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Você É O Meu Prêmio

.1.

Mais uma semana e vamos todos morar na rua. Isso mesmo, morar literalmente na rua.

Oi! Eu sou Maria Isis Gusmão, filha única de Heitor Gusmão e Maria Marta Gusmão, herdeira da construtora Gusmão, a maior empresa atualmente no ramo de construções. Eu deveria estar feliz? Claro que sim... Se não fosse pelo meu pai apostando tudo que temos em cavalos. E pior, perdendo.

Nossos cartões já estão sem limites e nossas contas estão zeradas. O condomínio está atrasado e os salários dos nossos funcionários também.

Eu já não aguento mais ser tão questionada sobre quando meu pai vai dar uma entrevista sobre a situação dele e da empresa. A Construtora Gusmão tem nome no mercado, mas está perdendo o valor devido ao descontrole do meu pai. Ele está doente e não quer reconhecer.

Alguns funcionários ligam para nossa casa dizendo várias atrocidades e avisando que vão colocar a empresa na justiça. Eu não consigo mais ir a faculdade porque já fui chamada de ladra pelo filho de um dos diretores da empresa.

As coisas que temos na dispensa, segundo nossa secretária do lar, duram mais uma semana. Minha mãe não reage, só chora. Ela está isolada no quarto faz um mês e pouco, quando teve seu cartão dependente bloqueado pelo meu pai.

Eu não cheguei nem na metade do meu curso, não tenho experiência com nada. Como posso ajudar?

Sem contar que eu, para conseguir equilibrar as contas, teria que pelo menos trabalhar limpando bosta dos camelos de um sheik árabe.

–– Oi, Isis –– Nosso motorista, Jardel, vem ao meu encontro. –– Seu pai já disse quando vai me pagar? Meu filho de sete anos precisa muito de um tênis novo e eu também preciso pagar as pessoas que eu devo.

–– Ai, Jardel. –– Deixo meus ombros caírem em sinal de desânimo. –– Sabe qual é a verdade? Não temos um tostão no bolso e meu pai não aparece em casa têm 3 dias.

–– Então... Posso aceitar a proposta de emprego dos Medeiros? Eles ofereceram o dobro do que recebo aqui. Ou melhor, recebia.

–– Pode ir, Jardel. Você tem sua família pra alimentar. –– Toco em seu ombro. –– Não se preocupe que quando começarmos a vender o que ainda nos resta iremos pagar os seus direitos trabalhistas. Você é um amigo querido da família. Não vamos deixar meu pai sacanear ninguém.

Ele agradece e vai embora. Quando noto que não tem mais ninguém em volta, grito bem alto. Eu estou tão estressada, tão estressada...

–– Isis! Isis! –– Nita, nossa secretária do lar, aparece esbaforida. –– Sua mãe, menina!

–– Ai, por favor! Mais problemas, não.

Nem deixo ela concluir o que iria dizer, saio correndo atrás da minha mãe. Encontro minha mãe com um pote de remédios calmantes em uma mão e uma garrafa de whisky na outra. Ela estava com seu robe de seda favorito e suas pantufas egípcias caras.

Ela gritava, ameaçando sua vida. Mas eu já estava cansada daquela cena. Era a quarta desde que ela se isolou. Joguei-me na poltrona do seu quarto e senti minha cabeça rodar.

Isso tudo só pode ser castigo. Não pode ser outra coisa.

–– Não duvide, filhinha –– Balançava a garrafa e o pote de remédios. –– Esse mundo é muito cruel. Não vou suportar viver assim. Prefiro a morte.

–– Mãe! –– Gritei sentindo um nó esquisito travar a minha garganta. –– Mãe, para com isso! Você... Você não vê o quanto eu estou sobrecarregada? O papai sumiu, as pessoas estão ligando cobrando as dívidas, estão me chamando de ladra... Mãe... –– Deixo as lágrimas caírem. –– Como a senhora pode estar pensando em morrer porque não vai beber mais seu champanhe caro ou não vai fazer compras em Paris três vezes ao ano?

