Quando imaginei começar bem a minha vida, eu não imaginava que seria como mãe. Eu sempre quis ter um bebê, mas tendo uma boa rede de apoio, um marido que estivesse do meu lado, a minha mãe junto comigo ou pelo menos morando por aqui por perto e ter amigos ao meu lado, mas eu não tinha nada disso.
Eu havia mudado de cidade tinha exatamente seis meses. Morava no Rio de Janeiro com os meus pais, mas recebi uma proposta ótima de emprego em um estúdio de tatuagens e eu, como sempre quis trabalhar nessa área, aceitei de imediato.
Comecei então a empacotar as coisas e me mudei para São Paulo. Lá eu trabalhava oito horas por dia e passava muito tempo ao lado de Caio-ele era o meu chefe.
Não demorou para que começássemos a nos envolver e tínhamos apenas casos secretos juntos. Ele dizia ser solteiro, mas eu mesma não sabia ao certo se aquilo era ou não verdade, pois eu nunca conheci a família dele.
O mesmo dizia ser muito reservado e que não tinha muito contato com a sua família, mas eu sempre suspeitei disso, mas não ficava insistindo.
Mas quando comecei a sentir muitos enjoos matinais e a querer dormir o tempo todo, eu logo percebi haver alguma coisa de errado comigo.
_ Deve ser alguma coisa que você comeu-dizia Caio, quando eu dizia estar me sentindo muito cansada-não deve ser nada de mais.
_ Ah, eu não sei, Caio. Durmo bem a noite, mas eu ainda continuo me sentindo muito cansada.
_ Não se preocupe com isso gata, deve ser estresse do trabalho. Agora vamos, porque o trabalho nos chama.
_ Tá bem, vamos.
Mas os sintomas não aliviaram e eu comecei a vomitar pela a manhã ou quando ficava nervosa com algo, me sentia muito estressada e chorosa.
Mas eu apenas pude ter a certeza do que era quando tive um pequeno sangramento.
Eu estava no meu turno de trabalho quando senti uma enorme dor na barriga. Era tão forte que eu mal conseguia ficar de pé. Logo fui para o banheiro e vi que havia sangue ali. De princípio eu pensava que pudesse ser o meu ciclo mensal, mas veio em uma cor diferente. Era meio rosado. Esperei mais algum tempo até a dor passar e fui até o frigobar do lugar e peguei uma garrafa de água.
Eu me lembro apenas de ter visto o Caio tentando me chamar, mas eu já estava desfalecendo. Depois disso, eu vi tudo escuro e quando acordei, já estava no hospital.
Eu abro os meus olhos e logo vejo o rosto do médico. Ele era meio idoso, pele escura e parecia bem compreensivo, tentando me explicar o que havia acontecido comigo.
_ Você desmaiou devido a falta de oxigenação do seu corpo, mas você já está sendo medicada e poderá ser liberada daqui algumas horas.
_ Mas o que provocou exatamente o desmaio?- pergunto ficando um pouco preocupada, já que dificilmente eu fico mal de saúde.
_ Provavelmente foi algum alimento que você ingeriu que possa ter te feito mal ou passar muitas horas sem se alimentar.
_ Entendo. Eu irei precisar fazer algum exame, tipo de sangue?
_ Bem, era isso que eu estava conversando com o seu namorado- ele olha para Caio, que logo aparenta uma expressão séria - eu lhe recomendo fazer um exame de sangue, para descartamos alguma doença ou problemas mais sérios.
_ Tudo bem, eu quero fazer.
_Ok, irei chamar uma enfermeira para coletar o seu sangue, com licença.
_ Porque você quer fazer exame de sangue? Você já está bem melhor e tenho muitos clientes me esperando, muitos deles já me pagaram adiantado.
_ Nossa, você é bem insensível, sabia? Eu preciso saber se está tudo bem com o meu corpo, mas se você quiser ir, eu irei assim que o médico me liberar e se quiser, pode descontar do meu salário as horas extras perdidas.
_ Não é isso e sim que não vejo necessidade de fazer um exame de sangue. Não está achando que pode estar grávida né? Porque eu não quero ter um filho não, eu tenho a minha vida inteira pela a frente para ter que pará-la por conta de um bebê.
_ Nossa, está de parabéns agora hein. Eu nem estava pensando nessa hipótese, mas fique tranquilo que se caso acontecer, eu não irei precisar depender de você e do seu dinheiro.
_ Olha, vamos nos acalmar e esperar esse resultado chegar, quando você fizer esse exame e depois, nós vemos o que fazemos.
