Depois de passar uma semana em Manhattan, a trabalho, volto para o Brasil. Como o clima pode mexer tanto com uma pessoa? Lá está frio e aqui no meu lindo Rio de Janeiro quente como um vulcão, mesmo sendo noite.

Pedi um carro por aplicativo já que não consegui falar com meu ilustre marido, Bernardo Ventura Góes, não atende minhas ligações e meu carro ficou em casa.

Estou casada com ele há um ano, mas não é o casamento dos sonhos. Nossos pais nos obrigaram a casar e ele não gostou nada disso! Bernardo foi bem sincero comigo no dia do nosso casamento quando disse;

— Eu não amo você, Milena! Só estamos casados porque amo meus pais e devo obediência a eles, mas não espere que eu seja presente nesse casamento contratual. Porque ele não vai passar disso... Apenas um contrato!

E toda essa fúria dele é apenas por um motivo... O sentimento que ele sente por Aline Beltran, atriz famosa aqui no Rio de Janeiro.

Mas não sou o tipo de pessoa que entrega os pontos tão facilmente. Decidi comprar um presente para comemorar o nosso primeiro ano de casados.

Assim que o carro por aplicativo chega o motorista abaixa o vidro e pergunta;

— Milena Amorim Góes, é você?

Ouvir meu nome com o sobrenome de Bernardo me faz tão bem... Olho para o motorista e digo:

— Sim, sou eu!

Entro no carro e a noite quente do Rio de Janeiro me acompanha do aeroporto Galeão até Ipanema, onde moro com Bernardo em uma cobertura perfeitamente linda.

Onde moramos é um apartamento por andar, gosto dessa privacidade. E a cobertura é nossa já que estamos no último apartamento, adoro ficar lá em cima de noite tomando minha taça de vinho e admirando o mar e essa praia maravilhosa.

Finalmente chegamos de frente para o edifício onde moro, o pagamento foi feito pelo aplicativo e logo saio do carro pegando minha única mala.

Ao sair do carro sinto o vento que vem do mar e me abraça. Olho para cima e vejo minha cobertura lá no alto e digo:

— Já irei matar a vontade que estou de tomar um vinho e olhar o mar daí! Só preciso de um banho.

Logo subo e ao chegar em meu apartamento está tudo estranhamente calmo e escuro o que me faz pensar:

— "Será que o Bernardo viajou e esqueceu de me avisar?"

Mas ignoro o meu pensamento e caminho para o quarto arrastando a minha única mala. Me surpreendo com a luz acesa e Bernardo sentado no sofá tomando seu conhaque envelhecido preferido.

Deixo a mala no closet e volto falando para ele:

— Pensei que não estivesse em casa, já que quase não fica aqui e quase sempre está viajando.

Ele termina sua bebida e enquanto coloca outra dose diz olhando sério para mim;

— Milena, precisamos conversar! E não dá para adiar mais.

Olho para Bernardo me sentindo um pouco irritada. Eu acabei de chegar de uma viagem que nem queria fazer, esse idiota não pergunta nem se deu tudo certo! Olho para o lado e digo:

— Bernardo, estou cansada e preciso de um banho! Você pode esperar pelo menos vinte minutos?

Mas Bernardo impaciente como sempre se levanta do sofá, pega alguns papéis que estavam na mesa e vem até mim enquanto diz;

— Você pode tomar seu banho depois que assinar isso!

Ele me entrega os papéis e vejo apenas as assinaturas dele marcadas em cada papel, não li o conteúdo do que está ali e pergunto:

— O que tem nesses papéis que seja tão importante para que eu não possa nem tomar um banho para depois assinar?

Ainda mais impaciente ele diz algo que faz os papéis caírem das minhas mãos direto ao chão;

— São os papéis do nosso divórcio! Preciso que assine o mais rápido possível!

Ainda com as mãos vazias olho nos olhos esverdeado de Bernardo sem acreditar no que está acontecendo. Os papéis estão no chão e ele frio, arrogante e instável como sempre.

— Pode pelo menos me dar um motivo para assinar isso?

— Não tenho que te dar satisfações, Milena! Apenas assine isso!

Até o dia de hoje juro que tentei ser a melhor esposa para esse homem a minha frente! Fui gentil, amorosa, cautelosa... Tem um presente para ele dentro da minha mala.

Eu escolhi esse presente com cautela, levei três dias para encontrar o presente perfeito para um ano de casamento. Mas o que ele me deu de presente sem dúvidas superou o presente que eu comprei para ele.

Dou uma risada sem humor e digo:

— Belo presente de casamento... Um pedido de divórcio! Confesso que você foi bem original, Bernardo.

Nesse momento ele se afasta um pouco e diz;

— Eu... Eu não sabia que era hoje. Mas não importa, não posso mudar o que disse apenas para lhe agradar! Sabe que não sou falso.

