Droga!
Meu café, meu pobre dinheirinho gasto naquele momento era apenas uma mancha no chão, após o baque em meu ombro que fez o copo voar longe devido a forma brusca do impacto.
Quem diabos seria tão desatenta ao ponto de causar tamanho desperdício?
Virei com raiva para encarar a pessoa que esbarrou em mim, mas por incrível que pareça ela sequer havia parado para avaliar a situação ou pedir desculpas, já saía na calçada com seus longos cabelos sendo jogados de um lado para o outro. Observei que usava roupa de academia, era uma mulher e parecia falar ao telefone enquanto carregava o próprio copo de café — intacto por sinal.
A única com prejuízo havia sido eu, mas como não sou a pessoa mais ajuizada do mundo e sendo a mais financeiramente fodida possível, saí a passos largos seguindo a estranha mal educada.
— Ei, você aí! — chamei alto o suficiente para que boa parte das pessoas que passavam na calçada me olhassem estranho, mas a responsável pelo desastre continuou andando e falando no celular até parar ao lado de um carro. E que carro! — Ô bonitinha! — continuei e ela finalmente pareceu ouvir.
A mulher que já abria a porta do veículo, apoiando o celular entre o ombro e a orelha, virou o suficiente para me olhar. Me aproximei o suficiente e ela pareceu finalizar a ligação voltando toda atenção a mim.
— Falou comigo? — questionou se endireitando e só então percebi o tamanho da beldade.
A mulher era extremamente linda. Não suficiente, ela tinha um olhar afiado e gestos que deixariam qualquer um babando tamanha sensualidade. Não que estivesse sensualizando para mim, pelo contrário, ela parecia bem natural e até mesmo confusa, não entendendo o motivo de meu chamado. A estranha claramente tinha algo que atraía qualquer pessoa — não importando o sexo — eu podia sentir isso porque estava complemente encantada sem que ela tivesse feito nada.
— B-bem... — Me faltaram palavras. Ótimo, estava gaguejando e minha mente ficou em branco. Meus olhos vacilaram indo para todos os lados até parar em meu par de tênis brancos sujos pelo café, me fazendo lembrar o real motivo de estar alí. — Você esbarrou em mim lá dentro e sequer pediu desculpas.
— Não lembro de ter esbarrado em ninguém...
— Como não? — Revirei os olhos. — Você é dormente? Meu café foi todo pelo ralo! Agora tenho um par de tênis sujo e nenhum centavo pra outro café
— Ah, então é isso? — Ela abriu a porta do carro e inclinou-se deixando a bela visão da bunda inclinada que me fez desviar o olhar tentando parar de observar certos detalhes como se fosse um tarado idiota parado no meio da rua babando em uma mulher atraente. — Aqui.
Voltei a olhar para ela que estava novamente de pé diante de mim, segurando algumas notas de dinheiro. Arqueei as sobrancelhas, colocando as mãos na cintura, olhando desde o dinheiro até a cara dela. Fiquei incrédula e ela parecia já impaciente diante da minha falta de palavras.
— É assim que você resolve as coisas? — questionei.
— Olha, estou atrasada e não tenho tempo para ficar papeando no meio da rua. — Com toda a delicadeza do mundo ela pegou minha mão e depositou o dinheiro, mas quando já ia afastar prendi seus dedos com os meus impedindo.
— Sério? Vai me pagar e fica por isso? É assim que resolve as coisas no seu mundo?
— Meu anjo, no meu mundo eu sequer estaria aqui parada te dando atenção. — Senti os dedos dela apertando os meus e de supetão puxou meu corpo para mais perto, então pegou as notas da minha mão e me empurrou de volta, logo depois afastou-se e entrou no carro me deixando de pé na calçada.
Embasbacada.
***
Mais tarde naquele dia, estava tentando me concentrar no livro que lia, mas ficava difícil quando a imagem daquela estranha me vinha em mente e toda aquela cena durante a tarde passava diante de meus olhos como um filme.
Ricos!
Bufei dando de ombros, jogando o livro encima da escrivaninha. Mais um suspiro escapando por meus lábios e logo um coque se formando no alto de minha cabeça antes de levantar e ir para cozinha procurar algo para jantar.
