Sou único, não vi outros como eu por aí. Confesso que aqui é calmo e tranquilo, apesar de ser escuro e frio. Acabei me acostumando com esse espaço de imensidão escura.
Estou eu aqui em mais um momento em que não faço nada, apenas existo, até que um clarão devastador invadiu meu silencioso, calmo e escuro mundo.
Escuto uma voz que mais parece um eco ensurdecedor e digo;
— Você poderia abaixar o volume de seus pensamentos? Não consigo te ouvir do jeito que está gritando!
De repente o som ensurdecedor vira uma voz suave e calma que diz;
— Você ainda não me conhece, mas te observo a milênios. Criarei algo novo em breve e gostaria de sua ajuda para cuidar de algumas situações.
Eu me viro de costas pois a claridade está me machucando e digo;
— Poderia diminuir essa Luz? Está me fazendo mal!
Aquele "Ser" dá uma risada estrondosa e diz para mim;
— Para o que eu preciso que me ajude terá que lidar com a luz em alguns momentos!
Eu olho para ele e dessa vez, apesar da dor sou eu que dou risadas e digo;
— Não sei quem é você, muito menos de onde veio... Chegou aqui pensando que vou aceitar qualquer coisa que acha que devo fazer? Pode voltar para onde veio!
Ele não desiste fácil e continua tentando me convencer a fazer o que ele quer dizendo;
— Te darei a oportunidade de não ser mais tão solitário e poderá usar seus dons para punir o mal ou acabar com a angústia dos que precisam partir para ter outra chance de existência.
Ele é bom com as palavras. Mas ainda não entendi o que ele quer comigo e digo;
— Seja claro ou nada feito!
Então, pela primeira vez ele diz o que quero saber claramente;
— Pode me chamar de Deus, sei que você tem dons especiais. Eu consigo ver isso em você, esse seu dom vai me ajudar com minha nova criação e você não precisará mais viver aqui sozinho. Resumindo, eu darei a vida e no tempo exato você irá tirar.
Olho para Deus pensativo; "Não seria tão ruim fazer algo além de ficar aqui sem fazer nada." Dou a resposta para ele;
— Aceito! Mas você não poderá interferir em meu trabalho! Eu decidirei se devo ou não tirar a existência de alguém e você faz o seu trabalho.
Ele em sua essência de luz agora não tão intensa diz para mim;
— Concordo! Em alguns segundos você vai deixar de existir aqui e vai para o lugar que irá chamar de lar. Aconselho você a ter seus subordinados, dê nomes a eles... Até, Death!
Assim como apareceu ele some, poucos segundos depois sou jogado em um lugar que não conheço. Olho para cima e tudo lá é escuro porém vejo pontos brilhantes.
Estou em contato com algo que desconheço. Logo vejo algo cair do alto como uma bola de luz aterrizando em minha frente e ele se apresenta a mim como Lúcifer e diz;
— Olá, sou Lúcifer, um Arcanjo, filho de Deus. Estou aqui para te ajudar a entender tudo a sua volta e te entregar isso.
Ele me entrega um pano preto longo e diz;
— Esse manto vai ajudar para que você não mate nada a sua volta como está fazendo agora com a grama em que está sentado e nu.
Me levanto rapidamente e visto o tal manto e ele me dá um par de botas também, é como ele chama o tal artefato. Coloco em meus pés.
Lúcifer me explica tudo o que preciso saber sobre meu novo "corpo" já que eu não o tinha antes. Também me diz que os "humanos" não podem me ver e eu pergunto;
— O que isso quer dizer... Humanos?
E ele solta um suspiro entediado e diz sem vontade alguma;
— São os novos brinquedos do Papai. Ele vive fazendo isso, mas nunca dá certo. Eles sempre o decepciona. Não é a primeira vez que ele faz algo do tipo.
Escuto atentamente o que Lúcifer diz e depois pergunto;
— Então, ele já fez algo parecido antes?
Mas uma vez Lúcifer responde entediado;
— Não exatamente! A diferença dessa vez é que ele colocou você para o trabalho sujo! Bem vindo ao meu mundo!
Fico ali em um lugar cheio de árvores e grama, tudo isso foi dito por Lúcifer. Ele me contou tudo o que eu preciso saber desse novo mundo e eu até que gostei.
Conversamos por um bom tempo até que algo claro surge no horizonte e ele me diz que se chama sol. Descobri mais coisas sobre os humanos, animais e plantas.
Fiz uma amizade com Lúcifer e ele me apresentou um lugar chamado purgatório, onde a luz do sol não iria me incomodar e quando a noite caísse poderia explorar o mundo.
Acabei tendo alguns acidentes pelo caminho já que meu toque ou beijo tirava a vida de tudo a minha volta.
Logo pedi a Lúcifer que arrumasse para mim algo para as mãos. Sei que não será fácil, mas aqui é mil vezes melhor que o lugar em que eu vivia. Não quero sair daqui, mas terei que continuar?
Minha Existência ganhou um certo sentido depois que vim para esse novo mundo... A Terra. Estou aqui há dois séculos e cumpro meu trabalho a rigor!