–– Isis...

–– Para, mãe! –– Solto toda minha histeria enquanto grito. –– Eu só tenho vinte anos! Droga! Eu não pedi por nada disso... Não pedi.

–– Maria Isis, venha aqui!

–– Me erra.

Sumo daquele quarto enquanto ainda tenho sanidade. Minha vontade é puxar todos os meus cabelos e comê-los de tão estressada que eu estou.

Minha mãe nem sempre foi assim. Lembro nitidamente dos tempos em que ela esperava em frente a nossa antiga casa a minha chegada da escola. Eu morria de vergonha, mas era o jeito dela de dizer que ficou com saudades.

Ela adorava fazer misto quente com suco de laranja para mim aos finais de semana. Isso tudo acontecia antes da empresa do meu pai ser bem vista e muito requisitada. Resumindo, antes de mudarmos de classe social.

Minha mãe apaixonou-se pelas bolsas de grife, pelas jóias, pelas viagens, pelos cartões, pelos carrões. Esqueceu de todo o resto. Infelizmente.

Meu pai sempre foi amoroso. Sempre chegava com chocolates ou balas para mim. Mas depois do vício, nossa relação mudou drasticamente. Ele ficou impaciente, agitado. Tudo era motivo de gritar ou ignorar.

As vezes eu sinto que esse maldito dinheiro acabou com a nossa vida. Eu lembro que éramos mais felizes quando as coisas eram mais apertadas. Esquisito isso não?

Ligo para Suze, uma das pouquíssimas amigas que não afastou-se de mim, e peço para ela vir me buscar. Faço uma pequena malinha e fico na frente de casa esperando.

Ela tinha insistido muito para que eu fosse passar o final de semana na fazenda do amigo do irmão dela. Eles iriam fazer uma festinha para comemorar a compra da propriedade. Uma espécie de batismo do lugar. Regado a muita cachaça, ressalto.

Eu tinha recusado. Não conhecia o cara e muito menos estava com espírito para festas, mas depois dessa eu só queria extravasar. Era nítido que meus pais estavam pouco se lixando para mim. O foco dos dois era o maldito dinheiro.

Custa eu pensar um pouco em mim agora? Mesmo com o mundo desabando na minha cabeça?

–– O que te fez mudar de ideia, Isis? Sei que você não está muito no clima.

Suze é daquelas amigas sensitivas, que ama ler seu estado de espírito e te encurrala até você desabafar. Eu amo isso nela.

–– Estou farta de ficar me preocupando sozinha com a situação da minha família. –– Bufo, sentindo o mesmo nó na garganta de antes voltar. –– Meus pais são péssimos, Suze. Preciso distrair um pouco. Me conta, quem é o dono da tal fazenda?

–– É amigo do Maurinho; parece que se conheceram quando faziam boxe. Não sei bem sobre ele. Mas sei que geral foi convidado. –– Ela liga o som e me oferece chicletes. Aceito. –– Nós somos vips porque vamos nos hospedar no casarão. O resto da galera vai durante a festa. Espero que vá muitos caras bonitos e que beijam bem.

Gargalhamos ao olharmos uma para a outra. Eu não faço o estilo "passa o rodo", mas curto beijar na boca de vez em quando. Suze que faz esse estilo. Ela é terrível.

–– Espero que seja bom. Estou quase explodindo de tanto estresse. Pode aumentar o som? Adoro essa música.

Não demorou mais que três horas para estarmos passando pelas portas da Fazenda Paradise. Já estava perto da hora do almoço quando descemos do carro.

–– A Isis veio mesmo. Não acreditei quando Suze me mandou mensagem. –– Maurinho me abraça e beija minha testa. –– Se quiser, pode dormir comigo, no meu quarto.

–– Não enche, Maurinho!

–– Vai, imbecil. Cadê seu amigo? –– Suze é muito superprotetora. Ela odeia os contatos excessivos do Maurinho comigo. Sempre diz que ele é golpe.