A geladeira estava quase vazia, mamãe não tinha recebido dinheiro ainda e eu estava desempregada. Pelo menos até segunda-feira, quando finalmente começaria em meu novo emprego como assistente em uma agência de eventos.
— Como estou? — perguntou minha mãe parando na porta da cozinha.
Desviei os olhos da geladeira para observar ela fazendo pose usando um vestido de festa.
— Para onde vai desse jeito?
— Como assim para onde, Giulia? O Mauro me convidou para conhecer aquele barzinho novo, esqueceu?
Como pude esquecer o flerte dela com nosso vizinho da frente?
Minha mãe é uma mulher de espírito jovem e parece uma adolescente sempre que está apaixonada. Com Mauro não foi diferente, ela passou a plantar rosas na frente de casa e a cuidar muito bem delas, assim observava ele que sempre estava cuidando do próprio gramado e entre um bom dia e outro, eles começaram a bater papos matinais antes do trabalho.
— Está perfeita — afirmei.
— E você? Vai mesmo ficar em casa pleno sábado a noite? Devia chamar a Jéssica para comemorar seu novo emprego.
Dei de ombros enquanto abria o armário e pegava um pacote de pão de forma.
— Não tem como comemorar a saída do desemprego, mãe. De onde vou tirar dinheiro? — falei o óbvio, lembrando que foi uma dificuldade encontrar moedas perdidas nos bolsos de minhas calças jeans para comprar o café naquela tarde.
— Jovens... não sabem se divertir sem dinheiro. — Saiu ela resmungando.
— Divirta-se! — gritei antes de ouvir a porta da frente sendo fechada.
Meu domingo passou como sempre, faxina, tédio e sono. Quando vi já era segunda e o despertador me fazia saltar da cama com o coração acelerado devido o nervosismo por ser meu primeiro dia de trabalho.
A empresa era bastante conhecida no centro da cidade e muito requisitada, pois já havia realizado cerimônias de casamento de pessoas famosas, por isso era bastante procurada. Pela primeira vez na vida eu diria que tive muita sorte, por isso temia fazer alguma coisa errada e tudo ir por água abaixo.
De início percebi que o prédio além de lindo era daqueles em que logo cedo tem muita gente disputando espaço no elevador. Me espremi entre uma moça com perfume forte e um rapaz usando mochila nas costas, dificultando ainda mais as coisas. Eu não sou claustrofóbica, mas confesso que até chegar a meu destino foi uma pequena tortura.
Na recepção do andar onde havia uma moça muito bem vestida me informei sobre onde ficava a sala de Mariana Fernandes — a abençoada que me deu aquele emprego —, mas a moça informou que tinha ordens para que eu fosse direto até a sala da CEO. Não entendi, afinal eu seria assistente da Mari, que por sinal era irmã de minha amiga Jéssica.
Ok, devo admitir que aquele emprego não era tão sorte assim, afinal tinha um dedinho, ou talvez uma mãozinha toda da minha amiga.
Com o estômago revirando, segui para a sala que a moça indicou. Eu temia que o café da manhã voltasse a qualquer momento tamanho nervosismo, me questionando o quê a CEO queria comigo.
A secretária da mulher me informou que ela já me esperava e isso colaborou com a tremedeira em minhas pernas. Dei uma leve batida em seguida girei a maçaneta, abri a porta devagar e quando meus olhos foram até a mulher do outro lado da mesa, travei alí mesmo. Era ela, a mesma desastrada extremamente linda e sexy de sábado a tarde.
Na placa sobre a mesa em letras grandes e bonitas, estava escrito: Rafaela Bianchi. E ela com seus longos cabelos jogados para o lado direito do rosto, tinha o olhar fixo nos papéis em suas mãos, até me encarar fazendo um arrepio surgir em minha espinha.
Engoli em seco quando um sorriso de canto um tanto perverso surgiu nos lábios da mulher à minha frente.
Eu já estava nervosa, mas depois daquele olhar e sorriso, meu estado foi para níveis inimagináveis. Já não sabia bem como era falar, talvez tivesse voltado no tempo e me tornado um bebê que mal consegue balbuciar alguma coisa e que anda tropeçando, pois foi justamente isso que aconteceu, eu tropecei em meus próprios pés quando me forcei a caminhar até a cadeira diante da mesa.