Sinto nojo do Caio ao ouvir dizendo aquelas palavras. Como ele pode ser tão frio e insensível assim? Se eu estiver mesmo grávida, é claro que eu irei cuidar e eu espero que ele possa mudar de opinião caso dê positivo.
A enfermeira chega depois de alguns minutos e coleta o meu sangue. A mesma diz que o resultado sairá daqui 4 horas e como eu ainda preciso voltar para o trabalho, decido que irei passar para buscar no dia seguinte.
_ Você está liberada- diz a enfermeira Cíntia, me entregando um papel com o comprovante que irei precisar para pegar o exame amanhã.
_ Obrigada- agradeço, pego a minha bolsa e eu e Caio voltamos para o estúdio de tatuagens.
Assim que chegamos, ele logo entra na sua sala particular, enquanto eu faço as fichas dos clientes.
Havia nove pessoas esperando para serem atendidas, mas que foram muitos atensiosos quando eu expliquei o motivo da nossa demora.
_ Qual desenho você quer fazer hoje?- pergunto a Clara, uma das nossas clientes, da qual já fez 3 tatuagens: uma coroa de flores nas costas, um pássaro em baixo do braço e uma pequena borboleta perto do calcanhar.
_ Hoje eu irei querer uma libélula no meu outro calcanhar- responde ela animada- cada uma delas representa ciclos em minha vida que se fecharam.
E lá vamos nós outra vez ouvir ela dizendo a história por trás das tatuagens. A coroa de flores ela fez em homenagem a mãe dela, que faleceu há alguns anos; o pássaro foi quando ela terminou com o pai de seu filho, o que lhe representa uma certa liberdade dele e borboleta significa que ela agora se sente em paz consigo mesma.
_ A libélula tem algum significado especial?- pergunto, aguardando a sua resposta, que com certeza ela sempre tem na ponta da língua.
_ É em homenagem a minha irmã, que se mudou para uma cidade bem longe. Nós não éramos nada próximas, pelo o contrário, ela me infernizava o tempo todo, sempre que podia e por isso esse desenho, para simbolizar a minha paz espiritual.
_ Entendo. Vou te mostrar os modelos disponíveis desse animal e você escolhe um, está bem?
_ Claro. O Caio já chegou? Ele me disse que precisava conversar comigo.
_ Sim, ele está na sala dele, mas irei chamá-lo.
_ Tudo bem, obrigada.
Não sei bem o que a Clara quer conversar com ele, mas vou até o seu escritório e o chamo.
_ Caio, a Clara disse que quer conversar com você e pediu para te chamar- digo, ao bater na porta e ouvir ele dizer que eu poderia entrar.
_ Tudo bem, diga que já estou indo.
_ Tá bom- quando iria sair da sala, ele me chama.
_ Cristina...- ele se levanta e segura na minha mão - me desculpe a forma que falei com você mais cedo. É porque eu fiquei bem nervoso com a possibilidade de poder ser pai. Eu sei que eu nunca lhe apresentei a minha família, mas é por que eles são pessoas bem tóxicas e eu não quero que tenha uma impressão errada sobre mim.
_ Você tem outra família? Por que essa é a única explicação para você nunca me apresentar a eles.
Quando o mesmo iria abrir a boca para responder, alguém bate na porta, nos interrompendo:
_ Caio, podemos conversar agora ou você ainda está ocupado?- Clara entra na porta, sem esperar que ele diga que pode entrar.
_ Sim, podemos. Cristina, conversamos depois, eu preciso resolver isso primeiro.
_ Tudo bem- respondo e saio da sala, os deixando sozinhos.
Continuo atendendo todos os clientes, mas tenho que parar a todo tempo, pois começo a sentir cólicas fortes e enjôo. Dou uma pausa, após algumas horas e compro um lanche na esquina- um pastel de forno sabor frango com catupiry e uma lata pequena de Coca-Cola.
Volto para o meu expediente após dez minutos e continuo com o serviço. Caio continua conversando com a Carla e me questiono se ela poderá ser a ex mulher dele ou talvez o pai da criança dela.
Finalmente ela sai da sala, depois de algumas horas e Caio me chama para conversarmos.
Ele pede para eu fechar a porta e após eu me sentar, ele diz:
_ Ela é a mãe do meu filho, mas nós não temos nada há anos. Ela tem dois filhos e eu sou o pai do mais velho, de 10 anos. Ela veio aqui porque quer que eu reconheça o menino como filho, sendo que eu apenas soube hoje da criança. Ela havia me trocado por outro cara e eu nem quis confusão, já que eu também queria viver uma vida mais livre.