–– Também te amo, Suzane. –– Revira os olhos. –– Ele chega daqui a pouco. Mas tem bebida nos freezers e comida nas geladeiras. Subam e escolham um quarto para vocês. Os funcionários estão fazendo o almoço.

Suze não exagerou quando chamou de casarão. São três magníficos e espaçosos andares. Tenho certeza que isso aqui deve ter custado uma grana alta.

–– Esse amigo do Maurinho deve ser muito bem de grana viu? –– Jogo minha malinha em cima da cama. –– Que lugar espetacular!

–– Isso é. Meu irmão disse que ele tem negócios vantajosos e que planeja expandir ainda mais sua riqueza. É um homem empreendedor.

–– Pelo jeito que você fala dele já deve ter pedido a ficha completa ao Maurinho. –– Ela gargalha. –– Já sei que visitarei mais vezes esse lugar futuramente. Gostei.

Organizamos nossas coisas e descemos para o térreo. O cheiro que vinha da cozinha estava maravilhoso e minha barriga estava roncando.

Suze avisou que iria atrás do Maurinho e eu aproveitei para ir à cozinha. Tinha cerca de quatro a cinco funcionários, andando de um lado para outro. Fiquei envergonhada e iria dar a volta, mas uma delas me notou.

–– Quer algo, senhora?

–– Não queria incomodar... É que eu estou com um pouco de fome. Acabei de chegar.

Ela pede que eu espere enquanto prepara uns aperitivos para mim. Ela me entrega três sanduíches, uma fatia de bolo e uma latinha de refrigerante. Agradeci e pedi desculpas pelo incômodo.

Sentei-me na varanda para apreciar a vista enquanto comia. O lugar é muito grande e está sendo todo decorado para a festa.

–– Ei, Isis –– Suze grita e acena de longe. –– Tem gente chegando ai.

Assinto continuando a comer tranquilamente. Não tinha comido nada hoje e não iria abandonar a comida por causa de quem vem chegando.

Um jipe surge em alta velocidade e para bem em frente a entrada do casarão. Aos poucos, um a um descem do carro. Apenas observo. Suze e Maurinho aproximam-se.

O último a descer é o motorista, que me encara por mais tempo do que eu gostaria. Desvio do olhar dele. Que homem gato!

–– E ai, Maurinho! –– Cumprimentam-se.

–– Fala, Rafa! –– Maurinho faz um sinal para que eu me aproxime. –– Essas são Suze, a pé no saco da minha irmã, e essa é meu sonho de consumo, Isis.

–– Sejam bem-vindas! –– Ele fica com os olhos vidrados em mim e isso me incomoda.

–– Obrigada!

–– Valeu!

O tal Rafael pediu com licença, pois tinha muito a fazer. Mas pediu que ficássemos à vontade. Junto com ele no carro tinha vindo mais uma galera. Gabi, Amanda, Ícaro e Nathan. Todos nos cumprimentaram e depois sumiram.

–– Notei que o todo poderoso ficou vidrado em você, gostosona. –– Suze me cutuca. –– Vê se não banca a chatonilda.

–– Até que ele é bonitinho. –– Dou de ombros enquanto olho por ele onde foi. –– Mas não vamos criar expectativas. Ele pode muito bem ser um mala. Odeio homens assim.

–– Não dou duas horas de festa e você vai estar grudada na boca dele.

Bagunço seu cabelo enquanto ela continua com suas gracinhas. Para passar o tempo resolvemos passear pela área da fazenda.

O estábulo era gigantesco e tinha muitos cavalos. Nada contra esses bichinhos, mas eles me lembram uma fase dolorosa e complicada da minha vida.

A estufa também era sensacional. Um funcionário nos mostrou algumas espécies raras já crescidas e também nos mostrou algumas recém-plantadas.

Suze alegou estar apertada e pediu que eu a esperasse na área arbórea do local. Tinha uma árvore imensa com um balanço pendurado chacoalhando com o vento. Não resisti e sentei.

