...As pessoas só observam as cores do dia no começo e no fim, mas para mim está muito claro que o dia se funde através de uma multidão de matizes e gradações, a cada momento que passa. Uma só hora pode consistir em milhares de cores diferentes. Amarelos céreos, azuis borrifados de nuvens. Escuridões enevoadas. No meu ramo de atividade, faço questão de notá-los....
— Marcus Zusak, A menina que roubava livros
...|•Dedicatória•|...
...Para minha melhor amiga Letícia, esperando de coração que um dia ela reencontre algo que ela não disse o que era, mas eu sei que era Amor....
...|•Prólogo•|...
Gatilho: este capítulo pode conter cenas de violência física e/ou mental.
Pow. Pow.
— Amélia, leve Bella para o quarto, rápido! — Jack grita, havia desespero em sua voz. — Não saia de lá até que eu vá ou até você ver que tudo acabou. Ande!
Passos rápidos, fortes, sincronizados. Como um batalhão, um exército. Um arrepio percorre minha espinha. Há algo errado. Alguém puxa meu braço num toque suave. Amélia.
— Vamos Bella! — me levanto do sofá tateando a minha volta. — Não demore, garota! — ela entrelaça minha mão na dela como de costume, e a outra mão ela põe em meu braço. Me guia.
Eu não sei o que está acontecendo. Não vejo. Não posso ver. Perdi minha visão quando tinha três anos de idade em um acidente de carro onde estava toda minha família. Eu fui a única que tive uma sequela permanente. Nunca mais voltei a enxergar e para falar a verdade, nem tenho mais esperanças. Faz tantos anos que…é como se eu tivesse me acostumado com esta minha sina. Qual a cor do céu? Dizem que é azul. Azul celeste. Um nome bonito. Mas como é a cor azul? Eu não sei. Não me recordo.
A deficiência visual é um dos motivos pelos quais minha mãe diz que sou imprestável. Ela nunca quis saber de mim — não depois daquele acidente. Eu era a princesa dela, hoje sou uma bastarda em seus lábios cruéis. Meu pai então contratou Amélia, que cuida de mim desde meus três anos de idade. Eu a chamo de mãe quando estamos a sós. Não me importo. Foi ela quem cuidou de mim durante vinte e um anos. Ela que deve ser considerada minha…
Pow.
— Bella, corre! — Amélia diz arfando.
— Mas…
— Sem mas garota! Eu irei te guiar — ela me interrompe. — Corra se não quer morrër.
— Morrër?! O que está acontecendo? — confusa.
Começo a correr com incerteza. Passos tropeçados. Incorretos. Amélia minha guia. Não poder enxergar é a pior coisa do mundo. Eu não sei para onde estamos indo, o que estou fazendo, eu não sei o que está acontecendo…
— Um ataque — simplesmente. — Homens vestidos de preto e armados até os dentes invadiram a casa e estão atirando — ela diz como uma metralhadora: ansiosa, desajeitada.
— Jack… — murmuro com preocupação.
— Ele irá ficar bem, eu espero.
Eu espero. Isso não é uma frase nada consolante. Jack é meu irmão mais velho e diferente de minha mãe, não me odeia. É o que dá a entender. Mas não é porque não me odeia que demonstra todo o carinho e amor do mundo. Ele me trata bem. Muito bem, afinal.
— Onde papai está? — questiono enquanto sinto Amélia me puxar para uma curva.
— Ele estava no escritório da última vez que o vi. Não sei onde está agora.
— Ele está bem? — uma das perguntas mais temíveis do mundo. Não a faça se sentir que a pessoa está à beira da morte, é rara às vezes em que dizem a verdade.
— O senhor Walter sabe o que faz — ela responde com a voz trêmula.
