NovelToon NovelToon

Um Destino... O Amor! "Dr. Amor"

01

PRÓLOGO

“A nossa vida é uma sucessão de transformações...”

GABRIELA

8 ANOS ATRÁS

Estava na cama, aninhada nos braços do homem que tenho certeza que será a razão da minha vida. A todo momento o fitava, e sorria quando ele tocava “daquela” maneira em mim.

— Você é a mulher da minha vida, Gabriela. — Ele beijou meus lábios de uma forma terna.

— Adoro quando fala isso para mim, sabia? — Me aninhei decidida em seus braços fortes.

— Eu adoro falar isso para você, meu anjo. Você é a razão da minha existência, e nunca te abandonarei.

— Me promete, Enzo?— Olhei com medo em seus olhos, procurando qualquer traço que seja de hesitação, mas ainda bem que não encontrei.

— Sim. Irei até o fim com você, Gabriela.

Não sei bem o porquê, mas senti que suas palavras soaram verdadeiras…

CAPÍTULO 1

“Quando nossos corações nos pregam uma peça, não há como desviar...”

ENZO

Estava bastante atrasado para meu compromisso, mas ainda havia uma paciente que não havia sido atendida. Olhei no sistema o seu nome, e fiquei um pouco paralisado. Gabriela Paixão? Não é possível que seja quem estou pensando...

Relevei.

Sei que várias pessoas têm o mesmo sobrenome, e por isso me acalmei um pouco mais. Após liberar a entrada dela pelo sistema, esperei por alguns momentos revivendo alguns acontecimentos que ocorreram certos anos atrás com uma mulher que tinha exatamente o mesmo nome da minha próxima paciente.

Em um súbito momento, ouvi uma pequena batida em minha porta. Como de praxe, pedi para a pessoa entrar, mas eu realmente não esperava o que aconteceu em seguida...

Quando a vi entrar, um misto de sensações me acometeu. Perdi o foco e a fala. Fiquei nervoso e não consegui parar de fitá-la por uma grande fração de tempo.

É ela.

— Gabriela? — Olhei aturdido para aquela mulher que anos atrás fez parte da minha vida.

— Boa tarde, doutor. — Ela sorriu sem graça.

Vários instantes se passaram, mas eu não conseguia expressar mais nenhuma palavra, tamanho o meu desconforto com essa situação. Vou explicar para vocês o motivo de estar assim...

Conheci Gabriela quando ela completou 16 anos de idade. Na época eu tinha 17 anos, e era uma pessoa bastante centrada em meus objetivos. Sempre tive o sonho de ser médico e por isso sempre estudei para que minhas notas alcançassem uma média exorbitante para realizar meu sonho.

Uma festa de aniversário foi o ápice para que eu me encantasse com o jeito de Gabriela. Ela era diferente das outras mulheres, e isso me chamou a atenção, bem lá no fundo.

Gabriela sempre foi muito tímida, e tinha poucas amigas na época. Quando a olhei pela primeira vez, senti algo estranho em meu peito. Sabe quando o coração acelera do nada quando olhamos para uma pessoa específica? Então, foi isso que ocorreu, e na época eu não sabia como lidar com essa situação, muito menos com esse sentimento que havia brotado em meu peito.

O tempo foi passando e a minha coragem foi aumentando em tentar alguma aproximação. Confesso, antes eu era tímido, até demais para o meu gosto. Hoje... bem, sou extremamente o oposto.

Mas, voltando a nossa história, o fato é que conversamos somente quando Gabriela completou 17 anos de idade. E, se for para resumir os fatos, três meses depois do primeiro diálogo começamos a namorar.

Gabriela sempre foi uma linda mulher, a mais bonita que tive a oportunidade de conhecer. Sua pele morena contrastava com seus cabelos escuros. Seu corpo era todo natural, e por isso me deixei fantasiar por vários momentos com o que ela escondia por debaixo de suas roupas. Eu disse anteriormente que ela era a mulher mais linda que tinha visto por causa desses aspectos, mas tinha mais, bem mais...

Seus olhos verdes, juntamente com seus cabelos negros me lembravam algumas atrizes de Hollywood, vocês podem pensar que é exagero, mas não é! Além de tudo, ela media 1,75m e tinha imposição, apesar de ser tímida. Ela chamava a atenção onde passava...

Depois que começamos a namorar, tudo em nossa vida começou a dar certo. Ficamos juntos por 2 anos, e vários planos foram feitos, mas estraguei tudo. O fato é que a abandonei e nunca me perdoarei por isso. Fui um crápula, pois feri seus sentimentos. A esperança que ela depositou em mim foi totalmente retalhada e eu a deixei.