Na nossa antiga casa com quintal eu tive um balanço também. Era nostálgico para mim estar sentada nesse agora.

–– Incomodo?

Olhei para trás de mim e lá estava ele de braços cruzados, avaliando cada canto do meu rosto.

–– Na-não. Desculpe. –– Saio do balanço. –– Só quis sentar um pouco enquanto espero minha amiga.

–– Isis, não é? –– Assinto. –– Não tem problema algum. Pode aproveitar cada parte daqui. Viu os cavalos? Gosta de cavalgar?

–– Não. Quer dizer, já cavalguei uma vez. Não curti muito. –– Por que está parecendo que estou falando de outro tipo de cavalgada? –– Mas seus animais são belíssimos.

–– Obrigado. Bom, até mais.

Ele segue seu caminho, passa por Suze e a cumprimenta. Já sei que Suze vai vir cheia das caraminholas na cabeça por ter nos vistos conversando.

–– E ai? Já decidiu se vai dar pra ele ou vai só beijar?

–– Suzane! –– Exclamo, falsamente horrorizada. –– Você é simplesmente terrível, garota!

O momento do almoço foi interessante. Todo mundo conversava entre si, trocando figurinhas sobre o que fazem ou como gastam seu dinheiro no tempo livre. Fiquei em silêncio; ora sorrindo ora assentindo. Eu não conseguia me enturmar e isso era graças ao medo de falarem sobre minha família.

–– E você, garota? Trabalha ou faz curso? –– Amanda aponta o garfo para mim, fazendo com que todos ficassem calados.

–– Tranquei a faculdade. –– Tento ignorar todas atenções em mim. –– Tô vendo o que eu faço ainda. Por enquanto tô na minha.

–– Você não é filha de Heitor Gusmão, o CEO da Construtora Gusmão? –– Obrigada, Rafael. Você acabou de cair no meu conceito. –– Maurinho me disse.

Olhei para o irmão da minha amiga sentindo que podia fazê-lo virar pó só com o poder do meu ódio. As vezes eu sinto que posso enforcar Maurinho e não sentir remorso por isso. Droga!

.2.

Eu estava super sem graça. Todos ansiavam minha resposta e eu apenas assenti. Coloquei alguns brócolis na boca tentando mostrar que eu estava ocupada demais para possíveis questionamentos que poderiam surgir.

–– Eu estou super animada para a festa mais tarde. –– Suze bate na mesa assustando a todos. –– Alguém aqui curte gin tônica?

E, graças a minha querida amiga, o assunto mudou para bebidas. Olho para ela e agradeço apenas com o olhar. Ela pisca um olho para mim e sorri. Como eu amo essa garota!

Depois do almoço, alguns foram dormir um pouco e outros escolheram curtir a piscina. Eu fui uma dessas. Eu, Maurinho, Suze e Ícaro trocamos de roupa e nos jogamos na piscina com a água já aquecida. Apesar do solzão, estava um pouco frio. Ninguém quis arriscar se jogar na água gelada.

Eu e Suze nos divertíamos fazendo stories juntas. Acho que eu esqueci de dizer que somos estudantes e blogueiras de moda. Na verdade, eu era. Como não vou voltar para o curso preciso mudar minha biografia no meu perfil.

–– Odeio quando você faz essa carinha, Isis –– Ela me aperta e chacoalha. –– Vamos lá! Animação!

–– Não vou mais poder trabalhar com moda no meu perfil. Nem o curso vou terminar. Quando eu penso nisso me sobe um ódio do meu pai... Urgh! –– Bato na água espirrando-a para todos os lados.

–– Sua vaca! Agora você vai ver!

Suze entendeu como uma pirraça e começou a jogar água em mim. Decido revidar na mesma proporção e aquela piscina ficou pequena para tanta diversão. Os meninos acabaram entrando na brincadeira também.

Notei que Ícaro ficava lançando uns olhares de quem tá querendo beijar minha boca e eu resolvi devolver os olhares na mesma intenção. O cara é maior gato, sorrisão, alto e simpático. Eu tenho mesmo que perder tempo?

