Serena Davis trocara o gélido inverno inglês pelo verão do Brasil e a temperatura beirava vinte e sete graus.

Chegara na véspera no Rio de Janeiro, o último local em que gostaria de estar no momento.

A terra de seu pai! Um pai que conheceu pouco!

Tinha dormido mal e ao acordar bem cedo, ligara para a mãe, Branca.

Depois de assegurar-se de que ela estava bem, Serena passara as últimas horas muito ansiosa!

Olhou para o relógio em seu pulso, estava quase na hora de encontrar-se com Joseph Lewis.

Só este nome já era suficiente para deixá-la nervosa, mas ela sabia que, como executor do testamento de seu pai, ele era a última esperança.

Serena pensava que preferiria viver na mais absolutamente pobreza do que aceitar um centavo da herança do pai.

Mas não estava preparada para arriscar as chances que a mãe teria de se recuperar de uma operação de câncer de mama por causa de alguns milhares de libras.

Serena achava que o pai devia muito mais à mãe!

Branca, na época, uma ingênua jovem de dezenove anos, conheceu Brandon Davis e se apaixonou por ele num jogo de polo em Cotswolds.

Ele era um jogador de polo brasileiro bem mais velho.

Branca engravidou e se casou em meses, e Serena, nascida na Inglaterra, foi o resultado!

Brandon continuou com o circuito de polo e, quando voltou para pegar a mãe e filha, e levar para o rancho no Brasil, o casamento não durou mais de seis meses.

No rompimento do noivado de Serena, sua mãe confessara que seu charmoso marido admitira que tinha uma amante no Rio e que não tinha a intenção de manter-se celibatário enquanto enquanto viajava pelo mundo jogando polo.

Branca voltou para a Inglaterra com o bebê e logo depois pediu o divórcio.

Serena não culpou a mãe! Sua própria experiência com o pai fora um desastre!

Aos catorze anos, Brandon ofereceu a ela uma viagem de férias ao Rio de Janeiro e Serena agarrou-se a possibilidade de encontrar um pai que não via desde bebê e do qual não se lembrava.

Imediatamente, Serena se sentiu atraída pelo filho do fazendeiro, um rapaz de vinte anos chamado Luccas Maia.

Encorajada pelo pai, ela ia para o Rio nos verões e ficou noiva aos dezessete anos, marcando o casamento com Luccas depois que Serena completasse dezoito anos.

Felizmente ela acordou para a realidade a tempo e terminou tudo!

Serena passou sete anos sem falar com o pai e voltar ao Rio De Janeiro, a não ser por aquele momento se não fosse pela mãe.

*

O lobby do prédio de Lewis era rodeado por um conjunto de portas de vidro e Serena aproveitou para observar seu reflexo enquanto passava.

Nada mal, pensou. Serena optara por vestir uma camisa azul clara, saia na altura dos joelhos com uma jaqueta de manga curta.

O cabelo estava solto e usava sandálias de salto fino que a ajudavam a aumentar sua altura, pensou que parecia inteligente e pronta para negociar!

O recepcionista observou-a com apreço.

— O senhor Lewis a espera. A secretária dele a conduzirá ao escritório.

Serena o agradeceu sorrindo.

O pequeno percurso de dois andares foi o suficiente para outro ataque de ansiedade!

Felizmente a porta do elevador logo abriu e ela saiu num silencioso corredor.

Não havia nenhuma secretária à vista e tudo o que via era uma porta bem distante.

Serena consultou novamente o relógio. Já passava do meio dia.

Estaria Joseph Lewis fazendo algum jogo diabólico?

De certa forma, não o culpava! Ele ligara para ela há cinco meses propondo a reconciliação com o pai.

Depois tentou mais três vezes e Serena ignorou todas as sugestões.

Principalmente porquê, devido a uma trágica coincidência, foi na mesma época que sua mãe descobriu que tinha câncer.

Serena recebeu o primeiro telefonema de Joseph Lewis uma semana antes da operação da mãe.

Dizia que seu pai sofrera um pequeno ataque cardíaco, nada sétio, mas Joseph pensou que Serena talvez pudesse visitá-lo, ou mesmo ligar para ele.

Na opinião dele, era hora de pai e filha esquecerem as desavenças e se reconciliarem.

