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Flor De Lótus

1

O salão vasto e imponente do meu mestre se estende diante de mim, suas paredes ornamentadas zombando silenciosamente da minha existência diminuta. Estou sentada imóvel no canto mais sombrio, relegada mais uma vez à posição familiar e humilhante de um animal de estimação obediente. Esta analogia reflete dolorosamente a minha realidade atual, uma existência reduzida a nada mais que um objeto para o prazer e capricho de outro ser.

A almofada sob mim, que em tempos passados oferecia um conforto macio e acolhedor, agora se assemelha a uma superfície de pedra dura e fria. Cada fibra do tecido parece conspirar contra mim, transformando-se em agulhas minúsculas que perfuram minha pele já machucada e sensível. É um reflexo tangível da minha situação desoladora, um lembrete constante do desgaste físico e emocional que tenho suportado dia após dia, semana após semana, mês após mês.

O silêncio opressivo que domina o salão é quase ensurdecedor. O único som que ouso fazer é a respiração suave e controlada que mal move meu peito. Este silêncio sepulcral serve apenas para amplificar o grunhido de fome do meu estômago, um lembrete constante e implacável de que já se passaram horas, talvez até dias, desde a última vez que recebi algo para comer.

Tento me manter quieta, esforçando-me ao máximo para não provocar a ira do meu mestre. Cada músculo do meu corpo está tenso, travando uma batalha silenciosa contra o tremor que ameaça me dominar. A punição, sempre inevitável e severa, aguarda ao menor sinal de desobediência. O medo dessa punição é como um veneno que corre em minhas veias, paralisando-me e mantendo-me presa neste canto escuro.

Recordo com um arrepio os momentos da última sessão de espancamento. As lembranças invadem minha mente como uma onda de terror, tão vívidas que quase posso sentir o impacto dos golpes novamente. Cada contusão ainda pulsa em minha pele como fantasmas persistentes, atormentando-me com a memória da dor. Fecho os olhos com força, tentando afastar as imagens, mas elas persistem, gravadas a ferro em minha consciência.

Lembro-me de ter implorado por misericórdia, minha voz quebrada por soluços: "Por favor, mestre, eu serei melhor, eu prometo. Por favor, não me machuque mais."

Mas minhas súplicas caíram em ouvidos surdos, e os golpes continuaram a cair, cada um mais forte que o anterior, até que a dor se tornou tudo o que eu conhecia.

A dor tornou-se uma companheira constante, uma presença tão familiar quanto minha própria respiração. Mas o que realmente assombra cada momento de minha existência é o medo paralisante de provocar novamente a fúria do mestre. Este medo é como uma criatura viva dentro de mim, crescendo e se alimentando de cada pensamento, cada movimento, cada respiração.

A sensação de tontura e fraqueza causada pela combinação de fome e sede é quase insuportável. Minha visão ocasionalmente fica turva, e tenho que lutar contra a escuridão que ameaça me engolfar. Meus lábios estão ressecados e rachados, minha língua inchada e pesada em minha boca. Cada engolir é uma agonia, minha garganta seca protestando contra o movimento.

Porém, surpreendentemente, esta não é minha maior preocupação. Aquilo que verdadeiramente me preocupa, aquilo que tento desesperadamente suprimir, é a necessidade crescente de usar o banheiro. A pressão em minha bexiga é quase insuportável, uma dor constante que rivaliza com todas as outras. Tento me concentrar em qualquer outra coisa, contar os padrões no tapete, recitar mentalmente poemas que aprendi na infância, qualquer coisa para distrair minha mente desta necessidade urgente.

A memória da última vez que não consegui me controlar, deixando-me escapar, é uma cicatriz em minha mente. A humilhação de ser punida por isso, amarrada e deixada no pátio principal, exposta e desprotegida contra o frio cortante da noite, é algo que desejo, com todo o meu ser, evitar a todo custo.

Eu havia chorado, as lágrimas misturando-se com a urina que encharcava minhas roupas, meu corpo tremendo de frio e vergonha. "Desculpe, mestre, por favor, me perdoe. Não vai acontecer de novo, eu juro."

Mas minhas palavras não significavam nada para ele. Fui arrastada para o pátio, meus protestos ignorados, e amarrada a um poste. A noite era gelada, o vento cortante penetrando minha pele molhada como mil agulhas de gelo. Eu tremia incontrolavelmente, meus dentes batendo com tanta força que temi que pudessem quebrar.