A mulher não expressou nada diante de meu claro nervosismo, apenas me observou com uma calma assustadora até que sentasse, podendo relaxar ao menos as pernas.
— Que coincidência, não? — começou ela. — Estava aqui olhando seu currículo e notei que tem pouca experiência no ramo.
Gelei dos pés a cabeça, lembrando que havia uma foto horrorosa em meu currículo.
— S-sim, me formei em...
— Educação física — concluiu me deixando sem fala, então somente confirmei. — Mas nunca atuou na área.
— Perdão, mas eu já respondi todas essas perguntas para a moça no RH. Bem, eu já trabalhei em uma empresa anteriormente como recepcionista e a Mari...
— A Mari se solidarizou e decidiu ajudá-la diante de sua situação financeira. Tudo bem Giulia, não estou aqui para julga-la, simplesmente gostaria de conhecer melhor a pessoa que Mari escolheu a dedo como assistente pessoal. — Ela voltou a juntar os papéis sobre a mesa, desviando o olhar para eles. — Espero que dê seu melhor no trabalho, pois não costumo passar a mão na cabeça de pessoas contratadas por indicação. Agora, se me der licença.
— Garanto que não darei menos que o meu melhor — afirmei, não conseguindo esconder uma certa raiva em cada palavra e até mesmo no olhar que lancei para ela que não voltou a me encarar.
Mulherzinha nojenta! Tinha que ser justo ela alí? Tantas pessoas na face da terra e justamente a mulher sexy do Starbucks tinha que me recepcionar com sua maneira fria e estranhamente atraente?
Os céus estariam me testando para ver até onde aguento sob pressão?
Não era possível que depois de seis meses de desemprego eu teria que rebolar para não desagradar a CEO da empresa. No fundo eu já sabia que entrar num emprego daquela forma me faria correr o risco de passar por situações semelhantes, mas tinha que ser justo com aquela mulher?
— Finalmente encontrei você! — Em meio a minha reflexão assustei-me ao encontrar Mari no corredor. — Onde estava?
— Bem, a...
— A Rafaela te chamou, não é mesmo? — Observei ela revirar os olhos antes de me dar as costas. — Bem a cara dela — murmurou. — Vem, vamos ao trabalho.
Não posso dizer que aquele emprego seria difícil, muito pelo contrário, parecia divertido apesar de cansativo. Mari é responsável pela parte de decoração, então eu fiquei responsável por contatar fornecedores e anotar cada mínimo detalhe, principalmente durante as reuniões sobre os eventos. Naquela semana em especial seria um noivado.
Eu também era responsável pelo café, entre várias outras pequenas coisas que me deixavam sempre em movimento.
Não voltei a ver a tal Rafaela durante aquela semana e confesso ter sentido um certo medo de esbarrar com ela em algum lugar da agência, mas não aconteceu.
Com o fim de semana se aproximando, estava eu na cafeteria do outro lado da rua em que fica o prédio da empresa. Não era meu lugar favorito, primeiro porque os preços eram absurdos e segundo porque as pessoas da agência estavam sempre por lá e eu senti uma certa dificuldade em interagir com eles, não sei bem o motivo, mas meu santo não bateu com o de ninguém alí.
— Senta aqui com a gente, Giulia — chamou Mel, uma das garotas da área de marketing, como se ouvisse meus pensamentos enquanto estava encostada no balcão com meu capuccino em mãos.
— Você deve estar estressada, a Mari hoje tá uma pilha — comentou Rhuan, também do Marketing, quando me aproximei da mesa.
— Será que a Rafaela não deu conta do recado ontem a noite? — O comentário de Mel me fez arquear as sobrancelhas, mas todos riram concordando com ela.
Como assim, Rafaela e Mariana tem alguma coisa?
— Ouvi ela gritando com você logo cedo — disse Rhuan me olhando e todos pareciam esperar uma resposta.
— Um fornecedor estava dificultando as coisas, nada demais... — Dei de ombros.
— Relaxa Gi, você pode desabafar com a gente. — Mel colocou a mão em meu ombro — Ninguém naquela empresa aguenta mais os dramas dela por causa da CEO. Esse foi o pior romance de escritório que poderia ter acontecido porque as duas tem um temperamento horrível.
— Verdade, em dois anos nós já vimos de tudo daquelas duas — concordou uma outra moça.
