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Correndo Com Os Lobos

Capítulo 1

A morte levou o meu brilho… lembro-me claramente do dia em que tudo aconteceu, os pesadelos não me deixam esquecer das cenas…

  Muita coisa aconteceu naquela noite. A noite em que eu morri, mas meu coração continuou batendo. A noite em que perdi a única pessoa que algum dia entendeu minha raiva, e que me ensinou a controlá-la 

...“  — Parabéns meu amor, quatorze anos, você está enorme, e me dá tanto orgulho minha princesa - o pai da garota dissia enquanto beijava lhe a testa. A garota nunca se  cansava daquilo, nunca se cansava do amor deles....

...  — Parabéns filha. Nós te amamos muito, sempre - a mãe disse também ao vir lhe abraçar e olhando nos seus olhos a disse. – Você é especial, nunca se esqueça disso minha menina...

...  — Obrigada mãe, pai, eu também amo vocês, muito....

...  — Tá bom, eu também amo vocês, mas agora me deixem abraçar minha sobrinha preferida. Sai. - a tia, ansiosa, já empurra o pai da menina para o lado e lhe abraça, aquele abraço caloroso, que tanto a fazia se sentir segura....

...  Éram apenas os quatro, a garota amava aquilo. No fim da noite sua tia iria até seu quarto e a contaria histórias de lobos, não importa quantos anos a menina tivesse. Mas naquela noite isso não aconteceu. O pai da garota levantou do sofá e falou que iria buscar refri e as coisas para fazer brigadeiro, apenas porque a menina estava com vontade. Isis, nossa pequena garota, foi junto, quando saíram do mercado e íamos em direção ao carro um homem apareceu a frente deles, ele estava de capuz e máscara, não dava para enxergar o seu rosto direito, ele levantou uma arma e apontou na cabeça do pai da menina....

...medo! A menina sentiu tanto medo....

...O pai deixou a menina atrás dele, para lhe proteger e disse ao homem calmamente....

...  — O que você quer? Dinheiro? O carro? Eu te dou tudo, pode pegar. - estendia as chaves do carro e a carteira para o homem. – Só não machuque minha filha....

...  — Não lembra de mim? - ao olhar no rosto do pai a menina via pavor, medo, ela nunca vira o pai com medo antes, ele nunca sentia medo, ou pelo menos nunca deixava transparecer....

...  — Ah, sim, você se lembra, perfeitamente. E eu também me lembro de você, mas essa garota não, a filhote ainda não era nascida. - uma risada de escárnio é ouvida, Isis estava paralisada....

...Quem era aquele homem? e o que ele queria com meu pai? ...

...Seu pai em um reflexo rápido tentou desarmar o homem, raiva, era isso que tinha em sua feição, a mais pura raiva, ele conseguiu desarmar o homem, mandou-a  correr, rápido e para longe, e ela foi, correu tão rápido e para tão longe que sentia as suas pernas doerem e falharem, e o que me fez as pernas congelarem e seus joelhos cederem, a levando ao chão foi o disparo que ouviu quando chegou a esquina, seu coração parou por um segundo e o medo lhe atingiu, de que fosse ele, de que a morte o tivesse levado, e depois de meia hora naquele chão sujo, os seus joelhos doíam, e ao longe, ela começava a ouvir os barulhos das sirenes, ambulância e polícia....

...Ela correu de volta ao estacionamento do mercado, mas desta vez, os seus joelhos não cederam, não até que chegasse onde queria, onde o corpo, sem vida de seu pai, com a camiseta azul clara completamente manchada de sangue, estava, foi ao seu encontro, mãos tentaram a segurar, mas a garota foi mais rápida, a garganta doía, o cheiro metálico, o líquido escarlate manchando as suas mãos....

...  — pai… por favor, acorda, eu preciso tanto de você - sussurrava enquanto tinha a cabeça do pai sobre as pernas, seu sangue agora também manchava o vestido branco de sua filha....

