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Segunda Chance

Capítulo 01

Havia uma semana que Elisa sentia uma inquietação crescente, sabia que seu sexto sentido estava a alertando de que algo aconteceria, pois desde pequena, era capaz de intuir quando algo estava escapando de seu controle, ou talvez, aquele sentimento fosse pelo fato de ter que lidar com dois filhos em idades diferentes. Qual mãe nunca passou por isso? Sua filha mais velha, Liz, era uma garota de dezessete anos, e já havia passado por todas as fases possíveis, havia sido rebelde, respondona, mas também já fora carinhosa, companheira e engraçada. Agora, a menina parecia estar na fase dos questionamentos, absolutamente tudo, era contestado.

Em contrapartida, o filho mais novo de Elisa, um menino de dez anos, era sempre alegre, tinha energia de sobra, mas era também muito amoroso, tanto com ela como com o seu pai, Murilo. Em muitos momentos, Elisa pensara que iria surtar por ter que dar conta da casa, do trabalho e de seu casamento, pois não é nada fácil se desdobrar para atender a todos, mas ainda assim, amava mais do que tudo na vida, cada integrante daquela família, e sabia todos os sacrifícios que já havia feito para chegar até onde havia chegado, e acordar todos os dias ao lado do homem que a amava e demonstrava seu amor a cada segundo, era reconfortante.

Mais uma semana estava começando, e Elisa sabia que teria muito trabalho pela frente, e que no final de tudo, daria conta das coisas, ela abre seus olhos e os esfrega com o dorso de sua mão, ao notar que Murilo também havia acabado de acordar, e a olhava, ela abre um sorriso apaixonado, pois a cada dia que passava seu amor por ele aumentava, e mesmo estando dezessete anos ao lado dele, ela ainda sentia o mesmo frio na barriga toda vez que seus olhos se cruzavam.

— Bom dia, minha princesa!

— Bom dia, amor!

— Você acordou especialmente linda, hoje!

— É mesmo? Você me diz a mesma coisa, todos os dias!

— O que eu posso fazer, se a cada dia você está mais linda?

— Eu conheço seus truques, senhor Hoffman, está tentando me fazer ficar nesta cama o dia todo, não é?

— Sim! O que eu posso fazer, se você chegou em minha vida e trouxe uma vida nova, dentro deste meu coração solitário? — Diz Murilo, abrindo um sorriso ainda maior.

Imediatamente, Murilo se apossa dos lábios de sua esposa, e em questão de segundos, os dois já se entregavam à paixão. Murilo era um homem intenso, e cada vez que estavam juntos, era como se fosse a primeira vez, pois com o passar dos anos, o amor e a paixão entre eles, somente aumentava.

Momentos depois, Elisa se arrumava em frente ao espelho, de forma apressada, pois havia passado mais de duas horas de seu horário, seu filho de dez anos com certeza já tinha ido para a escola, e sua filha, Liz de dezessete anos, certamente já tinha ido para sua aula de ballet.

— Me atrasei, de novo! — Diz Elisa tentando colocar seus brincos.

— Mas foi por um bom motivo! Não se preocupe, pois não é a primeira vez que perdemos a hora!

Murilo a olhava hipnotizado, ainda mantinha um sorriso nos lábios. Enquanto ela andava de um lado para o outro, ele se arrumava de forma muito calma, como se não estivessem se atrasado um minuto sequer. Momentos mais tarde, Elisa se despede de seu marido, e sai apressada, ela entra em seu carro, e sai, não tomara nem café da manhã, pois seus compromissos a aguardavam. 

O dia estava quente e abafado, o céu estava aberto, de um azul como nunca visto antes, não tinha nuvem alguma. Mesmo o dia estando lindo, alguma coisa no coração de Elisa dizia que alguma coisa estava errada. Uma inquietação crescente tomava conta de seu peito, e ela tinha certeza que algo estava prestes a acontecer, pois sempre fora muito intuitiva, e se alguma coisa a incomodava, tinha certeza de que era somente uma questão de tempo, até que acontecesse.

