A vida é bem sacana, na maioria das vezes.
Não me levem a mal, eu não sou uma dessas mulheres amarguradas com a vida, na verdade, sou bem grata a tudo o que passei para chegar até aqui, mas convenhamos, a vida não é nada gentil, e não liga nem um pouco para o seu planejamento. Você pode acreditar que tem o controle sobre o seu destino, mas não, não mesmo.
A minha vida fora planejada desde o momento em que decidi me aventurar em outro país, eu julguei que seria uma jornada tranquila, sem muitos percalços, eu estava tão enganada. Não posso dizer que todas as minhas experiências foram ruins durante o meu intercâmbio, pois não foram, mas, a forma como as coisas se desenrolaram mudaram a minha vida por completo, a forma como o meu coração foi quebrado e a minha confiança foi minada fizeram com que eu me tornasse outra mulher, uma mulher mais madura, mais centrada e principalmente mais triste e desconfiada.
Acho melhor que eu comece do início, e relembre o tempo em que eu era simplesmente uma garota com muitos sonhos vivendo no Brasil, idealizando a vida perfeita nos Estados Unidos sendo Aupair de uma família que me adotaria como filha e faria com que os meus dias fossem incríveis e memoráveis. Olhando para trás posso me alegrar de ter conseguido encontrar uma Família tão amável quanto os Max's, tudo o que fizeram por mim me fez ser uma pessoa melhor e mais adulta.
Se eu tivesse seguido o meu planejamento inicial, eu teria passado por esse intercâmbio ilesa e só teria memórias boas desse período, mas como eu já disse, a vida não tá nem aí para o seu planejamento. Quando tudo parecia perfeito e estável, ele apareceu e mudou tudo.
Antes de falar dele, eu gostaria de falar de mim, gostaria que me conhecessem melhor, pois com o desenrolar dessa história vocês podem se questionar sobre a minha capacidade de percepção, sobre a minha ingenuidade, vocês se perguntarão: "-Como ela pode não perceber que ele está a enganando?!", "- Ela vai mesmo abandonar o seu maior sonho pra se casar e criar filhos, coisas que ela sempre deixou claro que não eram pra ela?!". Sim, eu também tive raiva de mim em vários momentos dessa história, mas só agora eu consigo visualizar onde estava o meu erro, eu me apaixonei, e se apaixonar é o maior erro que alguém pode cometer após conhecer um cara lindo e gostoso, que nitidamente não é pra você.
O meu nome é Anne, e eu nasci no interior de Minas Gerais, uma cidade bem pacata e tranquila, tudo o que eu não sou. Sempre fui uma garota bem resolvida em relação a tudo na minha vida, sou determinada e não meço esforços para conquistar os meus objetivos, a minha família sempre foi presente em todos os momentos e a nossa relação não podia ser melhor, a minha mãe sempre me apoiou em tudo o que pode, e o meu pai nunca perdeu a oportunidade de declarar a sua admiração e crença no meu potencial. Toda essa atenção e apoio me impulsionaram a sonhar alto e me esforçar ao máximo a realizá-los.
Quando eu era criança eu já pensava em ser alguém importante na vida, olhava ao redor e não conseguia entender como as pessoas se contentavam com o interior e o pouco que ele tinha a oferecer. Foi esse sentimento de não pertencimento que me impulsionou a embarcar num Intercâmbio de Au Pair, com esse intercâmbio eu poderia viajar para outro país, morar por um ano com uma família anfitriã, com as despesas básicas pagas e mais um salário semanal de 195 dólares, em troca eu teria somente que cuidar das crianças da família. Eu nunca tive receio em relação a mudanças, pelo contrário, sempre gostei de aventurar-me e vivenciar coisas novas, quando eu encontrei a Família perfeita para o meu intercâmbio eu embarquei sem medo de ser feliz e não me arrependo disso.
No primeiro fim de semana de agosto eu entrei em um avião com destino a Nova York, a despedida da minha família teve a carga dramática esperada, era a primeira vez em que ficaríamos tanto tempo longe, e para uma garota que nunca saiu do interior por mais que uma semana, um ano no exterior poderia ser assustador.
O voô foi incrivelmente tranquilo, o que contrastou bastante com o caos emocional em que eu me encontrava no pouso, finalmente a ficha tinha caído e eu comecei a entender que eu estava muito longe de casa e sem conhecer absolutamente ninguém. Todos os questionamentos que evitei fazer durante todo esse processo, vieram com tudo no momento em que pisei no Aeroporto LaGuardia, Será que a família gostaria de mim, assim que me conhecessem? E se não gostassem, como eu iria embora dali? E se eu não gostasse deles também, até porque eles vivem uma realidade muito diferente da minha.