Eu olho para ele e pergunto:

— E você quer que eu agradeça?

Ficamos ali nos olhando como se fosse uma guerra e um de nós precisasse perder para sair vitorioso.

Estamos encarando um ao outro até que Bernardo fala para mim virando seu olhar para o outro lado;

— Milena, você melhor que ninguém sabe que esse casamento é fracasso! Não será um total estrago esse fim para algo que não devia ter acontecido!

Bernardo diz friamente para mim enquanto se serve de mais uma dose de seu conhaque. Ainda impaciente digo para ele:

— Você precisa ser mais claro comigo, Bernardo! Se quiser que eu assine esses papéis seja sincero!

Me abaixo para catar os papéis que estão no chão e ele se senta no sofá novamente. Escuto sua respiração ficar pesada enquanto ele diz;

— Aline... Está doente e precisa de mim! Seu problema médico é terminal e seu último desejo é se casar comigo! Sabe que tenho sentimentos por ela, vou realizar seu último desejo!

Ainda abaixada catando os papéis, congelo enquanto minha mão está prestes a pegar o último papel. Meu peito queima e meus olhos ardem.

Pego o último papel do chão me levanto e digo para Bernardo sem me virar para ele:

— Eu realmente preciso de um banho! Espere apenas vinte minutos e irei assinar esses papéis.

Ele até pensa em dizer algo, consigo sentir apenas ouvindo o som baixo que ele faz com a boca... Mas desiste e fica quieto.

Assim que entro no banheiro tranco a porta e me sento no vaso sanitário. Com uma mão em meu peito e outra em minha boca eu choro feito uma criança que precisa de colo.

Fico ali tentando não me sentir um lixo sem importância enquanto o homem pelo qual meu coração insiste em bater está esperando para que eu assinale sua liberdade de um casamento fracassado, como diz ele.

Vou tirando minhas roupas aos poucos enquanto choro em silêncio para que Bernardo não escute. Entro embaixo do chuveiro, mesmo não querendo molhar os cabelos peço para a água levar com ela tudo o que estou sentindo.

Não posso passar a noite aqui e não posso evitar o inevitável! Saio do banho e deixo minhas lágrimas misturadas com água descer pelo ralo do box. Me seco e visto um roupão, enrolo uma toalha em meus cabelos e saio do banheiro com meu rosto sem expressão.

— Seus olhos estão vermelhos! O que aconteceu?

Pergunta Bernardo e respondo enquanto pego minha caneta em minha bolsa para assinar os papéis:

— Deixei cair shampoo em meus olhos... Não é nada demais.

Me viro se costas para ele e enquanto assino os vários papéis, Bernardo diz se explicando;

— Espero que possa entender o motivo para o que estou fazendo! Quero realizar o último desejo de Aline e o meu também que é o de estar com ela!

Não respondo nada, apenas assino até a última folha e entrego em seguida os papéis para ele e digo:

— Agora é só aguardar os trâmites legais assim que você der a entrada. Outra coisa, me avise quando o fizer.

Ele pega rapidamente os papéis das minhas mãos e conferi bem na minha frente folha por folha. Me sinto insultada por ter que presenciar tal coisa como se eu fosse uma pessoa em quem ele não pode confiar.

— Terminou?

Pergunto irritada, já que ainda estou nua e preciso me vestir. Também quero ficar sozinha! Ele apenas me olha e sorri. Canalha, como pode sorrir depois de algo tão sórdido?

Bernardo sai e me deixa sozinha mais uma vez em um quarto que era para ser nosso. Ele dorme no quarto ao lado desde que nos casamos. Nunca tive o real prazer de ter uma vida de casal, a verdade é que não sei como é realmente estar casada.

Me visto e pego uma garrafa de vinho, pego uma taça e vou para o terraço. Me encosto no parapeito e coloco minha taça e garrafa no mesmo.

Enquanto derramo o vinho dentro da minha taça olho para o mar e me pergunto:

— "Será que ele vai querer ficar com o apartamento?"

Se for o caso terei que aproveitar bastante essa vista. Não tenho certeza ainda de onde iria morar, esse apartamento foi comprado para nós dois. Ingenuidade minha não pensar no dia de amanhã.

Mas amanhã começo a dar uma olhada nos apartamentos que tenha para vender por aqui. Não quero perder essa visão perfeita do mar e da praia.

Depois da garrafa e taça vazia decido ir para cama, mal consigo ver a hora já que estou embriagada. Assim que chego em meu quarto me jogo na cama sem nem ao mesmo tirar o que preciso para me cobrir.

Mas enquanto o sono começa a me abraçar sinto algo cobrir meu corpo. Bernardo? Não! Não seja tão ingênua, Milena! Por que ele seria gentil com você em um momento como esses?

