...NICK...
Antes de mais nada, me sinto no dever de avisar que esta não é uma história de amor tradicional. Para ser honesto, essa história é tão complicada que nem chega a ser bonita. Ainda mais quando você é o filho bastardo do baterista de uma das bandas de rock mais aclamadas do mundo, não é de se surpreender que seus relacionamentos sejam complicados. Acrescente na mistura uma mãe egoísta, mimada e autocentrada que me criou e o resultado vocês já devem imaginar que não tem nada de positivo.
Poderia dar início nessa história em diversos lugares: no meu quarto, onde eu abraçava minha irmã, Mia, que vivia chorando por conta da crueldade verbal da nossa mãe; ou na porta da casa, de onde ela via, com lágrimas escorrendo pelo rosto, meu pai me levar para passar o final de semana, deixando-a sozinha com minha mãe. Ambas as situações aconteciam com frequência e me marcaram para sempre.
Eu odiava ver Mia chorar, todavia, tive de aprender a lidar com isso. Mia e eu tínhamos a mesma mãe, mas nossos pais eram diferentes. Meu pai era um roqueiro famoso, que me introduzia, sempre que tinha oportunidade, no mundo de sexo, drogas e rock and roll nos finais de semana e por um mês inteiro durante as férias de verão. Ele nunca se esquecia de mim, nunca inventava desculpas, se fazia sempre presente em todos os momentos da minha vida.
Por mais imperfeito que ele fosse, Rush Finlay sempre aparecia para me buscar, mesmo quando estava bêbado ou chapado. Já o pai de Mia era o oposto: ele não se importava com a filha. Ele a deixava sozinha quando meu pai me pegava e, ainda que eu adorasse passar os dias com ele, ficava deprimido sabendo que minha irmã precisava de mim. Podíamos dizer que eu representava a figura paterna para ela. Eu era a única pessoa em quem confiava para cuidar dela e isso fez com que eu amadurecesse mais rápido que os demais garotos da minha idade.
Quando eu pedia ao meu pai para que levasse Mia conosco, ele balançava a cabeça negativamente com o argumento de que a minha mãe jamais deixaria, e não dizia mais nada. Eu compreendia que, se minha mãe não deixava, não havia esperança. Então, Mia ficava sozinha. Eu odiava toda essa situação e queria poder odiar alguém por isso, mas eu era uma criança e era muito difícil odiar a minha mãe.
Então eu aprendi a direcionar o ódio e o ressentimento ao homem que nunca ia vê-la. Odiei com todas as forças o homem cujo sangue corria pelas veias de Mia, embora ele não a amasse o suficiente para mandar sequer um cartão de aniversário.
Uma vez, Mia pediu a minha mãe que a levasse até a casa do pai. Ela queria ter a oportunidade de ver o rosto dele e conversar. Eu sempre achei, no fundo, que a minha mãe nunca tinha contado pra ele sobre a existência da filha e, por isso, Mia vivia num conto de fadas em que num belo dia seu pai surgiria para salvá-la e lhe dar o amor que ela tanto desejava.
A casa dele ficava numa cidadezinha no interior do Alabama. Era uma casa muito menor que a nossa, mas para Mia era a casa perfeita. Mas não era a casa ou a cerquinha branca que a rodeava ou as bicicletas encostadas na porta da garagem que assombravam a minha irmã, era a garota que lhe abria a porta. Ela tinha cabelos compridos tão loiros que eram quase brancos. Mia achou que ela era uma princesa.
Então ela observou ao redor e viu as fotos na parede que mostravam a menina junto com outra exatamente igual a ela e um homem segurando as mãos das duas. Era o pai delas. A menina que lhe tinha aberto a porta era uma das filhas que ele amava. Ele não sentia falta da filha que deixara pra trás, era obvio, só de ver o quanto ele estava feliz naquelas fotos. E foram essas fotos que torturaram Mia por anos depois disso.
Minha mãe insistia em dizer que ele sabia sobre a existência de Mia, e naquele dia tudo o que ela disse fez total sentido: seu pai a ignorava porque tinha a vida dele, uma esposa e aquelas duas filhas lindas e angelicais que se pareciam tanto com eles.
Durante muito tempo eu tinha vontade de odiar minha mãe por ter levado minha irmã até lá, por ter esfregado a verdade na cara dela. De certa forma, Mia era feliz vivendo sua fantasia, mas perdeu a inocência naquele mesmo dia. E, pra mim, foi o estopim pro ódio pela família dele crescer ainda mais.