Fui tirada do meu devaneio ao avistar uma placa com os seguintes dizeres: "Bem Vinda a Família Ann, estávamos contando os segundos para te conhecer", a placa era segurada por uma menina linda e loira, que tinha 14 anos de idade e um sorriso muito doce. Sam seria minha irmã caçula pelo próximo ano, e pelo o que pude conhecer dela durante o processo de entrevistas para o intercâmbio, eu não tive dúvidas que nos daríamos muito bem. A Sra Grace Max era extremamente elegante e bonita, e ainda assim não exalava um ar esnobe ou arrogante como a maioria das mulheres em sua posição, ela era doce e gentil, acolhedora e carinhosa. Eliot Max era um homem muito distinto, sério, mas caloroso, a sua postura transparecia a satisfação que sentia com a minha chegada e passava toda a segurança que eu precisava para me sentir parte daquela família.
O trajeto de carro até a casa dos Max's é um dos momentos mais memoráveis de toda a minha vida, o misto de emoções que eu sentia por estar naquele país, vendo pela primeira vez aquelas ruas movimentadas de Nova York, e todos os seus pontos turísticos, a sensação de liberdade e pertencimento me atingiram de uma só vez, finalmente após anos eu me sentia no meu lugar, e todas as possibilidades estavam a minha frente. Durante toda a viagem que durou 20 minutos, Sam me mostrou pela janela do carro todos os seus lugares favoritos e prometeu me levar em cada um deles, Grace fez questão de perguntar se eu gostaria de passar em algum lugar para comprar algo que precisasse, aquele trajeto foi tão natural e caloroso que me fez esquecer por um minuto a real situação.
Eliot estacionou o carro em uma garagem amplo que possuía mais 2 carros Suv estacionados, eu já sabia do padrão de vida abastado da família Max, mas não podia visualizar na minha mente a grandeza daquele lugar, a casa era enorme, devia ter no mínimo 7 quartos, incontáveis banheiros, piscina, sauna, sala de jantar espaçosa e aconchegante, eu gastaria um dia inteiro para conhecer tudo, Grace me direcionou para a porta da sala de estar, e mais uma vez eu fui arrastada para a luxuosa vida deles, o cômodo era impecável tanto na limpeza quanto na decoração, mas o que mais me chamou atenção foi um lindo piano que estava no centro da sala, próximo a uma lareira que dominava toda a parede, Grace entrou do que eu julguei ser uma cozinha, e eu fiquei me perguntando se alguém na família tocava aquele piano, desde pequena sempre fui apaixonada por música, ouvir alguém tocando qualquer instrumento ou cantando era algo que me deixava sempre muito animada.
Estava embasbacada com o ambiente quando uma voz me trouxe para a realidade.
- Você deve ser a nova babá.
Me virei e meus olhos pararam em cima de um Homem que mais parecia saído de um catálogo de cuecas, alto, loiro, olhos azuis que mais pareciam cinza, a pele clara e iluminada que contrastava muito bem com seus lábios vermelhos e volumosos, ele devia ter 1,92 de altura, no mínimo, e vestia uma camisa preta do Pearl Jam, o que fazia com que seus músculos ficassem em evidência sob o tecido fino.
Eu passei os meus olhos por toda a extensão do seu corpo, acredito que encarei o seu rosto por tempo demais, quando consegui me recompor resolvi me apresentar.
—Oi, meu eu sou a Anne a Nova AuPair, você deve ser o Bennett, é um prazer finalmente conhecê-lo.
Ofereci a minha mão para um cumprimento e o meu melhor sorriso, que foi simplesmente ignorado.
— Não me importa qual seja o seu nome, eu não tenho interesse em saber da vida de ninguém que trabalhe nessa casa, e dirija se a mim como senhor Max em ocasiões futuras.
Ao dizer essas palavras ele simplesmente se virou e me deixou na sala digerindo e processando toda a situação. Ainda estava me recuperando do ocorrido quando Grace voltou da cozinha com uma bandeja nas mãos, ela me levou até a mesa de jantar
e me fez sentar em uma cadeira, colando a bandeja com diversos tipos de comidas, enquanto eu comia a Grace me contava sobre todos os programas que poderíamos fazer juntas durante a minha estadia ali, me contava da felicidade que sentia em receber uma intercambista em sua casa e o quanto valorizava essa troca cultural que teríamos nesse período, em tudo que ela dizia eu sentia aconchego e sinceridade, todo o estranhamento que senti no avião tinha se dissipado.