...Perceber que o havia perdido, para sempre, sem salvação, sem uma última história antes de dormir, sem ouvir a sua risada, e sem sentir os seus braços quentes lhe aconchegando e fazendo-a sentir tão segura. Um grito, dor, medo, raiva, um grito, tão doloroso, se sobressai entre as sirenes, que viraram agora a esquina, a mesma esquina a qual esteve paralisada, e sentia o  peito doer, o grito não cessou, sua garganta agora ardia, colocou parte da dor para fora naquele pequeno rugido, na tentativa de aplacar a dor, mas a dor, a tão nova que se alojava em meu peito, a dor da perda, ela ficaria por muito tempo....

...Mal sabiam os policiais que chegavam, que uma garota de 14 anos, se encontrava debruçada sobre o corpo sem vida do próprio pai. Ela foi tirada de cima dele em prantos por um policial, ela não o impediu, estava fraca, e com tanta dor, era como se uma faca, tivesse sido enterrada em seu peito, o ar faltava e os pulmões doíam, sentia que iria morrer junto a ele, e de fato, uma parte dela morreu....

... O homem havia fugido e levado a vida de seu pai junto. Ela se culpa, a todo momento. "Não era para eu estar lá, se eu não estivesse lá ele não teria reagido, e não teria morrido."...

...O pior foi saber que o homem não levou nada material, nem carteira, nem chaves do carro. Apenas a vida de seu pai. “...

  — Filha, já estamos chegando. - a minha mãe avisa me fazendo sair de meus devaneios. 

  Estãmos nos mudando para uma cidade nova, como um recomeço, depois de tudo. Não foi só a morte do papai que mudou tudo, muita coisa mudou, muita coisa aconteceu… E infelizmente, nós duas mudamos.

  — Aqui tudo será diferente, é a nossa chance de recomeçar. - Ela quer fingir que nunca aconteceu, que não dói, mas eu sei que lá dentro, ela faria de tudo pra que ele ainda estivesse aqui, sei que ela ainda chora toda noite, mesmo depois de anos, e sei que ela tenta, ela tá sempre tentando ser forte. Mas na verdade nada vai ser diferente, a dor vai continuar, como sempre, e sempre vai ter algo para estragar tudo, e esse “algo” nos últimos 2 anos, tem sido, eu.

 Ao chegarem em frente a casa há um carro do xerife, óbvio, é uma cidade pequena, tem que haver um xerife.

 Saíram do carro e foram até lá, uma mulher saiu com um grande sorriso.

  — Bem-vindas, eu sou a xerife Lia.- ela comprimenta eu e minh mãe com um aperto de mão e um grande sorriso no rosto.

  — Espero que gostem da vizinhança, é bem calma. Apenas evitem adentrar muito a floresta. - Lia fala e algo em mim se agita. Evitar a floresta, vou passar a maior parte do meu tempo la, provavelmente.

  — Vou ajudar a descarregar o caminhão. 

Saio dali antes que tenha a chance de ouvir mais alguma coisa, minha cabeça já está começando a latejar de dor.

...☆...

 Já noite estou deitada em minha cama, pensando, dois dias e eu já tenho aula no colégio novo, e é óbvio que nada vai ser diferente. 

 Vou até a janela que dá pra parte de trás da casa e fico sentada observando a lua, isso me acalma, e me faz lembrar das histórias de lobos que minha tia e meu pai contava pra mim, eram histórias muito parecidas, mas parece que contadas de pontos de vistas diferentes.

De repente ouço um uivo, meu coração acelera e tenho vontade de ir em direção ao som em meio a floresta, eu não fazia a mínima ideia de que havia lobos aqui, e isso só me deixa mais curiosa para conhecer a floresta.

 Mais tarde tomo um banho e antes de deitar na cama tomo dois comprimidos, para que eu consiga dormir. Me deito e quando estou quase dormindo ouço novamente o uivo, meu coração novamente acelera e eu apago..

..."  — E como era o lobo, papai? - a garotinha perguntou animada com mais uma das histórias de lobos do pai....