Só Deus sabe o quanto me arrependi disso, mas acabei fazendo o que a razão mandou, e deixei meu coração fora desse assunto específico.

Prometi que ficaríamos juntos, mas na primeira oportunidade saí da cidade e fui seguir meu sonho de ser médico. Na época, eu era jovem, mas sei que o que fiz foi imperdoável. Não estou fazendo tempestade em copo d’água, longe disso. Nem preciso dizer como ela se sentiu. Apesar de ela ter sugerido a ideia de namorarmos a distância, sequer considerei essa possibilidade. Por dentro eu estava quebrado, mas fui até o fim e não cedi, iria completar meu objetivo e me formar com excelência.

O que mais me deixa triste é que prometi que estaria sempre ao seu lado. Inúmeras vezes disse que a amava e que em nenhuma hipótese a deixaria. Não sei se esse foi o meu maior erro, mas joguei minhas palavras ao vento, pois a abandonei.

Por mais que faça bastante tempo, não me esqueci de Gabriela. Eu posso levar uma vida desapegada, sair com várias mulheres, até mesmo transar todos os dias, mas ela continua em meus pensamentos. A maioria das coisas que disse a ela naquela época eram verdade, mas sei que ela jamais me perdoaria por tê-la abandonado do modo que fiz.

Confesso, se pudesse voltar no tempo, daria um jeito de tentar mudar as coisas...

— Posso me sentar?

— Claro. Me desculpe. — Ela me despertou das lembranças antigas que estavam me acometendo.

— Obrigada. — Ela se sentou e me fitou.

— Sem problemas. — Sorri. — Tem muito tempo, não é? — Tentei puxar algum assunto.

— Como assim? — Ela me olhou desconfiada.

Havia vários anos que não nos víamos. Será que ela estava jogando comigo ou não se lembrava mais de mim?

— O que te trouxe aqui? — Mudei um pouco o assunto.

— Bem... eu sofri um trauma na cabeça, e... não me lembro de um pedaço da minha vida. Fui aconselhada a consultar com você, pois poderia me passar para um traumatologista, e...

— Espera... você sofreu uma pancada? — Meus olhos quase saltaram para fora depois de ouvir isso.

— Sim, eu... — Ela responde levemente assustada.

— Isso é sério? Você se recorda da sua adolescência? Do que... você se lembra exatamente? — A interrompi surpreso.

Além de tudo, fiz várias perguntas em poucos segundos. Por causa dos vários questionamentos rápidos, acabei confundindo ela.

— Eu... não me lembro de muita coisa, doutor.

Doutor?

Será que Gabriela não se lembra mais de mim? Eu preciso ter certeza disso.

— Você tem alguma lembrança... de mim?

Gabriela ficou assustada com o modo direto que perguntei. Vi que ela não estava confortável ainda em minha presença.

— Me desculpe... eu deveria me lembrar de você? A gente se conhecia?

Pela segunda vez perdi a fala. Gabriela não se recordava de mim, e isso me afetou mais que o normal.

— Fomos amigos algum tempo atrás, antes de começar a faculdade de Medicina — disse depois de vários segundos pensando no que falar.

— Éramos muito amigos?

Mais do que imagina, pensei comigo.

— Sim.

Ela ficou algum tempo tentando lembrar algo, mas por fim, desistiu.

— Me desculpe por não lembrar, eu... tento me esforçar, mas não consigo recordar de alguns fatos.

— Ei, se acalme. Irei te ajudar.

Disse essa frase no automático, mas ainda não tinha noção do que faria. Tantos anos juntos esquecidos dessa maneira... não estava sabendo lidar com essa situação.

— Eu preciso ser direta, me falaram que eu só tenho dez minutos, se...

— Se equivocaram! — Fui firme após interrompê-la. — Você tem o tempo que desejar.

— Verdade?

— Sim.

Na verdade, ela teria somente dez minutos, mas não iria deixá-la sair daqui enquanto não descobrisse o que havia realmente ocorrido com ela.

— Tudo bem. Me sinto mais confortável se te contar a história desde o começo.

— Tenho todo o tempo do mundo. — Menti.

— Certo. — Gabriela ficou relutante por alguns instantes. — Eu me casei há 3 anos.

Imediatamente após ela dizer essa frase, meu coração se apertou. Os sentimentos do passado tomaram conta de mim, e confesso que fiquei com ciúmes de ouvir essas palavras, mesmo depois de tanto tempo sem vê-la.

— Certo.

— Ainda me lembro muito como era a relação com ele, mas mesmo assim,

nos divorciamos cerca de 6 meses atrás.