Aquelas garotas tiraram da minha irmã a vida que ela tinha direito e um pai que pudesse amá-la. Elas não o mereciam mais do que Mia. Até sua esposa se aproveitava de sua beleza e das filhas para mantê-lo afastado da minha irmãzinha. Eu simplesmente odiava todos eles.
Acabei tomado pelo ódio, mas, na verdade, a historia começa no dia em que Isabella Wynn entrou nervosa em minha casa com aquele maldito rosto de anjo. O que eu menos esperava era que esse anjo se tornaria o meu pior pesadelo.
(Nick Finlay)
(Mia)
...ISABELLA...
Quando estacionei minha picape na frente da casa de dois andares situada na beira da praia em Rosemary, Florida, não imaginava que iria encontrar pelo menos vinte carros de luxo que ocupavam o comprido acesso de carros daquela casa. Meu pai não tinha me dito que daria uma festa esta noite. Ele não tinha me dito quase nada, pra ser mais exata.
Ele nem sequer apareceu para o funeral da minha mãe. Juro que, se eu não precisasse de um lugar pra morar, eu não estaria ali. A fim de arcar com as despesas médicas da minha mãe, eu precisei vender a casinha que minha avó nos deixou e tudo o que me restava eram as minhas roupas e a picape Ford de quinze anos da minha mãe.
Pra mim, foi bastante complicado ter que ligar pro meu pai depois dele não aparecer nem uma vez durante os três anos em que minha mãe batalhou contra o câncer. Complicado, porem necessário. Querendo ou não, ele era o único parente que me restava e eu precisava de ajuda.
Olhando novamente para a casa iluminada à minha frente, vi o quanto eu não me encaixava naquele lugar. Aquela era a nova casa do meu pai e de sua nova família.
Saí dos meus devaneios quando percebi que alguém abria a minha porta com um tranco. Por instinto, levei a mão até o assento ao meu lado e peguei minha pistola nove milímetros. Levantei-a e apontei bem no meio do rosto do intruso, segurando-a com as duas mãos, pronta para puxar o gatilho.
- Meu Deus do Céu...eu ia perguntar se você estava perdida, mas com esse troço na minha cara eu digo o que você quiser. Por favor, guarda essa arma, moça.
Olhei para o sujeito de cabelos claros e bagunçados, com as duas mãos pra cima e olhos arregalados à frente da minha pistola e levantei uma sobrancelha. Ainda não sabia quem era aquele cara. Agir da forma que ele agiu, abrindo a porta da picape de um desconhecido não era um jeito normal de abordar uma pessoa.
- Não acho que estou perdida. Aqui não é a casa de James Wynn?
- Você está me deixando nervoso com esse troço apontado para a minha cara, meu bem. Porque você não abaixa a pistola antes que aconteça um acidente? – O sujeito engoliu em seco.
- Eu não conheço você, está escuro aí fora e eu estou sozinha num lugar desconhecido. Então, me perdoa se eu não me sentir muito segura neste momento. – Esse cara estava começando a me irritar. – Pode confiar em mim, meu bem, que não vai acontecer nenhum acidente; eu sei manejar uma pistola muito bem.
O sujeito pareceu não acreditar em mim e, agora que eu conseguia vê-lo melhor, ele não me parecia totalmente ameaçador. De qualquer forma, eu não me sentia a vontade para baixar a arma.
- Você disse James? – Ele repetiu devagar enquanto balançava a cabeça imerso em pensamentos. – Deve ser o novo padrasto do Nick. Eu o conheci antes dele e Charlotte viajarem para Paris.
Como assim: viajem para Paris? Esperei mais explicações, mas o sujeito só ficava olhando pra pistola, prendendo a respiração. Sem tirar os olhos dele, abaixei a pistola e me certifiquei de acionar a trava de segurança antes de guarda-la. Quem sabe sem a pistola ele conseguisse me dar as devidas explicações.
- James está em Paris? – Fui direto ao assunto, porque não estava com disposição para conversas, eu precisava de respostas.
O sujeito fez que “sim” com a cabeça e eu amaldiçoei meu pai em pensamentos. Ele sabia que eu chegaria hoje. Tínhamos nos falado semana passada, depois que eu vendi a casa.
- Você o conhece? – O sujeito perguntou.
