Sou Gabriel Nunes, atualmente com 25 anos, sou casado com a Nana, que tem 22 anos, nosso casamento foi feito no aniversário de 18 anos dela. No começo nossa casinha foi montada com coisas que ganhamos de parentes e amigos.
A mãe dela, a Tia Neuza, fez questão de nos dar uma geladeira, comprou em um bazar que fica no morro. Minha mãe, Dalva, deu o fogão também comparado no bazar do morro.
Como eu sou louco pela Nana, comecei a trabalhar cedo. Como eu disse no início tivemos tudo de segundo mão, doado por parentes, mas hoje temos tudo novo. Compramos um móvel de cada vez, um eletrodomésticos de cada vez e hoje temos a nossa pequena casinha dos sonhos.
Ela trabalha na comunidade mesmo, e eu trabalho no centro do RJ, meu trabalho no restaurante é cansativo. As vezes chego em casa mais tarde do que deveria, mas não posso reclamar.
A Nana trabalha dentro da comunidade, em uma creche, ela sonha em ser mãe. E agora vejo que está na hora de realizar esse sonho do meu amor, já estou juntando dinheiro faz uns 5 meses só para surpreende-la com boa parte do que precisa para montar um quarto de um Bebê.
Estou descendo o morro para ir trabalhar, como sempre faço. Ao fazer esse percusso todos os dias é difícil não falar com os caras do movimento, conheço alguns desde a escola.
Por exemplo o Bruno Silva, vulgo Nego, ele está nessa vida há dois anos. Começou como usuário e agora ele é um Soldado, tudo porque ele já serviu o exército e sabe usar uma arma muito bem!
O Joaquim, vulgo Batman, é um dos subgerente da boca. Entrou nessa vida depois que a irmã e a noiva dele foram levada pela facção inimiga... O corpo delas foi jogado no pé do morro. Elas estavam nuas e com marcas de agressão pelo corpo, além dos cabelos cortados.
O Antônio, Vulgo Falcão, virou vapor, cuida das vendas de drogas na boca. Esse aí só entrou porque queria luxo e riqueza.
Vou contar um pouco do que sei só de viver aqui; Os adolescentes que trabalham para traficantes de favelas cariocas recebem de R$ 100 a R$ 3.000 por semana e participam de uma estrutura hierárquica que lhes possibilita subir de cargo e aumentar seus vencimentos.
Os adolescentes começam no tráfico fazendo pequenos serviços, como enviar recados dos traficantes e comprar comida para eles.
À medida que vão ganhando a confiança dos chefes, passam a olheiros ou fogueteiros. Pessoas que alertam sobre a chegada da polícia.
A partir daí, vão subindo de posto, podendo chegar a gerente-geral, que recebe de R$ 2.000 a R$ 3.000 por semana.
Assim como ocorre em uma empresa, para ocupar um cargo no tráfico é necessário preencher alguns pré-requisitos. Para se tornar gerente da "coca" , pessoa que administra a venda da droga, é preciso ter exercido com sucesso a função de vapor. Quem vende a mercadoria na boca-de-fumo.
GERENTE GERAL - é o responsável pela administração da boca. GERENTE DO BRANCO - é o responsável pelo tráfico de "coca" no morro. GERENTE DO PRETO - é o responsável pelo tráfico de "erva" no morro. Os gerentes, tanto de cocaína quanto de maconha, têm normalmente mais de 18 anos
_A HIERARQUIA DO TRÁFICO_
DONO DO MORRO - É o cargo mais alto no morro. Ele é o dono da boca, e por isso o que recebe os lucros. No caso de morte ou prisão, seu cargo geralmente é ocupado pelo gerente geral. Não há idade mínima para ser "dono".
GERENTE GERAL - É o responsável pela administração da boca.
GERENTE DO BRANCO - É o responsável pelo tráfico de "coca" no morro.
GERENTE DO PRETO - É o responsável pelo tráfico de "erva" no morro. Os gerentes, tanto de cocaína quanto de maconha, têm normalmente mais de 18 anos.