Bernardo não me ama! Ele é incapaz de me amar! Caio cada vez mais profundo em meu sono e minha consciência se perde ali.

Acordo com um pouco de dor de cabeça e o estômago agitado, mas não foi isso que me despertou e sim o aroma perfeito de café da manhã que está invadindo meu quarto.

Antes de me levantar percebo que estou coberta, mas esse cobertor estava no closet. Será que acordei e fui até lá? Acho melhor não pensar nisso agora!

Vou até o banheiro e escovo meus dentes, em seguida lavei bem o meu rosto e passei hidratante. Eu até iria tomar um banho, mas preciso muito de um gole de café puro.

Vou até a sala de refeições e lá está uma mesa perfeitamente arrumada de café da manhã. Mas isso não é o que me surpreende! O que me surpreende é ver Bernardo arrumando a mesa com uma expressão gentil em seu rosto. Me aproximo e digo:

— Bom dia, Bernardo!

Ele me olha e diz como se fossemos um casal de verdade;

— Sente-se, irei servi-la essa manhã! Gostou da mesa?

O que está acontecendo com ele? Me pediu o divórcio ontem e hoje está me tratando como a esposa que ele queria? Olho para ele que puxa uma cadeira para que eu me sente.

Sem muita opção me sento e assim que ele me serve uma xícara de café sinto meu coração aquecer e aquilo me deixa emocionada então respondo para ele:

— Está perfeita! Você realmente caprichou!

Ele me serve um belo misto quente de queijo minas, ele sabe que é meu favorito. Em seguida uma xícara de café com leite, estou apreciando esse momento como se fosse uma obra de artes. Até que a intenção por trás desse ato vem para azedar o meu café.

— Milena, vou visitar a Aline no hospital... Preciso que vá comigo.

Paro de comer já que tem um nó em minha garganta que me impede de continuar comendo ou até mesmo respirar. Olho para ele enquanto solto o misto quente e minha xícara e digo:

— Por que eu faria algo assim? Não a conheço e nem quero!

Falo já me levantando da mesa de café da manhã perfeito que virou um desgosto. Mas Bernardo segura meu braço e diz com um sorriso no rosto tentando ser gentil;

— Não seja impetuosa, Milena! Sei que você é uma pessoa boa e não vai deixar algo tão mesquinho atrapalhar uma visita a uma pessoa que está no leito de um hospital por despeito!

Despeito!? Olho para a mão dele e depois para ele, o mesmo me solta e eu digo fríamente:

— Não sou uma pessoa mesquinha e pequena! Mas também não sou de ferro, Bernardo!

— Do que você está falando, Milena?

É como dizem por aí... O pior cego é o que não quer ver, o pior surdo é o que não quer ouvir e o pior mudo é aquele que prefere não falar. Tento respirar e manter a calma ao perguntar:

— Por que precisa de mim? Creio que seja algo que pode fazer sozinho!

Ele se afasta e diz descaradamente;

— Não... Posso! Como iria explicar aos meus Pais uma visita a sós com alguém que eles sabem que tenho um passado?

Ah, então é isso... Ele não quer decepcionar os pais. Mas pode tripudiar em mim. Serei obrigada a ver os dois sendo carinhosos um com o outro e agir como se fosse uma planta.

Cruzo os meus braços enfrente ao meu peito e digo com frieza e uma certa dificuldade:

— Tudo bem, Bernardo! Eu vou com você! Quando você quer sair?

Agora com um sorriso de verdade nos lábios ele diz enérgico;

— Podemos ir agora mesmo! Vou tirar meu carro!

Ele está agitado andando para lá e para cá e eu digo:

— Calma, Bernardo! Preciso de um banho! Me dê meia hora pelo menos.

Ele faz cara feia, mas se senta e cruza as pernas e quanto olha para o relógio caro em seu pulso. Eu ando calmamente até meu quarto, assim que entro vou para o meu closet e levo dez minutos para escolher o que vou usar.

Não vou deixar por menos se ele quer me obrigar a ir ver aquela mulher pode ter certeza que vou estar no salto com a minha melhor roupa e uma maquiagem maravilhosa para tampar minha tristeza.

Assim que termino meu banho caminho lentamente para o meu closet e lá faço a mágica acontecer sem pressa. Vestida com um look poderoso e com a maquiagem perfeita borrifo o meu melhor e mais caro perfume e passo pela fumaça perfumada.

Assim que abro a porta do meu quarto vejo Bernardo parado como se fosse bater em minha porta. Ele fica ali parado me olhando de baixo para cima e eu digo:

— Algum problema?

Ele engole em seco e tenta se afastar enquanto diz;

— Você demorou mais de meia hora... Pelo menos valeu a espera!

Enquanto fala isso ele sai andando e eu acabo dando uma risadinha involuntária. Saímos, mas eu não queria ir para onde estamos indo.