Não disse? Mentira. Toda vez que a voz de Amélia falha desta forma é porque ela está mentindo. Estão escondendo algo de mim, constato — eu já devia ter me acostumado com isso. Mas por quê? O que está acontecendo? Por que esses caras estranhos estão aqui? Acredito que não estariam sem um bom — muito bom mesmo — motivo. Ah, mas me esqueci que nunca me contam nada e ainda por cima ameaçam Amélia para caso ela me conte. Ordinários! Que ódio. Que ódio desse mundo, que ódio da vida!
Se eu fosse capaz de enxergar, minha mãe se importaria comigo como antes? Meu irmão se aproximaria mais de mim, falaria mais? Meu pai…meu pai se importaria mais comigo, cuidaria mais de mim? Eu nunca vou ter essa resposta, porque não foi assim. O destino traçou minha vida de outra forma e qual é a importância dela? Qual diferença ela faz? Eu ainda não sei. Sinto que um dia saberei.
Sinto uma angústia repentina, sinto um vazio. Não tem nada de bom acontecendo. Caos. Para que esconder? Eu quero saber. Tudo. Sem rodeios, sem enrolação. Minhas pernas já estão doloridas de tanto correr. Não aguento mais. Não quero esconder, não quero fugir. Quero ver o que está acontecendo, o que está me deixando angustiada tão de repente. Quero poder enxergar, mas não posso. É uma mërda.
— Amélia quando vamos chegar? — pergunto entre respirações rápidas, descompassadas.
— Aguente somente mais um pouco Bella.
Pow.
A mão de Amélia fica trêmula contra a minha, sua mão em meu braço, fria. Ela parece feita de gelo. Já senti gelo — foi uma experiência engraçada há tantos anos. A textura, o sabor. Mas a cor…eu queria saber a cor do mundo. A cor do amor, a cor da vida. Sinto nossa velocidade diminuir, meus pulmões ardem. O som de algo sendo digitado, o baque do destrancar de uma porta. A mão de Amélia já não está mais em meu braço. Mas a outra ainda está apertando forte a minha mão, como que para se certificar que eu estou ali: viva, inteira.
— Entre com cuidado Bella e não se mova — fiapos de desespero definham em sua voz. Solto sua mão.
Caminho para frente devagar, buscando por algo. Minha mão encontra algo áspero, frio. Ferro. A porta. Dou mais alguns passos, deve ser o suficiente. Num baque surdo a porta se fecha, sinto Amélia se aproximar por trás e me dar a mão outra vez. Ela me guia e me senta em algo acolchoado. Parece-me ser uma poltrona ou algo parecido. Este não é o meu quarto.
— Amélia, onde estamos? — exijo, ela suspira.
— Numa espécie de quarto ou sala protegido. Ninguém entra aqui sem a senha da porta.
Certo. Um cômodo seguro, protegido.
— O que está acontecendo? — repito. Eu quero saber a verdade.
— Eu já te disse. Homens…
— Não invadiriam sem um motivo, não são ladrões — a interrompi firme, fria.
— Bella…
— Eu estou cansada de ouvir a mesma coisa toda hora Amélia. Todo dia, por toda minha vida. Até hoje. Chega! Eu quero saber o que está acontecendo de verdade.
— Bella por favor…não faça isso comigo! — suplica.
— Fazer o quê? Todo mundo pode fazer o que quiser comigo e eu não posso exigir a verdade uma vez na vida? — batuco os dedos nos joelhos, impaciente.
— Eu não posso Bella… — cogita.
— Se você quiser, você pode. Eu quero a verdade. Eu nunca quis a verdade tanto quanto agora.
— Bel… — suspira.
— Mãe…
Silêncio. Certo. Talvez eu não deva insistir. Não posso obrigá-la a me contar a verdade. Não mesmo.
— Você tem razão Bel, eu vou te contar — sorrio. — Você tem todo o direito de saber a verdade e eu não sei porque me senti intimidada pela senhora Ruth quando ela me ameaçou…
— De qualquer forma ela te ameaçou, qualquer um se sentiria intimidado.