Um grande alívio percorreu meu corpo. Havia gostado de ouvir essa notícia.

— Pode prosseguir. — A encorajei.

— Fui encontrada pela minha amiga em meu banheiro, cerca de um ano atrás. Eu estava inconsciente. Os policiais disseram que fui agredida com um taco de beisebol.

— Como é? — Levantei da mesa. Fiquei irado em ouvir essas palavras.

— Meu ex-marido me agrediu, mas não me lembro do ocorrido. Estou dizendo isso por causa do inquérito que foi instaurado, e por causa da confissão dele.

Soquei a mesa, não me contive. Gabriela se assustou, mas não consegui me conter.

— Me desculpe, não queria lhe assustar, Gabriela. — Balancei a cabeça em negação. Não podia me descontrolar dessa maneira.

— Não tem problema. — Seus olhos estavam fixos em mim.

— De verdade... me desculpe.

Ela sorriu um pouco sem graça.

— Depois desse episódio, fiquei em coma por alguns meses. Fiquei entre a vida e a morte, pois a pancada que recebi foi bastante intensa. Ao acordar, notei que havia perdido a minha memória, pois não havia conseguido me lembrar nem dos meus pais e nem da minha irmã. Mas, com o tempo, fui recordando algumas coisas.

— E continua se lembrando?

— Não, estagnei. Eu vim para essa clínica, pois fiquei sabendo que o traumatologista daqui é muito bom, e... resolvi arriscar. Eu quero recuperar a minha memória, eu quero... viver.

Gabriela começou a chorar, não pensei muito e fui em sua direção. Ao abraçá-la, em um primeiro momento pensei que seria repelido, mas Gabriela me segurou forte e chorou em meu peito.

Todo aquele sentimento que insisti em esconder voltou à tona de uma forma que não consigo descrever. Vê-la aninhada em meus braços desta forma fez com que eu voltasse no tempo, e me vi perdido em seu cheiro e em seu corpo que pulsava quando estava junto do meu.

— Me desculpe, doutor. — Ela se afastou enquanto enxugava as lágrimas

que brotavam em seu rosto.

— Me chame de Enzo, por favor. E não tem problema, como disse antes, éramos próximos.

— Tudo bem.

Após nos sentarmos, voltei a fazer algumas perguntas sobre a vida de Gabriela. Definitivamente, eu irei ajudá-la.

— Você ainda tem contato com seu ex-marido?

— Não — ela disse firme.

— Graças a Deus!

Gabriela me olhou com uma cara desconfiada, mas riu logo depois.

Seu sorriso não havia mudado nada, muito pelo contrário, estava mais lindo que quando a conheci.

— Éramos amigos, então... eu fico assim. — Sorri para ela.

Não podia demonstrar tanta firmeza. Gabriela precisava confiar em mim, por mais que o erro de não estar com ela seja meu.

— Obrigada por se preocupar comigo.

— Sempre irei me preocupar com você. Adorei rever você neste momento. Preferia que fosse para uma consulta normal.

— Você me conhece há muito tempo?

— Um tempinho.

— Hmm.

— Te conheci quando completou 16 anos de idade, e a última vez que te vi, você estava com 19 anos de idade.

— Tem 7 anos que não me vê.

— Sim.

Por erro meu!

— Houve alguma coisa para nos afastarmos?

— Passei no curso de Medicina em outro Estado e por isso tive que sair da cidade. — Resumi os fatos.

Mesmo sabendo que sempre tive escolha, me arrependo de tê-la deixado.

— Entendo.

— Gabriela... irei fazer várias perguntas, é de praxe.

— Tudo bem.

— Qual sua última lembrança? O que vem em sua cabeça quando tenta se lembrar de alguma coisa do seu passado?

Gabriela parou por alguns instantes tentando lembrar-se de algo.

— Me lembro de tudo dos meus 15 anos para trás. Mas tem um problema nisso tudo.

— Qual?

— A partir de uma data específica, eu começo a ficar confusa.

— Me explique melhor.

Notei que Gabriela estava um pouco relutante e duvidosa com algumas coisas.

— Eu me lembro de alguns acontecimentos dos meus 16 anos em diante, mas coisas picadas, entende? Recordo de alguns episódios com 23 anos, outros com 24, mas ao mesmo tempo em que me lembro de certos acontecimentos com essa idade, não tenho conhecimento de outros.

— Você quer dizer que se lembra de algumas coisas com uma idade específica, e não se lembra de outras no mesmo ano, é isso?