_ E o que você irá fazer?
_ Eu não sei. Vou começar a dar pensão, mas eu não sei se quero fazer parte da vida da criança. Ela esperou dez anos para me falar que sou o pai? Não posso entrar na vida dele assim.
_ Mas ele ficará feliz de saber que tem um pai e mais alegre ainda se você quiser conhecê-lo.
_ Eu não te chamei aqui para dar opiniões e sim porque ela pode querer me prejudicar e eu prefiro que você saiba por mim e não por ela.
_ Nossa, você me dá vários foras e eu nem sei porque eu ainda estou com você. Quer saber? Eu vou embora.
_ O que você quer dizer com isso?
_ Que estou me demitindo e também me afastando de você. Você é uma pessoa tóxica e eu quero distância disso.
_ Bom, é você que estará perdendo, mas irei fazer a sua carta de demissão e te pagar o que você já recebeu dos dias trabalhados. Você até que foi esperta, porque o mês completou ontem.
_ Eu não planejei nada disso. Apenas quero viver em paz.
_ Bom, saiba que se você estiver mesmo grávida, nem precisa me procurar porque não quero criar mais um bastardo- ele me entrega um cheque com o valor do meu salário: 2 mil reais- toma, agora saia da minha loja e não me procure mais.
_ Ok- respondo e saio de perto dele e de sua loja, deixando vários clientes esperando serem atendidos.
Quando nos casamos com uma pessoa, pensamos que será para sempre- ou até quando a morte nos separa- mas eu devia ter percebido que ela não prestava.
Em nosso casamento, ela já fazia algumas piadas sem graça e queria abraçar todos os meus amigos, porém eu pensava que isso fosse apenas uma forma de carinho e não que isso já mostrasse o caráter dela.
Clarice era o nome da minha esposa- não, ela não morreu- pelo o contrário, está bem viva, tendo um caso com o meu melhor amigo.
Descobri por acaso ao chegar mais cedo em casa e encontrar os dois transando em nossa cama box.
Eu sempre chegava em casa às 22hs porque trabalhava como professor em duas escolas distantes e ainda dava aulas particulares para os adultos em um centro comunitário.
Sempre a ajudei com tudo o que ela precisasse- fosse dinheiro para ir ao salão de beleza até ir buscá-la em algum bar porque estava bêbada demais para dirigir.
Nos finais de semana, era sempre em nós irmos em algum lugar chique ou em alguma casa de praia.
— Como você pôde fazer isso comigo?- eu dizia a ela, depois dos dois colocarem os seus trajes- estamos casados há dez anos e você me faz algo assim e justo com ele.
— Ah, você nem pode reclamar, Robert. Você trabalhava direto, só chegava tarde em casa. Vai saber se você não tinha alguma mulher na rua.
— Eu fui fiel a você, nunca nem ousei olhar para outra mulher.
— Bom, isso é problema seu, não meu. Eu quero ficar com ele. Se você aceitar isso, podemos revezar os dias entre um e outro.
— Você está de sacanagem comigo? Eu me casei com você faz dez anos e você me vem com essa de querer ficar com nós dois?- pergunto sentindo uma raiva indescritível - pode ficar com a casa porque não quero brigar na justiça por esse lixo. Apenas me mande os documentos do divórcio que eu assino.
Pego todas as minhas roupas, colocando em duas malas grandes de rodinhas e saio da casa que um dia eu a chamei de lar, indo buscar um novo rumo em minha vida.
Compro uma passagem apenas de ida para São Paulo pela a internet e saio de ônibus até a Rodoviária Novo Rio. Eu morava em Guarulhos antes de conhecer a minha ex esposa, mas então eu havia me mudado para o Rio de Janeiro por causa de sua família - ela não queria ficar longe deles- e eu como um bom marido, concedi o seu desejo.
Conheci o amante dela- o meu ex amigo- quando a levei em uma partida de futebol no Maracanã. Ele estava sentado na cadeira ao nosso lado. Compartilhávamos do mesmo time e logo ali, se formou uma amizade.
Eu como vascaíno doente, o chamava para ir em todos os jogos e minha esposa nem sempre nos acompanhava, mas ele sempre perguntava por ela. No começo, eu pensava que fosse apenas por educação, mas hoje eu entendi tudo- eles estavam tendo um caso pelas as minhas costas e isso me magoa demais.
Vou dar um bom tempo sem ficar com uma mulher. Eu sei que nem todas são assim, mas já tive dor de cabeça o suficiente por um ano inteiro e não quero me meter em mais problemas.
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