Clara
A forma como ele me olhava parecia penetrar minha alma. Apesar de ser apenas uma garotinha na época, eu sentia uma conexão inexplicável entre nós.
É claro que, devido à nossa diferença de idade naquele momento - ele com 17 anos e eu com 12 -, compreendo agora que seria impossível que qualquer coisa acontecesse entre nós.
Hoje, aos meus 26 anos, entendo o quanto ele foi respeitoso e maduro comigo. Mesmo quando não resistindo aquela atração ele me deu um selinho, eu fiquei assustada e corri, meu coração acelerado, mas ao mesmo tempo, me senti bobamente feliz com um sorriso de orelha a orelha.
A conexão entre nós era inegável, quando ele visitava a casa dos meus pais, era como se o tempo parasse.
Nossos olhares se encontravam e era como se nossos corpos se comunicassem, havia uma atração palpável, mesmo que fosse impossível naquela fase da vida. Nós dois sabíamos que algo forte existia entre nós, apesar da nossa pouca idade.
Volto à realidade quando meu filho João, de 10 anos, me chama:
— Mãe! Mãe! O arroz vai queimar!
Percebo que deixei o arroz no fogo e me apresso em desligá-lo. Olho para o meu filho com seus cabelos ondulados e castanho, e digo:
— João, obrigada por me avisar, filho. Às vezes, minha cabeça está distraída. Só espero que seu pai não perceba que queimei um pouco o arroz.
Ele se aproxima, segura minhas mãos e diz:
— Mãe, acontece. Meu pai não pode te culpar por isso.
Eu o abraço apertado e beijo seu rosto, dizendo:
— Eu te amo, filho! Muito mesmo. Nunca se esqueça disso.
Ele sorri e me abraça, respondendo:
— Eu também te amo, mãe, para sempre.
Ficamos abraçados por um tempo, até que minha filha Isabely aparece segurando sua boneca. Com seus 6 anos, ela é muito esperta, seus cabelos lisos e castanhos descem em cascata até o meio de suas costas.
Ela se aproxima sorrindo e diz:
— Abraço em família! Eba!
Caímos na risada, abraçados, aproveitando o momento, até que Sérgio com seu típico corte de cabelo curto e cavanhaque bem alinhado, chega.
Ele entra dizendo:
— O almoço está pronto, Clara? Estou com muita fome e ainda tenho muito trabalho pela frente.
Suspiro profundamente e respondo:
— Está, Sérgio.
Arrumo a mesa e logo começamos o almoço. Como eu já previa, Sérgio percebe o arroz queimado e diz:
— Não acredito que você queimou o arroz! Que diabos você estava fazendo que deixou a comida queimar? Você não faz nada direito, seu único compromisso é cuidar da casa e nem isso você está fazendo corretamente.
Engulo em seco, um nó se formando na minha garganta. Mas meu filho intervém e diz ao pai:
— Isso acontece, pai. A culpa não foi da mamãe.
Sérgio olha para João e diz:
— E eu falei com você, moleque? Tenha respeito com seu pai e não se intrometa em conversas de adultos.
João olha para o pai com um olhar acusador e revoltado e diz:
— Espero que o senhor também tenha mais respeito com minha mãe.
Temendo algo pior, me adianto e digo:
— Filho, está tudo bem. Seu pai está cansado, e realmente foi um descuido meu, mas terei mais cuidado para que não se repita novamente.
Minha pequena Isa, olhando para o pai, pergunta:
— Papai, por que o senhor está sempre cansado e irritado?
Sérgio olha para nossa filha e responde:
— Eu só estou um pouco estressado, filha, não se preocupe.
E assim seguimos almoçando em silêncio. Às vezes me pergunto se eu e Sérgio estamos apenas nos tolerando. Tudo se tornou monótono em nossa relação. Sei que temos responsabilidades, mas sinto falta de ter certa liberdade dessas obrigações. Tive que amadurecer muito cedo, pois me envolvi com o Sérgio em uma idade jovem e logo engravidei.
Talvez tudo fosse diferente se eu não estivesse tão iludida, achando que eu e Sérgio compartilhávamos do mesmo sentimento. No começo, foi tudo muito bom. Eu o amava muito, disso tenho certeza, mas ele não correspondia ao meu amor da mesma forma.