...  — Ele era grande, de pelos cinzas, e olhos bem azuis. - disse o pai da menina, feliz pela animação da filha com mais uma das histórias....

...  — E ele era mal, papai? ...

...  — Não, ele queria apenas proteger sua amada e seu filhote. Agora vamos dormir… "...

Capítulo 2

Hoje resolvi conhecer a floresta. Os uivos que ouvi ontem a noite me deixaram curiosa e tentada, quem sabe eu não encontre um lobo, provavelmente ele não seria nada amigável, mas eu só quero ver um, de longe.

Chego em uma parte da floresta que é linda, as folhas secas caídas por todos os lados, as árvores formam um círculo e o sol entra dentre as várias e extensas árvores.

  — Quem é você? - me assusto com a voz que vinha de trás de mim, um garoto, alto, cabelos castanhos que vão até o queixo e olhos castanhos que lembram chocolate.

  — Oi... é, eu sou a Isis, e quem é você? - pergunto confusa, da onde ele surgiu mesmo?

  — Sou o Benjamin. Você é nova na cidade né? Minha mãe foi dar as boas vindas pra você e sua mãe. Eu estava no carro.

  — Sim. Sua mãe seria a xerife, Lia?

  — Sim. Eu vi você la, parecia entediada.

  — Um pouco, sabe, carregar caixas não é meu hobbie. - ele ri com meu comentário, e que sorriso bonito esse garoto tem.

  — Você não devia estar aqui, a floresta é perigosa. - me alerta, ainda com um pequeno sorriso no rosto.

  — São os lobos, né? E se é perigosa o que você faz aqui?

  — Eu... Eu já tô acostumado, ando por essa floresta a anos, sei onde é perigoso e onde não é.

  — Hum, eu não me importo. - vou até uma das árvores e me sento escorando minhas costas na mesma, pego dois comprimidos e os engulo a seco.

  — Você não se importa de ser devorada por lobos? - ele pergunta em tom de brincadeira.

  — Não é isso. Não acho que algo vá acontecer, não comigo.

Mentalmente lembro a mim mesma que sou amaldiçoada, a morte me persegue em todo canto, mas nunca busca a mim.

Minha cabeça começa a girar e meus olhos já pesam, Benjamin está falando algo, mas não ouço direito.

  — Ei, você tá bem? - ele se agacha em minha frente.

  — O que você tomou? - ele parecia preocupado, um pouco em pânico talvez.

Não consigo mais manter meus olhos abertos e apago....

...☆...

Me sinto carregada por alguém, meu corpo está dolorido e gelado, não tenho força para abrir os olhos ou me mexer, minha cabeça está encostada no peito de alguém quente. Minha cabeça lateja de dor, minha boca está seca e não consigo abri-la ou formar uma palavra sequer.

Percebo que já não estamos mais dentro da floresta pela pouca iluminação que que vejo por baixo das pálpebras, as luzes que vinham dos postes das ruas silenciosas. não poderia adivinhar que horas são.

Tento me lembrar quem poderia ser a pessoa que me carregava, e logo me lembro de Benjamin, ele sabia onde ficava minha casa, então era ele.

  — Minha filha. - ouço a voz da minha mãe.

  — Ai meu deus, obrigado garoto. Você poderia levá-la para dentro, por favor, venha. - A pessoa que me carregava entra e sobe as escadas, minha mãe está logo atrás, ouço os passos dela.

Deixei ela preocupada, mais uma vez, dei trabalho, estou sempre fazendo isso, não é totalmente por querer, eu apenas não consigo ser tão forte como ela.

Sou colocada em minha cama e acabo apagando alguns minutos depois.

...☆...

Ao me olhar no espelho vejo que estou com olheiras profundas e meus cabelos brancos estão emaranhados como um ninho, penteio meus cabelos e decido mantê-los solto. Coloco uma bermuda legging preta que vai até o meio das coxas, uma camiseta branca e um tênis Jordan preto e branco.

Vou direto para o colégio, o único que tem na cidade. Minha mãe já havia ido trabalhar.