— Dois anos? — Não pude evitar demonstrar surpresa.
— Dizem que agora elas estão mesmo separadas, mas não boto muita fé — Rhuan deu um gole no café enquanto as outras três garotas sentadas ao redor da mesa confirmavam.
Eu nunca ia imaginar que a Mari fosse lésbica, ou bi, pan... enfim, que ela é do vale. Afinal sou amiga da Jéssica há anos e confesso que durante a adolescência tive uma certa queda por elai, que é irmã mais velha de minha amiga. Mas sempre que eu visitava elas a Mari estava saindo ou chegando de uma farra e nunca me deu muita atenção.
Como eu ia adivinhar? Vergonhosamente meu gaydar nunca foi muito bom.
Em meio a meus pensamentos consegui juntar as peças, lembrando de meu primeiro dia de trabalho quando Rafaela me chamou apenas para especular alguma coisa que na época não saquei. Então era isso? Ciúmes!
Quase ri da minha desgraça por não perceber que naquele momento estava no meio de um casal problemático. Bom, mas isso passou e eu não tinha mais nada a ver com aquelas duas.
...***...
— Como estou? — Minha mãe surgiu abrindo a porta de meu quarto me fazendo desviar os olhos do livro e analisar seu vestido.
— Linda, como sempre. Para onde vai? — Olhei o relógio em meu celular e era um pouco mais de sete da noite.
— Mauro me convidou de última hora para jantar com as filhas dele. — Ela riu, visivelmente nervosa. — Na próxima você vai também.
— Ok, divirta-se então.
Eu até tinha pensado em dizer que não queria me envolver em nada disso. Não queria ir a nenhum tipo de jantar em família, mas deixei que ela saísse sorrindo feito uma boba apaixonada cantarolando, me fazendo rir voltando o olhar para o livro até ouvir vozes na frente da casa, então decidi ir até a janela observar mamãe que abraçava Mauro e logo depois os dois atravessavam a rua até a casa dele de mãos dadas.
Voltei para meu livro e passou-se poucos minutos até meu celular vibrar, era minha mãe ligando, pedindo que eu levasse o saca rolhas, pois Mauro não estava encontrando o dele. Não suficiente, ela pediu que eu me vestisse adequadamente para aproveitar e ficar para jantar com a família. Claro que eu queria inventar qualquer coisa para evitar esse encontro famíliar com estranhos, mas mesmo assim não reclamei para não quebrar o clima dela, então apenas coloquei uma roupa mais apresentável, prendi meus cabelos que estavam uma bagunça e fui pegar o bendito saca rolhas.
Atravessei a rua com uma falta de ânimo enorme, pois definitivamente meu livro estava bem mais interessante. Dei duas batidas na porta da casa e ela logo foi aberta por uma garota com sorriso de orelha a orelha.
— Que rápida, Gi! — disse, como se me conhecesse há tempos. — Sua mãe não parou de falar sobre você. Vem, entra!
— Não, eu só vim trazer iss...
— Não faz nenhum sentido o papai ter convocado todas as filhas para conhecer a nova namorada e você que está do outro lado da rua, não estar presente! — Ela agarrou em meu pulso e praticamente me arrastou para dentro da casa. — Ah e prazer, eu sou a Hanna.
Não tive tempo de reação para nada, pois logo estavamos na sala de jantar onde avistei minha mãe rindo de maneira animada, assim como Mauro, mas o que atraiu meus olhos causando uma enorme surpresa foi a mulher ao lado dele. Era ela, Rafaela Bianchi.
— Ainda não consigo acreditar em tamanha coincidência — repetiu minha mãe pela décima vez.
Já estávamos terminando o jantar. Rafaela já havia comentado de uma forma bem clara sobre termos nos encontrado antes, na agência. Eu nem queria entrar muito em detalhes, mas o pai dela começou a me encher de perguntas.
Passei o tempo todo sem jeito diante do olhar e a postura da CEO que estava sentada bem na minha frente. Por sorte, Hanna que era bem tagarela, estava sempre mudando o assunto da conversa.
— Adorei o jantar e a conversa, mas agora se me derem licença vou fazer vídeo chamada com meu maridinho — anunciou Hanna levantando da cadeira e saindo rapidamente.
— Ele está viajando a trabalho — explicou Mauro quando a filha sumiu no corredor.