Quando terminei de me alimentar, seguimos para o meu quarto, um espaço amplo e muito bem decorado, como o restante da casa toda. O quarto possuía um banheiro igualmente incrível e arejado, o quarto era pintado em um tom de azul lindo e sereno, muito similar a cor dos olhos de Bennett, então me veio a mente que em nenhum momento o Bennett havia sido citado desde a minha chegada, e nem mesmo Grace cogitou me apresentar a ele, isso só aumentou a minha curiosidade em relação a ele.
- Grace, eu conheci o Bennett na sala, quando cheguei.
- E como foi? Ele foi gentil com você? Eu devia tê-la avisado sobre a presença dele hoje. O meu filho é um rapaz maravilhoso, muito educado, gentil, carinhoso, mas ultimamente ele tem estado diferente, algumas coisas aconteceram nos últimos meses e ele fechou-se muito para todos ao seu redor. Espero que não se assuste com o comportamento dele, prometo que ele não lhe incomodará.
Eu assenti com a cabeça e tranquilizei a Grace sobre o nosso encontro.
- Não se preocupe Grace, não houve nenhum incômodo entre nós, ele não parece estar extremamente feliz com a minha chegada, mas isso não será um problema.
Interrompo a minha frase no meio ao bocejar demoradamente, não tinha percebido o quão cansada eu estava e o quanto eu precisava descansar. A Grace também notou o meu cansaço.
- Não será um problema querida! Todos estamos felizes com a sua chegada e a sua permanência em nossa família, incluindo o Bennett, não se preocupe, com o tempo você se sentirá mais acolhida. Mas agora você precisa descansar um pouco, foi uma viagem longa e o fuso horário deve estar acabando com você, durma um pouco e descanse, mais tarde faremos um programa familiar para que possamos nos conhecer melhor.
Grace sai do quarto me deixando sozinha com meus pensamentos, realmente preciso descansar, meu corpo e minha mente estão esgotados. Eu deito na cama macia e fecho os meus olhos, e sono vem chegando e com ele a consciência de que agora essa é minha vida.
O meu primeiro dia em Nova York pode ser descrito como memorável, eu não só conheci todos os pontos turísticos da cidade, como também tive momentos inesquecíveis com a minha nova família, eu estava quase me sentindo mal por gostar tanto de outra família que não fosse a minha, a minha mãe não gostaria nadinha disso.
Os Max´s eram sem sombras de duvidas a família mais incrível e afetuosa que eu poderia encontrar nesse intercâmbio, me fizeram sentir parte integrante da família desde o primeiro minuto, e eu sou muito grata a isso, quando voltamos pra casa naquele dia eu estava tão eufórica e ansiosa para contar tudo aos meus pais no Brasil, nossa conversa no telefone foi longa e cheia de saudades, contei cada detalhe da minha nova vida e ouvi as novidades de casa. Ao encerrar a ligação eu senti um conforto acolhedor no peito, aquela conversa com os meus pais me fez perceber que eles sempre estariam ao meu alcance, mesmo que por telefone, eu sempre poderia recorrer a eles independente de onde estivesse.
Ouço uma batida na porta e ao abrir me deparo com a Sam, ela é muito bonita, assim como o restante da família tem cabelos loiros e olhos claros, um padrão australiano, com 14 anos ela parece uma garota confiante e decidida, com esses genes seria difícil não ser. Sam é tão educada e gentil quanto bonita.
- Posso entrar Anne?
-Claro, fique a vontade, como eu posso te ajudar Sam?
- A mamãe pediu para que eu te perguntasse se está muito cansada\, pois ela organizou um jantar de boas vindas para te apresentar aos amigos da família. Mas caso você prefira ela pode transferir para amanhã.
Eu estava realmente cansada da viagem e dos passeios por Nova York, mas eu não poderia recusar um jantar organizado para mim, a Grace obviamente deve ter dedicado muito tempo a isso.
- Eu adoraria conhecer os amigos da família\, além de estar faminta\, um jantar seria incrível\, diga a Grace que eu vou descer assim que me arrumar\, por favor Sam!
Sam assente e sai do quarto, me deixando ansiosa pelo jantar dessa noite.