Quando eu crio definitivamente coragem de me aproximar dele na piscina, uma bomba atômica é lançada entre nós, nos separando. Bomba essa que emergiu e sorriu com ar debochado para mim.

–– Pensei em me divertir com vocês. Tudo bem, Isis?

–– Ah, claro. Fique à vontade. A piscina é sua, afinal.

Todos olharam para mim, não entendendo patavinas do tom irônico que usei, mas eu fingi que nada fiz. Ele claramente jogou-se entre mim e o Ícaro para afastar-nos. Se ele quer que role algo entre a gente agindo que nem um garoto mimado dessa forma, sinto muito dizer, mas nada terá da mamãe aqui.

Eu não sou propriedade de ninguém para disputarem quem fica comigo. Na verdade, eu sou de quem eu quiser. Pelo tempo que eu quiser. Amo minha liberdade de escolha e espero continuar assim por muito tempo.

Maurinho e Suze resolvem afastar-se; foram fazer videochamada com a mãe histérica e preocupada que eles tem. Ícaro avisou que iria tentar relaxar um pouco e saiu da piscina também.

Restando apenas eu, numa extremidade da piscina, e Rafael na outra. Ele mergulha e vem em minha direção. Deus, ajude-me. Não quero ceder a esse arrogante de cara. Apesar de muito gato.

–– Você é ranzinza assim com todo mundo ou só com quem tá afim de você?

Uau! Mais corajoso do que o Ícaro. Tá ai, gostei. Apenas sorrio como resposta. Adoro ser enigmática.

–– Espero te encontrar na festa antes de ficar muito bêbado. Quero lembrar de tudo que podemos fazer juntos, se você quiser.

–– Mas é um idiota metido mesmo.

Ele gargalha perante minha resposta atrevida, mas eu só consigo focar nesse belo sorriso em minha frente. Eu quero o número do dentista dele. Espera ai, quero não. Eu não tenho dinheiro para isso. Merda!

Conversamos um pouco até Suze e Maurinho retornarem. Resolvo sair da piscina e Suze me acompanha. Quando estávamos dentro do quarto, Suze foi logo me cutucando e perguntando o que estava rolando entre mim e o Rafael. Suze, como sempre, muito fantasiosa.

–– Você fala como se eu já fosse casar com o cara amanhã, amiga. Sai dessa! Você nem é assim.

–– Mas sei que você é. Por isso tenho que cuidar de você. –– Faz bico. –– Minha amiga é romântica, mas a melhor amiga dela a protegerá.

–– Minha melhor amiga é muito doida, isso sim! Você arruma meu cabelo? Tô com uma preguiça...

Ficamos no quarto até a hora do início da festa. Olho o celular para ver se tem alguma mensagem importante, mas não tem nada. Nem do meu pai, nem da minha mãe. De ninguém. Melhor assim.

Eu e Suze curtimos estilos bem diferentes de roupas. Suze é bem patricinha, louca por cores claras e combinações românticas. Eu amo vestir cores fortes e modelos ousados.

Olhando as duas produzidas para a festa nitidamente eu pareço que vou a uma das baladas mais movimentadas da cidade e Suze parece que vai a um encontro de universitários em um barzinho. É bem engraçado.

–– Hoje eu quero beijar no mínimo sete. Espero que você não dê muita moral pro Rafael. Ele vai ficar se achando se você ficar arrastando asa pra ele. Homens são assim.

–– Para com essa história de Rafael, Suzane. Eu quero beber e me divertir. Pelo menos enquanto ainda posso. Vamos descer?

Nós duas resolvemos usar botas ao invés de saltos e foi a melhor ideia que tivemos. A região ao redor do casarão é de terra socada e não combinaria em nada com saltos. Principalmente depois de várias doses.

Suze já estava de olho em um convidado e nós mal pisamos na festa. Eu ainda me impressiono com a rapidez que essa garota tem em flertar com os homens.