RESPONSÁVEL PELAS ARMAS - Cuida do armamento do morro. É uma espécie de subgerente da boca.
SOLDADO - Usa armas pesadas, faz a segurança dos morros e participa das guerras. A preferência é para quem já serviu o exército (por que sabe manejar armas), mas há alguns soldados com 15 anos.
VAPOR - Cuida da venda das drogas dentro da boca.
AVIÃO - Vende drogas para as pessoas que vão comprá-las no morro. Geralmente são crianças de 7 a 12 anos.
VIGIA OU OLHEIRO - Fica vigiando a entrada do morro para ver se a polícia ou inimigos estão subindo. A preferência é para crianças e deficientes físicos.
FOGUETEIRO - Solta fogos avisando da chegada da polícia ou de inimigos. Pode ter qualquer idade.
E assim é formado tudo aqui no Morro do Amor. Mas voltando para a minha vida, comprei um presente para Nana e dentro da caixa tem também um par de sapatinhos de bebê na cor vermelha.
Estou ansioso pela volta para casa, principalmente por ser o dia que eu saio mais cedo. Estou na Van, voltando para casa enquanto o motorista escuta um samba... Quando ele muda de estação escuto uma notícia que as coisas no morro do Amor não estão indo bem.
E isso me preocupa, sempre que tem operação na comunidade fico no pé do morro até acabar. E como moro muito lá em cima o moto táxi não vai por causa da operação e tenho que subir a pé.
Quando finalmente chego no pé do Morro eu vejo que eu vou ter que esperar muito ainda, de onde estou eu só consigo ouvir o som da bala comendo.
E isso aqui já virou uma rotina, sempre que esse holocausto acaba sou obrigado a subir o morro e ver corpos pelo chão, eu não aguento mais isso. Sei que vivo aqui desde sempre, mas ver as pessoas perdendo a vida, porque nada aqui é planejado na hora de uma invasão da polícia.
Me deixa revoltado isso. Eu só quero poder viver a minha vida, com a minha esposa, dentro do meu lar em paz na minha casinha.
Sem me preocupar com a bala furando as paredes da minha casa por causa de um confronto com a polícia. Eu sempre falei para Nana; "Eu quero dar uma vida melhor para você!" E essa vida não é aqui.
Mas infelizmente eu não posso sair daqui agora, porque eu não tenho condições de manter uma vida fora do Morro. Aqui no centro do Rio de Janeiro tudo é muito caro, somente a vida nas comunidades, nos morros é mais em conta para quem trabalha como eu e como minha esposa.
Estou aqui há mais de meia hora, somente agora não escuto mais tiros. Acho que a polícia já deve ter ido embora por outro lado do Morro... Então eu preciso subir. As coisas estão calmas, vejo cartuchos pelo chão, ainda não vi ninguém. Até que um policial com sua arma apontada para mim diz;
— Abaixa! Abaixa! Abaixa! Coloca as mãos onde eu possa ver! Faz qualquer uma gracinha que eu atiro!
Eu me deito no chão com as mãos esticadas de cada lado da minha cabeça e respiro fundo. Essa Não é a primeira vez que eu sou parado pela polícia e não seria a última.
Mas é a primeira vez que me mandam deitar no chão, normalmente eles só me revistam mesmo e me liberam. Mas dessa vez tem alguma coisa errada e esse policial está muito agitado.
A realidade é que eu tenho medo que ele atire em mim, que acabe com a minha vida, isso não seria a primeira vez aqui na comunidade.
Eu já vi isso acontecer, eles atiram sem pensar se nós somos traficantes, quando na verdade somos apenas trabalhadores que estão voltando ou indo para o trabalho.
Eu não acho isso justo. Fico aqui deitado no chão, só que ele não me revista, o PM segura minhas duas mãos e algema. Isso para mim já está passando do estranho. Eu tento falar;
— Senhor, acho que prendeu a pessoa errada. Eu não fiz nada de errado, estou voltando do meu trabalho e...
Nesse momento eu levo um chute na cara eu apago ali.