Serena ficou tão surpresa ao ouvir uma voz do passado que disse que tentaria, e a ligação foi encerrada amigavelmente.

O telefonema seguinte ocorreu na véspera da operação de sua mãe.

Lewis disse que o pai dela tivera outro infarto, mais sério, e estava hospitalizado.

Lewis comprara para ela um lugar no voô para o Rio De Janeiro do dia seguinte e tudo que ela precisava fazer era ir ao aeroporto e pegar a passagem.

Serena declinou a oferta, pois queria estar aio lado da mãe na operação.

A conversa terminou de forma nada amigável.

A terceira ligação foi uma semana depois, para informar que o pai dela morrera e que a data do enterro já fora marcada.

Novamente, Serena não pôde atender, pois estava mais preocupada com a recuperação da mãe.

Serena compreendia a impressão que Lewis devia ter dela!

Uma filha que se recusava a visitar o pai e não aparecia em seu enterro!

Talvez quando explicasse as circunstâncias Joseph entendesse.

Ainda assim, a ideia de vê-lo novamente a deixava muito ansiosa.

Joseph estava no rancho quando Serena visitou o pai pela primeira vez.

Um italiano com interesses na América do Sul, ele se hospedara no rancho no ano anterior, a pedido da madrasta Lisa.

Lisa era irmã de Brandon, pai da Serena.

Joseph era tecnicamente seu primo, mas não havia relações de sangue.

*

Joseph já era um homem de negócios bem sucedido e noivo de uma belíssima brasileira, Aline, que conhecera em São Paulo, quando ela tentou uma carreira de cantora.

A mãe dela trabalhava como cozinheira no rancho Maia, vizinho do rancho Davis onde Joseph estava.

Para a adolescente Serena, ele parecera de uma geração diferente, engomadinho demais para ser um amigo, na melhor das hipóteses um conhecido e, na pior, um adulto cerceador!

Serena imaginava o que a jovem e moderna Aline via nele.

Serena sorriu. Sabendo o que sabia, encontrar o pomposo Joseph Lewis novamente não seria fácil

Ainda assim, ela enfrentaria um leão por sua mãe e, com esse pensamento, desistiu de ficar parada no corredor e abriu a porta à sua frente.

Olhando ao redor, notou que continuava sozinha!

Naquele momento, a porta foi aberta e Serena olhou para o homem que entrou na sala.

Joseph Lewis.

Seus olhos se arregalaram em surpresa e por um momento ela ficou atônita diante do poder de sua masculinidade.

Ele tinha mais de um metro e setenta, cabelos negros levemente prateados na frente.

Seus traços esculturais não eram de uma beleza clássica.

As maçãs do rosto eram saltadas, tinha um raiz tipicamente romano e um queixo determinado.

Ele era o mais impressionante espécime masculino que encontrava nos últimos tempos!

Mas também ela não tinha tanta experiência assim.

Tivera poucos homens desde o rompimento do noivado.

E aquele certamente era casado!

O terno cinza-escuro que vestia caía perfeitamente em seus ombros largos e uma camisa branca aberta no pescoço.

O paleto estava aberto e um cinto de couro cinza sustentava uma calça pregueada que envolvia quadris enxutos, coxas poderosas e longas pernas.

Sua masculinidade era impressionante e Serena pensou coml deixara de notar isso quando era adolescente.

Mas quando os olhos azuis dela buscaram os dele, encontraram apenas um olhar negro e um cenho franzido.

Nada mudara afinal, pensou Serena.

Serena sempre se sentira desconfortável diante dele.

Frente aos treze anos dela, ele parecia ter uma presença inconfrontável!

Quando ele demonstrava desaprovação a ela, especialmente com Luccas, Serena se sentia de alguma forma ameaçada.

Mas com uma percepção tardia, Serena notou que o repelia da mesma forma.

Ela se ressentia da fácil relação que ele tinha com o pai que ela apenas começava a conhecer.

E também da amizade dele com Luccas Maia, que na época Serena pensava ser o amor de sua vida.

Apagando as memórias indesejadas, Serena levantou-se e seu coração deu um salto quando os lábios dele, perfeitamente moldados e sensuais, se abriram em um sorriso sociável.

Serena se arrepiou sem saber o porquê!

Estava errada! Ele mudada! Parecia ainda mais arrogante e arredio!