Após me arrumar eu desço para encontrar a família Max na sala de jantar, estão todos lindos e radiantes, como sempre, o sorriso de Grace se ilumina ao me ver, me sinto satisfeita com a minha escolha de roupas nunca tive problemas com a minha aparência, não que eu fosse uma beldade dentro de todos os padrões de beleza, mas eu sempre amei todos os atributos que eu tenho, tenho estatura mediana, cabelos longos e castanhos, meus olhos são cor de avelã assim como os da minha mãe, meu rosto possui sardas discretas que contrastam com os meu lábios volumosos e rosados, tenho longos cílios negros que valorizam muito o meu olhar, para o jantar eu resolvi vestir um vestidinho leve que valorizou todas as minhas curvas, além de ser elegante o suficiente para esse encontro com os amigos da família.
Sinceramente eu não sabia o que esperar dessas pessoas, eles provavelmente também eram ricos, mas seriam gentis e humildes como os Max’s ou seriam milionarios esnobes e egocêntricos? Eu não demoraria muito para descobrir como eram, logo que desci até a sala de jantar eles chegaram.
A família Summer era formada pela Susan e Carrick, que eram pais orgulhosos de Chloe Summer, uma mulher lindíssima e bem humorada com quem me identifiquei logo de cara, seus pais não eram diferentes muito descontraídos e calorosos.
A família Carrington era formada por Jamie e Charles, que deram vida aos incríveis e excêntricos Clair e Matthew que com certeza se destacavam em qualquer espaço que frequentassem.
Chris e Ethan eram amigos de faculdade do Bennett, além de serem muito próximos do restante da família, assim como Bennett os dois eram lindos demais, só que diferente dele os rapazes eram educados e gentis.
No decorrer do jantar eu pude conhecer melhor cada pessoa que estava naquela mesa, e me senti muito privilegiada por isso, aquelas pessoas eram tão amigáveis quanto possível e assim como minha família anfitriã não mediram esforços para me fazer sentir parte do grupo, com exceção do Bennett, eu sinceramente não entendia o porquê de tanta antipatia e hostilidade vindo dele, mas não importava, o restante do pessoal me fazia sentir acolhida.
O jantar fluiu perfeitamente bem, e foi incrível a forma como me entrosei com todo mundo, eles seriam com certeza os meus amigos.
Antes de irem embora Chloe e Clair se despediram com um abraço, pegando o meu número de celular para que pudéssemos marcar uma saída o mais rápido possível, elas queriam me mostrar todos os melhores pub's da cidade, e eu estava ansiosa para isso. Os rapazes tiveram a mesma despedida calorosa, e com um abraço em cada um deles eu me virei e fui para o meu quarto descansar, no fim do jantar eu estava completamente satisfeita e renovada, o contato com aquelas pessoas me fez gostar ainda mais desse país e estava confiante sobre o futuro dessas relações.
Algum tempo depois do jantar ouço uma batida na porta.
- Pode entrar!
Grace entra no quarto e se senta na cama ao meu lado, o seu sorriso acolhedor está estampado no seu rosto.
- Você gostou do jantar? Julguei que seria uma boa ideia te apresentar aos amigos da família\, os garotos tem praticamente a sua idade\, pensei que fazer amizades poderia ajudar a tornar o seu intercâmbio menos solitário.
Essa mulher me surpreendia, sempre pensando no bem-estar dos outros, se desdobrando para que todos ficassem felizes. O seu esforço em fazer da minha estadia em sua casa a melhor possível, me comovia de verdade.
- Grace\, eu não tenho palavras para definir o quão feliz eu fiquei com esse jantar\, os seus amigos são pessoas incríveis e foi como se eu os conhecesse há anos\, eu não sei como agradecer por toda essa dedicação que você têm tido comigo.
Grace considerou as minhas palavras e prosseguiu.
— Nós estamos aqui para isso querida, você faz parte da nossa família agora, e eu cuido da minha família com tudo o que tenho.
Eu não tinha dúvidas em relação a isso, Grace realmente fazia tudo por sua família e eu era privilegiada por fazer parte disso.
Nós conversamos por muito tempo naquela noite, organizamos a minha rotina em relação ao trabalho com a Sam, até porque essa era minha função ali, acompanhar a Sam no que fosse preciso. Eu estava realmente esgotada e quando um bocejo escapou pelos meus lábios, Grace o recebeu como uma deixa para encerrarmos a nossa conversa.
De volta ao silêncio do meu quarto, eu repassei aquele dia na minha cabeça, eu precisava processar tudo, 24 horas atrás eu estava no Brasil, acomodada na minha antiga vida, e agora estou na maior cidade do mundo com uma nova família, novos amigos e uma perspectiva diferente da vida, eu sentia um medo surreal de me decepcionar e acabar decepcionando essas pessoas durante o processo, eu sabia que essa jornada seria intensa, só não imaginava como.
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