Assim que chego em frente ao grande colégio penso seriamente em cabular aula e ir para a floresta, mas eu não faria isso, não hoje. com sorte talvez eu aguentaria 5 horas dentro de uma sala.

  — Oi. Você é aluna nova né? Me chamo Hadria - uma garota de cabelos ruivos e cacheados surge em minha frente com um grande sorriso. Como ela conseguia ter toda esta animação logo pela manhã.

  — Oi. Sou a Ísis. - respondo ainda andando para entrar no colégio e ela me acompanha vindo logo atrás.

Ela falava várias coisas, como o quanto a cidade normalmente é calma e que em breve eu me encaixaria bem com os outros estudantes, ou talvez não tanto. Legal ela grudou no meu pé, e não para de falar um segundo, por isso gosto de ficar sozinha, gosto de silêncio. não me levem a mal, ela parece ser legal.

Essa escola é enorme, e ao andar pelos corredores algumas pessoas me olham, mais especificamente para meu cabelo, meus longos cabelos brancos, não passam tão despercebidos como eu desejo.

as aulas acabariam em 5 horas e eu poderia ir para a floresta, se eu não acabar explodindo antes.

...☆...

Havia acabado as duas primeiras aulas e eu já não aguentava mais, Hadria estava sempre falando e minha cabeça estava prestes a explodir então arranjei um jeito de fugir dela.

Vou para a floresta, desta vez pretendo ir mais para dentro. Hadria havia falado que havia lobos na floresta, apesar de eu já saber. Eu seria azarada demais se encontrasse com um.

Depois de um tempo andando floresta adentro resolvo parar ali mesmo e me sentar, hoje eu não iria me dopar pelo menos essa é a intenção. Apenas quero ficar aqui, submersa em meus pensamentos.

Meus pensamentos voltam ao dia do acidente, sempre voltando, sempre me assombrando. Realmente a dor, ela nunca fui embora, ela sempre esteve aqui, em alguns momentos mais presente, em outros eu até esquecia que ela estava ali, mas estes momentos eram raros, e normalmente não duravam muito. Sempre voltando no..e se... e se eu não estivesse lá, se eu tivesse decidido ficar em casa com a mamãe e esperado, será que seria diferente? Eu sinto tanta falta dele, ele faz uma saudade imensa. Sinto falta do abraço dele, das histórias sobre lobos que ele costumava contar e do quão ele sempre me motivou a correr atrás do que eu queria. Ele era e sempre vai ser o melhor pai. Ele fazia eu me sentir única, eu era a princesinha dele. Se ele me visse hoje, ele não teria orgulho do que me tornei, do que estou me tornando, do quão ruim minha alma pode ser, se visse que eu deixei a raiva e a dor tomar conta, fazendo totalmente o contrário do que ele me ensinou, ficaria tão desapontado. Eu me sinto tão fraca, tendo deixado que a tempestade dentro de mim tomasse conta de tudo ao meu redor..

  — Eu queria que você estivesse aqui papai. - sussurro enquanto sinto o nó em minha garganta e a saudade.

  — Tudo seria tão diferente, você me ensinaria a lidar com a raiva, a controlá-la, a usá-la a meu favor. Você sempre foi um ótimo pai, e um ótimo marido, mamãe concordaria com isso - ri fraco, enquanto lágrimas se acumulavam em meus olhos.

Ao escutar um graveto quebrando me viro rapidamente para trás, de onde vinha o barulho tinha um grande lobo de pelagem negra. Me assusto com o grande animal à minha frente mas de maneira alguma ouso me mover. O lobo tinha olhos alaranjados como o fogo, com certeza, era como fogo vivo, ele me encarava, também imóvel, não parecia que queria me atacar, pelo contrário, o animal parecia estar com certo receio em se mover ou se aproximar. Ele lentamente se deita nas folhas secas da floresta como se não quisesse me assustar.

  — Isso é mais uma das minhas alucinações? - me pergunto e no mesmo instante o lobo vira a cabeça para o lado.