Aquela noite pareceu durar uma eternidade. Cada minuto era uma tortura, o frio penetrando até meus ossos, a vergonha queimando em meu peito. Eu oscilava entre períodos de choro silencioso e momentos de desespero absoluto, desejando que tudo acabasse, que a escuridão me engolisse de uma vez por todas.

Agora, sentada neste canto, luto contra essa memória, contra a necessidade urgente que ameaça me dominar novamente. Respiro fundo, tentando acalmar meu corpo trêmulo, rezando para qualquer divindade que possa estar ouvindo para que eu consiga me segurar até que o mestre me permita usar o banheiro.

De repente, uma comoção irrompe pela casa, quebrando o silêncio opressivo. Sons abafados de gritos e lutas penetram o salão, enchendo o ar com uma tensão palpável e um pressentimento de mudança. Meu coração dispara, batendo com uma força que ameaça romper meu peito, e permaneço imóvel, tentando me tornar uma com as sombras, temendo o que ou quem poderia estar por vir.

A porta do salão se abre abruptamente, como se fosse o prelúdio de algum evento cataclísmico. O som ecoa pelo ambiente, fazendo-me encolher ainda mais em meu canto. Meus olhos, arregalados de medo, fixam-se na entrada, onde surge a figura imponente de seres alienígenas vestidos de preto.

2

Eles são altos, muito mais altos que qualquer humano que já vi, com pele de um tom azul-acinzentado que parece brilhar sob a luz do salão. Seus olhos, grandes e completamente negros, varrem o ambiente com uma intensidade que me faz tremer. Estão armados com dispositivos que parecem saídos de um filme de ficção científica, claramente distintos dos tipos de visitantes habituais do mestre.

Observo, paralisada de medo e curiosidade, enquanto eles se comunicam entre si em uma língua desconhecida e estranhamente melódica. Suas vozes são graves e autoritárias, ecoando pelas paredes do salão de uma maneira que faz meu estômago se contorcer de ansiedade.

Um deles, o que parece ser o líder, faz um gesto com a mão e os outros se espalham pelo salão, examinando cada canto com uma eficiência assustadora. Meu coração parece querer saltar pela garganta quando percebo que um deles está se aproximando do meu canto.

Instintivamente, tento me manter tão imóvel quanto possível, lembrando-me dos castigos impostos pelo mestre sempre que o medo me fazia tremer diante dele. Fecho os olhos com força, desejando poder desaparecer, tornar-me invisível aos olhos destes seres estranhos.

Abro os olhos lentamente, meu corpo tremendo incontrolavelmente agora, para ver o alienígena parado diante de mim. Ele é ainda mais impressionante de perto, sua altura fazendo-o parecer uma torre sobre mim. No entanto, algo em seus olhos me faz pausar. Não há a crueldade fria que estou acostumada a ver nos olhos do mestre. Em vez disso, há algo que não consigo identificar imediatamente - seria... compaixão?

O alienígena se agacha lentamente, colocando-se ao meu nível. Seus movimentos são cuidadosos, como se estivesse lidando com um animal assustado - o que, percebo com uma pontada de tristeza, não está muito longe da verdade.

Ele estende uma mão em minha direção e eu me encolho instintivamente, esperando um golpe que não vem. Em vez disso, ele para, sua mão pairando no ar entre nós.

Para minha surpresa e confusão, ele remove sua própria vestimenta - uma espécie de capa longa e escura - e a coloca sobre mim com cuidado. O tecido é surpreendentemente macio e quente, oferecendo um conforto que não sentia há tanto tempo que quase tinha esquecido como era.

Este gesto simples, este vislumbre de compaixão e humanidade, é quase demais para suportar. Sinto lágrimas começarem a se formar em meus olhos, uma emoção que há muito tempo aprendi a suprimir ameaçando transbordar.

Quando ele me levanta no colo, meu corpo treme involuntariamente, uma reação instintiva ao medo de ser punida por deixar meu posto sem permissão, por mostrar fraqueza. Espero o golpe, a dor, a punição que sempre segue qualquer demonstração de vulnerabilidade.

Mas nada disso vem. Em vez disso, ele me segura com um cuidado e gentileza que me são estranhos, emitindo um som suave, quase como um cantarolar, numa tentativa clara de me acalmar, de me assegurar que, de alguma forma, tudo ficará bem.