— Mas eu não devia. Eu deveria ter te contado, ela não precisava saber. Não depois de tudo o que ela fez com você. A verdade é sua e ninguém tinha o direito de escondê-la. Nem mesmo eu.
— Conte — insisto.
— Aqueles homens do lado de fora desta sala que estão cercando a casa e perambulando por ela vieram atrás de seu pai. Houve uma ameaça há duas semanas. Uma dívida enorme. Seu pai está mais endividado do que se pode imaginar. Milhões de dólares. Bilhões na pior das hipóteses. Seu pai até mesmo me chamou em sua sala para me demitir a alguns meses mas eu disse que não importava com o salário, que mesmo demitida ficaria para cuidar de você. Ele não se opôs. E não há com que pagar a dívida. Não tem de onde tirar fundos, de onde tirar dinheiro. A gente está no fundo do poço, no fundo mesmo. Seu pai faliu. Estamos com uma grande ameaça pairando sobre a cabeça ou talvez sobre a cabeça de Walter se ele ainda estiver vivo. Tinha somente até hoje ao meio-dia para pagar ao menos uma parte. Mas não tinha com que pagar. E eles vieram atrás de seu pai.
Morto. Vivo. Morto ou vivo? Onde está meu pai? Por quê? Porque não podiam me contar, porque esconder isso de mim? Simplesmente…eu entenderia. Walter pode estar morto. Jack pode estar morto. Ruth pode estar morta. E eu aparentemente protegida junto com a mulher que cuidou de mim durante toda a minha vida. Lágrimas escorrem pelo meu rosto. Quentes, amargas. Apesar de tudo, minha família. E podem muito bem estar todos mortos neste exato momento. Eu…eu… Sinto Amélia me abraçar e a agarro com força, me derramando, desfazendo em lágrimas em seu ombro.
— Bel, vai dar tudo certo. Acredite, vão todos sair bem.
— Não, não vão — soluço. — Há um vazio em meu peito. Não vai, algo muito ruim já aconteceu.
Qual o gosto da morte? Qual a textura?
Gatilho: este capítulo pode conter cenas de violência física e/ou mental.
Foi…simples. Não teve muita demora, enrolação. Não teve uma despedida decente. Em nossa atual situação, era o mínimo que podíamos fazer. Não tinha muito o que pensar, falar. Foi…silêncio. Ninguém tinha vontade de dizer, gritar, de implorar. Não tinha porquê. Ninguém chorou. Não teve lamento. Ao menos a morte não é injusta — ela pode ser tudo, menos injusta. A morte trata a todos da mesma forma.
É o suficiente.
A única voz em meio a todo aquele silêncio, todo aquele vazio, era a do padre — ou pastor, não sei — fazendo uma oração pelas almas. Almas que foram libertadas pela morte, levadas por ela. Inclusive a de Walter. Este momento sóbrio, onde só havia uma viúva, dois órfãos, uma serva e um coveiro e o religioso diante do túmulo, me fez recordar de uma cena do livro A menina que roubava livros de Marcus Zusak que há tantos anos fora lido a mim por Amélia. A cena representava o enterro do irmão mais novo de Liesel — a personagem principal da história — a qual agora tanto me identifico.
...✯ Uma pequena observação ✯...
...Eu sou cega. Liesel enxergava perfeitamente bem....
Eu era uma dos dois órfãos. Jack, o outro. A viúva se tratava de minha mãe, o defunto de meu pai. Num estalar de dedos tudo havia mudado. Foi incrível a forma com que aqueles homens sequer se importaram com a presença de Jack e Ruth na sala de estar — sequer os tocaram, como se fossem fantasmas: invisíveis. Não tinha porque percebê-los, estavam petrificados, colados como duas estátuas no chão. Não tiveram trabalho algum. Tinha sido rápido. Ao menos, Walter não sofreu. Uma série de tiros, uma ameaça se tornando realidade. Meu pai no chão, morto. Foi tudo o que Jack contou.