Assim que terminamos o almoço, Sérgio volta para o trabalho, e meus filhos se preparam para a escola. Logo em seguida, me arrumo e os levo para a escola a pé, já que fica perto de nossa casa.
Me despeço deles:
— Até mais tarde, meus amores. Boa aula!
Eles me dizem:
— Até mãe! — enquanto acenam.
E assim retorno para casa. Quando estou chegando perto de minha casa, a Dona Amélia, minha vizinha, me chama:
— Clara, querida, pode vir aqui um momento?
Me aproximo dela, que está no portão de sua casa. Como moramos em um bairro tranquilo e seguro, temos mais confiança em andar por aqui. A polícia faz rondas frequentes, pois há uma favela ao final de uma rua próxima.
Chego perto dela, e ela me cumprimenta:
— Como você está, querida?
— Estou bem, e a senhora?
Ela me dá um pequeno sorriso e responde:
— Estou bem. Eu queria te convidar para um projeto, se você estiver interessada, é claro.
Olho curiosa e um pouco ansiosa para ela e pergunto:
— De que projeto se trata, Dona Amélia?
Ela me olha sério, e me diz:
— Para ser sincera com você, é um projeto beneficente, então não receberemos pagamento por isso. Mas teremos a oportunidade de ajudar muitas crianças através do conhecimento. Eu e mais algumas senhoras levaremos livros e ensinaremos algumas crianças da favela próxima a ler. Como você é uma jovem encantadora, achei que talvez você gostasse de nos ajudar.
Eu achei a iniciativa extremamente nobre e, como só cuido da casa, eu gostaria muito de ser útil e ajudar nesse projeto.
São crianças que realmente merecem aprender, e qual melhor maneira do que ensinar através da leitura? Isso abrirá a imaginação delas para coisas boas. Então, com um sorriso, digo a ela:
— Será um prazer fazer parte disso. Podem contar comigo.
Dona Amélia me dá um sorriso genuíno, e me diz:
— Sabia, que podia contar com você Clara.
Assim me despeço dela, e sigo para minha casa, agora só preciso fazer o Sérgio, entender que esse projeto é importante.
Diogo (Também conhecido como DG):
Hoje, aos meus 31 anos, enquanto observo as luzes das casas lá embaixo, estando aqui no topo do morro, reflito sobre a minha vida.
Com os braços cruzados e vestindo uma blusa com capuz, me encontro, contemplando tudo de cima. Nessas horas, acabo refletindo sobre tudo o que vivi e sobrevivi.
Lembro-me da minha infância no interior, onde nunca tive a presença do meu pai. Eu era um espírito livre e sei que dei muito trabalho para a minha falecida mãe.
Como posso explicar essa parte de mim para as pessoas? Talvez tenha sido um distúrbio causado pela negligência do meu pai, mas não tenho certeza. Ou talvez eu tenha nascido assim, destinado a ser um cara totalmente problemático.
Foi essa trajetória que percorri, no meio das correrias do dia a dia, que me trouxe até aqui. Foi aqui, neste morro, que Diogo Garcia deu lugar a DG, o chefe temido por todos.
Tive que fazer coisas realmente terríveis para alcançar essa posição, precisei conquistar a confiança das pessoas certas e, literalmente, lutar contra outras ainda mais malignas.
Estou distraído quando Lucas, um dos meus homens de confiança, se aproxima de mim.
— E aí, chefe? Os carregamentos foram concluídos com sucesso.
Sei perfeitamente que ele está se referindo aos carregamentos de drogas, então respondo:
— Me entregue a planilha depois, Lucas. Preciso acompanhar todos os detalhes minuciosos dessa carga.
— Tranquilo, já deixei na sua mesa, chefe.
Olho para ele com seriedade e digo:
— Qual é, Lucas? Já te disse para me chamar de DG quando estivermos a sós.
Ele sorri discretamente e diz:
— Tudo bem, é questão de costume... Sabe como é, né?
Rimos juntos. Lucas é mais que um amigo, ele é um irmão que está comigo há muito tempo.
Ele me olha e diz:
— Os moleques estão fazendo um churrasco lá em cima da lage, você quer ir? Tem várias garotas que subiram o morro, o que significa carne nova.
Passo a mão na barba, suspiro profundamente e respondo:
— Hoje não estou a fim, Lucas. Não estou interessado em churrasco nem em mulheres.