Não, eu não o conhecia. Desde que ele abandonara a mim e a minha mãe há cinco anos, eu só o vira umas duas vezes. Eu apenas me lembrava do pai que eu tive até o dia em que minha irmã gêmea morreu em um acidente de carro, quando ele estava dirigindo. Nesse mesmo dia, não apenas perdi minha irmã e melhor amiga, mas como perdi meu pai, que se tornou o homem que não me ligava para saber se eu estava bem enquanto cuidava da minha mãe doente.
- Sou a filha dele, Isabella.
O cara na minha frente arregalou ainda mais os olhos, jogou a cabeça para trás e riu. Eu ainda não tinha entendido qual seria a graça. Estava esperando que ele próprio me explicasse, mas ele apenas me estendeu a mão.
- Venha comigo, Isabella, quero te apresentar uma pessoa. Ele vai amar saber que você é filha de James Wynn.
Encarei a mão dele e estendi o braço para pegar a minha bolsa. A brisa do mar bateu no meu rosto e o cheiro salgado da praia era inconfundível. Eu nunca tinha visto uma praia, pelo menos não ao vivo. Apenas em fotos e em filmes, mas o cheiro era exatamente o que eu imaginava que seria.
O sujeito deu a volta e estendeu as mãos para dentro da caçamba da picape para pegar a mala que a minha mãe mantivera guardada no armário para a “viagem de carro” que nunca chegamos a fazer. Tínhamos a ideia de atravessar o país e subir a costa oeste, mas isso foi antes dela ficar doente.
- Obrigada. Acho que eu não sei seu nome.
- Como assim não sabe o meu nome? Esqueceu de perguntar quando estava com aquela pistola apontada para a minha cara?
Ele perguntou enquanto puxava a minha mala e eu dei um suspiro. Talvez eu tenha exagerado um pouco com a pistola, mas ele tinha me assustado, poxa.
- Meu nome é Mason. Eu sou amigo do Nick.
- E quem é Nick?
- Você não sabe quem é o Nick? – Ele virou a cabeça em direção à casa. – Venha, vou apresentar você.
Não sei o motivo pelo qual Mason estava achando tanta graça. Fui caminhando ao seu lado enquanto ele me conduzia até a casa. Quando nos aproximamos, a musica lá dentro ficou mais alta. Se meu pai não estava em casa, quem estaria?
A única coisa que eu sabia era que o nome de sua esposa era Charlotte. Será que ela tinha filhos e a festa que estava rolando lá dentro era dos filhos dela? Quantos anos será que eles tinham? Eu não sabia. Meu pai sempre foi muito vago ao falar sobre ela. A única coisa que ele mencionou era que eu iria gostar da minha nova família, mas em nenhum momento ele disse quem era essa família.
- Esse tal de Nick mora aqui?
- Mora. Bom, pelo menos durante o verão. Ele vive se mudando para as suas outras casas conforme as estacoes do ano. – Mason deu uma risada. – Pelo visto você não sabe nada sobre a família para a qual o seu pai entrou, não é mesmo, Isabella?
- Não, eu não sei nada sobre eles. Meu pai não entrou em detalhes.
Parando no alto da escada que conduzia à porta da frente e olhando para os meus olhos, Mason me explicou que Nick era meu irmão postiço, filho único do famoso baterista, Rush Finlay. Sua mãe, Charlotte, mora nesta casa, que pertence a Nick, apenas porque ele deixa. Explicou também que a festa que estava tendo lá dentro era de Nick e aquelas pessoas eram todas amigas dele.
Quando nos viramos para entrar na casa, a porta foi aberta por uma morena alta e longilínea que me encarava da porta, usando um vestido curto e um par de sapatos de salto que me fariam quebrar o pescoço se eu tentasse usá-los. Ela me olhou com cara de desagrado e uma expressão mal-humorada.
- Oi Mia. – Falou Mason.
- Quem é essa daí? – Perguntou a garota, olhando pra ele.
- Uma amiga. – Respondeu ele, estendendo a mão para segurar a minha e me puxar pra dentro da casa. – Venha, vamos por aqui.
A sala não estava tão cheia quanto eu imaginara. Quando passamos pelo saguão, um arco ia dar onde eu imaginava ser a sala de estar. Mesmo assim era bem maior que a minha casa inteira. Duas portas de vidro se abriam para uma vista do mar de tirar o folego.
Quando chegamos ao bar, olhei de relance para as pessoas ao nosso redor. Todas paravam para me dar uma rápida conferida de cima a baixo. Eu estava me destacando no meio daquelas pessoas em minhas roupas da loja de departamentos.