Não demorou nem meia hora para que meu irmão mais velho entrasse naquela sala transtornado. Os homens tinham ido embora. Ele deu a notícia sem rodeios e agradeço aos céus por ele ser tão direto. Ruth havia se trancado no quarto depois de velar o corpo até que o buscassem. Para falar a verdade, somente saiu de lá nesta manhã para ir ao enterro. Amélia disse que seus olhos estavam inchados e vermelhos. Pareceu-me que tinha passado a noite chorando — pelo que ouvi. Por amar meu pai ou pela dësgraça que agora recaiu em nossa cabeça? Deixe-me adivinhar: talvez a segunda opção.
É claro que também chorei — não a estava julgando por isso — mas não de frente ao túmulo, em frente à Ruth. A noite havia servido para isso — com Amélia me consolando. As lágrimas nos lavam por dentro, nos acalmam, nos deixam leves, aliviados. Quem nunca caiu no sono chorando? Agora, Ruth está trancada em seu quarto outra vez. Nem se deu o trabalho de se sentar à mesa para o almoço assim que chegamos. Não sei se olhou em minha direção.
Jack não voltou para casa, do cemitério foi direto para a empresa falida. Eu não estava com fome, mas Amélia obrigou-me a comer com um argumento — há muito ultrapassado — de que eu poderia passar mal se não me alimentasse. De Ruth ela cuidaria mais tarde, ou seja, agora. Deve estar anoitecendo neste exato momento. Faz alguns minutos que Amélia saiu de meu quarto, estou só. É estranho ela sair para cuidar de Ruth e me deixar, ela nunca precisou. Amélia sempre esteve comigo. É estranha a perspectiva de dividi-la com a mulher que pouco se importa comigo, mesmo que ela apareça estava vulnerável. É um pouco ridículo, entende? Aquela que nunca precisou de ninguém precisar agora. Sinto-me cansada. Talvez eu deva dormir.
[ … ]
Ouço o barulho de uma discussão. A paz se foi nesta manhã. Faz dois dias que Walter está morto. Não falei com ninguém durante esses dias, em exceção de Amélia. Ela é sempre uma exceção. É mais que normal que eu fale com ela todos os dias — não há opção. Não ouvi falar de Jack, Amélia sempre dizia que ele não estava em casa. Mas na noite passada eu o ouvi chegar tarde — estava sem sono. Ouvi sua conversa irritada e fria com alguém pelo celular, seu murro descontrolado na parede. Só não consegui distinguir as palavras ditas, ele podia estar gritando, mas tentava ao máximo abafar a conversa. Só sei que era algo sobre a dívida. E agora, logo de manhã, Ruth e meu irmão estão discutindo. Fazia algum tempo em que eu não escutava a voz descontrolada de minha mãe.
— Por que os dois estão brigando tão cedo Amélia? — perguntou para os ares, não sei onde ela está.
— Não sei Bel, não estou entendendo nada do que dizem — pondera.
— Me leve onde estão — peço.
— Tem certeza? — ela duvida.
— Absoluta — me levanto da cadeira da sala de jantar onde tomava meu café para dar ênfase ao pedido.
— Eles estão no escritório — Amélia revela pegando em meu braço, me indicando o caminho. — Faça silêncio — avisa.
Apenas aceno com a cabeça concordando. Nós duas caminhamos silenciosamente, ouvidos à escuta, prestando atenção. A cada passo a conversa fica mais alta, mais grave. Mas ainda é impossível de entender.
— Estamos chegando e a porta está aberta. Quando eu apertar sua mão é porque já estamos lá dentro, entendeu? — sussurra.
— Sim — sussurro de volta.