–– Primeiro cinco doses e três músicas e só depois você me abandona pelos seus machos. Ok, Suzane Valadares?

–– Ok, Maria Isis Gusmão.

Suze sempre começa a beber com bebidas fortes, então pede uma dose de tequila. Eu não tenho o estômago tão forte, então peço um coquetel de fruta com vodka.

–– Você viu que aquela tal de Amanda ficava olhando torto pra você? –– Cochicha, mas sem me olhar.

–– Despeita feminina. Não suporto isso. Poderíamos todas sermos unidas, mas existem essas que gostam dessa rivalidade sem justificativa. Eu hein!

Enquanto fofocávamos, Rafael surgiu ao lado de um outro gostosão que eu ainda não tinha visto. Só que ele não conseguiu roubar o brilho que envolvia o dono da festa.

Como que os homens ficam tão charmosos vestindo suéter? Se eu colocar fico parecendo um saco de batatas. Se muito eu tenho, no meu guarda-roupa devem ter dois suéteres. E eu só uso em época natalina.

Enquanto eu divagava, não tinha notado que estava olhando fixamente para ele. Suze sussurrou avisando-me. Rafael olhou de volta e eu, para não parecer uma idiota, peguei minha taça e brindei no ar em forma de cumprimento. Ele riu e voltou a falar com as outras pessoas.

–– Você está pagando de apaixonada, Isis. Você já foi mais difícil. O que foi? O cupido te acertou e finalmente você vai dar?

–– Você sabe que eu nunca me apaixonei. Não vai ser agora que isso vai acontecer, com tantos problemas desmoronando na minha cabeça. –– Termino minha bebida. –– Vou de gin agora. Você quer?

–– É óbvio!

Eu já tinha bebido bastante, mas não tinha dançado. A pista tinha sido liberada e eu arrastei Suze para o meio. Fora nós duas, umas dez pessoas também estavam dançando. Mas parecia que nós éramos o centro das atenções.

Riamos e dançávamos feito loucas, sem ligar para o que falariam. Eu queria extravasar, deixar sair todo estresses desses últimos meses. Já que não tem dinheiro para SPA, o jeito era dançar e beber.

Três músicas depois e eu já necessitava de mais álcool. Suze avisou que era a hora dela se divertir com o sexo oposto um pouco. Pedi que ela tomasse cuidado e se protegesse sempre.

Peguei um drink e fiquei observando a movimentação intensa que estava naquele lugar. Tudo uma loucura!

–– Estava procurando por você. –– Rafael senta ao meu lado.

–– Por quê?

–– Pra festa realmente começar pra mim.

.3.

Acabei gargalhando com a cantada barata, de adolescente do nono ano, que Rafael tinha acabado de me dar. Sério mesmo?

–– Ah, é? E como seria isso?

–– Assim.

Ele me rouba um beijo no meio de geral. Retribuí na hora em que senti sua língua pedindo passagem. Ele segura meu cabelo, do jeito que só homem com boa pegada faz, e intensifica ainda mais nosso beijo.

Ainda consegui ouvir um virjão passando e dizendo para irmos com calma que transar em público configura crime de ato obsceno. Eu mereço!

–– Vai com calma, ô apressadinho! –– Afasto-me da sua boca.

–– Não costumo perder tempo quando quero muito alguma coisa.

–– Está me achando com cara de algum brinquedo em promoção?

Peguei minha bebida e saí de perto dele. Não tenho saco para riquinhos metidos a besta que olha para uma mulher gostosa como se ela estivesse à venda. E pior, em promoção.

Descartei minha bebida, que já estava ficando quente, e peguei outra. Quando ia me direcionando para a pista de dança, minha bexiga deu sinal.

Como Suze estava longe e eu não iria deixar minha bebida do lado de fora do banheiro sem alguém olhando, acabei tendo que descartar. Fiz isso no maior ódio. Tinha acabado de pegar.