— Isso mesmo. — Ela assentiu. — Na época que eu tinha 23 anos de idade, tenho lembrança do aniversário de uma amiga minha que ocorreu no mês de março, mas não me lembro das festividades dos 20 anos de casamento dos meus pais que ocorreu em maio, entende? Me parece que algumas coisas estão desconexas em minha cabeça.

— Certo. Você se lembra de algo neste mesmo ano após o mês de maio?

— Sim, me lembro do aniversário da minha irmã em dezembro.

— Entendi.

— Minha cabeça está complicada, não sei bem o que faço para reviver essas lembranças. — Seus olhos ficaram marejados novamente. — Tem um período da minha vida, cerca de 6 anos atrás, mais ou menos, que não me lembro de absolutamente nada.

Ela não sabe, mas essa deve ser uma parte do período que namoramos. Mesmo assim, ela deveria se lembrar de mim, pois nos conhecemos com uma idade relativamente baixa.

— Gabriela... não esforce sua mente. Tudo irá acontecer no seu devido tempo. Você já se lembrou de boa parte da sua vida, é questão de tempo para que você se recorde de tudo.

— Você acha isso, Enzo?

Adorei ela falar meu nome igual antigamente. Esses sentimentos que Gabriela estava despertando em mim são difíceis de serem ditos.

Sei que falar desse jeito não foi muito certo, pois não posso garantir que ela irá se lembrar de tudo, mas eu precisava confortá-la de alguma forma, principalmente porque ela fez parte da minha vida.

— Tudo irá se resolver, você vai ver.

— Eu tenho medo dele voltar... ele já me procurou e ameaçou.

Meus olhos começaram a soltar faíscas depois de ouvir isso. Após tudo que esse infeliz causou, ele ainda a está procurando?

— Minha vontade é de esfregar a cara dele no chão neste momento.

Gabriela riu um pouco.

— Não sabia que apesar do tempo você ainda se preocuparia comigo.

— Sempre irei me preocupar com você, pois...

Parei.

Não posso dizer a ela que a abandonei, não desse modo. Ela já está passando por várias coisas e não quero piorar a situação.

— O quê?

— Você foi uma pessoa bastante especial em minha vida — disse por fim.

Gabriela sorriu sem graça.

— Obrigada. Conversar com você está me fazendo muito bem. Pensei que seria uma simples consulta, mas que bom que nos conhecíamos.

— Sim. Irei te ajudar em tudo que precisar. Hoje mesmo encaminharei você para meu amigo, Renato, o traumatologista que você deve ter ouvido falar. Monitorarei seu desenvolvimento, não vou te abandonar, Gabriela!

Dessa vez não irei!

— Obrigada por tudo que está fazendo por mim, por mais que a conversa tenha sido por pouco tempo, notei que sua amizade por mim é verdadeira.

— Meu desejo é que tudo voltasse como antes. Realmente queria que ficássemos próximos, Gabriela.

— Não vejo problemas nisso. Fiquei curiosa em saber como era a nossa relação. — Ela sorriu para mim, e não perdi tempo.

— Irei deixar meu telefone particular com você. O dia que quiser poderemos conversar sobre esse período que passamos juntos.

Iria dar espaço a ela. Gabriela precisava disso.

— Eu também deixarei meu contato com você, Enzo.

***

— O que você tem hoje? Me parece tão aéreo.

— Não é nada — disse me esquivando. Não estava com muito saco para perguntas sobre minha vida pessoal, não depois do que ouvi de Gabriela em meu consultório.

— Hoje não está parecendo o “doutor amor” que me acostumei a ver... e sentir.

Olhei possesso na direção de Evelyn. Ela sabe o que acho do que ela disse nesta ocasião. Neste momento, estávamos nus na cama, após uma noite regada a sexo selvagem.

Após ver Gabriela fiquei tenso e precisava de algo para me acalmar. Felizmente, transar atenua a minha situação.

— Você sabe que odeio que me chamem de doutor amor. — Olhei irado em sua direção.

— Todas te chamam assim! — Ela foi dura. — Não adianta falar assim comigo! — Evelyn disse brava.

— Odeio esse apelido!

— Deveria adorar. Muitas mulheres que têm uma noite com você querem provar das suas “habilidades”.

Evelyn é desbocada, não a culpo por ser assim. Somos muito iguais. Queremos sexo sem compromisso. Algo forte, bruto, sem limitações.

— Que seja! Eu não estou aqui para provar nada e você sabe bem disso. Esse apelido deve ter sido inventado por alguma mulher que estava há muito tempo sem transar, só pode.

— Por que diz isso?

— Doutor amor?! Sério isso?! — Gargalhei, e Evelyn me acompanhou. — Amor é uma palavra muito forte, sei lá — complementei.