— Hanna parece bem jovem, quem olha pensa que ainda tem dezessete — comentou minha mãe.
— Realmente — confirmou o homem. — Casou-se cedo.
— E você Rafaela, pensa em casamento? — Minha mãe e seus questionamentos. — Tem cara de quem é mais focada no trabalho.
— Pelo que vejo você lê bem as pessoas — falou a Bianchi, enchendo novamente a taça de vinho. — Não tenho planos de casar.
— A Rafa sempre foi muito estudiosa e focada nos próprios objetivos. Não é atoa que agora administra o próprio negócio — disse Mauro todo orgulhoso. — Mas não pense que esqueci os netos que me prometeu quando mais jovem — brincou.
Pela primeira vez vi a mulher ficar sem jeito, dando um sorriso que fez seus olhos ficarem apertadinhos. Ela baixou a cabeça e vi seu sorriso sumir, seu rosto tomando outra expressão, como a anterior fosse apenas fachada, para não demonstrar o quão incomodada ficou.
Será que ele sabia sobre a sexualidade da filha? Me perguntei. Bom, não era da minha conta.
— A Gi é uma encalhada. — Minha mãe soltou aquilo simplesmente do nada e meus olhos quase saltaram. — Nunca focou muito nos estudos, mas também não vejo sequer sair com ninguém para se divertir de vez em quando. Mas aos menos a idade fez com que buscasse algo melhor profissionalmente, tanto é que está na agência...
— Mãe — murmurei entredentes.
A minha sorte foi que Mauro, mesmo rindo — de mim com certeza — mudou o assunto, chamando ela a juntar-se a ele na lavagem da louça e assim o assunto morreu. Me ofereci para ajudá-los, mas eles queriam ter aquele momento a sós, como se fosse algo muito divertido, então apenas levantei me preparando para ir embora, mas Rafaela fez o mesmo e pegando a garrafa de vinho me lançou um olhar intimidador.
— Que tal uma última taça na varanda? — convidou e eu pensei em negar, mas não queria fugir assim, então apenas confirmei e após pegar uma taça seguimos até a varanda na frente da casa.
A rua estava vazia, somente lá na esquina algumas crianças brincavam fazendo algazarra. O céu estrelado tentava se destacar mesmo com a iluminação da cidade. O vendo frio me fazia estremecer um pouco. Observei Rafaela enchendo a taça dela e logo em seguida a minha, depois colocou a garrafa encima do parapeito e encostou-se ao mesmo.
— Meu pai é viciado nesse vinho — comentou observado a taça entre as mão. — Mamãe odiava que ele bebesse, mesmo que não cometesse exageros. Ela não gostava de nenhum tipo de bebida e diversas vezes tentou mudar isso nele. — Ela virou o rosto para me olhar e os lábios se curvaram em um breve sorriso. — Espero que dê tudo certo entre ele e sua mãe.
— Eles parecem se dar bem — comentei, também me apoiando ao parapeito.
O silêncio se fez presente nos minutos seguintes. Dei um gole na bebida tentando me manter calma, pois aquela situação era meio desconfortável.
— Está indo tudo bem no trabalho? — Ela quebrou o silêncio.
— Acho que você saberia caso não estivesse. — Quase bati em minha própria boca após dizer aquelas palavras. — Quero dizer...
— Você tem razão, estou por dentro de todos os assuntos de minha agência.
— Podemos deixar uma coisa bem clara? — falei o mais séria possível. — Eu não tenho nada a ver a Mari. Sou amiga da irmã dela, somente isso.
— Eu não...
— Sei o que pensou por eu ter entrado lá como assistente dela.
— Giulia, imagino que tenha ouvido muitas fofocas a meu respeito, mas ao contrário do que possa estar pensando, não costumo misturar minha vida profissional com a pessoal, tanto é que a Mari ainda trabalha comigo. Minha única curiosidade em relação a você foi devido seu currículo e... Confesso que após ver sua foto lembrei de nosso primeiro encontro, então quis apenas confirmar.
— Tudo bem então — murmurei antes de tomar mais um gole de vinho, tentando não pensar em minha foto.
— Sei que te devo um café — disse. E eu levantei o rosto para olhar em seus olhos. — Naquele dia eu estava uma pilha, mas depois analisei bem a situação e percebi que fui uma idiota.