Me lembro da primeira pessoa que levei... Era uma senhora que sofria mais tratos dos filhos. As pessoas normais não podiam e não podem me ver, mas sempre que eu ia até a cama dela a ouvia sussurrar;
— Estou pronta... Leve-me!
E esticava a sua mão até mim juntando as suas últimas forças. Mas "Luz" me dizia que não estava na hora e eu era obrigado a vê-la agonizar. A princípio não entendi até que chegou o dia e entendi o propósito dele. No fatídico dia todos os filhos estavam no quarto.
Luz decidiu que a punição para eles seria ver a pessoa que os trouxe a esse mundo partir por terem feito ela sofrer tanto! Achei poético e justo. Não o questionei mais depois disso.
Existo por aí e somente quem está prestes a vir comigo consegue me ver... Fiquei realmente curioso com a tal senhora. Com o passar dos anos fui montando minha legião de ceifeiros.
Fui descobrindo quem sou e o que posso fazer e assim como "Luz" tem sua legião de anjos, eu tenho a minha de ceifeiros. Meus ceifeiros seguem minhas ordens e quando descubro que algum deles estão fazendo algo que não deve deixa de existir.
É um pouco melancólico a forma como existo, vivo por aí durante a noite e durante o dia vou para o purgatório e fico andando por lá. Almas atormentadas por seu fim antecipado vivem lá em agonia e desespero.
Converso com elas que fazem sempre as mesmas perguntas irritante que são;
— Por que eu?
— Você não podia fazer isso comigo?
— Você está feliz por me tirar da minha família?
Tento explicar para eles que se eu não tivesse feito o que fiz que viveriam com dor até o próprio corpo colapsar e se desfazer. Mas ainda assim me culpam por seus fins trágicos.
Aqui tem homens, mulheres, adolescentes, crianças... Bebês. Sabe quando uma mulher perder um bebê em seu ventre? Esse bebê vem parar aqui.
Eu entrego ele para Luz, e assim tem a chance de ter uma existência melhor. Não acho justo seres tão puros virem para esse lugar. E também porque as almas atormentadas tendem a comer esses pequenos.
Se passou mais um século, eu encontrei alguns contra tempos pelo caminho. Por exemplo, Miguel, gêmeo de Lúcifer que agora foi banido do céu, está pegando no meu pé.
Parece que ele se sente o "gerente" e quer me dar ordens! Sendo que o Combinado entre Luz e o meu ser é um não se envolver no que o outro faz. Mas de repente parece que Luz resolveu tirar férias e deixou o idiota no lugar.
Foi como Lúcifer me disse que seria, Luz ficou entediado e decepcionado já que nada saiu como ele queria e deixou tudo aqui de lado. E agora tenho que lidar com seu filho mais mimado.
— Miguel, eu já lhe disse que sua presença não é bem vinda aqui! E não vou ouvir ou fazer qualquer coisa que você disser ou me mandar fazer.
Ele se irrita e abre suas enormes asas douradas criando vento e desordem onde estou ao dizer;
— Quem você pensa que é para falar assim comigo? Como você ousa? Você está aqui para cumprir ordens como um mero serviçal!
Eu me levanto e abro minhas enormes asas negras como a noite levanto o meu queixo e falo;
— Lúcifer tinha razão! Você quem deveria estar no inferno e não ele! Aqui em meu território você não é ninguém! Recolha suas asas e saia dos meus domínios ou sairá daqui sem suas preciosas asas!
Ele falta pouco enfiar sua enorme lança em mim. Não demora muito o vejo sair, mas não por onde deveria e decido segui-lo. Vejo ele parar em uma estrada e tem uma chuva fina caindo.
Logo vejo um carro vindo ao longe. Tem uma família dentro do carro, consigo ver ao longe que são dois adultos e uma linda menininha. Quando o carro se aproxima vejo Miguel abrir suas enormes asas e digo;
— Não faça isso!
Ele apenas sorri e assim que o carro se aproxima dele seu bater de asas joga o carro contra uma árvore não dando chance do motorista fazer nada além olhar para sua esposa e filha.
Ao tentar ajuda-los acabo tocando nos dois adultos. Suas almas se levantam e ao perceber o que aconteceu imploram para que eu não leve a pequena menina.
Eu olho para a menina e sinto algo dentro de mim, não sei dizer o que é isso. Chamo dois ceifeiros que levam as almas embora e eu me sento no chão enquanto olho para a pequena menina... E Miguel começa a falar;
— Está vendo como é fácil? Eu mando e você simplesmente obedece! É para isso que você está aqui!
Com ódio e ira ainda olhando para criança agonizando digo;
— Por que quer matá-los? O que eles fizeram para você? O seu trabalho é protegê-los, não matá-los!
Ele dá uma gargalhada perversa e diz com ironia;
— Mas é o que eu estou fazendo! Você não está vendo?
Com outro bater forte de asas ele desaparece, mas sua gargalhada ecoa por todo o lugar.
Estou aqui com a menina, cada balançada que seu pequeno corpo de 6 anos da meu ser entra em um misto de angústia e desespero. Meu "toque" quer ela e está difícil segurar minha mão.