— Queria que fosse “doutor bruto”, “doutor gostoso”, ou alguma outra? — Ela se achegou em meu peito.

— Na verdade, eu preferia não ter nenhum apelido.

— Ahh... — Ela fez uma carinha triste.

— Só que confesso a você que isso pode ter me ajudado.

— Pode ter certeza que sim! — Ela me deu uma piscadinha.

Evelyn é tipo... uma ficante fixa minha, por assim dizer. Sua aversão a relacionamentos me deixa mais tranquilo para estarmos na presença um do outro. Algumas mulheres com quem me envolvo acabam se apaixonando. Não as culpo, e também não vou me gabar. Tudo que me proponho a fazer é bem elaborado e bem feito. Se elas se apaixonam, é um mérito meu.

— Preciso voltar para a minha casa. Amanhã chegarei um pouco mais cedo na clínica.

— Tudo bem.

Estávamos em um motel qualquer. Nunca levo mulheres para minha casa.

Não mesmo!

Depois de deixar Evelyn em sua casa, fui embora para minha residência. Confesso que o dia foi atípico, e com várias surpresas.

Fiquei vários minutos pensando em Gabriela. O que seu ex-marido fez com ela é imperdoável, e dessa vez não ficarei ausente da vida dela. O problema é se ela se lembrar de tudo e não quiser mais me ver. Mas, mesmo assim, ficarei observando-a, pois realmente me importo com ela…

02

“Algumas oportunidades serão aproveitadas...”

GABRIELA

Estava com uma camisola branca no topo de uma montanha.

Meus olhos estavam fixos no caminho rochoso que ficava posicionado em minha frente. Não sei o que me deu, mas fui caminhando em direção a sua extremidade.

Quando fui até o limite do pico, eis que cheguei bem na ponta de um precipício. Alguma força me movia para continuar andando sempre em frente, e eu não conseguia controlar perfeitamente meus movimentos.

Ao olhar para baixo e notar a vasta escuridão, alguns arrepios percorreram meu corpo.

O que eu estava fazendo aqui?

Por qual motivo continuei a caminhar para essa extremidade?

Por que meus pés não me obedecem?

Por um momento me estabilizei. Pensei que daria meia volta e retornaria ao ponto inicial, mas estava... imóvel.

É muito estranho essa sensação que está me acometendo. Por um momento consigo raciocinar perfeitamente, e no outro não consigo controlar meu corpo. Estou me sentindo estranha.

Instantes depois, meus ouvidos captaram alguma coisa. Tive certeza de que alguma pessoa estava vindo ao meu encontro. Não conseguia me mover, por isso não identifiquei quem era, pois estava de costas. Fiquei contemplando aquela escuridão no precipício que estava prestes a cair. Sim! Algo me dizia que eu mergulharia nesse vasto buraco negro.

— Vim te ajudar. — Uma voz masculina disse praticamente colada aos meus ouvidos.

— Graças a Deus! — sibilei.

— Está tudo bem. Você não irá se machucar. Confia em mim?

Pensei por um momento, mas disse: — Confio.

Senti suas mãos segurando meu quadril, e quando pensei que tudo iria acabar bem, notei que esse homem me empurrou no precipício...

***

Acordei assustada.

A maioria dos meus sonhos são confusos. Minha vida virou um inferno após sair do hospital.

Fui em direção ao banheiro e lavei meu rosto por inúmeras vezes. Olhei para o espelho e vi uma mulher que não tem noção do motivo de estar tendo sonhos dessa maneira. Na verdade, nem posso considerar o que estou tendo ultimamente como sonhos, mas sim pesadelos.

Após fazer minha higiene pessoal, saí do meu quarto. Ao chegar na sala, Claire já estava preparando o café da manhã.

— Bom dia, dorminhoca. — Ela sorriu para mim.

— Bom dia, amiga.

— Como foi a consulta? — ela me indagou.

Não havia visto Claire desde ontem pela manhã, e por isso não havíamos conversado sobre o horário exato que iria ao hospital.

Conheci ela quando estava cursando Administração em Orlando, no Estado da Flórida.

Sempre fomos muito ligadas, desde o primeiro período da faculdade. Além de tudo, nós duas nascemos na cidade de Miami, uma feliz coincidência. Agora que terminamos o curso, voltamos para nossa cidade natal.

Apesar de termos o temperamento um pouco diferente, sempre nos demos bem uma com a outra. Claire é uma mulher que fala o que pensa, e isso é uma característica marcante. Ela expressa sua opinião doa a quem doer, e não é o tipo de pessoa que segue um padrão específico. Se for para resumir, ela é autêntica.