Acordo em uma cela com mais de 12 homens, estou no chão sentindo uma forte dor em meu rosto. Um dos homens que nunca vi na minha vida diz;
— A bela adormecida acordou! Agora sai daí que é meu canto preferido! Acho bom tu fica tua novato, logo vai entender que obedecer faz bem para os ossos e o corpo.
Eu me levanto sem entender nada, vou até as grades e tento chamar alguém... Mas sou ignorado. Até que não sei exatamente quanto tempo depois sou levado até uma sala e me obrigam a me sentar.
Quando abro a boca para perguntar o que está acontecendo levo um soco na boca... Mas eu insisto e pergunto;
— O que eu estou fazendo aqui?
O Policial diz debochadamente;
— Me explica o por que tinham armas e drogas na sua mochila, "Chininha"? Aí você vai saber o porquê está aqui.
Olho para ele sem entender e pergunto;
— O senhor me chamou de quê? Está me confundindo! Não sou o chininha e na minha mochila tinha apenas meu uniforme de garçom! Lá também tinha meus documentos. Sou Gabriel Nunes, tenho 25 anos e trabalho no restaurante...
Ele me interrompe e diz de forma arrogante;
— Você não precisa mais fingir. E logo estará sendo levado para onde merece! Fique aí, logo alguém vira falar com você.
Em casa a esposa de Gabizin está preocupada, ela sabe que já era para o marido está em casa e então vai até o portão para ver se ele está vindo. Ela olha para a descida e diz;
— Droga! Não vejo ninguém! Onde está o Gabriel? Ele não é o tipo que não vem para casa sem avisar.
Ela está nervosa e distraída, olhando para a direção da rua em que seu marido deveria está vindo até que Nego a surpreende dizendo;
— Está fazendo o que na rua Nana? Mete o pé pra dentro da sua casa! Tu não perdeu nada na rua!
Nana apreensiva diz para Nego;
— Nego, Gabizin não chegou em casa ainda! Tu sabe que ele não faz esse tipo de coisa... E hoje teve operação no morro. Eu só quero encontrar ele!
Enquanto um dos meninos com radinho está passando Nego está vendo o quanto Nana está nervosa e diz para o menino;
— Ei, menor passa a visão manda esse rádio pra cá! Passo um rádio pro Falcão e pergunto; Aê Falcão, passa visão, tu viu Gabizin aí? O moleque não chegou em casa ainda.
E Falcão diz para Nego;
— Mano, o cria bateu aqui não... Mas vou dar um perdido aqui e se eu encontrar ele te passo a visão mano, já é?
Sem uma boa notícia para dar a Nana, Nego diz para Falcão e depois para Nana;
— Fechou irmão! De boa Nana, daqui a pouco o Gabizin brota aqui vou dar um rolê e volto aqui. Já é?
Ela preocupada diz;
— Eu vou ficar a sua espera, por favor, não esquece! Eu entro, mas fico na varanda. Não consigo tirar os olhos do portão.
Nana anda nervosa para lá e para cá até que Nego volta e com um olhar preocupado diz para ela;
— Nana, a parada é o seguinte... Os verme levou ele. Parece que confundiram ele com o Chininha. Mas vamos passar um fio para uns parceiros que estão no lugar para onde levaram ele.
Nana trêmula e nervosa, com seus olhos cheios de lágrimas diz;
— Quem levou o Gabriel? A merda da Polícia levou o meu marido? Eu não vou permitir que ele fique preso! Vou correr atrás dos nossos direitos!
Nana tenta se acalmar para pensar melhor no que fazer e pergunta para Nego;
— Nego, um dos menor pode me deixar próximo a delegacia? Não precisam me deixar na porta, só uns metros antes.
Nego solicito diz para o Menor;
— Menor, leva a mina do Gabizin onde ela pediu e toma cuidado, vigia menor.
Ela agradecida fala para Nego;
— Obrigada, Nego.
Nana entra rapidamente em casa e troca de roupa, pega seus documentos e as xerox dos documentos do Gabriel e volta para a varanda correndo olhando em volta para ver se o menino já está a sua espera e nada.