Mais uma sequência de passos. Respiro fundo, ansiosa. Não sei o que vou ouvir, mas não me parece ser algo bom. Sinto que de alguma forma irá me fazer mudar por inteiro.
— Ele irá matar a todos nós Jack! Todos! Não temos escolha! — minha mãe grita, autoridade, medo, tudo na voz.
— O que não temos escolha? — pergunto a interrompendo fria o bastante ao sentir o aperto de Amélia.
— O que você… — Ruth vocifera.
— Deixe-a mãe! Ela tem todo o direito de saber — Jack também a interrompe.
Ruth bufa.
— Conte você a ela então, pois eu não direi nada.
Algo é arrastado: uma cadeira. Outra. Rute se senta.
— Quer se sentar, Bel? — meu irmão pergunta apreensivo.
— Não, não quero. Obrigada — mantenho a frieza.
— Certo — Jack pigarreia. — Estamos com problemas na empresa há algum tempo…
— Se for falar da dívida pela qual Walter foi morto, eu já sei. Não é necessário repetir toda a história melancólica. Quero saber o motivo da discussão — seca.
Gatilho: este capítulo pode conter cenas de violência física e/ou mental.
— Quem te disse isso? — Ruth se sobressalta, engulo em seco. Cometi um erro entregando Amélia.
— Eu permiti que Amélia contasse tudo a Bella dois dias atrás.
— Você… — ela rosna.
Jack…essa não foi bem a verdade. Amélia apenas admitiu a ele meia hora depois de ter me contado o que havia feito. A reação dele foi inesperada. Ele apenas disse que era o certo a se fazer já havia muito tempo. Depois disso, me sinto mais à vontade em sua presença, simpatizo mais com ele. Afinal ele não é uma pessoa má.
— Ela tinha todo o direito de saber depois de tanto tempo sendo jogada para escanteio — ríspido. — Bella — ele se dirige a mim outra vez, a voz mais suave — , não sei como você irá lidar com isso, mas o credor, aquele misërável, entrou em contato comigo ontem à noite e disse que tem uma forma para negociarmos a dívida. Uma oferta.
— Uma oferta… — levanto as sobrancelhas. — E o que tem isso para que estejam discutindo? — suavizo o tom de voz, pensativa.
— Tem que não vou negociar nada. Não vou dar o que ele quer — ele responde seco.
— Como assim não vai dar o que ele quer? — franzo a testa.
O cara está dando uma chance e Jack não quer agarrá-la?! Ele só pode ter ficado louco! Não, não! Não é possível! Jack está delirando…
— É o que estou dizendo a este cabeça dura que não quer salvar nossos pescoços! — Ruth interfere, bufando irritada.
— Claro! Porque você simplesmente não se importa com o que ele quer, não é mesmo? — Jack retruca.
— Como pode dizer isso se sequer sei o que é? Como vou saber se você não quer dizer? — protesta.
— Por que se você já quer dar tudo sem se importar com o quê, sem saber de nada, na hora que eu disser o que ele quer ofertar você simplesmente vai negociar o mais rapidamente possível. Eu não sou um negociante de vidas ou seres humanos.
— E qual é a oferta? — questiono mais como uma ordem do que como um pedido.
— A oferta, irmãzinha? Tem certeza? — ri de nervoso. — A oferta dele é que se entregarmos você a ele a dívida estará paga. Uma troca. E o ordináriø ainda ofereceu uma certa quantia para isso.
— Eu?! — recuo. — O que ele quer comigo? — perplexa.
Como alguém pode querer algo como eu?! Uma cega. Ninguém nunca me quis, nem mesmo minha própria mãe. Porque um salafráriø iria querer? Claro! Para abüsar de mim, não é? Para me fazer de brinquedo por ser uma deficiente idiøta. Eu não acredito.
— Espera! Ele quer Bella para quitar a dívida? Tão simples assim? — Ruth pergunta como que ainda digerindo o que foi dito.