Entre um paciente e outro,  aproveitava para mandar mensagem para sua filha adolescente, Liz, e seu filho Breno, gostava de saber o que o pequeno menino de dez anos aprontava durante o período em que ela não estava em casa, já com sua filha Liz, gostava de saber com quem ela andava, já que Liz era uma adolescente de dezessete anos, e ultimamente andava meio rebelde. Por volta das onze da manhã, Elisa recebe em seu consultório odontológico, um imenso buquê de rosas vermelhas, e no cartão, lia-se apenas:

...Para meu amor de hoje e sempre, nunca se esquecer que é única dona do meu coração. Te amo....

...Sempre seu, Murilo....

Ela olhava aquelas flores e aquele bilhete com um sorriso aberto em seus lábios, pois a cada dia que passava, ela e Murilo se amavam mais, e as demonstrações de amor dele, por ela, a derretia por inteiro.

Elisa era uma renomada dentista, era dona de uma rede de consultórios que atendia a alta sociedade, era apaixonada por seu trabalho, e sua rotina. Desde pequena tivera que lidar com o preconceito das pessoas, pois ser negra, filha de empregada doméstica e moradora de comunidade, já era motivo suficiente para as pessoas olharem torto e julgarem seu caráter, como se isso fizesse sentido. Porém, sua mãe sempre a educara de forma que ela JAMAIS se sentisse menos do que as outras pessoas, Elisa crescera com a consciência de que era merecedora sim, de estar em lugar de liderança, e desde pequena, estabelecera uma meta: Seria uma das melhores dentistas do país, senão, a melhor, e nada a impediria isso, não abaixaria a cabeça para ninguém, muito menos se sentiria menos importante do que as outras pessoas, porém, sabia que se dedicar o dobro, pois suas condições financeiras, não era a das melhores.

Com muito empenho, e a ajuda das pessoas certas, ela havia conseguido se estabelecer financeiramente,  ainda na juventude, já que não havia nascido em berço de ouro. Desde que se conhecera por gente, sempre fora ela e sua mãe batalhando sozinhas, apenas. A vida na comunidade não havia sido nada fácil, pois apesar de a maioria das pessoas daquele lugar serem pessoas de bem, e trabalhadoras, tinham que lidar além do preconceito, com com a violência que aumentava cada dia mais. Mas olhando no presente, cada conquista que Elisa tinha, olhava para trás com orgulho de sua trajetória, e sabia que sua mãe havia sido fundamental nesse processo. 

Naquele dia de trabalho, o tempo havia voado. Elisa olha em seu luxuoso relógio de pulso e percebe que se aproximava das três da tarde, e seu expediente estava próximo de se encerrar, pois podia se dar ao luxo de sair a hora que bem entendesse, e mesmo tendo chegado mais tarde, ir para casa e ficar com seus filhos e seu marido, era sagrado. Ao atender seu último paciente, ela tira seu impecável jaleco com seu nome bordado, pega sua bolsa de grife, e sai porta afora, pois iria para casa. Ao se despedir de seus funcionários, ela caminha até o estacionamento e entra em seu luxuoso carro, liga o rádio afim de relaxar um pouco, e em poucos minutos já seguia pela estrada afora. 

O trânsito estava lento, parecia que tinha mais carros do que de costume, o que era no mínimo estranho, pois àquele horário, era sempre tranquilo. Um pouco mais à frente, Elisa para o carro, estava oficialmente num engarrafamento. Abruptamente a música é interrompida, e o radialista entra ao vivo para anunciar um grave acidente.

...... Os condutores de veículos devem evitar a via expressa neste exato momento, pois um grave acidente acaba de acontecer. Nos chegam informações de que dois jovens alcoolizados acabam de bater o veículo, um rapaz, e uma moça, ambos de mais ou menos dezesseis anos. O resgate acaba de nos informar que o rapaz é que dirigia o veículo, e que infelizmente acabou perdendo o controle do veículo, e bateu de frente com um caminhão. Ao que tudo indica, o rapaz faleceu ainda no local, e a jovem que o acompanhava, está em estado grave... A qualquer momento, traremos novas informações......