Acalme-se, mantenha o controle, trata-se de um negócio, dizia Serena a si mesma.

Ela tinha confiança para lidar com qualquer situação e educadamente estendeu sua mão.

— Senhor Lewis, que bom vé-lo novamente.

— Joe, por favor, afinal somos quase da mesma família!

Joseph disse perscrutando com os olhos azuis a mulher à sua frente.

Os olhos da cor do céu grandes e de cílios espessos o encaravam, mas evitavam contato direto com seu olhar.

Os cabelos negros e compridos estavam livres.

Acrescente-se um pequeno nariz perfeito e uma boca rosada luxuriosa que implorava para ser beijada e a mulher era uma dinamite!

O olhar de Joseph desceu até um decote que se insinuava pelo corte da jaqueta.

O corpo dele ficou tenso. A imagem da adolescente morena, baixinha e magra que ele carregara em sua mente por anos desapareceu diante daquela bela figura feminina.

Serena Davis tornara-se uma mulher muito atraente.

Joseph olhou enquanto ela o observava, notou a chama de reconhecimento em seus olhos brilhantes e algo muito próximo a medo.

Serena tinha todo direito de ter medo, ele pensou, cinicamente, aquela desgraçada sem coração!

Não a via a oito anos, seu corpo mudara, mas reconheceria aqueles olhos em qualquer lugar.

— Perdoe-me pelo atraso, Serena! Espero que não tenha aguardado muito!

Joseph apertou a mão ainda estendida dela.

Serena engoliu em seco. O aperto de mão dele era firme e caloroso, provocava efeitos muito estranhos em sua pulsação.

— Não muito!

Ela respondeu.

— E, por favor, pode me chamar de Serena!

Respondeu debochadamente, enquanto tentava puxar a mão, Joseph apertou ainda mais.

— Por favor, sente-se!

Joseph esperou que Serena se sentasse para largar sua mão.

— Há muito tempo não nos vemos. Acho que desde a sua festa de noivado quando você tinha... quantos anos? Dezessete, dezoito?

— Dezessete!

Serena confirmou.

A última coisa de que precisava era ser lembrada de sua festa de noivado, especialmente por aquele homem!

Serena não o via desde aquela época, mas, erguendo a cabeça, olhou para Joseph e por um rápido instante sentiu algo perigoso naqueles insondáveis olhos azuis e naquela postura ereta.

Seus instintos todos a avisaram de que deveria ter cuidado com um homem como Joseph e, ao se lembrar do quarto e último telefonema que ele fizera, alguns dois depois do enterro do seu pai, Serena arrepiava-se ligeiramente.

*

Joseph Lewis a informara, com ironia, que ele era o único executor do testamento e que o pai dela adicionar uma cláusula uma semana antes de morrer, dizendo que, se ela concordasse em voltar para o Rio em até seis meses depois do falecimento dele, receberiw algo de valor.

Serena respondera que não estava interessada e que pretendia jamais aceitar a oferta de Joseph, mas agora cinco meses depois, precisava do dinheiro!

Mais especificamente falando, sua mãe precisava do dinheiro!

O médico recomendara um novo tratamento de três anos com remédios importados como a melhor alternativa para plena recuperação da cirurgia, mas aqueles medicamentos não eram distribuídos gratuitamente na Inglaterra e o tratamento estava programado para começar em alguns dias.

Serena garantiu à mãe que elas poderiqm arcar com a despesa extra, pois fazia questão que ela tivesse o melhor.

Serena administrara a padaria para a mãe no último e começou um esquema de expansão para fornecer serviços de buffet para empresas.

Elas se mudaram para uma nova casa.

O antigo apartamento foi transformado em outra cozinha com a ajuda de um empréstimo de um banco, que também serviu para a compra de um novo carro para as entregas.

Infelizmente para Serena, no momento em que a necessidade do novo tratamento fora anunciada, as finanças estavam esticadas ao limite!

Serena guardara para si a informação, para não preocupar a mãe.

Ela tentaria recorrer ao banco, mas eles não emprestariam mais dinheiro tão cedo!

Serena buscara levantar o dinheiro de todas as formas, sem conseguir.

Finalmente, em desespero, entrou em contato com o escritório de Joseph, na Itália.