Quando saí do banheiro, acabei batendo de frente com Ícaro. Ele pediu desculpas e perguntou se estava tudo bem comigo. Ele fazia aquele tipo de homem cavalheiro, porém com maior cara de golpe.

–– Você viu a Suze?

–– Aquela sua amiga né? –– Assinto. –– Vi, mas faz uns quinze minutos. Estava perto das árvores.

Agradeci e saí em busca de Suze. Normalmente sempre fazemos isso. Procuramos uma a outra para sabermos se está tudo sob controle. É uma forma de cuidarmos uma da outra.

Encontro-a ficando com dois caras, encostada em uma árvore gigantesca. Que safada!

Apesar de já ter bebido bastante, eu sentia que precisava de mais álcool. Bebi duas doses de tequila e demorei alguns minutos tentando estabilizar meu cérebro e meu estômago.

–– Não deveria beber tanto assim.

–– Você de novo, Rafael? Sério?

Ele ri e pede ao barman duas rodelas de abacaxi. Assim que o barman entrega as frutas, ele me oferece.

–– Come. Vai ajudar.

Eu não tinha colocado nada consistente no estômago e não iria rejeitar as frutas que aparentavam estar bem suculentas.

–– Obrigada.

Me impressionei com a velocidade que comi as frutas. Acho que estou com fome. Mas odeio misturar bebida alcoólica e comida. Sempre vomito muito depois.

–– Você não foi muito com a minha cara né?

–– Acho você um riquinho metido? Acho! Mas também acho um gostoso. –– Rio de mim mesma por estar tendo coragem de dizer isso ao dono da festa e do lugar onde estou hospedada. –– Desculpe a sinceridade.

–– Por que está rindo enquanto me pede desculpa? Posso estar me sentindo ofendido agora.

–– Eu devo estar ficando maluca mesmo. –– Gargalho. –– Estou dizendo que acho metido o cara que nada mais é que o dono da festa em que eu estou comendo e bebendo de graça.

–– Mas chamou de gostoso também. Melhorou um pouco a sua situação.

Rafael não é tão insuportável como aparenta ser. Talvez ele seja legal. Um pouquinho só.

–– Bebe comigo. Gosto da sua companhia. –– Sugere.

–– Algo mais leve, por favor. Se eu continuar bebendo tequila não terei forças de chegar no quarto. Melhor não arriscar.

Ele pediu dois drinks e pediu um prato com alguns salgados para beliscarmos. Enquanto bebíamos, ele perguntava coisas sobre mim para passar o tempo. Claro que não falei sobre a catástrofe que estou vivendo. Ninguém precisa saber agora. Logo nossa situação vai estar nos jornais mesmo.

–– O que está achando da sua festa? Já beijou quantas?

–– Festas assim pra você existe uma meta de quantas bocas são possíveis beijar numa noite? Porque pra mim não. Gosto de conversar, beber. Beijar é opcional. –– Dá de ombros. –– Até agora eu só beijei e pretendo continuar beijando você.

Ao terminar de dizer isso, ele umedece a parte inferior dos lábios. Eu não resisti. Deus viu o quanto eu me controlei durante toda a conversa.

Ele tinha mãos tão firmes, um beijo tão molhado e caprichado, um cheiro tão másculo e uma pegada de deixar qualquer mulher que valorize isso de pernas bambas.

Ficamos entre beijos, conversas e bebidas por um bom tempo. Suze, podre de bêbada, pediu para que eu fosse dormir com ela. E claro, eu irei.

–– A gente se vê. Tenho que ir com ela. –– Dou um selinho rápido nele. –– Valeu pela festa. Tchau.

–– Até mais, Isis. Tchau, Suze.

Abraçadas, seguimos para o quarto cantarolando nossa costumeira canção dos bêbados. Essa canção é composta por um ritmo qualquer e palavras inexistentes. É isso.

Fomos juntas tomar uma ducha de água fria, escovamos os dentes, colocamos o pijama e caímos na cama. Nem sei quando eu apaguei, mas lembro de reclamar dos roncos de Suze antes de capotar.