Elisa abaixa o volume do rádio, e começa a se inquietar, pois imaginava a dor e a angústia dos pais daqueles jovens, não conseguia imaginar sua vida sem seus filhos. Aproveitando que estava parada na estrada, e que tudo levava a crer que o trânsito não andaria tão cedo, ela pega seu celular, e liga para seu filho de dez anos, o menino atende no mesmo instante, e de forma alegre. Os dois conversam mais um pouco, e em seguida Elisa desliga. Resolve então ligar para sua filha, Liz, que àquele horário deveria estar saindo de sua aula de ballet, pois em poucos dias seria sua formatura oficial, e já com dezessete anos, se formaria em Ballet Clássico, já pois que estudava desde seus sete anos de idade.

O telefone chamava sem resposta, e o coração de Elisa começava a bater depressa, pois apesar de sua filha ser um tanto quanto temperamental, sempre que ela ligava, Liz atendia. Os motoristas dos carros ao lado de Elisa começam então a sair de seus carros e caminhar até o acidente, nessa hora a curiosidade sempre fala mais alto, e num gesto automático, Elisa acaba também saindo de seu carro e caminhando junto com os outros motoristas. Seu telefone insistia em chamar por sua filha, mas nada mudava, o telefone dela apenas chamava. 

Ao se aproximar um pouco mais do acidente, Elisa ia ficando cada vez mais angustiada, ela olhava o resgate trabalhar de forma apressada, afim de tentar retirar a jovem das ferragens do carro, já que ela ouvira que infelizmente o condutor do veículo havia falecido. Ela nota então o corpo do jovem rapaz coberto no chão, e sente seu corpo se arrepiar por inteiro. Ela se aproximava cada vez mais do acidente, e acaba encostando na faixa sinalizadora que o resgate colocara para os motoristas curiosos não ultrapassarem.

Nesse momento, Elisa acaba ouvindo um celular tocando, exatamente com a mesma música como tocava o de sua filha, poderia ser uma coincidência, se não fosse o fato, de o toque em questão era dae  sua música favorita de Liz, era a, Blue Danube, por Johann Strauss. Imediatamente seus olhos começam a procurar os de Liz, mas de onde estava, não conseguia ver com nitidez se a jovem socorrida, era sua filha, ou se ela estava por perto vendo a cena. Elisa andava por entre as pessoas tentando um melhor ângulo, precisava ver se conseguia reconhecer a jovem ferida. No mesmo instante em que os socorristas e os bombeiros retiravam a jovem do veículo e a colocavam na maca, o coração de Elisa quase para, pois finalmente consegue ver a jovem acidentada, e sim, era sua filha, assim como seu coração dizia.

Desde a manhã, seu coração andava apertado, e todas as vezes que isso acontecia, alguma notícia ruim logo chegava. Imediatamente ela começa a chorar e a gritar para que a deixassem se aproximar de sua filha, precisava ficar perto de Liz.

— Me deixem passar, por favor!

— Não pode ultrapassar a barreira, senhora!

— Mas é minha filha que está ali.

— Sua filha? Tem certeza?

— Claro que sim, me deixe acompanha-la......eu imploro!

— Está bem, mas não a toque, está bem? Ela precisa ir ao hospital imediatamente, pois seu estado é grave. Eu sinto muito, senhora!

Elisa ultrapassa a barreira e sai correndo em direção à sua filha, a menina se encontrava inconsciente, e sangrava muito. A todo instante Elisa a chamava, quase que no automático, pois era evidente que Liz não a ouvia. Ela tremia por completo ao ver o estado em que sua filha estava, e pede aos céus com todas as suas forças que sua filha se salvasse. 

Ao entrar na ambulância, ela tinha seus olhos fixos em sua filha, não conseguia desviar um minuto sequer, e via o quanto os socorristas se esforçavam para manter o quadro dela estável.