Ele já compreendendo o motivo, diz:
— Entendi. Dia nublado, não é?
Dia nublado é quando a reflexão bate, o dia em que penso "E se fosse diferente?". É quando questiono por que escolhi esse caminho sem volta, quando me pergunto se mereço redenção.
Lucas se aproxima, coloca as mãos nos bolsos da calça e começa a admirar a vista daqui de cima. Olhando para as luzes das casas abaixo, ele me pergunta:
— Você está pensando nela novamente?
Com um pequeno sorriso discreto, respondo:
— Sim, sempre que penso nela, mergulho nesse mar de reflexões. Ela nunca saiu da minha mente.
Como sempre, ele diz:
— Eu já te disse, DG, podemos encontrá-la para você. Só precisamos que você nos dê o nome dela.
E como sempre digo a ele:
— Não, Lucas, ela ficará melhor sem mim. Além disso, a mãe dela me detestava. Odiava quando eu ia na casa deles e vivia me chamando de garoto problema. Na verdade, a mãe dela estava certa. Sempre fui um problema.
Lucas me olha com reprovação e diz:
— Não acho que você seja um problema. Apenas acho que você tem facilidade para atrair problemas. E você tem ainda mais facilidade para resolvê-los.
— Pois é, guardo apenas boas lembranças daquela época, mesmo com a mãe dela me odiando.
Lucas me olha intrigado e pergunta:
— Se a mãe dela não gostava de você, como você ia na casa dela então?
— O irmão dela era meu amigo. Ele sempre me defendia da mãe deles.
Ele responde:
— Entendo. Mas vocês eram muito jovens, não é? Especialmente a garota.
— Sim, Lucas. Havia uma atração muito forte entre nós. Muitas vezes, eu me odiava por isso. Não entendia por que estava acontecendo, por que sentia isso por aquela garotinha.
Ele me olha e diz:
— Realmente, era uma situação desafiadora, ainda mais porque você também era jovem na época.
Concordando com ele, digo:
— Sim, mas em uma noite, quando ela saiu com a mãe e depois voltou para casa porque tinha esquecido algo, segurei a mão dela enquanto ela passava perto de mim. Lembro que ela estava confusa, queria sair, mas eu a puxei suavemente e disse que queria dizer algo a ela. O que aconteceu foi apenas um selinho, em nenhum momento forcei nada.
Lucas então diz:
— Isso mostra o quanto você a respeitou, independentemente de ter dado o selinho ou não.
Lembro perfeitamente do momento em que ela saiu correndo. Na verdade, sorrio ao lembrar da cena. Lucas, atento, me pergunta:
— E esse sorrisinho aí, o que foi?
— Apenas lembrei que, depois do selinho, ela saiu correndo e me deixou lá, sem entender nada por um momento. Mas logo entendi que eu tinha sido o primeiro garoto a dar um selinho nela.
Lucas parece intrigado com a minha revelação e continua a me questionar:
— E como foi depois disso? Vocês mantiveram contato?
Eu reflito por um momento e respondo:
— Depois desse episódio, as coisas mudaram um pouco entre nós. Acho que ambos ficamos um pouco confusos e incertos sobre o que aquilo significava. No entanto, continuamos amigos e nos víamos ocasionalmente. Mas gradualmente, nossos caminhos começaram a se afastar à medida que crescemos e seguimos rumos diferentes.
Lucas, curioso, pergunta:
— Mas DG, o que você ia dizer a ela antes dela sair correndo, logo após o selinho?
Eu suspiro, relembrando aquele momento específico, e respondo:
— Na verdade, Lucas, eu estava tão nervoso que acabei não dizendo nada. Naquele instante, eu apenas queria expressar o quanto eu me importava com ela, o quanto ela significava para mim. Mas as palavras fugiram de mim, e o selinho foi tudo o que aconteceu.
Lucas assente, demonstrando compreensão, e diz:
— Entendo, às vezes as emoções nos deixam sem palavras. O importante é que você tentou mostrar seus sentimentos de alguma forma.
Concordo com ele, refletindo sobre a situação, e acrescento:
— Sim, você está certo. Acredito que, naquele momento, o gesto foi a maneira que encontrei para transmitir um pouco do que sentia. Mesmo que tenha sido breve, deixou uma marca em nós dois.