Tão simples assim? Essa pergunta quando dirigida a você, quando remete a você é como um golpe de faca. Fundo, hemorrágico, dolorido. Não há nada pior que isso. Uma pessoa que não se importa com você jogar isso na sua cara sem vergonha alguma.
— Não ouviu o que eu disse? — frio.
— Mas isso é… — ela começa, extasiada.
— Isso é o que não vou permitir que aconteça — Jack grita irritado, socando algo, acredito que a mesa do escritório.
— Jack… — murmuro.
— Não adianta Bella! Não e não!
Amélia aperta minha mão com força. Ela está trêmula e suando frio. Ou sou eu quem estou trêmula?
— Não temos escolha — Ruth argumenta.
— Então é isso? Você é capaz de dar a própria filha a um misërável em troca de dinheiro? — meu irmão a acusa.
— Não temos escolha. Ou entregamos Bella ou todos nós morremos.
— Prefiro a morte — Jake declara.
— Mas eu não — Ruth retruca.
— Eu concordo com Jack — Amélia apoiando o meu irmão.
— Cale a boca e não se meta onde não foi chamada Amélia! — vocifera.
— Não fale assim com ela! — digo em tom de ameaça, fria, ríspida.
— Falo da forma que eu quiser e você não se mete também. Preste você atenção no tom que usa comigo!
— Da mesma forma que você fala do jeito que quiser eu falo do jeito que eu quero. Você não manda em mim.
— Não mando? — ela ri com escárnio. — Sou sua mãe, mando em você tanto quanto o presidente manda no país.
— Não é minha mãe — declaro com frieza. — Nunca se deu esse título, não é hoje que dará.
— Preste atenção no que diz sua ingrata!
— Ah, ingrata! — solto uma risada. — Com certeza! Não sou nem um pouco grata por nada que vem de você. Não é minha mãe.
— Te dei a luz, carreguei você por nove meses em meu ventre e não sou sua mãe? — retruca.
— Do que adianta tudo isso se não deu amor, não deu afeto? Acha que um filho é só carregar no ventre por um determinado período de tempo, dar-lhe a luz, dar roupa, comida e um teto estará tudo certo? Não somos animais. Seres humanos necessitam de apoio, de carinho, de amor. Ao contrário de você, Amélia me deu tudo isso e um pouco mais. Ela daria a vida por mim enquanto você tenta salvar o próprio pescoço. Isso é mãe. Amélia é minha mãe, não você.
Alguém funga ao meu lado. Amélia está chorando.
— Entregaremos Bella e ponto final. Ligue para o credor e marque o dia e a hora, se não fizer eu mesma o farei — Ruth sibila para Jack e passos firmes são ouvidos saírem do escritório e se distanciarem.
Ruth vai me entregar para um desconhecido por…por dinheiro! Eu não acredito. Eu não imaginava que ela me odiasse tanto dessa forma. Eu sinceramente não precisava saber disso. Eu sou uma bastarda de todas as formas aos olhos dela. Nunca tive valor algum, bem, agora tenho não é? Vão me comprar com dinheiro. Isso é demais para mim, não acha?
— Desculpa, Bel — Jack gagueja. — Eu falhei como seu irmão, eu falhei — ele me abraça pela primeira vez em toda a vida e eu o agarro, engolindo o choro. Ele me aperta contra si com força.
— Jack você não falhou, você tentou. O problema sou eu por ser tão imprestável — soluço.
— Não repita o que aquela mulher diz.
— O problema não somos nós, é Ruth — Amélia funga me abraçando por trás.
Ficamos nós três ali abraçados chorando.
— Minha pequena Bel! Eu nunca mais vou te ver na minha menina.
— Não Amélia — Jack funga. — Eu vou encontrar uma forma de salvar Bel de Oliver, para ele ela não ficará. Eu prometo, nem que eu tenha que entregá-la ao inimigo mais temido dele. Para Oliver, não.
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