- Nick! Quero te apresentar a Isabella. Encontrei-a lá fora com um ar meio perdido. Acho que talvez ela seja sua.
Quando ouvi Mason pronunciar o nome do tal de Nick, eu desviei os olhos das pessoas ao redor para ver quem ele era. Ai Ai Ai...Nick estreitou os olhos e me estudou com atenção. Os olhos dele tinham um tom esquisito, surpreendente e incomum. Eu nunca tinha visto nada como aquilo. Ele estava com uma cerveja na mão e se inclinou para a frente no sofá branco.
- É mesmo? – Ele disse com uma voz preguiçosa. – Ela pode até ser gata, mas é muito novinha. Não dá para dizer que é minha.
- Ah, cara, ela é sua sim... considerando que o pai dela fugiu pra Paris com a sua mãe, eu diria que agora ela é sua, sim.
Nick não disse nada, apenas tomou um grande gole da garrafa que tinha em suas mãos. Só de ver pela sua expressão, eu poderia afirmar que ele iria me pedir pra ir embora a qualquer momento. Aquilo não era nada bom. Eu tinha apenas US$20,00 na bolsa e estava quase sem gasolina.
Ele estava prestando atenção em mim outra vez. Estava esperando que eu fizesse alguma coisa. O que ele queria que eu dissesse? Um sorriso de ironia moveu os seus lábios e ele piscou pra mim.
- Estou com a casa cheia de convidados e a minha cama também já está lotada. Acho melhor ela ir pra um hotel até eu conseguir falar com o papai dela.
Ficou claro pela forma como ele pronunciou a palavra “papai” que ele não gostava do meu pai. Na verdade, eu nem poderia culpa-lo, pois aquilo não era problema dele. Afinal, quem me mandara até ali foi o meu pai, não ele. O problema é que eu tinha gasto todo o meu dinheiro em gasolina e comida durante a viagem.
Puxando minha mala das mãos de Mason, virei-me e me dirigi até a porta. Ouvi Mason bater boca com Nick, mas mantive o foco em não escutar nenhuma palavra. Eu não conseguia olhar pra nenhum dos dois. Nick não gostava de mim e isso tinha ficado claro. Senti as lágrimas arderem nos meus olhos, mas eu os mantive para baixo.
Quando estava segura do lado de fora da casa, deixei escapar um soluço enquanto andava até a minha picape. Meu lugar não era ali, naquela casa ridícula e com aquela gente metida. Estava com saudades de casa e da minha mãe.
(Isabella Wynn)
(Mason)
...NICK...
Eu tinha falado pra Mia que não queria ninguém em casa naquela noite, mas, como ela nunca aceitava um “não” como resposta, ela convidou as pessoas mesmo assim. Eu estava recostado no sofá, com as pernas estendidas e uma cerveja na mão. Eu precisava ficar tranquilo e atento para que nada saísse do controle, porque os amigos da Mia eram mais novos que os meus e podiam ser muito bagunceiros.
A voz do Mason me tirou dos meus devaneios.
- Nick! Quero te apresentar a Isabella. Encontrei-a lá fora com um ar meio perdido. Acho que talvez ela seja sua.
Olhei para Mason, meu irmão postiço, e então para a loira que estava ao seu lado. Eu já tinha visto aquele rosto antes. Ela estava mais velha, mas isso não impediu que eu a reconhecesse. Ela era uma delas. Meus olhos buscaram a Mia pela casa e eu a avistei próxima a porta de entrada fazendo careta. Isso não ia ser nada bom. Será que Mason não tinha desconfiado quem era essa garota?
- É mesmo? Ela pode até ser gata, mas é muito novinha. Não dá para dizer que é minha. – Eu disse, tentando encontrar um meio de tirá-la daqui...e rápido.
A garota se encolheu ao ouvir minhas palavras. Aquele seu olhar perdido não estava ajudando. Ela sabia que não era bem-vinda naquela casa e veio mesmo assim. Por que parecia tão inocente?
Olhei novamente para Mia e vi que ela estava prestes a explodir. Voltei a olhar pra garota à minha frente, a fonte de sofrimento para a minha irmã durante boa parte da sua vida. Ela era deslumbrante. Seu rosto em formato de coração adornava um par de olhos azuis esverdeados e seus cabelos loiros caíram sobre seus seios muito bonitos, que eram exibidos em uma regata justa. É, ela precisava ir embora logo.
- Ah, cara, ela é sua sim... considerando que o pai dela fugiu pra Paris com a sua mãe, eu diria que agora ela é sua, sim.