A sensação de calor e segurança em seus braços é estranhamente reconfortante. É algo que não sentia há tanto tempo que quase tinha esquecido como era. Por um momento efêmero, permito-me nutrir uma centelha de esperança, um desejo ardente por algo mais do que a dor e a humilhação constantes que definiram minha existência até então.

Ele me leva através dos corredores silenciosos e sombrios da casa, passando por cenas de caos e confusão. Vejo outros alienígenas levando mais mulheres, todas parecendo tão assustadas e confusas quanto eu me sinto. Há gritos e sons de luta vindos de algum lugar distante da casa, e me encolho instintivamente ao ouvi-los.

Finalmente, chegamos ao lado de fora, onde uma enorme nave espacial está estacionada. É uma visão impressionante, sua superfície metálica brilhando sob a luz das estrelas. O alienígena me leva para dentro, onde sou colocada delicadamente em uma cama.

O leito é macio, tão macio que por um momento penso estar sonhando. Afundo no colchão, sentindo cada músculo dolorido do meu corpo relaxar pela primeira vez em... não consigo nem lembrar quanto tempo.

Outro alienígena se aproxima, e observo com uma mistura de medo e fascinação enquanto eles conversam entre si. Suas vozes são baixas e urgentes, e embora não possa entender as palavras, posso sentir a tensão no ar.

Um deles pega um pequeno dispositivo e se aproxima de mim com uma intenção que não consigo decifrar. Meu corpo se tensa novamente, preparando-se para a dor que sempre acompanha o desconhecido.

Eu observo, imóvel, enquanto o alienígena coloca o dispositivo em sua própria orelha, um gesto que me deixa ainda mais confusa. Em seguida, ele se aproxima de mim, e, quando vejo o dispositivo se aproximar, um impulso de pânico me faz tentar recuar.

Sou gentilmente contida, presa em um abraço que, embora firme, não é ameaçador. O alienígena me olha com um olhar que parece transbordar de desculpas enquanto prende o pequeno dispositivo no lóbulo da minha orelha direita.

Sinto uma picada aguda, uma dor que, embora mínima comparada ao que já suportei, me faz gritar involuntariamente. É um som pequeno e assustado, mais um gemido do que um grito real, mas é o primeiro som que me permito fazer em... não sei quanto tempo.

"Você machucou a pequena fêmea," o alienígena que me segura exclama, sua voz carregada de uma preocupação genuína e inesperada.

Fico chocada ao perceber que entendo suas palavras. O dispositivo, percebo, deve ser algum tipo de tradutor. É como se um véu tivesse sido levantado, permitindo-me finalmente compreender o mundo ao meu redor.

O alienígena que havia colocado o dispositivo em mim responde com uma expressão de culpa e remorso: "Eu não a machuquei de propósito, ela é muito frágil, por isso sentiu dor."

3

Ele se dirige ao alienígena que me segura e depois olha para mim, seus olhos transmitindo uma sinceridade rara. "Me perdoe, pequena, não foi minha intenção causar-lhe dor. Se eu soubesse, teria tomado precauções para que você não sofresse desnecessariamente." Suas palavras, embora simples, carregam um peso imenso, marcando a primeira vez em muito tempo que alguém se desculpa comigo por me causar dor.

"Obrigada," eu consigo murmurar, minha voz fraca e rouca pelo desuso prolongado. Estou surpresa por encontrar gratidão em meu coração, um sentimento quase esquecido. Estou tão grata por finalmente entender o mundo à minha volta, por ter a chance de me comunicar, ainda que seja com seres de outro planeta. Os alienígenas me olham com uma mistura de pena e curiosidade, um olhar que, embora desconfortável, é infinitamente preferível aos olhares cruéis e lascivos a que estava acostumada.

Olho com curiosidade ao redor, ainda sem sair dos braços do alienígena que me segura. A nave é um ambiente completamente novo para mim, cheio de luzes piscantes e superfícies metálicas brilhantes. É um contraste gritante com o ambiente opressivo e sombrio ao qual estava acostumada.

O alienígena que me segura percebe meu interesse e diz gentilmente: "Já vamos partir. Você está segura agora." Ele se vira para se despedir dos outros e vai ao encontro de outros seres que eu presumo que sejam guardas pelo jeito como estão vestidos.

Sou colocada cuidadosamente na cama. O conforto é quase esmagador depois de tanto tempo dormindo no chão duro. Sinto meu corpo relaxar involuntariamente, anos de tensão começando a se dissipar. O cansaço me atinge como uma onda, e percebo que não me lembro da última vez que dormi sem tanto medo embora ele ainda esteja presente.