— Não... — me interrompi enquanto pensava um pouco. — É, você foi — confessei e ambas sorrimos. — Mas não preci...
Me interrompi novamente quando meus olhos focaram na figura no outro lado da rua. Era Jéssica nos encarando com os braços cruzados e o pézinho nervoso batendo na calçada. Como eu conhecia muito bem minha amiga, rapidamente pedi licença a Rafaela e deixando a taça de lado, sai quase correndo ao encontro da outra que me fuzilava com o olhar.
— O que faz aqui a essa hora? — questionei ao me aproximar.
— Sou eu quem faço as perguntas aqui, dona Giulia. — Ela lançou mais um olhar na direção de Rafaela, logo depois segurou em minha mão me arrastando para a porta de casa. — Que flerte era aquele com a Rafa?
Arregalei os olhos ao ouvir aquilo, mas não respondi de imediato. Abri a porta e empurrei ela para dentro, não deixando de dar uma última olhada para a varanda onde Rafaela descaradamente mantinha o olhar fixo em nós, então fechei a porta e me voltei para Jéssica.
— Não tem flerte nenhum! Pirou?
— Me diz você! Não acredito que está de rolo com a ex da Mari.
— Qual o problema? Quero dizer, não estou de rolo coisa nenhuma!
— Amiga, a Rafa e a Mari tiveram a relação mais problemática de todos os tempos. Não se mete nisso por favor, é cilada. Maldita hora que pedi para ela te ajudar com o emprego.
— Ei, ei, ei! Jéssica por favor, para de enrolar as coisas, eu não tenho nada a ver com a Rafaela. Caramba, ela é filha do novo namorado da minha mãe, dá pra acreditar?
— O quê?
Jéssica estava tão surpresa quanto eu. Expliquei tudo o que rolou naquela noite e aproveite para incluir como conheci Rafaela, para que não ficasse nenhum mal entendido. Não pedi explicações sobre o relacionamento da irmã dela e a CEO, pois não era da minha conta, então era melhor apenas manter distância, até porque quem estava namorando era minha mãe, então não havia motivo para ficar mantendo contato com Rafaela. Tudo permaneceria em seu devido lugar.
Ficamos conversando por horas, afinal fazia tempo que nosso trabalho não nos permitia tempo para papear daquela forma. Jéssica era muito mais ocupada que eu e como estava namorando, dificilmente restava tempo para sair um pouco e relaxar, mas nós estávamos sempre trocando mensagens e ela até mesmo me ajudou com o emprego.
...***...
Na terça-feira minha TPM havia me torturado bastante, então após o expediente decidi me presentear com uma deliciosa torta de chocolate.
Entrei na cafeteria que ficava na frente da empresa, fiz o pedido e enquanto entregava o dinheiro para a caixa, outra mão se sobressaiu a minha me assustando.
— Inclui dois cafés no pedido dela — falou Rafaela a meu lado. E eu embasbacada encarei ela com o rosto bem próximo, mantendo o olhar na atendente. — Tudo em meu cartão, ok Lana? — Ela piscou para a garota, em seguida me encarou.
— Não...
— Não aceito não como resposta. — O olhar felino parecia ameaçador, então me resumi a dar um passo atrás tentando me manter sã em uma distância mais confortável. — Relaxa Giulia — falou baixo o suficiente para que somente eu ouvisse, tornando aquele momento um tanto desconfortável para mim. — Você sempre fica muito tensa quando estou por perto.
— O-o quê? — Sorri sem graça e abri a boca para retrucar, mas a moça do caixa devolveu o cartão dela que após um sorriso saiu desfilando pelo café, indo embora sem nem esperar para pegar o pedido.
— Mais alguma coisa? — A tal Lana do caixa perguntou com uma sorriso que me fez questionar se era para mim ou de mim.
Neguei e segui até uma mesa perto da parede de vidro que dava para a rua, a tempo de observar Rafaela entrando no carro e logo indo embora.
Até mesmo a forma dela se redimir era exagerada. Minha vontade era obriga-la a agir como uma pessoa normal para evitar que se repetissem momentos contrangedores como aqueles que me meti desde que nos conhecemos, mas eu não tinha nada a ver com ela e definitivamente estávamos quites. O assunto Rafaela Bianchi estava morto.
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