Mason, esse cretino, estava achando aquilo divertido. Ele sabia muito bem quem ela era e estava adorando o fato de que isso incomodava a Mia. Mason era capaz de qualquer coisa para irritar nossa irmã.
Tomei um gole da minha cerveja e o encarei. Não estava a fim de drama e aquilo já tinha ido longe demais até mesmo para Mason. A garota precisava ir embora e ponto, não tinha o que discutir.
Isabella parecia querer sair correndo dali. Aquilo não era o que ela estava esperando. Será que ela esperava o que: o pai dela ali pra dar as boas vindas? Estava tudo parecendo conversa fiada. Ela conviveu com James durante quatorze anos, enquanto eu estava convivendo a apenas três e já sabia que o cara não valia nada.
- Estou com a casa cheia de convidados e a minha cama também já está lotada. Acho melhor ela ir pra um hotel até eu conseguir falar com o papai dela.
Sem abrir a boca pra dizer nada, a garota tomou a mala dela das mãos de Mason. Notei que seus olhos estavam marejados e senti a consciência pesar. Será que eu deixei passar alguma coisa? Será que ela queria que recebêssemos ela de braços abertos?
Isabella correu pra saída e eu vi a alegria de Mia quando a garota passou por ela.
- Sabia que você é um cretino insensível? – Mason rosnou pra mim. Eu não queria discutir. Mia se aproximou de onde estávamos com um sorriso triunfante no rosto. Ela tinha adorado aquela cena e compreendi o motivo: Isabella era uma lembrança de tudo o que Mia não tivera quando criança.
- Ela continua exatamente como me lembro: pálida e sem graça. – Murmurou minha irmã enquanto se sentava ao meu lado no sofá.
- Você é tão cega quanto malvada. Você pode odiá-la à vontade, mas não pode negar que ela é de dar água na boca. – Mason bufou.
- Não comece, Mason. – Falei em tom de alerta com ele. Mia poderia parecer feliz, mas eu sabia que acabaria desabando se parasse um pouco pra pensar nas coisas.
- Se você não for atrás dela, eu vou, Nick. Vou levar aquela bunda gostosa pra minha casa. Ela não é o que vocês estão pensando, eu conversei com ela. Isabella não sabe de nada, o idiota do James é quem pediu que ela viesse pra cá. Ninguém é capaz de mentir tão bem assim. – Disse Mason olhando com raiva pra mim e pra Mia.
- Até parece...meu pai jamais pediria uma coisa dessas. Ela veio pra cá porque é interesseira. Deve ter sentido o cheiro do dinheiro. Vocês viram a roupa dela? – Mia disse e torceu o nariz de nojo.
- Claro que vi. – Mason deu uma risada. – Porque vocês acham que eu quero tanto leva-la pra casa? Ela é muito gostosa, Mia, e não estou nem aí para o que você diz. A garota é inocente, está perdida e tem um corpo sensacional.
Terminando de falar, Mason virou as costas e se encaminhou para a porta. Ele ia atrás da garota e eu não podia permitir. Era fácil enganá-lo. Posso até concordar com o fato da garota ser um colírio para os olhos, mas ele estava pensando apenas com a cabeça inferior.
- Mason, pode parar aí. Deixa que eu vou atrás dela. – Avisei, me levantando.
- O que?! – Mia questionou, horrorizada.
Mason parou e me deixou passar por ele para fora. Não olhei pra Mia. Mason estava certo: eu precisava saber se Isabella estava fingindo ou se fora chamada para vir até aqui pelo idiota do James. E também queria dar uma boa olhada nela sem nenhuma plateia.
Isabella andava em direção a uma picape bastante velha e detonada quando abri a porta e saí. Fiz uma pausa imaginando se a camionete era realmente dela ou se alguém a tinha velado até ali. Estreitei os olhos na escuridão tentando enxergar se tinha alguém dentro do veículo, mas não consegui ver nada devido à distância.
Ela abriu a porta do motorista e fez uma pausa, respirando fundo. A cena poderia até ser considerada dramática se ela soubesse que estava sendo observada, mas pela forma que seus ombros arquearam, ela não fazia ideia.
Ninguém poderia questionar que ela era linda, mas ela havia sido criada por um homem que não passava de um aproveitador. Ela poderia ser uma grande manipuladora: usa da beleza para conseguir o que quer, sem se importar com quem poderia machucar pelo caminho.