Em poucos minutos chegam ao hospital e imediatamente sua filha é levada para dentro, e some por entre os corredores, a deixando ali, sozinha, desamparada e angustiada. Elisa não ouvia uma palavra sequer do que as enfermeiras diziam a ela, seus pensamentos estavam somente em sua filha, e no que poderia acontecer, a partir dali. Muito tempo se passa, até que ela resolve sair do lugar, pois parecia uma rocha, fincada ao chão. Elisa então reúne todas as suas forças e caminha até a recepção, afim de preencher a papelada, e logo em seguida, liga para seu marido, pois ele precisava saber urgentemente o que havia acontecido.

Capítulo 02

— Murilo? Sou eu, Elisa!

— Como está, minha princesa?

— Você precisa vir ao hospital central agora mesmo, nossa filha sofreu um acidente.

— Como é? O que houve?

— Não tenho tempo de explicar agora, amor. Por favor, venha o mais rápido possível.

— Claro! Estarei aí em poucos minutos.

Elisa então liga para sua casa e avisa que tanto ela, quanto seu marido, Murilo, chegariam mais tarde, e que era para dizerem para Breno, o filho deles, que tinham tido uma emergência no trabalho. Ela sabia que seu filho era esperto o bastante para saber que alguma coisa estava errada, mas por hora, era o que deveria ser feito.

Ela andava de um lado para o outro na minúscula sala de espera, e todo médico ou enfermeiro que passava, ela perguntava sobre sua filha, mas todos diziam a mesma coisa, diziam que assim que tivessem alguma informação, a avisariam. Cerca de quinze minutos depois, Murilo a encontra na sala de espera e a abraça. Elisa o agarra o mais forte possível, pois precisava se sentir segura de alguma forma, e naquele momento, deixa toda sua angústia sair do peito. Murilo a abraçava com força, acariciava seus cabelos e dizia suavemente que tudo ficaria bem.

Elisa se desprende dos braços dele, depois de muito tempo, enxuga suas lágrimas com o dorso de sua mão, e o olha nos olhos.

— E se acontecer alguma coisa com nossa filha?

— Não vai acontecer nada, meu bem!

— Como sabe? Eu a vi sendo socorrida, tinha tanto sangue......eu estou desesperada......

— Ei! Eu estarei sempre aqui com você, passaremos por isso juntos.

— Eu tenho tanto medo de que aconteça o pior com nossa menininha, meu amor!

— Vamos manter o pensamento positivo, eu sei que é difícil, mas temos que esperar pelo melhor. Nossa filha está num excelente hospital, tenho certeza que farão o que é possível para salvá-la, ainda iremos ver nossa filha brilhar nos palcos, afinal, ela é uma excelente bailarina, e ainda nos dará muito orgulho.

— Assim espero, não consigo imaginar minha vida sem ela.

— Não vamos alimentar pensamentos ruins agora, vamos apenas confiar que ela terá o melhor tratamento.

O tempo passava devagar, o relógio parecia empacado, os minutos pareciam se arrastar, e quanto mais ela esperava, mais angustiada ficava. Por volta da uma da manhã, o médico que estava cuidando dela finalmente aparece para dar uma satisfação.

— Senhor e senhora, Hoffman?

— Sim! E nossa filha? Como ela está? — Pergunta Elisa, visivelmente abalada.

— Podemos ir, até minha sala? Preciso explicar algumas coisas para vocês, e a sala de espera não é o lugar mais adequado.

Nessa hora o coração de Elisa dispara, pois sabia que não viriam boas notícias. Os três andavam pelo corredor do hospital apressadamente. Ao entrarem na sala do médico, imediatamente se apressam a fazerem perguntas.

— E então? O que houve? Nossa filha está bem, não está?

— Se acalme, senhora Hoffman, o que tenho a dizer, não será nada fácil, vocês dois terão que ser muito forte, mas é uma conversa necessária. Pois bem, o acidente da filha de vocês foi muito grave, tão grave que o outro rapaz que estava dirigindo, veio a falecer. O caso, é que com a batida, o organismo da filha de vocês ficou muito debilitado, e.......ela acabou perdendo parte do fígado e precisará de um transplante.

— Um transplante? Meu Deus!