Claire é pequena. Mas, vocês sabem, não é? Irritem uma baixinha para vocês verem! Eu fiz o teste uma vez e não deu muito certo. Minha amiga deve medir na faixa de 1,60... no máximo. Sou bem mais alta que ela e bem mais calma. Quando Claire explode... sai de baixo. Acho minha amiga muito bonita, pois ela é toda natural. Além de ruiva, possui os olhos castanho-claros, e uma boca carnuda de dar inveja. O problema maior dela em relação aos homens é que ela destruiu vários corações ao longo da sua caminhada. Ela não é de se apegar, e enjoa muito fácil deles, por isso seus casos duram no máximo um mês. Eu já sou um pouco diferente...

— Estou melhor — respondi sua pergunta a respeito da consulta. — Por incrível que pareça, conversar com o doutor Enzo me deixou mais tranquila.

— Fico feliz, amiga. Ele te encaminhou para algum especialista?

— Sim. E disse que vai acompanhar minha situação de perto. Ele falou que faz questão de monitorar meu processo, apesar de não ser a área dele. — Dei um pequeno sorrisinho de satisfação.

— Hmm.

Claire me deu um cutucão nada convencional.

— Pode parar com isso! — Olhei com uma cara de deboche enquanto gargalhava sentada na cadeira.

— Não disse nada. — Ela levantou as mãos.

— Sei que pensou. Eu te conheço, Claire — disse decidida.

Minha amiga é um pouco "direta" em alguns aspectos e provocativa em outros.

— Só acho que alguns médicos não são assim, nada mais.

— É aí que entra outra questão que me surpreendi.

— Qual? — Ela levantou as sobrancelhas de curiosidade.

— Ele me conhece... conhecia, sei lá. — Não sabia a palavra certa para usar nessa ocasião.

— Como é? — Claire soltou um gritinho.

— Isso mesmo. Fomos amigos durante um período. Ele fez faculdade em outro Estado, e agora voltou para a cidade.

— Não acredito! — Ela esbugalhou os olhos. — Isso é muito bom.

— Pois é. Só tem um pequeno problema.

— Que seria...

— Fico muito sem graça na presença dele. Isso se deve principalmente ao fato de saber que ele me conhecia. — Parei por certos momentos relembrando um pouco da consulta. — Posso ter mudado em muitas coisas desde então. E, como não me lembro dele, fiquei receosa em alguns momentos.

— Ele é bonito, desejável, gostoso?

— O que uma coisa tem a ver com a outra? — Comecei a balançar minha cabeça negativamente enquanto me ajeitava melhor na cadeira.

— Só responda, por favor. — Minha amiga fez uma cara séria. Tenho certeza que se não esclarecer suas dúvidas, terei grandes problemas.

— Sim. Até demais.

— Certo. — Ela sorriu.

— Agora posso saber o motivo da pergunta?

— Não é nada. Você fica um pouco sem graça na presença de homens bonitos, apesar de ser a amiga mais linda que tenho. Perguntei somente para ter uma comprovação, Gabriela.

— Não vou falar mais nada para você! — Simulei uma cara enfezada.

— O que eu fiz?! Eu, hein! — Ela me lançou um olhar enigmático, mas sabia que eu estava brincando com a situação que estava ocorrendo.

— Você adora joguinhos, amiga.

— Muito. — Ela se vangloriou. — Você precisa de um homem assim em sua vida.

Será que ela estava se referindo a um médico?

— Está me chamando de problemática?

— Você sempre foi problemática, Gabriela. Se conforme com isso, por favor. — Nós duas começamos a rir. — Estou falando de um homem que lhe traga segurança, entende?

— Acho que sim.

— Eu sei que se sente desprotegida depois de tudo que ocorreu com Antony. Quero que siga em frente, e vou te ajudar, pode ter certeza.

— Eu sei. Estou me preparando para isso. Você sabe que nunca fui uma pessoa de sair muito. Acho que a minha segurança é ficar quieta em casa, entende? Eu prefiro a tranquilidade do local onde moro, mas ultimamente, nem isso está me ajudando.

— Por quê?

— Eu preciso preencher esse buraco em minha vida, Claire. Eu necessito me lembrar dessa lacuna perdida do meu passado.

— É questão de tempo, amiga.

— Você sabe que não é bem assim. Eu posso nunca mais me recordar de algumas coisas que ocorreram. Não sei o porquê, mas sinto que perdi acontecimentos marcantes nesse período.

Esse é um dos meus medos mais reais.