Eu desci as escadas da porta da frente e caminhei em direção da picape. Isabella ainda estava sentada no banco do motorista e eu queria que ela fosse embora antes que Mason caísse em seus golpes. Ele era um alvo fácil pra ela, caso ela quisesse se aproveitar dele.
Ela se virou e nossos olhares se cruzaram pouco antes dela soltar um grito. Seus olhos estavam vermelhos, dando a real impressão de que ela estava chorando de verdade. Talvez aqui realmente não fosse um golpe, até porque não tinha ninguém ali fora pra ela dar show.
Sem dizer nada, ela apenas virou para o volante e girou a chave na ignição. O carro não pegou e ela começou a ficar histérica ao tentar fazer a picape pegar, mas, pelo barulho, imaginei que não houvesse uma gota de combustível no tanque.
Confesso que vê-la frustrada, dando tapas no volante, foi uma cena bem engraçada. De que adianta dar esse show se ela tinha deixado o tanque vazio? Se não fosse tão inocente quanto aparentava, posso dizer que ela era uma excelente atriz.
- Problemas?
- Acabou a gasolina. – Respondeu ela, baixinho.
Pela sua expressão, ela não queria dizer que não conseguia ir embora. Me lembrei de que ela era filha de James Wynn e que ele a havia criado, a que ele preferia, abandonando a Mia durante todos aqueles anos. Eu não sentiria pena dela. Eu não poderia deixa-la voltar pra casa. Se deixasse, teria que lidar com a Mia. Do contrário, seria Mason quem cuidaria dela e, então, tinha grandes chances de que ela se aproveitasse dele.
- Quantos anos você tem?
Eu já deveria saber a resposta, mas pensei que ela fosse mais velha do que aparentava. Ela arregalou os olhos e a expressão assustada fazia com que a garota parecesse mais nova. O único sinal de que ela era mesmo maior de idade era a forma como ela preenchia a regata e os jeans.
- Dezenove.
- Serio? – Perguntei, sem saber se deveria ou não acreditar nela.
- Serio.
- Foi mal, mas é que você parece mais nova. - A testa franzida dela era uma graça, mas eu não podia pensar dessa forma. Droga. Ela significava problemas e eu não estava precisando de problemas como esses agora. Passei meus olhos pelo corpo dela, para que ela soubesse que eu não era confiável. – Retiro o que disse. Seu corpo
tem toda pinta de dezenove. Na verdade, é o seu rosto que parece de uma pessoa muito mais jovem. Você não usa maquiagem?
- Olha aqui, Nick, minha gasolina acabou e eu tenho apenas US$20,00 na bolsa. Meu pai fugiu e me abandonou depois de prometer me ajudar. Acredite em mim quando digo que ele seria a ultima pessoa para quem eu pediria ajuda. E não, eu não uso maquiagem. Tenho problemas maiores no momento do que cuidar da minha aparência.
Era impressão minha ou eu tinha sentido um desprezo pelo seu querido pai em sua voz? Tinha quase certeza de que sim. Parece que James estava na sua lista negra. Eu estava ponderando o fato de que Isabella seria outra vitima de James Wynn. Ele abandonou Mia e parecia ter abandonado Isabella também e, com isso, eu estava prestes a fazer algo pelo qual poderia me arrepender mais tarde.
- Olha, Isabella, eu não gosto do seu pai e, pelo tom da sua voz, você também não. Tem um quarto vazio hoje a noite e vai ficar vazio até que minha mãe retorne de viagem. Minha empregada vem fazer faxina apenas uma vez por semana, então você pode ficar no quartinho que tem embaixo da escada. É pequeno, mas tem uma cama.
- Minha alternativa é dormir na picape. Então posso te garantir que o que está me oferecendo é bem melhor do que eu tenho. Obrigada.
Serio mesmo que eu estava deixando essa garota dormir dentro do carro na rua? Aquilo era bem perigoso.
- Cadê sua mala?
Isabella fechou a porta da picape e foi até a traseira pegar a mala. Vendo que ela poderia não conseguir levantar por cima da carroceria, estendi o braço por trás dela e peguei a bagagem. Ela se virou assustada, o que me fez sorrir.
- Posso carregar sua mala. Não sou tão babaca assim.
- O-Obrigada. – Ela agradeceu sem tirar os olhos inocentes de mim.
Caramba, ela tinha olhos lindos e eu não estava costumado a ver garotas sem maquiagem com muita frequência. A beleza natural de Isabella era espantosa, o que me fazia lembrar que ela representava problemas. Uma coisa era certa: teria que manter distância dela.
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