— Se acalme, senhora Hoffman, a senhora e seu marido tem grande chance de ser compatível com ela, e na maioria dos casos a cirurgia é um sucesso, tanto quem doar, como quem receber o fígado, levará uma vida completamente normal, já que o fígado é o único órgão que se regenera completamente, ele volta ao tamanho normal para você e o receptor em aproximadamente dois a três meses.

— E como saberemos se somos compatíveis?

— Se estiverem de acordo, podemos fazer os exames agora mesmo, e como são os pais dela, a chance de serem compatíveis é muito grande, mas se não forem, o que acontece bastante, podem organizar um mutirão, sugiro que avisem a família e os amigos mais próximos para encontrarmos alguém compatível, é comum o doador não ter parentesco com o paciente.

— Está bem, faremos os exames agora mesmo, e eu tenho fé que um de nós dois será o doador — Diz Murilo, com muita confiança.

— Ótimo, quanto mais rápido, melhor. Mas deixarei com vocês, uma lista dos requisitos básicos para doadores vivos, e se os exames de vocês derem negativo, já saberão dos critérios.

Elisa olhava atenta para o papel, pedia aos céus para que ela própria pudesse salvar a vida de sua filha, prestava atenção em cada detalhe daquele papel, pois caso não fosse compatível, teria que achar alguém que fosse, mas faria o possível e o impossível para conseguir salvar a vida de sua filha. No pequeno papel, lia as seguintes informações:

Critérios para doar fígado | Doadores Vivos

- Ser maior de 18 anos;

- Gozar de boa saúde;

- Não sofrer de obesidade;

- Ter compatibilidade sanguínea e imunológica com o receptor;

- O doador precisa ter estatura maior ou pelo menos igual ao do receptor;

- Veias, artérias e vias biliares do doador e do receptor também precisam ser compatíveis;

Os doadores são convidados a interromper as seguintes atividades pelo menos um mês antes da cirurgia:

Tabagismo: se você é um fumante moderado, pare de fumar um mês ou mais antes da cirurgia. (Pessoas que fumam muito não são doadores de órgãos ideais; elas têm um risco aumentado de complicações cardíacas e pulmonares com qualquer cirurgia).

Contraceptivos orais: os doadores devem parar de tomar pílulas anticoncepcionais cerca de quatro semanas antes da cirurgia para diminuir o risco de coágulos sanguíneos após o procedimento. Você deve usar outras formas de controle de natalidade durante esse período.

Álcool e drogas: antes da cirurgia, você deve estar sóbrio de álcool e drogas. Dependendo da droga, um período maior de sobriedade pode ser necessário.

Elisa termina de ler o informativo, e enquanto isso, Murilo ouvia atentamente sobre os procedimentos que deveriam adotar para os exames, pois corriam contra o tempo, já que a saúde da filha deles estava frágil. Ao saírem da sala do médico, os dois se encaminhavam ao laboratório dentro do próprio hospital, já que estavam no melhor hospital da cidade. Ao terminarem a bateria de exames pedidos em caráter de urgência pelo médico, notaram que o dia já havia amanhecido, lá fora os primeiros raios de sol já enfeitavam o céu, e o cansaço começava a aparecer.

— Já amanheceu, meu bem. O que acha de irmos até a cantina do hospital? Depois de tomarmos um café, iremos tentar ver nossa filha, espero que nos deixem vê-la, nem que seja por um instante apenas.

— Está bem! Não vou sair daqui enquanto não conseguir vê-la, embora nosso filho também mereça atenção, mas nesse momento não consigo sair daqui.

— Não se preocupe, eu liguei para casa e pedi que levassem Breno para casa de meus pais, sua mãe também foi junto, achei mais adequado neste momento difícil, disse que tínhamos ido viajar a trabalho. Acho melhor assim, não podemos preocupa-lo, pois ele é louco pela Liz, e depois resolvemos isso. Devemos nos preocupar com um problema de cada vez.

— Eu não sei o que eu faria sem você, Murilo! Você sempre foi meu companheiro em tudo. Em cada momento de angústia, é você que segura a minha mão!