Os raios fortes do sol que entravam pela janela e batiam no meu rosto fez com que eu acordasse. Tudo no meu corpo doía, principalmente meu fígado s cabeça.

Suze ainda roncava. Teve sorte da janela não ser perto da cama dela. Levantei, mesmo cambaleante, escovei os dentes, arrumei os cabelos e resolvi ir atrás de uma xícara de café.

Eu estava com uma cara péssima. Quem me olhasse já sabia que eu estava com ressaca. Por sorte, tinha café da manhã pronto para todos. Fiquei apenas no café forte e sem açúcar.

Sentei na varanda e fiquei observando o povo da limpeza dando o grau no que sobrou da festa. Inclusive, tinha gente dormindo na pista de dança. Sorrio quando notei que era Nathan. Ele tem maior cara de festeiro mesmo.

–– Oi. Bom dia!

Gabi surge com uma caneca nas mãos. Respondo no mesmo tom. Ela estava com a mesma cara de ressaca que eu.

–– Ontem a festa foi maravilhosa né? Curti horrores!

–– Pois é. –– Dou um grande gole no café. –– Estava precisando de uma dessas.

–– Vi que você e o Rafa ficaram.

–– É...

–– Depois que você e a sua amiga foram embora ele acabou ficando com a Amanda. –– Dava pra sentir a acidez no comentário dela. Típico de pessoa que gosta de intriga. –– Festas dão sempre o que falar mesmo.

Assenti não querendo mais continuar aquele papo. Dei a desculpa de que iria ver os cavalos e deixei-a sozinha.

O que ela quis tecendo aquele tipo de comentário? Gerar ciúmes em mim? Por causa de um cara desimpedido que fiquei uma única vez?

O cara é um gostoso, beija bem, está solteiro, montado na grana, bancando festão... Tem mais é que aproveitar mesmo.

Se ela quis dizer que eu fui só mais uma, sinto dizer a ela que ele também foi só mais um. Mania chata de perseguição essas doidas tem. Eu hein!

Assim que eu fui me aproximando do estábulo, notei que Rafael estava mexendo em alguns cavalos. Quando pensei em dar meia volta, ele gritou pelo meu nome. Dei bom dia e me aproximei.

–– Dormiu bem? Já tomou café da manhã?

–– Dormi, sim. E optei ficar no café puro mesmo. –– Fiz um gesto mostrando que meu estômago não tá muito legal. –– Gosta mesmo de cavalo né? Aqui tem tantos.

–– É, gosto mesmo. Considero meu animal da sorte. –– Ele alisa um cavalo marrom do pêlo bem macio. –– Trouxeram-me muitas coisas boas.

–– Legal.

Fico observando em silêncio enquanto ele escova alguns animais. Mesmo sendo rico, me impressiona ele mesmo estar fazendo isso e não seus funcionários. Talvez ele não seja de um todo o riquinho metido que eu julguei que ele fosse.

–– Hoje é o dia da fogueira. Vai aparecer né?

Suze tinha me dito que seriam dois dias de comemorações. O primeiro dia seria uma festa e o segundo dia seria algo mais pacífico. Iriam acender uma grande fogueira e ficar em volta dela. Terá bebida, comida, conversas, música ao violão. Coisas assim, mais tranquilas.

–– Vou, sim. Vim para me divertir.

–– Que bom! Ah, você fica muito fofa de pijama. Nem parece a garota que disse na minha cara que eu era um riquinho metido.

–– Desculpe. –– Quero um buraco para me enterrar. –– Falo coisas sem pensar sob efeito de álcool. Foi mal, Rafa.

Ele riu e balançou a cabeça em negação. Despeço-me dele e volto para ver se Suze já tinha acordado. Eu estava doida para fofocar com ela sobre a festa.

Quando bebe, Suze chega a ser pior que um urso durante a hibernação. Agora eu preciso esperar pacientemente a madame despertar do seu sono restaurador.

Que saco!

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