"Descanse agora," diz o alienígena, sua voz suave e reconfortante. "Temos uma longa viagem pela frente."

Assinto levemente, sentindo meus olhos ficarem pesados. Pela primeira vez em anos, permito-me relaxar completamente, deixando que o sono e o cansaço me levem. Caio em um sono profundo, mas ainda não livre de pesadelos.

Quando acordo, me deparo com uma pequena comoção. Meus olhos se abrem lentamente, ajustando-se à luz suave da nave. Por um momento, o pânico me domina ao não reconhecer meu entorno, mas então as memórias dos eventos recentes voltam, trazendo consigo uma onda de alívio.

Prestando um pouco mais de atenção ao que dizem, entendo que já chegamos ao planeta de destino. A excitação e o nervosismo são palpáveis no ar, misturados com uma dose de apreensão. Ouço fragmentos de conversas ao meu redor:

"O que vai acontecer conosco agora?"

"Será que vamos poder voltar para casa?"

"E se este lugar for pior do que de onde viemos?"

As vozes são um misto de esperança e medo, ecoando meus próprios sentimentos conflitantes.

Um dos alienígenas se aproxima de mim, seu rosto mostrando uma expressão que interpreto como gentileza. "Está na hora," ele diz suavemente. "Uma a uma, vocês estão sendo levadas ao consultório do curandeiro. É sua vez agora."

Sou levada com cuidado até o consultório. Meu coração bate forte no peito, uma mistura de medo e antecipação me consumindo. Ao entrar na sala, me deparo com o mesmo ser que furou minha orelha com o tradutor. Surpreendentemente, relaxo visivelmente ao vê-lo, um rosto familiar neste mundo estranho.

Ele percebe minha reação e sorri, um gesto que parece iluminar toda a sala. "Bem-vinda," ele diz, sua voz calma e reconfortante. "Por favor, sente-se na cadeira em frente à minha mesa. Vamos começar os exames."

Hesitante, me movo em direção à cadeira. Cada passo é uma luta contra anos de condicionamento, contra o medo profundamente enraizado de confiar em alguém. Mas algo neste ser, em seus olhos gentis e voz suave, me faz querer tentar.

Os exames são realizados com uma eficiência e cuidado que me surpreendem. Cada movimento é explicado antes de ser executado, cada toque é gentil e respeitoso. É um contraste tão gritante com o tratamento a que estava acostumada que sinto lágrimas se formando em meus olhos.

"Está tudo bem," o médico alienígena diz, notando minha emoção. "Você está segura aqui. Ninguém vai machucá-la."

Suas palavras desencadeiam algo dentro de mim, uma comporta de emoções reprimidas por tanto tempo que explode. Começo a chorar, soluços profundos e dolorosos que sacodem todo o meu corpo. Anos de medo, dor e solidão fluem através dessas lágrimas.

O médico não tenta me impedir ou me silenciar. Ele simplesmente espera, oferecendo uma presença reconfortante enquanto eu libero toda a dor acumulada. Quando finalmente me acalmo, ele me oferece algo para beber e limpar meu rosto.

"Você passou por muito," ele diz suavemente. "Mas está acabado agora. Aqui, você terá a chance de se curar, de recomeçar."

Após os exames, sou levada para um dormitório que promete ser um santuário de segurança e recomeço. O quarto é espaçoso e bem iluminado, com várias camas dispostas em fileiras ordenadas. Cada cama tem lençóis limpos e um cobertor grosso dobrado na ponta.

No entanto, o medo e a desconfiança, forjados em anos de abuso e negligência, são companheiros difíceis de abandonar. Enquanto me enrolo na cama, tentando controlar a ansiedade que me consome, escuto os comentários das outras mulheres que compartilham o dormitório.

"Olhem para ela," ouço uma voz dizer em tom de escárnio. "Parece um animal assustado."

"Provavelmente era a favorita do mestre," outra voz responde com amargura. "Aposto que ela gostava disso."

As palavras cruéis lançadas em minha direção, agora compreensíveis graças ao tradutor, apenas alimentam meu crescente pânico. Fecho os olhos com força, tentando bloquear as vozes, tentando me convencer de que estou segura agora.

Mas é difícil. Apesar da promessa de segurança, a incerteza sobre o futuro e o trauma do passado tornam difícil acreditar verdadeiramente que finalmente encontrei um refúgio, um lugar onde posso começar a reconstruir a minha vida, longe das sombras do medo e da dor.

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