Lucas sorri e conclui:
— Às vezes, as ações falam mais do que as palavras. Tenho certeza de que ela deve ter se lembrado desse momento especial.
Eu sorrio em resposta, agradecido pela compreensão de Lucas, e digo:
— Espero que sim. Talvez um dia eu tenha a chance de conversar com ela novamente e finalmente dizer as palavras que ficaram presas naquele momento.
Clara
Foi uma luta para fazer o Sérgio entender esse projeto no morro. Ele me disse tantas coisas ruins por se tratar de um lugar assim, que prefiro nem lembrar.
Mas, independentemente disso, sei que ele não gostou. No entanto, eu vou seguir em frente, mesmo que ele não aprove.
Assim, o dia passa. Após o almoço, levo meus filhos para a escola e depois me junto às outras senhoras na casa da dona Amélia. Estava tão envolvida nas conversas e ajudando a carregar os livros na pequena van que nem percebi quando minha mãe chegou.
Ao avistá-la, me aproximo e digo:
— Bença, mãe!
Ela me dá um pequeno sorriso e responde:
— Deus te abençoe, filha.
Em seguida, ela diz:
— Vim te visitar, mas parece que você está ocupada.
Eu sorrio singelamente e respondo:
— Estou fazendo uma boa ação, mãe. Este projeto tem como objetivo ajudar as crianças carentes do morro aqui perto.
Ela me olha e diz:
— Que ótimo, filha. Posso ir junto?
Olho para ela por um momento e digo:
— Claro, só preciso verificar com dona Amélia se há espaço para a senhora.
Chamo dona Amélia, que se aproxima sorrindo e cumprimenta minha mãe, já que elas se conhecem. Dona Amélia é a primeira a falar:
— Como vai, Márcia? Vai se juntar a nós?
— Será um prazer, Amélia. Há espaço para mim? — pergunta minha mãe.
Dona Amélia sorri e responde:
— Claro que sim! É sempre bom ter mais pessoas dispostas a ajudar.
Terminamos de colocar as coisas no carro e partimos em direção ao morro. Logo avistamos as casas, quase grudadas umas nas outras, no topo do morro, com suas lages. Era uma visão típica de uma favela, com vielas estreitas.
Dona Amélia estaciona a pequena van em uma rua próxima e nos aproximamos do barracão, onde ensinaríamos aquelas crianças. Ao nos aproximarmos da porta, vejo um garoto jovem armado com uma enorme arma, cujo tipo não consigo identificar. Ele nos olha e se aproxima.
Minha mãe comenta:
— Será que isso é uma boa ideia, Clara? Olha como esses delinquentes se comportam.
Assustada, olho para ela e sussurro:
— Por favor, mãe, não comece. A senhora sabe muito bem a realidade aqui. Estamos aqui para ajudar, não para julgar. E além disso, a senhora não pode falar essas coisas aqui. Existe uma hierarquia, não estamos mais no asfalto lá embaixo na cidade, mãe. Aqui, as autoridades são eles.
Mesmo contrariada, ela assente. O garoto se aproxima de nós e diz:
— E aí, tias? Como posso ajudar?
Dona Amélia responde prontamente:
— Olá, jovem. Viemos aqui para dar início ao projeto que eu comuniquei com seu chefe na semana passada. Ele me deu permissão.
Ele nos avalia por um momento e diz:
— Só um momento, por favor. Preciso passar a informação para o chefe.
Ele pega um dispositivo de comunicação e se afasta para informar nossa chegada ao chefe. Após alguns minutos, ele volta e nos diz:
— O chefe pediu que vocês o aguardem, pois ele está com a chave do barracão e logo virá trazê-la.
Assentimos e aguardamos. Não demora muito para ouvirmos um barulho alto de moto. Um motociclista com jaqueta preta e capacete totalmente preto se aproxima da porta do barracão.
imediatamente constato que deve ser o chefe do morro. O jovem se aproxima dele e fica ao seu lado, pronto para agir.
Nos aproximamos e quando ele tira o capacete e nos olha, o tempo parece congelar.
Estou estática, chocada. Não consigo acreditar que ele está ali, diante de mim. Nunca esqueceria aquele rosto.
Ali, a poucos centímetros de mim, está Diogo, o garoto que costumava frequentar a casa dos meus pais.