Como cortesia, ele enviou uma passagem aérea e uma reserva de hotel no Rio dois dias depois.

Mas agora que estavam frente a frente, perguntar o que seu pai deixara e imaginar se seria possível conventer isso em dinheiro parecia muito mais desanimador.

— Senti muito por saber que seu noivado com Luccas não deu certo!

A voz de Joseph despertou Serena do seu transe.

— Cheguei na casa de Brandon um dia antes de seu casamento e descobri que você tinha cancelado, de acordo com o seu pai, porquê pensava ser muito jovem e queria se divertir por mais tempo antes de assumir um compromisso... decisão repentina?

Foi a pior época de sua vida e, ainda assim, segundo Joseph, seu pai fez com que ela parecesse uma tola sonhadora.

Seus olhos azuis procuraram cautelosamente os dele, como se por um segundo enxergasse uma sombra de emoção nas profundezas: simpatia ou censura?

Não tinha certeza. Ele saberia a verdade sobre o rompimento do noivado?

— Sim. Tive minhas razões!

Serena piscou levemente, evitando a indagação do olhar astuto dele.

Não cabia a ela contar a verdade a Joseph!

*

A realidade era diferente! Três dias antes do casamento, decidiu caminhar até o rancho vizinho, onde Luccas morava para fazer uma surpresa...

Serena ficou paralizada, e daquele dia em diante jamais esqueceria do que vira!

Seu noivo estava nu com Aline, noiva de Joseph, igualmente nua, sem sequer notar sua presença!

Não havia qualquer dúvisa sobre o que estavam fazendo e, sentindo o estômago revirar, ela saiu correndo.

Serena atingiu o outro lado do rio e caiu em prantos.

Foi assim que Aline a encontrou, logo entendendo o que ocorrera.

Serena recebeu uma lição de vida muito dolorosa.

Aline informou que ela e Luccas eram amants desde jovens.

Ninguém mais sabia de sua relação com Luccas e ela não queria que Serena contasse a verdade para ninguém, principalmente para Joseph Lewis.

Ele financiava sua carreira e Aline realmente tinha intenção de se casar com ele quando fosse a hora, quando se cansasse do cenário musical.

Quando Serena disse que aquilo era vergonhoso e se Alice tivesse que se casar com alguém que fosse com o Luccas, sua visão adolescente sobre o amor fora arruinada, e o simples ato de pensar nele a tocando causava náuseas.

— Como você é inocente! Certamente não imaginava que um macho carioca ficaria contente em ver sua namorada um mês por ano? Você realmente pensa que ele quer se casar com você por alguma razão diferente do rancho do seu pai? Seu pai e Luccas fizeram um acordo, você vai herdar tudo isso, assim como o Luccas, seu noivo! Duas boas propriedades unidas em uma só e as duas famílias unidas! Cresça menina, e encare a realidade! Por que pensa que seu pai esperou tantos anos para buscá-la? Era porquê ele estava esperando você chegar numa idade em que pudesse ser usada! Quanto ao Luccas.. ele me ama, e se casaria comigo amanhã, se eu concordasse! Mas não há chances de eu ficar presa a este país! Joseph é uma aposta melhor e viajarei pelo mundo cercada de luxo!

Aline jogou tudo no ventilador. Serena ficou muito abalada com as coisas que ouviu!

O véu da inocência foi arrancado inesperadamente de seus olhos, Serena foi forçada a enfrentar o fato de que aquilo tudo fazia sentido!

Aline fez Serena prometer que não contaria sobre seu caso com Luccas.

Mais tarde, Serena contou ao seu pai que cancelaria o casamento porquê viu Luccas fazendo sexo com outra mulher!

Brandon a aconselhou a não ser tola, dizendo que sexo e amor não era a mesma coisa ente um casal, o que logo aprenderia.

Serena tentou argumentar, mas finalmente resolveu calar-se, quando seu pai perdeu as estribeiras e contou a verdade.

Tudo tinha sido combinado com o senhor Maia e os dois ranchos seriam unidos pelo casamento.

Como filha única, era dever dela fazer o que ele mandasse.

Senão, ela cortaria os laços com ela, sem deixar nenhum centavo!

Foi nesse momento que ela viu quem realmente era o seu pai!