Nana começa a ficar nervosa até que escuta o barulho da moto, corre para o portão e quando vê quem está na moto se preocupa e diz;
— Falcão, você sabe que não pode sair do morro! Por que está nessa moto? Quer ir preso?
Falcão preocupado com o amigo diz para Nana;
— O cria é meu mano! Parceiro! Quando precisei me ajudou, vou levar você e vou trazer. Dou meu jeito pra sumir das vistas dos verme, mas vou te levar lá! Sobe logo!
Apreensiva e mais nervosa ainda Nana sobe na moto e segue pelas vielas até sair do morro. O Falcão a deixou há uns 8 minutos andando da delegacia e se escondeu em um lugar que não conseguiriam vê-lo.
Nana esta muito nervosa e estressada ela acha que sua menstruação desceu. Ao chegar na recepção e por ser quase 1 hora da manhã a mulher da recepção não a trata muito bem.
Até Nana começa a gritar e fazer um escândalo e um policial vem falar com ela e diz;
— Senhora, se continuar fazendo esse barraco vai acabar detida! Respeite o ambiente em que está agora!
E Nana irritada diz;
— Ao invés de vir me dizer o que posso ou não fazer, me pergunte porque eu fiz! Ai, sim você estará sendo profissional e cumprindo com o seu dever! Eu quero saber onde está o meu marido e o motivo por ele estar aqui!
O policial impaciente bufa e diz para Nana;
— Me entregue algum documento que vou verificar! Mas acho melhor baixar sua bola.
Nana entrega a xerox autenticada da identidade do Gabriel para o policial, não demora muito ele volta com um sorriso sórdido nos lábios e diz para Nana;
— Seu amigo vai ser transferido para a penitenciária em Bangu amanhã pela manhã. Sinto muito...
O policial sórdido fala com um sorriso nos lábios e Nana indignada diz;
— Espera um minuto, por que? Meu marido é trabalhador, não se envolve com nada de errado! Somos pessoas de bem! Eu quero ver meu marido!
Nana se exalta e volta a gritar, mas o policial tripudia e diz;
— Pessoas de bem? A senhora trata a recepção da delegacia como a sala de sua casa, e seu... Marido, estava com uma mochila recheada com drogas, dinheiro e armas! Diz para mim; Onde a senhora vê pessoas de bem aqui?
Nana se sente pequena e sozinha, mas enfrenta tudo de frente sem abaixar a cabeça e diz para o policial;
— Isso é mentira! O Gabriel trabalha em um restaurante em Ipanema! Ele nunca se envolveu com o movimento do morro! Como podem prender uma pessoa assim? Vocês não podem transferir ele assim! Sei que temos direito a um advogado, ele não teve direito nem a uma ligação para a família e tenho certeza que ele ligaria para mim!
Ainda debochando de Nana o Policial insiste ao dizer;
— Ele foi pego com uma enorme quantidade de dinheiro e produtos ilícitos, fora a arma de fogo com numeração raspada! Pode até contratar um advogado, mas as coisas não estão boas para o seu marido!
O Policial a deixa ali de pé e sai e Nana fala sozinha;
— O que eu vou fazer? Eles não vão me deixar vê-lo agora! Eu não sei como vou pagar um advogado! Terei que fazer uma reunião de família! Mas não sei quantos vão acreditar em nós, principalmente depois que reformamos nossa casinha e trocamos os móveis. Mas ninguém viu que levamos 2 anos para fazer isso! Mas a língua dos moradores do morro é enorme!
Nana respira fundo mais uma vez e diz;
— Não importa! Vou dar um jeito! Tenho certeza que a mochila verdadeira do Gabriel está aqui com eles, mas não sei se vão me entregar.
Nana volta para o lugar onde deixou o Falcão e ele pergunta;
— Qual foi o proceder, Nana? Manda o papo, o cria vai para casa quando amanhecer?
Nana olha para Falcão com lágrimas nos olhos e diz;
— Não...
E começa a chorar e Falcão a abraça.
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