Além da dor na cabeça que sinto certos dias da semana, eu tenho medo dessa pancada causar algo que posso levar pelo resto da vida. Para certas coisas sou medrosa e essa é uma delas. Perder minha identidade, por assim dizer, é algo que me afetaria em grandes proporções.

— Isso não vai acontecer, Gabriela.

Claire veio em minha direção e me deu um grande abraço.

Minha amiga é um dos meus alicerces e não tenho vergonha em dizer isso. Além da minha família, ela é uma das pessoas com quem mais tenho contato, por morarmos juntas, e por isso me abro muito com ela. Posso afirmar que Claire sabe de vários segredos meus e sempre me auxilia quando estou com algum problema, principalmente depois do incidente que me acometeu.

— Não sei o que faria sem a sua amizade, amiga.

— Você não seria ninguém sem mim. Eu sei disso. — Ela me deu uma piscadinha.

— Você é demais. — Gargalhei alto.

— Minha autoestima é muito elevada. E em breve a sua será também. É a meta da minha vida.

— Tudo bem.

Ficamos um certo tempo sem falar nada. Minha cabeça estava trabalhando muito ultimamente, mas de uma forma errada. Acho que todos esses sonhos que estou tendo estão tomando forma de pesadelos por causa do meu stress, e pela falta de inovação em minha vida.

— Que tal assistirmos um filme hoje? — disse do nada.

— Combinado. Vou olhar na Netflix se...

— Não, não. Vamos ao cinema. Tem muito tempo que não vejo uma sessão em uma tela grande.

— Certo. — Ela me olhou desconfiada. — Essa vontade surgiu somente agora?

— Sim. Não sei o que me deu. Você está certa em um ponto: preciso sair um pouco mais e viver a vida.

— É assim que se fala! — Claire se vangloriou.

***

03

Estávamos no shopping nesse momento. Olhei aquela infinidade de filmes à minha frente (tudo bem, exagerei!), e fiquei pensando em qual veríamos. Na verdade, eu já tinha um em mente, mas queria saber a opinião de Claire.

— Estou na dúvida, amiga. — Ela me olhou com uma cara triste.

— Eu escolho. — Pisquei para ela. — Está entre quais filmes?

— A Verdade Oculta e A Procura de um Desamor.

— O filme do título diferente. — Olhei para o enorme banner do filme em questão que estava perto de mim.

— Verdade. Fiquei curiosa, sabia?

— Eu também. Então... — Fiz um pequeno suspense. — Que tal vermos esse filme?

— Combinado.

Fomos para a fila dos ingressos, e depois em direção à fila da pipoca. Sempre fui magra, mas eu gostava de comer muita besteira, até demais para o meu gosto.

Após comprarmos pipoca e alguns quitutes, olhei para o lado e vi um rosto familiar. Era ele...

Fiquei fitando Enzo por alguns segundos sem dizer nada.

— Ei, está me ouvindo? — Minha amiga me tirou do transe. Não sei bem o porquê, mas travei quando o vi. Confesso que dei uma boa analisada nele, principalmente porque ele estava de pé.

— Me desculpe.

— O que houve para ficar com essa cara?

— Esse homem. — Apontei a cabeça na direção em que Enzo se encontrava. — Ele é meu médico.

— Jesus! — Ela soltou um pequeno grito.

— O que foi?

— Pegue algo grande e bata na minha cabeça, por favor. Quero me consultar com esse gostoso.

Não me contive e comecei a rir do seu comentário. Quase derrubei o balde de pipoca no chão.

— Você não presta, sabia?! Isso é algo para se falar? — disse séria, mas me diverti pelo modo como ela discorreu.

— Me dê um desconto. — Ela me olhou firme, virando de lado logo após me dar uma olhada inquisitória. — Olhe para esse homem, Gabriela. É sério que não acha ele atraente?

— Eu não disse isso.

Enzo é um pedaço de mau caminho se for para exemplificar a situação. Alto, forte, olhar penetrante, queixo definido, boca... bem, dá para se ter uma noção pelo modo que estou falando. Apesar de ter um corpo que me agrada, suas feições chamam mais ainda a atenção.

Ele possui os olhos negros, bem como os cabelos, que são arrepiados e lisos. Sua barba cerrada em contraste com o sorriso que presenciei no consultório me deixou paralisada e sem graça. Ele é o tipo de homem que constrange certas mulheres, digo isso por causa da sua beleza. Tenho certeza de que algumas delas dariam tudo para ter um homem assim em seus braços. Além de tudo, me parece ser um ótimo médico, pois foi bastante atencioso comigo.

— Sei que pensa loucuras quando olha para ele. — Claire me deu um abraço de lado.