— Isso se chama amor, minha princesa! Estaremos juntos nos bons e nos maus momentos, lembra? Eu sempre a amei, e sempre a amarei.

— Eu também o amo muito, Murilo. Nunca se esqueça disso.

Elisa e Murilo caminham até a cantina afim de tomarem um café, e em seguida, conversariam com os médicos para terem mais alguma informação.

Capítulo 03

Os exames de Elisa e Murilo haviam saído em tempo recorde, mas as notícias não haviam sido nada boas.

— Eu sinto muito, senhor e senhora Hoffman, mas nenhum de vocês dois poderá ser o doador.

— Eu não acredito! Eu sou a mãe, tinha certeza que poderia ser a doadora!

— Infelizmente, não! Mas isso acontece, é mais frequente do que a senhora pensa. Agora o que temos que fazer é achar alguém compatível o mais rápido possível, pois o tempo da filha de vocês está se esgotando. Sugiro que vão para casa e avisem todos os parentes, amigos e pessoas próximas para que façam os exames para descobrirmos alguém adequado. Não percam tempo!

Ao ouvirem aquelas palavras, Elisa e Murilo saem apressadamente do hospital e começam a saga em busca de alguém compatível. Avisaram toda a família, amigos, e até os funcionários de ambos. Todos os dentistas que trabalhavam com Elisa e todos os funcionários dos escritórios de advocacia de Murilo haviam aceitado fazer os exames.

Uma semana se passa, e agora corriam contra o tempo, mas a cada resultado negativo do exame, o coração deles ficavam apertados. Àquela altura Breno, o filho deles já havia descoberto que a irmã dele estava no hospital, pois não poderiam mentir para sempre, sem contar que um menino de dez anos, é bem esperto.

— Minha irmã vai ficar bem, não vai?

— Claro que sim, garotão! Sua irmã é forte, logo, logo, ela estará aqui em casa com a gente — Dizia Murilo, tentando passar segurança para seu filho.

— Eu posso “ver ela”, papai?

— Ainda não, mas assim que ela puder receber visitas, eu prometo que te levo até lá.

A vida de Murilo e Elisa havia se transformado numa angústia sem fim, pois a única coisa que faziam, era tentar achar alguém compatível. Não dormiam direito, não comiam, tampouco estavam bem psicologicamente. Os dias eram exaustivos, mas ainda assim, se mantinham unidos. Todos, absolutamente todos os funcionários, amigos, familiares, e até alguns clientes de ambos haviam aceitado fazer os exames para descobrirem a compatibilidade, porém, quando o resultado da última pessoa saíra, o mundo de Elisa e Murilo desmoronado novamente, pois havia dado negativo.

Naquela noite, Elisa chorava silenciosamente em sua cama, pois não sabia mais o que fazer.

Murilo entra no quarto e se deita ao lado de sua esposa, a abraça e tenta confortá-la, mesmo ele próprio se sentindo destruído.

— Acharemos uma solução, minha princesa.

— Mas não resta ninguém mais, Murilo! O que faremos?

Murilo se mantinha em silêncio, não tinha certeza se deveria tocar num certo assunto do passado, mas mesmo assim, não se tratava somente dele, e sim, da vida de sua filha.

— Acho que você sabe muito bem o que devemos fazer, não é? — Diz, Murilo, a contragosto.

Elisa para de chorar no mesmo instante, e o encara, pois sabia exatamente sobre o que seu marido estava falando.

— Você não espera que eu remexa no passado, né?

— É necessário, meu amor. Lembre-se que não é sobre nós dois, e sim, sobre nossa filha. Temos que pensar somente nela, é questão de vida ou morte.

— Você acha mesmo que teremos que chegar a esse ponto?

— Para ser sincero, acho que deveríamos ter feito isso desde o início, pois a vida de nossa filha é mais importante do que qualquer coisa, e não podemos descartar nenhuma possibilidade.

