descrença e puxo o meu capuz como válvula de escape para cobrir melhor o meu rosto e não ser reconhecida por esse homem.
— Que foi, Mel?
— É ele... — sussurro para apenas ela ouvir.
— Ele até que é lindo, não é?
— Não isso! Ele é o cara com quem eu trombei no corredor...
— Sério? Mas, por que está se escondendo se foi apenas um simples acidente?
— Não quero que ele me reconheça.
— Eu mal entrei na sala e já estou vendo que duas alunas estão a conversar livremente como se não notassem a minha presença aqui. Estão começando bem, meninas.
— Não fala nada, Sofie...
— Garota de capuz, você poderia o abaixar? Está em uma sala de aula. — Ouvindo suas palavras, eu movi uma mão para frente, levantando o indicador e negando seu pedido com ele. — Posso saber o porquê? — Repito o movimento com meu dedo.
— Mel? Olha pra frente... — Ela me cutuca sob a mesa, mas eu me recuso com todas as minhas forças.
— Ela está com algum problema no rosto ou com alguma dor excruciante? — Ouço sua voz se aproximando e ficando cada vez mais alta como seus passos.
— Não, Senhor... — Minha amiga responde.
Sinto o capuz ser puxado da minha cabeça, descobrindo o meu rosto.
— Ah. Princesa das Quadras, certo? — Perguntou, irônico.
— Quem? — Me faço de desentendida, o olhando com tanta inocência que poderia enganar qualquer um. Mas, pela expressão dele, ele não é qualquer um. — Desculpe, você deve ter se confundido...
— Não, eu tenho certeza de que é você.
— Seja como for, você não pode tirar o capuz de uma pessoa contra a vontade dela. Isso é invasão da privacidade de um aluno.
— A sua amiga é sempre tão desdenhosa? — Suas sobrancelhas se franzem e seu olhar desvia para a Sofie lentamente, esperando a resposta dela.
— Sim, na maioria das vezes... — Ela responde, olhando para mim de relance pelos cantos dos olhos.
— Pronto, estou sem capuz, já que isso o incomoda tanto. — Arrumo o tecido na parte de trás do meu pescoço, arrumando meu cabelo para fora da roupa e da frente do meu rosto.
— Não me incomodou. Só queria ter certeza de que você não tinha mentido sobre a sua turma ser a terceiro C.
— Como? — Me espanto. — Você nem sabia que era eu.
— Vi sua foto nos documentos que me foram entregues. — Cruza os braços com um leve sorriso de canto, estufando o peito, fazendo parecer que é bem mais alto do que já é. — E você tem notas boas em outras matérias, mas em matemática... Tsc, tsc, tsc... — Maneia a cabeça negativamente, me encarando entre os cílios tão negros quanto seus cabelos exageradamente mergulhados em gel.
— Pense o que quiser... — Retruco com meu habitual desdém. Não vou ceder à esse professorzinho metido a galã.
— Hum... Bom. Vamos começar a aula. — Ele dá meia volta e anda até sua mesa, aparentemente, desistindo.
Foi fácil demais, não?
— O que foi isso? — Minha amiga volta a cutucar minha perna, quase se jogando no meu ombro para falar baixinho.
— Eu o insultei sem saber que esse mesmo professor era o mesmo homem com quem esbarrei no corredor. — Respondo, olhando fixamente para as costas do idiota.
— Ok, você não se deu bem no primeiro dia dele.
— Tudo bem, pessoal. Que tal vocês me dizerem o que andaram aprendendo com o Thompson nesses últimos meses em que ele foi o professor de matemática? — Se vira quando chega em sua nova mesa, se inclinando para sentar na ponta da madeira envernizada e cruzando os braços ao olhar diretamente na minha direção, sorrindo. — Se soltem, quero criar uma boa intimidade com cada um de vocês para que possamos progredir corretamente. — Ele passa a língua pelos dentes e leva uma das mãos aos cabelos, os arrumando para trás de forma sedutora. — Devo começar perguntando os nomes das meninas?
Por favor, que o dia não seja longo...
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