*

Joseph notou que Serena apertou os lábios carnudos, mas olhou para baixo sem esforçar para romper aquele longo silêncio.

Joseph não se surpreendeu por Serena não encontrar palavras, tendo em vista o que carregava na consciência.

Despreocupadamente, especulou qual seria a desculpa que ela usaria para justificar a insensível desatenção ao pai.

— Creio que você sabe que o Luccas morreu num acidente de carro alguns meses depois!

Joseph comentou.

— O pai de Luccas me enviou uma carta!

Serena confirmou. Ela lembrava da raiva no curto texto de uma linha, cuja mensagem principal era que a culpa da morte de Luccas era dela!

Luccas estava dirigindo rapidamente porquê Serena quebrara o seu coração e seu pai desejava que ela fosse para o inferno.

Os olhos de Joseph emitiam raiva. Serena sabia sobre o acidente de carro, o acidente que matara seu ex-noivo e a ex-namorada dele e ainda assim ela tinha coragem de encará-lo.

Céus, ela era insensível! Controlando a fúria ele disse:

— Deve ter sido um choque para você também, apesar de ter partido.

Joseph apertou o ombro de Serena, por um momento e ela pôde sentir a pressão dos dedos em seus ossos.

— Sim!

Serena murmurou.

— Desculpe. Perdoe-me por lembrá-la dessa dor!

Joseph respondeu.

Sentada, ela sentiu uma grande desvantagem, pois a marcante presença dele crescia diante dela.

Levantando o queixo, Serena olhou para o rosto dele.

Seria sinceridade o que aquele olhos azuis expressavam?

Não tinha certeza!

Por que ela sentia aquele desconforto, como se tivesse sido ofendida?

— Sim, bem, mas prefiro não falar sobre isso!

Serena desviou os olhos do olhar intenso dele, enquanto seus pensamentos giravam.

Ele deveria saber porque estava ali, então por que estava sendo tão gentil?

Talvez o casamento e algns filhos o tivessem amolecido!

Serena Davis, 25 anos

Joseph Lewis, 36 anos

Aquela conversa não estava seguindo os caminhos que Serena planejara.

Não estava ali para reviver o passado, mas para tentar garantir o futuro da mãe.

— Não vim aqui para falarmos do passado! Minha maior preocupação é o presente!

Serena explicou.

— Sim, claro, quanta tolice a minha achar que você precisasse de compaixão. Afinal, deixou Luccas esperando no altar!

Joseph se afastou, acrescentando:

— Por que se preocuparia com a morte de um ex-noivo, há alguns anos, se nem ficou preocupada com a recente morte do pai?

Serena ergueu a cabeça repentinamente, piscando os olhos de forma insolente, confirmando suas dúvidas sobre a sinceridade dele e notando que tudo aquilo não passava de vingança.

— Você não sabe nada da minha relação com o meu pai. Ou melhor, da falta de relação mas isso não é da sua conta!

Em uma das poucas vezes em que Serena conversou com seu pai, ele explicou como,havia alguns anos, quando sua irmã Lisa era uma estudante, ela se envolveu com um partido político de esquerda no Rio de Janeiro.

Depois de passar um tempo por conta de suas crenças, finalmente fugira para a Europa.

Lisa conheceu um italiano viúvo que tinha um filho pequeno de quatro anos, Joseph, e se casou com ele, jamais retornando.

Serena duvidava seriamente que Brandon entraria em contato com a irmã, caso não tivesse ela mesma tomado a iniciativa mais tarde, pedindo ao enteado já adulto que abordasse seu irmão em nome dela.

Brandon Davis era um homem manipulador e de coração frio, como Serena descobrira.

— De certa forma é da minha conta, pois sou o executor do testamento do seu pai.

Lembrou Joseph.

— E, evidentemente, sua preocupação óbvia é garantir os direitos da sua madrasta, Lisa, eu entendo!

Reagiu Serena.

— Mas eu não..

— Pode parar!

Interrompeu Joseph.

— Não tenho a menor intenção de discutir negócios com você de barriga vazia. Vamos almoçar e então conversaremos.

Serena não queria sair para almoçar com ele.

Na realidade, queria fugir daquela presença marcante o quanto antes.

Mas bastou olhar para o sorriso de determinação estampado naquele rosto atraente para saber que não teria escapatória.