— Ele foi alguém do meu passado, é normal ficar pensando algumas coisas. Essa pancada em minha cabeça...

— Esqueça esse assunto, Gabriela. — Ela me interrompeu quando viu que falaria sobre a agressão que sofri. — Vamos focar no filme e torcer para sentar perto daquela delícia. Comecei a rir.

— Primeiro temos que torcer para ele estar vendo o mesmo filme que a gente.

— Verdade. — Ela olhou para cima.

— E ele está acompanhado. Por favor... não vá me fazer nada de errado ou estranho.

Enzo estava acompanhado com uma mulher linda.

— Claro que não! Como você disse, ele está com uma mulher ao lado. Agora, se estivesse só ele... tenho certeza de que pularia em seu colo.

Balancei a cabeça em negação enquanto me deliciava com o momento. Apesar de tudo, eu sou uma mulher feliz, e tento levar a vida de uma maneira que eu aproveite tudo a minha volta.

Já dentro da sala e posicionada em minha cadeira específica, fui responder uma mensagem em meu celular. Notei que Claire estava fazendo o mesmo. Como o trailer dos outros filmes não havia começado, fiquei um pouco entretida com o celular.

— Olá, como está, Gabriela?

Tomei um baita susto quando vi Enzo na minha frente estendendo a mão. Fiquei sem reação. Não notei que ele havia me visto.

— Oi... doutor Enzo — disse essa pequena frase em três segundos. Um tanto quanto em câmera lenta.

— Por favor, me chame de Enzo, somente. — Seu sorriso transpareceu, e eu me vi perdida em sua face.

— Você que é o doutor que está tratando a minha amiga? — Claire disse do nada enquanto guardava o celular.

— No momento, pode-se dizer que sim.

— Trate bem dela, por favor. Gabriela me disse que você é um ótimo médico e que tem um baita sorriso. — Ela parou. — A parte do sorriso comprovei agora — complementou.

— Claire! — Desviei meu olhar.

Enzo começou a gargalhar. Ele não parecia sem graça, na verdade, ele estava se divertindo com a situação.

— Éramos muito amigos no passado. Pode ter certeza de que auxiliarei Gabriela com tudo que estiver ao meu alcance.

— Fico feliz. — Claire disse.

O trailer de algum filme começou no imenso telão.

— Terei que voltar ao meu lugar. Foi muito bom te rever, Gabriela.

— Digo o mesmo, Enzo — disse sem graça.

— Até mais, Claire.

— Até... — Ela deixou a frase no ar, praticamente babando nele. Fiquei com vergonha por nós duas.

Enzo se sentou um pouco longe da gente.

— M-E-U D-E-U-S. Esse homem de perto é mais bonito ainda. Como proceder, Gabriela? — Claire me olhou maravilhada.

— Que história é essa de falar que eu achei o sorriso dele bonito? Posso saber quando foi que te falei isso? — disse furiosa pelo constrangimento que ela me havia feito passar.

— Você não me disse isso.

— E por que falou isso para ele? — Olhei incrédula em sua direção.

— Estava fazendo uma "média". — Ela piscou para mim.— E nem me venha falar que não acha o sorriso dele bonito.

— Não é isso. Só que... fiquei sem graça.

— Bobeira! — Ela praticamente cuspiu essas palavras. — Notei que ficou paralisada quando ele sorriu para você, assuma.

Claire me pegou!

A sessão havia começado, mas confesso que fiquei observando Enzo durante praticamente todo o filme. Ele estava longe, mas mesmo assim, eu não podia dar tão na cara que olhava para ele.

A mulher que estava ao seu lado me parecia querer atenção a todo o momento, já ele... não. Realmente me parecia que ele estava focado no filme. Apesar de eles estarem muitas fileiras em nossa frente, conseguia perceber algumas coisas.

— Eu queria um médico gostoso desse, sabia?

— Sei. — Dei de ombros. — Depois de um mês enjoaria dele, como é o normal para você.

— Talvez. Mas me divertiria muito com aquele corpo. Ahh, pode ter certeza que sim.

— Você não presta, amiga.

— Não, gatinha.

O filme acabou rápido e não prestei muita atenção na história. Além de ter uma amiga falante ao meu lado, fiquei pensando em Enzo. Estranho demais...

Quando nos encaminhamos para sair da sala, vi que seu olhar procurou o meu, e com um aceno de cabeça e um sorriso, se despediu de mim.

Enzo saiu abraçado com a moça que estava em sua companhia, e não sei o motivo, mas senti uma pequena ponta de ciúmes, acho que estou ficando louca...

Para mais, baixe o APP de MangaToon!

novel PDF download
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!