  — Como se você entendesse algo que eu falo. - dou uma risada leve ao me encontrar falando com um lobo. Que piada.

Resolvo arriscar perder a mão e a estendo devagar na intenção de acariciar a cabeça do grande lobo, ele não recua nem avança, apenas fica me olhando. Ao conseguir encostar nele me aproximo mais, mesmo que ainda com certo receio, faço carinho em sua cabeça enquanto me sento ao lado do mesmo, ele deita sua cabeça em minhas pernas e fica olhando as grandes árvores e o sol que brilha dentre elas enquanto aproveita o carinho. Que lobo atirado, acabo rindo sozinha do lobo, oque chama a atenção do mesmo que levanta a cabeça para me olhar, os olhos de fogo, tão hipnotizantes.

A que ponto cheguei estou no meio da floresta com um lobo deitado em meu colo enquanto faço carinho no mesmo, mas pelo menos não estou chapada.

Deve ser boa a sensação de poder correr livremente pela floresta e sentir o vento sobre os pelos, deve ser libertador.

Agora, como uma distração, minha mente estava focada no lobo e nas grandes árvores ao nosso redor, naquele breve momento, mesmo que não fosse real, a dor sumiu, como um remédio.

Capítulo 3

Sinto frio  e ao abrir os olhos percebo que estou na floresta, demorou um tempo até que eu assimile e lembre, as imagens do grande lobo vem a mente mas ele não estava mais lá, eu estava sozinha no meio da floresta. Nem sei se aquele lobo era real ou uma alucinação ou talvez um sonho.

Olhos de fogo...

olho as horas e são 19:27, minha mãe ainda não deve ter  chegado, melhor voltar logo para casa,  não quero dar trabalho de novo.

Enquanto caminho penso no lobo, era um lobo, por qual motivo não me atacou, tá eu tenho mais afinidade com animais do que com humanos, mas era um lobo. Mas talvez nem fosse real, minha mente me lembra, poderia ser só mais uma das minhas alucinações.

...☆...

Entro em casa e vou direto pra cozinha, estou morta de fome. Me surpreendi ao encontrar minha mãe lá, com uma taça de vinho na mão. Logo que entro ela me olha, parece exausta, olheiras fundas de baixo dos olhos que estão cheios de lágrimas e vermelhos, rosto abatido de cansaço. Odiava ver ela assim, desde que papai morreu ela tem se matado trabalhando, e a noite bebia e chorava, nada mudou, ela queria tanto que mudasse, mas é difícil mudar, principalmente quando a dor ainda nos sufoca.

  — Oi. perdão, não ter avisado, fiquei na floresta a tarde toda. - explico antes dela ter chance de falar algo.

  — Tudo bem querida. Deve estar sendo difícil, afinal faltam dois dias pro aniversário dele - ela me lembra de cara que logo será aniversário do papai, o ?que normalmente é um motivo para que eu me dope mais que o normal, ou tomar algo que sei que me deixaria apagada o dia todo.

  — Você parece estar cansada, vá tomar um banho e descansar. - não comento sobre o que ela falou, odeio conversar sobre ele.

Normalmente eu deixaria ela se afogar em bebida, até que a dor fosse anestesiada pelo álcool e ela acabasse dormindo em cima de alguma foto dela e do papai, assim como da última vez, mas hoje ela precisa descansar, e deixar a bebida de lado um pouco.

  — Tudo bem, eu vou. - ela fala acompanhada de um grande suspiro.

  — Boa noite. - falo enquanto ela sobe, e eu vou pra geladeira procurar algo para comer.

Não entendam errado, ela é minha mãe, entendo ela, as vezes precisamos anestesiar a dor com alguma coisa, então às vezes, quando sei que está doendo demais, que é quando ela simplesmente se senta no sofá com uma garrafa de vinho na mão, sem lágrimas, apenas ela, e a dor, quando é assim, eu deixo, porque precisamos nos afogar um pouco as vezes, mas só um pouco, o suficiente para que nosso cérebro entenda que precisamos voltar a superfície, para buscar por ar. Por que, infelizmente, mesmo com tanta dor, continuamos vivos.