— Tem toda razão! É como você sempre diz, não é? Um problema de cada vez! Amanhã mesmo eu farei o que tem que ser feito! Eu confesso que nem cheguei a pensar em coisas do passado, pois eu tinha fé que conseguiríamos alguém, mas........agora não tem mais jeito, essa é nossa única alternativa.

— Sobre isso........Eu me adiantei, pois quando percebi que nosso tempo estava se esgotando e que ainda não tínhamos arrumado alguém compatível, eu comecei a cogitar a possibilidade de remexer no passado, e.........foi o que eu fiz!

— Então........você sabe do paradeiro dele?

— Sim, eu sei. Ele continua morando no mesmo lugar, ainda mora no morro das Laranjeiras, ainda vive no mesmo lugar em que vocês se conheceram.

— Eu jamais imaginei isso, confesso que nunca mais pensei nele desde que saí de lá. Não pensei que depois de tanto tempo, tivesse que revê-lo..........enfim.......não quero pensar nisso agora, quero somente salvar a vida de nossa filha.

— É o mais importante, meu amor!.......Elisa.............me prometa que, aconteça o que acontecer, sempre se lembrará que eu a amo?

— Não fale assim! Não acontecerá nada, eu também o amo. VOCÊ é meu marido, é o homem que me deu um lar, é o homem que me amou desde o primeiro momento que me viu, não tenho intenção alguma de reviver o passado.

— Tem certeza? Afinal..........Aquele homem foi o seu primeiro amor, e.........ele e o pai biológico da nossa Liz!

— VOCÊ, é o pai da Liz! Nunca se esqueça disso. Ele apenas foi o homem que contribuiu para que ela fosse gerada, mas quem esteve ao meu lado desde sempre, foi você.

— Promete que se sentir alguma dúvida quanto ao seu sentimento por mim, vai me contar?

— Isso não vai acontecer! Eu amo nossa vida e nossa família.........Amanhã tentarei falar com o pai biológico de Liz, mas minha intenção será única e exclusivamente para salvar a vida de nossa filha, nada além disso.

Ele então abraça sua esposa com muito amor, pois sentia que sua vida daria uma guinada completa. Estavam prestes a reviver o passado, e ele sabia muito bem a importância que Júlio havia tido na vida de sua esposa, afinal, dizem que o primeiro amor, é inesquecível.

Murilo Hoffman era um homem de 45 anos, era educado, charmoso, galante, cavalheiro, de boa família, e extremamente bonito e sedutor, por onde passava chamava atenção, pois sempre estava bem vestido e seu cheiro era inconfundível. Era filho de um importante juiz e crescera sabendo muito bem que seu destino seria o direito, pois desde pequeno demonstrava interesse pela advocacia.

Em sua juventude havia sido um garoto estudioso, o melhor da sala, era rodeado de amigos e garotas, mas seu coração pertencia somente a uma jovem, Elisa Martins, a filha da empregada de sua casa. O problema era que a menina parecia não se impressionar com o belo rapaz. Durante algum tempo, Murilo amou Elisa em silêncio, e sempre que tentava se aproximar da moça, sentia que não tinha chance alguma com ela, sem contar que eles tinham uma diferença de dez anos, e ele teria que espera-la completar a maioridade para se declarar.

Elisa era uma jovem negra, de cabelos crespos volumosos, sorriso largo, boca carnuda e olhos expressivos, corpo esguio, poderia ter sido facilmente uma grande modelo de passarelas. Por onde Elisa andava, chamava atenção, pois tinha uma beleza desconcertante, e uma classe invejável. Não demorou muito, para que Murilo se encantasse completamente por ela, pois Elisa saía da escola e ia até a mansão dos Hoffman todos os dias, depois da escola, pois a comunidade em que morava era um tanto quanto violenta. Na mansão todos conheciam Elisa e simpatizavam com ela, pois Elisa era uma menina doce, educada e simpática, e várias vezes ajudava sua mãe nas tarefas da mansão.

Agora, depois de tanto tempo, o passado batia à porta deles, os fazendo encarar as consequências de terem omitido algo tão sério. Teriam que lidar cada um com sua dor. Só restava saber o que sobraria, depois da tempestade.

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