Joseph Lewis não era homem de ser dispensado por ninguém, e se ela quisesse atingir seu objetivo, não poderia confrontá-lo.

-Uma refeição quente seria boa!

Concordou Serena.

"Boa" não seria a palavra que Joseph usaria, Serena virará uma linda mulher, mas, no momento, o tom róseo de sua face e a perplexidade de seus olhos brilhantes diziam tudo que ele precisava saber.

Serena era uma caçadora de fortuna, sem coração e sabia que o que era melhor para ela.

Joseph sorriu cinicamente, em contraste com o que transmitia seu olhar.

Devia ter alguma simpatia remanescente pela criança magrela de que se lembrara, mas a calorosa sensualidade da mulher diante dele não invocava simpatia, mas uma emoção mais básica.

Serena devia algo a ele pessoalmente.

Se o senhor Maia estivesse certo, ela era indiretamente culpada pela morte de Aline.

Havia muito tempo, é verdade, mas não era algo que Joseph conseguisse esquecer facilmente.

Joseph tinha o poder de garantir que ela não ganhasse um centavo e estava seriamente tentado a fazê-lo!

Mas era um homem de negócios matreiro e não tinha tempo nem intensão de passear pelo Rio de Janeiro.. pelo menos não mais que o necessário.

-Fico contente que tenha concordado e entendo sua preocupação com a herança de seu pai. Posso garantir que será recompensada!

Apertou o cotovelo de Serena com a mão forte, conduzindo-a para a porta.

-Mas não há pressa! Se você for aproveitar as vantagens da viagem que minha secretária organizou, não planejará ir para lugar algum na próxima semana! E é bom vê-la tão bem!

-Sim, bem..

Joseph estaria fazendo um elogio? Ou estava sendo sarcástico novamente? Olhando para ele, Serena acrescentou educadamente:

-Obrigada!

O que mais poderia dizer? Precisava de sua ajuda.

Os olhos claros e brilhantes de Joseph examinaram o lindo rosto dela.

Ele apertou a linha da mandíbula, ao notar a evasão dos olhos expressivos de Serena, exatamente como esperava!

Quando ele soube que Serena fugira do noivo e do pai, não se surpreendeu!

Para Joseph, ela parecia uma criança, quando ficou noiva, Serena era muito imatura para casar.

E quanto ao seu pai, Brandon, era difícil gostar dele.

O acidente de carro alguns meses depois do casamento cancelado fora apenas aquilo, um acidente!

Apesar de ter ficado arrasado, nunca pensou em culpar Serena.

O máximo que sentiu foi uma certa pena da moça.

Joseph sabia que o senhor Maia estava convencido de que Luccas dirigia de forma imprudente porquê estava arrasado pelo que Serena fizera.

Joseph acha que, se fosse necessário culpar alguém, este alguém seria Luccas, por deixar que as emoções se sobrepusessem ao bom senso.

Sua opinião começou a mudar quando Serena não entrou em contato com o pai, quando ele ligou para sugerir o reencontro.

Depois ele começou a pensar que talvez, aos 18 anos, Serena já não fosse mais a menina inocente que ele imaginava!

Mas como ela nunca respondera à sua segunda ligação, nem a terceira e tampouco aparecera no enterro do pai, Joseph se convencera daquilo e sua raiva se transformou num desejo de vingança!

Ao ver a mulher linda e sofisticada em que ela se transformara, o sentimento fora ainda reforçado e qualquer possibilidade de confiar nela fora logo apagada de seu pensamento.

Virando-se, Joseph pegou no braço dela novamente, transformando suas feições severas em uma máscara de simpatia.

-A morte de seu pai deve ter sifo desconcertante, apesar da relação de vocês não estar boa na época. O luto às vezes pode atacar as pessoas sem que elas esperem por isso!

Joseph disse, conduzindo-a para o elevador.

Joseph tinha razão! Na noite do enterro de seu pai, sozinha em casa, ela chorara pelo homem que dera vida a ela, lembrando apenas os bons momentos que passaram.

-Sim..

Serena murmurou.

Por um segundo, Joseph fitou aqueles olhos azuis brilhantes e ela de repente tomou a consciência da mão de Joseph em seu braço e do calor do corpo forte se estendendo até o seu, o intenso odor masculino provocandos suas narinas.