...☆...

Sai da escola a algum tempo e estou dentro da floresta, entrar na floresta vai acabar se tornando meu passatempo definitivamente. Hoje está muito quente, perguntei a hadria se havia alguma cachoeira ou rio na floresta, ela disse que havia uma cachoeira mas era bem para dentro, e disse que era perigoso eu encontrar algum lobo ou me perder, o discurso todo de que era melhor eu não ir. Mas aqui estou eu, dentro da floresta à procura da bendita cachoeira.

Ouço barulhos e vejo um movimento à minha frente, logo um lobo surge, o mesmo lobo daquele dia, os olhos de fogo são inesquecíveis, achei que tivesse sido uma alucinação minha.

Ele se aproxima devagar e eu não havia percebido antes, mas ele é enorme, deve ter um pouco menos de dois metros, talvez 1,90, enquanto eu estou aqui com meus 1,78, estou me sentindo baixa, mas apesar da altura parecia um bebê pedindo carinho ontem.

  — Por acaso você não sabe onde tem uma cachoeira por aqui? - rio de mim mesma por estar falando com o lobo, mas ele parecia me entender e se abaixa, fazendo um sinal com a cabeça para que eu suba nele.

  — Tá maluco, eu não subo aí não - ele choraminga e eu com certo receio me aproximo e subo, ele levanta e eu me agarro ao pescoço do lobo, então ele começa a correr, o arrependimento bate na hora, mas a sensação do vento em meus cabelos é maravilhosa.

Longos minutos passam e ele logo para, ao abrir os olhos me deparo com uma grande cachoeira, é linda a água é limpa e azul, chega a dar  para ver o fundo. Ele se abaixa e eu desço.

Me sento sobre uma pedra e o lobo vem atrás se deitando ao meu lado.

  — A água deve estar ótima, acho que vou entrar. - me levanto e logo começo a me despir ficando apenas de lingerie.

  — Você sabe nadar, lobo? - ele me olha e logo se levanta e fica ao meu lado, eu corro e me jogo na água e logo ele pula também.

A água está maravilhosa, eu ria de mim mesma, a sensação, tão boa, não me sentia assim, livre, a muito tempo, tão distante da dor, uma sensação tão estranha, não muito conhecida por mim, paz. Fico um tempo na água e logo sai, o lobo vem logo atrás.

  — Sabe lobo, você tem olhos de fogo, eles são hipnotizantes, e intensos. - digo enquanto pego minha toalha na mochila e enrolo em minha cintura. Olho para o lobo e ele está se sacudindo para poder se secar, quando me olha vira a cabeça, parece gostar do que falei.

Olhos tão intensos, que parecem ver todos ou meus pecados. Toda vez que os olho, pareço me perder em uma imensidão de escuridão e paz, como se silênciacem a dor. É doideira, mas me acalma.

O lobo logo se deita em minhas pernas, faço carinho enquanto sinto o sol em minha pele.

  — Faz muito tempo que não me sinto assim. - ele levanta a cabeça para me olhar com aqueles lindos olhos de fogo.

  — Sabe, livre, bem e… feliz de certa forma, é boa a sensação.

A sensação inconfundível, não muito conhecida por mim, de paz. Não posso me acostumar com isso, nunca dura muito, são apenas pequenos momentos que vem ser apreciados.

O tempo passa e eu ainda sinto o sol quente queimando sobre a minha pele pálida. Pego-me pensando se havia outros lobos, e se houvessem outros, onde eles se escondem? Não que isso me interesse mas eu sou curiosa, e se a outros lobos como olhos de fogo? Mais grandes que o normal e mansos, eu iria querer conhecê-los. E provavelmente eles iriam me devorar.

Hadria falou que era perigoso, mas até agora só achei ele, que é um neném, adora carinho, onde estava o perigo nisso??

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