Tem sangue em seu rosto e mal o vejo, mas quero que alguém venha em seu socorro. Sei que ela sente minha presença já que sua pequena mão está em minha direção, mas não vou fazer isso com ela!
Finalmente uma ambulância passa e com todo cuidado a retiram das ferragens do carro. Os Pais dela foram em outro veículo que seus corpos estavam "vazios". Não resisti e acompanhei a ambulância ate o hospital.
Sei que a minha presença muito próxima iria induzir a alma da menina a mim. Mas precisava saber que tudo iria ficar bem então dei uma. está distância e acompanhei tudo.
Depois de passar por duas cirurgias na cabeça a pequena menina ficou estável. Sai daquele hospital querendo fazer churrasco de Arcanjo, fui direto ao inferno falar com Lúcifer que ao me ver diz ironizando;
— Quer atear fogo em quem? Seus olhos parecem chamas vivas prestes a torrar tudo a sua volta!
Irritado ainda e com muito ódio falo para ele;
— Aquela sua copia mal feita quis me dar ordens hoje! Como Luz decidiu tirar férias e deixou aquele arrogante narcisista no lugar e agora ele pensa que pode mandar em mim!
Lúcifer da uma de suas famosas gargalhadas e diz;
— Eu sempre disse que quem deveria ter sido expulso era aquela imitação de bom menino! Mas quem foi expulso do Paraíso e jogado no inferno? Esse que vos fala!
Tento manter a calma e conto para ele o que aconteceu, mas ele não se surpreende e diz;
— Meu Pai tem uma péssima mania de fazer birra quando algo que ele cria não sai como ele imaginou e com isso se tranca no Jardim do Éden... Onde tudo começou e deu errado também.
Eu escuto Lúcifer falar sobre o Jardim do Éden... É um lugar que Luz nunca permitiu a presença de ninguém além dele e seus preferidos, Adão e Eva. Olho para Lúcifer e digo;
— Podemos encontrar o Éden e falar com ele sobre tudo que Miguel está fazendo!
Lúcifer da outra risada ao dizer debochada mente;
— Querido, Death, você acha mesmo que o Papai iria deixar sua localização tão evidente assim? O Jardim do Éden pode estar até aqui no inferno nesse momento que só iremos descobrir se assim ele quiser! Não se esgote atoa!
Se for do jeito que Lúcifer está falando como vou fazer para parar Miguel? Ele vai continuar tentando me obrigar a matar seres humanos ao seu Bel prazer!
— Death? Ele olha para mim e eu digo; Se quiser ajuda para derrubar meu gêmeo menos bonito te entregarei 100 dos meus melhores demônios para sabotar as armadilhas de Miguel. Mas precisará ter olhos em todos os lugares!
Suspiro aliviado ao dizer;
— Isso para mim não é problema! Esqueceu que tenho uma legião de ceifeiros? Tenho pares de olhos para todos os lados!
Sentamos e começamos a criar um mapa onde os demônios dele irão se posicionar junto aos meus ceifeiros e também decidiu me fornecer mais demônios.
Estamos no final de nossa reunião até que Lúcifer confessa algo que me deixa perplexo;
— Um belo dia meu grande e poderoso Papai, percebeu que não era justo que seu filho vivesse aqui sozinho... Como ele sabia que outro ser celestial não suportaria a minha essência me permitiu criar minha parceira ideal... Lilith.
Ele ficou melancólico agora, sinto que é um assunto delicado para ele, mas o mesmo continua dizendo;
— Ela era incrível, a criei submissa a mim. Mas ela era perigosa para os outros. Junto a ela eu criei também a minha cadela, mas nada dura o suficiente para fazer o Lúcifer aqui feliz.
Olho para ele e sei que vai me dizer o que aconteceu, mas ainda assim eu pergunto;
— Lúcifer, o que aconteceu com elas?
Ele da uma risada sem humor e vazia ao dizer;
— Meu querido irmão gêmeo disse para o nosso Pai que as duas eram uma enorme ameaça a vida humana e com minha distração por estar resolvendo outro problema no inferno... Miguel as matou enquanto ambas brincavam em um campo aqui perto.
Ao ouvir a história de Lúcifer percebo que realmente quem deveria estar aqui, preso não é ele, mas sim Miguel! Olho para Lúcifer e digo;
— Já que Luz não está no comando que tal trocar de lugar com Miguel? Que tal nós dois colocarmos ele aqui no inferno e você volta para o céu?
Ele me olha animado e diz;
— Acho que o meu Pai não iria gostar e talvez castigue nós dois... Mas eu topo! Porém não consigo sair daqui, acredite, já tentei várias vezes!
Dessa vez sou eu que dou risadas e digo;
— Sabe que posso varrer esse mundo inteiro em 7 dias, né? E se eu não encontrar uma resposta aqui vou varrer o universo! Mas eu vou te tirar daqui!
Apertamos a mão um do outro, as luvas que ele me deu são realmente boas. Mesmo que eu não sinta a textura de nada pelo menos não mato ninguém sem querer.
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