Éramos jovens na época e não entendíamos bem a atração avassaladora que existia entre nós. Sabíamos que algo forte nos atraía como um ímã.
Muitas vezes me pego lembrando do selinho que ele me deu naquela época, de como saí correndo com o coração acelerado e um sorriso no rosto.
Ele foi o primeiro garoto a tocar meus lábios, mas hoje sei que ele foi um verdadeiro cavalheiro e me respeitou. Aquele gesto delicado de um breve selinho foi a forma de mostrar o que ele sentia por mim.
Ele era tão amigo do meu irmão que, mesmo minha mãe não gostando dele, tinha que aceitá-lo, pois meu irmão o defendia com unhas e dentes. A lembrança do meu irmão, que já se foi, me deixa ainda mais abalada.
Sei que preciso me recompor, mas não consigo. Sempre me perguntei se, ao me reencontrar com ele, sentiria o mesmo que sentia quando era mais nova.
Agora, tenho minha resposta. Aquela atração que existia entre nós ainda está presente. Sinto como se tivesse voltado no tempo, experimentando todas as emoções que sentia antes. Ele ainda mexe comigo. Ainda me deixa tensa, tímida, encabulada, nervosa e muito mais.
E a maneira como ele me olha continua a mesma. Mesmo que agora ele seja um homem formado diante de mim, consigo enxergar aquele garoto dentro dele.
Ele ainda me olha como se pudesse ver além de mim, como se pudesse enxergar minha alma, e isso me deixa ainda mais nervosa.
Diogo se mantém em silêncio por alguns segundos, assimilando a surpresa do nosso reencontro. Seu olhar transmite uma mistura de emoções: surpresa, nostalgia e talvez até um pouco de arrependimento. Finalmente, ele rompe o silêncio, dizendo:
— Clara... É você mesmo? Não posso acreditar que nos encontramos aqui, depois de todos esses anos.
Minhas pernas tremem ligeiramente enquanto eu respondo com uma voz trêmula:
— Sim, Diogo. Sou eu. Estou aqui para ajudar com esse projeto. Nunca imaginei que você estaria envolvido com o morro.
Ele suspira profundamente e abaixa o olhar por um instante antes de me encarar novamente.
— Muitas coisas mudaram desde aqueles tempos, Clara. Eu... eu não esperava vê-la novamente dessa forma. Mas estou feliz por você estar aqui, disposta a ajudar as crianças.
Ainda abalada pelo reencontro, tento focar na situação presente.
— Diogo, você é o chefe do morro? Eu não consigo acreditar. O que aconteceu? Como isso tudo aconteceu?
Ele balança a cabeça, visivelmente desconfortável com o assunto.
— É uma longa história, Clara. Mas o importante agora é o projeto que vocês vieram realizar aqui. As crianças precisam de todo o apoio que pudermos dar.
Concordo, embora a curiosidade ainda esteja fervilhando dentro de mim. No entanto, sei que é melhor deixar as questões pessoais de lado e me concentrar no propósito que nos trouxe até aqui.
Ao notar a presença da minha mãe, Diogo hesita por um momento. Ele engole em seco, enfrentando o olhar desconfiado de minha mãe, e com uma voz educada, diz:
— Dona Márcia, é um prazer revê-la. Como a senhora está?
Minha mãe olha para ele com uma expressão ríspida e, sem hesitar, solta:
— Diogo, o garoto problema. Parece que eu sempre estive certa sobre você não é?
Diogo mantém a postura firme e não se deixa intimidar. Ele ergue o queixo ligeiramente e responde com sagacidade:
— Dona Márcia, as coisas mudaram. Eu sou o dono deste morro agora. E aqui, sou eu quem dito as regras.
Minha mãe arqueia uma sobrancelha, surpresa pela ousadia de sua resposta. Ela observa-o atentamente, avaliando suas palavras e a postura determinada que ele adquiriu.
Diogo mantendo a postura, com um sorriso discreto, vira-se para dona Amélia e a cumprimenta:
— Dona Amélia, que bom revê-la. Agradeço pela oportunidade de realizar esse projeto aqui no morro.
Sem mais delongas, Diogo nos pede para segui-lo, e assim adentramos o barracão. Ainda estou nervosa pelo nosso reencontro inesperado, mas sei que depois desse encontro, nossas vidas jamais serão as mesmas.
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